
Um dos mais interessantes personagens dos quadrinhos, o mago John Constantine está de volta ao Universo DC tradicional. Ou seja, irá voltar a interagir com Superman, Batman, Mulher-Maravilha, Lanterna Verde e companhia.
Constantine é um arrogante e egoista mago inglês criado pelo escritor Alan Moore e os desenhistas Steve Bissette e John Totleben e apareceu pela primeira vez na revista do Monstro do Pântano, The Saga of Swamp Thing 37, de 1985. Como os desenhistas eram fãs da banda pós-punk The Police, Moore estabeleceu que Constantine tivesse a aparência do cantor Sting e, desde então, assim ele é retratado.
O Monstro do Pântano, por sua vez, é uma criatura que habita os pântanos dos Estados Unidos e é metade homem, metade planta, criado por Len Wein e Berni Wrightson em 1971.
Em 1984, o escritor britânico Alan Moore chamou a atenção da DC Comics nos EUA com obras publicadas em sua terra natal, especialmente V de Vingança (que inspirou um filme estrelado por Hugo Weaving e Natalie Portman). Logo, Moore foi contratado para escrever as histórias do Monstro do Pântano, transformando a revista em uma série de terror com roteiros incrivelmente adultos e inteligentes. A DC, então, tratou de encomendar do autor várias histórias com seus personagens, o que resultou em histórias clássicas de Superman (Para o Homem que Tinha Tudo e O que Aconteceu com o Homem de Aço?), Batman (A Piada Mortal), bem como de Lanterna Verde e Vigilante. (No Brasil, essas histórias estão coletadas em um encadernado chamado Os Maiores Clássicos da DC por Alan Moore, altamente recomendado). Em 1986, Moore escreveu Watchmen, sua obra mais famosa e apreciada (que também virou filme, em 2009, dirigido por Zack Snyder), mas uma briga pelos direitos autorais da série o afastou definitivamente da DC.

Mas, em sua passagem por Monstro do Pântano, Moore assustou (e encantou) os leitores mostrando que o personagem não era o humano Alec Holland que após um acidente de laboratório teria se transformado no Monstro do Pântano, mas, ao contrário, era uma planta que pensava ser Alec Holland. Neste contexto, o mago John Constantine aparece para ajudar o personagem a lidar com seus poderes e ampliá-los.
A “descoberta” de Alan Moore fez a DC (na figura da editora assistente Karen Berger) ir à Inglaterra buscar novos talentos, ocasionando a chamada Invasão Britânica dos Quadrinhos, que revelou alguns dos maiores nomes dos quadrinhos atuais, como Neil Gaiman (Sandman), Alan Grant (que passou a escrever o Batman), Grant Morrison (Homem-Animal e hoje talvez o maior nome da DC) e Peter Milligan.
Jaime Delano, dessa mesma safra, foi encarregado de criar uma revista própria para John Constantine, lançando Hellblazer 01, em 1988. O título foi um grande sucesso entre os leitores adultos e aprofundou o background do personagem: ficou estabelecido que Constantine nasceu em Liverpool, na Inglaterra, mas no útero de sua mãe, seu cordão umbiliqual estrangulou seu irmão gêmeo e, ainda por cima, sua mãe morreu no parto, o que tornou seu pai alcoólatra. A sina da maldição, então, marcou Constantine desde o começo.

Aos 17 anos, o jovem se mudou para Londres e fez parte do Movimento Punk, tendo inclusive formado uma banda chamada Mucous Membrane (Membrana Mucosa) inspirada nos Sex Pistols. Ao mesmo tempo, ele começava sua iniciação em magia (negra) e, por pura inexperiência e incompetência, terminou condenando a alma de uma criança ao inferno. Este enlouqueceu Constantine, que passou dois anos em um manicômio. Porém, quando saiu, estava fortalecido e veio por se tornar um dos mais poderosos magos do Universo DC e um dos maiores desafetos do Diabo em pessoa.
Em termos editoriais, a revista Hellblazer foi um reduto de grandes escritores e desenhistas, de modo que pode ser apontada como uma das melhores da história. Seu sucesso resultou da criação do selo Vertigo, em 1993, onde a DC reuniu todos as seus títulos adultos, como Sandman, Livros da Magia, Jonah Hex, Preacher etc.
Entre os artistas, destaque para as fases de Garth Ennis com Will Simpson (que resultou no arco de histórias mais famoso do personagem, Hábitos Perigosos) e, depois, Steve Dillon (desenhista que criaria, com o autor, a série Preacher e também produziria uma famosa fase do Justiceiro da Marvel); além daquelas do escritor australiano Paul Jenkins com o artista Sean Phillips; de Warren Ellis (que saiu da revista após ter uma edição censurada); e de Brian Azzarello (autor de 100 Balas, de Batman: Cidade Instigada e Superman: Pelo Amanhã), que, curiosamente, foi o primeiro escritor norteamericano a escrever o título.

A citada Hábitos Perigosos, de Ennis e Simpson (publicada no Brasil nos três primeiros números da extinta revista Vertigo, da Editora Abril, em 1995), é uma boa mostra das histórias de John Constantine. Nela, o mago descobre que está morrendo de câncer – ele é um fumante inveterado – e se vê na iminência de ir para o Inferno por duas razões: pelo caso da criança condenada citada e por ter desafiado o Diabo.
Em determinada ocasião enquanto conversava em um pub (isso mesmo!) com o demônio, chamado também de o Primeiro dos Caídos, Constantine se aproveitou de uma distração do maligno ser e colocou água benta na bebida dele, de modo que, quando o demônio bebeu, foi seriamente ferido pela força divina. Querendo vingança loucamente, o Primeiro dos Caídos vê no câncer de Constantine a oportunidade perfeita de aprisioná-lo no Inferno e fazê-lo sofrer torturas eternas.

Contudo, sabiamente, Constantine vende sua alma aos outros dois caídos. Na cronologia estabelecida em Hellblazer por Garth Ennis (e uma boa contribuição de Neil Gaiman que escrevia Sandman), aquele que chamamos de Diabo é na verdade quatro entidades diferentes: os três caídos e o anjo Lúcifer, que desafiou Deus e foi condenado ao Inferno. Mas Lúcifer abdicou de seu posto e o papel de “Diabo” era exercido pelos caídos.
O Primeiro dos Caídos, o mais poderoso de todos, é o Diabo Cristão que conhecemos; enquanto o Segundo dos Caídos é algo como o “espírito do mal”, algo sem forma definida, apenas uma força negra consciente; e o Terceiro dos Caídos é um demônio que pode assumir qualquer forma que quiser, de modo que é identificado com os “demônios” em geral e as manifestações de outras religiões (como o Hinduísmo, por exemplo), além de ter sido a famosa Serpente que corrompeu Adão e Eva no Édem.

Quando Constantine se vê em um momento crítico de sua doença, ele resolve criar um ambiente místico em seu apartamento e corta os pulsos para acelerar sua morte. Então, o Primeiro dos Caídos aparece para reinvidicar sua alma, mas é surpreendido pela aparição dos outros dois caídos, para quem o mago havia vendido sua alma. Desse modo, os três caídos se vêem na iminência de iniciar uma guerra pela alma (valiosa) de Constantine e, com isso, destruir o Inferno. Não têm, portanto, outra opção senão curar Constantine e ressuscitá-lo.
Histórias desse calibre afastaram, obviamente, o personagem John Constantine do Universo DC tradicional habitado por Superman e Batman. Em suas primeiras histórias – seja ainda na revista do Monstro do Pântano ou no início de seu título solo – era comum o mago interagir com os heróis da DC e seu universo, mas o tom semirrealista, de teor fantástico, horror e temáticas adultas, terminaram por isolá-lo num universo particular do selo Vertigo. O mesmo aconteceu com o seu velho “amigo” Monstro do Pântano.
No entanto, isso agora mudou. Em uma jogada arriscada, a DC reintroduziu recentemente o selo Vertigo dentro do Universo DC tradicional (chamado pelos fãs de UDC). O Monstro do Pântano foi o primeiro, ele retornou em meio aos capítulos finais de Brightest Day (O Dia Mais Claro no Brasil), uma saga em que o Lanterna Verde tem que encarrar uma força que ressuscita personagens mortos.

Aproveitando a deixa da reaparição do Monstro do Pântano, agora é John Constantine que retorna. Os boatos de que o personagem voltaria ao UDC já vinham desde o fim do ano passado, mas se concretizaram no último capítulo de Brightest Day, o número 24, escrito por Geoff Johns e Peter Tomasi e desenhado, entre outros, pelos brasileiros Ivan Reis e Joe Prado.
Alguns fãs estão bastante felizes com isso, mas outros estão preocupados que a qualidade do personagem decaía.
Por fim, não esqueçamos que o mago inglês foi adaptado ao cinema em Constantine, um filme de 2005, dirigido por Francis Lawrence e estrelado por Keanu Reeves. A película, embora baseada em histórias como Hábitos Perigosos e Pecados Originais (as mais importantes do personagem), não agradou porque desvirtuou o personagem, retratado como um americano moreno que vive em Los Angeles e não um loiro britânico que vive em Londres, como nos quadrinhos. O roteiro também não é bem conduzido e, em meio às concessões de Hollywood, termina tirando a força das histórias originais.

