
O fã de quadrinhos pode sair com emoções confusas de Wolverine – Imortal, filme que dá prosseguimento a saga do herói mutante mais famoso da Marvel Comics, membro dos X-Men e adaptado aos cinemas pela 20th Century Fox. Por um lado, pode pensar que é um bom filme, sim. É bem melhor do que X-Men Origens – Wolverine, e dá mais ao mutante mais famoso da Marvel. Sem ter que dividir a tela com literalmente dezenas de mutantes, Logan ganha um pouco mais de profundidade.
O outro lado é que o fã dos quadrinhos pode pensar: “é, realmente, Dívida de Honra daria um ótimo filme”.
A questão é: o famoso arco de histórias chamado agora de Eu, Wolverine, lançado como uma minissérie em quatro capítulos por Chris Claremont e Frank Miller, em 1982, não é exatamente adaptado em Imortal. Há referências à história e seus personagens – Shingen Yashida, Mariko Yashida, Yukio – estão lá. Mas é outra história.
Imortal também bebe na fonte do arco Glória Escarlate, escrito por Chris Claremont e desenhado por Paul Smith em Uncanny X-Men 170 a 173, de 1983, principalmente – ou somente – por incluir dois personagens desta: os vilões Víbora (também chamada de Madame Hidra) e Samurai de Prata.
Então, Imortal pode ser uma decepção para quem vai ao cinema esperando ver um drama sobre um homem em confronto com sua fera interior e que encontra na cultura japonesa e sua devoção ao autocontrole e à honra um contraponto provocador. Se você quer ver Dívida de Honra adaptada ao cinema… Bem, não é desta vez.

Todavia, o ponto a considerar é que se você não vai esperando por isso ao cinema, mas está apenas em busca de um filme divertido sobre Wolverine, então, pode gostar bastante de Imortal.
Imortal tem alguns bons elementos. Curiosamente, o filme aproveita as subtramas de Dívida de Honra, em vez da história principal. Lembra da cena do urso? Bem, está lá. Diferente – vivemos em tempos politicamente corretos – mas em certo sentido fiel à original. A subtrama de Noboru Mori, o Ministro da Justiça do Japão, destinado a casar com Mariko Yashida também está lá, o que ficou legal para trama.
No mais, Imortal segue uma lógica própria, inserindo-se num contexto pós-filmes dos X-Men.
Passaram-se alguns anos após X-Men – O Confronto Final. A trama não diz precisamente quanto. Talvez um ano, talvez dois… Wolverine está perdido no seu Canadá natal, vivendo uma vida vazia e tendo pesadelos com Jean Grey (Framke Janssen), a mulher que amou e foi obrigado a matar no já citado filme. Inclusive, a Fênix aparece bastante no filme, como uma representação da psiquê atormentada de Logan, fazendo o papel de Janssen ser bem maior do que se esperava.

Logan é encontrado por Yukio, que está à procura dele faz um ano (daí a pista temporal). Embora seja uma grande lutadora, a Yukio de Imortal não é a ronin enlouquecida dos quadrinhos. Nem interesse sexual de Logan como na obra original. É apenas uma espécie de “menina de recados” do Clã Yashida e um tipo de irmã adotiva de Mariko. Ah, ela também é uma mutante, capaz de ver o futuro.
O filme cria uma ligação prévia de Logan com o clã Yashida, numa tocante cena mostrada logo no início: Logan é prisoneiro em Nagasaki quando a cidade é destruída pela bomba atômica. Mas consegue salvar um jovem soldado chamado Yashida. Seu nome não é revelado. Ele é apenas referido como Yashida ou Mestre Yashida. Mas não é Shingen, que é seu filho. Portanto, o Mestre Yashida é avô de Mariko.
Embora a escolha funcione para dar movimento à trama e ilustrar a imortalidade de Logan – que não envelheceu um único dia desde 1945 – tal ferramenta termina por diminuir (e muito) o papel de Shingen Yashida. A versão cinematográfica dele é ainda mais canalha do que a dos quadrinhos, porém, é um papel pequeno no filme. Há apenas uma cena em que se faz homenagem à história original, quando este Yashida confronta Logan com uma espada, o que remete – inclusive em algumas coreografias – à clássica luta entre Shingen e Logan desenhada magistralmente por Frank Miller, mas por outro lado, fica até meio sem propósito no filme.

Como já dito, a tônica do filme não é a honra, mas a imortalidade de Logan. É o mesmo drama que várias histórias do Superman já exploraram: um homem imortal carrega muita bagagem emocional, já que vê todos os que ama morrerem e permanece vivo. E no caso de Logan, ainda termina por ser responsável pela morte de alguns deles!
Assim, o que movimenta a trama é o convite do Mestre Yashida para que Logan abra mão de sua imortalidade e a transfira para o velho amigo. Enquanto decide, o mutante vai percebendo uma série de problemas em meio à Casa Yashida, que envolvem a relação entre Shingen e sua filha Mariko; o noivo dela; o samurai desgarrado Harada; e a Dra. Green, médica que cuida do velho e que, todo mundo já sabe inclusive pelos trailers, é a vilã Víbora.
Imortal tem boas cenas de ação desde o início. A luta no topo do trem bala é bastante bonita em termos visuais, mesmo totalmente impossível. Não há como não pensar na cena do trem de Homem-Aranha 2, mas tudo bem. O fator de cura de Logan é desestabilizado, o que o torna mais humano e falível ao longo da maior parte do filme, o que termina sendo interessante também.

Por fim, o maior problema de Wolverine – Imortal é o terceiro ato. É mais uma vítima da afamada Síndrome do Terceiro Ato, ou seja, aqueles filmes que perdem o pique ou perdem força no final, como Homem de Ferro 2. Há uma grande reviravolta na trama no final envolvendo o Clã Yashida e a ideia do espectador sobre os vilões da trama – e isso poderia ser algo positivo – contudo, não parece ser a melhor escolha lógica para o filme como um todo.
Sem entregar nada, sem spoilers, podemos apenas afirmar que a revelação do final enfraquece o filme como um todo. Parte do sentido e da lógica se perde – ou se perde toda – com a tal revelação final.
O que podemos dizer, afinal, está no trailer, é a representação do Samurai de Prata no filme. Transformá-lo em um tipo de Homem de Ferro ou melhor ainda em Monge de Ferro (o vilão do primeiro filme do ferroso) definitivamente não é o que os fãs queriam ver. Porque não fazê-lo como um mutante de armadura de samurai como nos quadrinhos? Tinha tudo a ver com a ambientação do filme – e da trama dos quadrinhos originais.

Mas isso é Hollywood, não é mesmo? Então, “por que não transformar o Samurai de Prata em uma armadura gigante?”. E ainda mais sem ser de prata! Adivinha qual é o metal…
De qualquer modo, Wolverine – Imortal é um filme bom. E vale a pena ser assistido. Como já dito, é uma abordagem digna do personagem no cinema.
Ainda não é o Wolverine raivosamente enlouquecido e sanguinário dos quadrinhos, mas é tudo o que Hollywood pode nos oferecer.
E um aviso: mantendo a tradição dos filmes da Marvel, há uma cena pós-créditos. Por isso, não vá embora quando a música subir.
Vale à pena: é uma das melhores cenas pós-créditos já vistas, construindo uma ponte com X-Men – Days of Future Past, o próximo filme da equipe mutante nos cinemas.
Wolverine – Imortal tem roteiro de Christopher McQuarrie (de Operação Valquíria) e Mark Bomback(de Duro de Matar 4.0), é dirigido por James Mangold e o elenco traz Hugh Jackman (Logan/Wolverine), Hiroyuki Sanada (Mestre Yashida), Hal Yamanouchi (Shingen Yashida), Tao Okamoto (Mariko Yashida), Rila Fukushima (Yukio), Will Yun Lee (Kenuichio Harada/ Samurai de Prata), Brian Tee (Noboru Mori), Svetlana Khodchenkova (Víbora) e Framke Janssen (Jean Grey). A estreia foi 26 de julho de 2013.
Wolverine foi criado pelo roteirista Len Wein e o desenhista John Romita como coadjuvante de uma história do Hulk, em 1974. Um ano depois, foi incorporado (também por Wein) à novíssima formação dos X-Men, e desde então, é um dos principais membros da equipe. Nos anos 1980, começou a ter suas aventuras solo e mantém-se como um dos personagens mais populares da Marvel Comics. Atualmente, também é membros dos Vingadores.

