Penúltimo capítulo da saga da Marvel nos dias atuais e que já teve publicada as partes Introdução, Parte 1, 2, 3, 4 e 5. Se não leu, vá lá e dê uma olhada!
Com o fim da Guerra Civil, os heróis estão divididos.
Tony Stark, o Homem de Ferro, agora é Diretor da Shield e maior autoridade mundial acerca dos superhumanos. E o responsável por pôr em prática o Ato de Registro de Superhumanos, que os obriga a se cadastrar e trabalhar para o Governo dos EUA.
O Capitão América, o maior opositor ao Ato, foi preso e assassinado às portas do tribunal.
Os outros heróis contrários ao Registro estão agrupados nos Novos Vingadores, agora, um grupo “fora da lei” com Wolverine, Homem-Aranha, Luke Cage, Dr. Estranho, Punho de Ferro, Ronin e Eco.
Os heróis a favor do Ato, como Mulher-Aranha, Hank Pym (Gigante), Miss Marvel, Sentinela etc., ajudam Stark no projeto Iniciativa dos 50 Estados, que pretende formar equipes de superhumanos para patrulhar em todos os Estados do país.
Norman Osborn (o Duende Verde) ganha maior importância e sua equipe, os Thunderbolts (criminosos que trabalham à força para o Governo dos EUA), começa a conquistar admiração popular, o que serve para amainar a imagem do maior inimigo do Homem-Aranha.
Todavia, a situação ainda irá piorar.
Estranhos acontecimentos fazem os Novos Vingadores começar a perceber que várias das ameaças que enfrentaram têm ligação entre si.
Para explicar como, o escritor Brian Michael Bendis inseriu uma “história retroativa”, ou seja, acrescentou um elemento do passado que não estava presente nas histórias originais, algumas ainda remetendo aos anos 1960. A maioria da vezes em que este recurso é utilizado tem resultados desastrosos, mas não foi o caso. Bendis teve uma ótima ideia e a implantou de modo competente.
A mais famosa saga dos Vingadores foi “A Guerra Kree-Skrull“, que retrata uma batalha entre duas raças alienígenas pelo domínio da Terra (que ocuparia uma posição espacial estratégica entre os dois impérios), publicada na revista da equipe no distante ano de 1971, escrita por Roy Thomas e desenhada por Sal Buscema e Neal Adams. (Esta história clássica está disponível no Brasil num encadernado chamado “Os Maiores Clássicos dos Vingadores Vol. 01”, disponível nas livrarias).
Os Skrulls são seres verdes, com orelhas pontudas e um característico queixo delgado, que possuem a capacidade de serem transmorfos, ou seja, podem mudar de aparência. Os Krees são seres azuis mais parecidos com os humanos e militares extremamente competentes. Ambas as raças foram criadas na revista do Quarteto Fantástico nos anos 1960 por Stan Lee e Jack Kirby, mas como é comum no Universo Marvel, logo migraram para outras revistas. Ao longo do tempo, confrontaram os Vingadores e os heróis da Terra várias vezes.
A trama retroativa de Bendis afirmava que, após a “Guerra Kree-Skrull”, os maiores representantes dos grupos de superhumanos se reuniram para pensar estratégias de defender o planeta de ameaças desse tipo. Esse grupo se chamou Iluminati e foi revelado em uma minissérie especial em cinco partes, escrita pelo autor e desenhada por Frank Cho.
Os Iluminati eram formados por Tony Stark (Homem de Ferro, representando os homens “normais”, sem poderes), Charles Xavier (o líder dos X-Men, representando os mutantes), Reed Richards (o líder do Quarteto Fantástico, representando os superseres), Namor (o rei de Atlântida, representante dos atlantes, seres subaquáticos), Dr. Estranho (o mestre das artes místicas, representando os mágicos) e Raio Negro (o líder dos Inumanos, uma raça de seres poderosos que habita a Terra e a Lua).
A minissérie mostra os Iluminati agindo em segredo – nenhum dos outros superseres sabia de sua existência – e interferindo em pontos importantes da história do Universo Marvel, mas sua principal ação foi a primeira. O grupo decidiu viajar até a sede do Império Skrull e revidar o ataque, para mostrar que a Terra não estava indefesa. Mas o ataque dá errado e o grupo é capturado. Os heróis são barbaramente torturados e são cobaias de experimentos científicos, mas conseguem escapar, causam grandes danos ao planeta Skrull e voltam.
No presente, a existência dos Iluminati é revelada quando o grupo decide que o Hulk se transformou em uma ameaça grande demais e decide exilá-lo da Terra. Eles capturam o golias verde, prendem-no em uma espaçonave e o enviam para um planeta desabitado. Na saga Planeta Hulk, o escritor Greg Pak mostra que o plano deu errado e o monstro caiu em um planeta-arena, onde seres alienígenas de grande poder brigam uns com os outros como gladiadores para entreter o público. O Hulk, com sua força descomunal, ganha destaque no torneio, vence e ainda libera uma rebelião que destrona o malígno rei, resultando na sua própria ascensão ao mesmo cargo. Agora, como chefe de um planeta, vivendo com uma mulher e à espera de seu primeiro filho, o Hulk decide não voltar à Terra e terminar seus dias ali. Contudo, a nave em que chegou explode e destrói o planeta inteiro, matando sua mulher e seu filho.
Louco de vingança, o Hulk reune um exército com seus amigos ex-combatentes e consegue voltar à Terra para se vingar dos Iluminati, na minissérie World War Hulk (Hulk Contra o Mundo, no Brasil), escrita por Pak e desenhada por John Romita Jr. O Hulk derrota todos os heróis da Marvel, mas no final, termina se detendo, pois não consegue matá-los, convencido por amigos, como Rick Jones (um antigo coadjuvante da Marvel) e o superpoderoso Sentinela, vingador do grupo de Stark. (Detalhe: esses dois arcos foram adaptados para um longametragem em desenho animado lançado em DVD, inclusive no Brasil, chamado Planeta Hulk).
Porém, o estrago estava feito: a existência dos Iluminati foi revelada e a desconfiança contra os superseres – advindas dos eventos da Guerra Civil – aumentou.
De volta à revista New Avengers de Bendis, desenhada agora por Leinil Francis Yu, outro passo para piorar as coisas se deu quando os Novos Vingadores decidem ir ao Japão impedir a ascensão ao poder da irmandade criminosa conhecida como Tentáculo e que está sendo liderada pela ex-heroína Elektra. Ninguém sabe ao certo porque ela se voltou ao crime e a equipe infliltra Eco para descobrir. Mas quando a farsa é descoberta, os Novos Vingadores intervêm diretamente. Na luta que se segue, Eco termina matando Elektra. Todavia, ao cair morta, o corpo de Elektra sofre uma mutação e revela ser, na verdade, um Skrull transmorfo que estava se passando por ela.
Os Novos Vingadores ficam perplexos, porque embora as habilidades transmorfas dos Skrulls já fossem amplamente conhecidas, eles eram facilmente identificados por meios tecnológicos, naturais ou místicos. E nenhum desses havia funcionado no caso de Elektra. O Dr. Estranho, o mago mais poderoso do universo, não havia notado; Wolverine, com seus sentidos hiperaguçados, não; o Homem-Aranha, com seu “sentido de aranha” infalível, também não…
Como ser possível ao Skrull que se passava por Elektra ter conseguido passar desapercebido?
Diante de um caso tão grave, os Novos Vingadores arriscam uma trégua ao clima pós-Guerra Civil e avisam Tony Stark e Reed Richards do ocorrido e os dois defensores do Ato de Registro fazem exames no cadáver alienígena que confirmam que ele não pode ser identificado quando transmutado.
Potencializado pela desconfiança e desilusão causada pela Guerra Civil, logo, um clima de paranóia toma conta de todos os superseres: e se os Skrulls tiverem realizado uma invasão secreta em massa à Terra e estejam infiltrados entre os heróis e vilões? Tony Stark não seria, na verdade, um impostor Skrull? Isso explicaria porque ele teria se voltado contra os Vingadores e o falecido Capitão América?
Para piorar, na medida em que as duas equipes de Vingadores – a legal de Stark e a clandestina de Luke Cage, Wolverine e Homem-Aranha – investigam o caso, mais evidências descobrem de que, realmente, os Skrulls estão infiltrados na comunidade de superseres.
Na minissérie em sete partes Invasão Secreta, produzida pelos mesmos Bendis e Yu, os Skrulls “saem do armário” e tentam dominar a Terra, garantindo que o planeta poderia viver normalmente, apenas se submeter às suas ordens (o que pode ser entendido como uma autocrítica à política externa dos EUA). Logo, se revela que há inúmeros alienígenas infiltrados na Shield e a agência de segurança é rapidamente imobilizada.
Os heróis reagem, mas descobrem que vários dos seus também são impostores Skrulls. Do lado “legalizado”, Hank Pym (o Gigante) é um deles, o que é grave, tendo em vista ele ser um dos líderes da facção, ao lado de Stark e Richards.
A Mulher-Aranha, uma das fundadoras dos Novos Vingadores, agora aliada ao grupo de Stark, também é revelada não apenas como um Skrull infiltrado, mas a própria Rainha Skrull, a líder máxima da invasão.
Até nos Iluminati havia um infiltrado: há algum tempo, Raio Negro havia sido substituído por um Skrull.
Para confundir os heróis ainda mais, os Skrulls liberam uma nave repleta de heróis que estavam mortos ou desaparecidos, como o Capitão América e a vingadora Hárpia, além de outras versões de heróis ainda atuantes, como Wolverine e o Homem-Aranha. Quem é verdadeiro ou falso? Esses recém-chegados são Skrulls impostores ou são os verdadeiros heróis que foram abduzidos há muitos anos e agora estão de volta?
Em meio a lutas e dúvidas, Reed Richards e Tony Stark conseguem inventar uma arma que desativa a transmutação dos Skrulls, revelando quem é verdadeiro ou não. Descobre-se que a maioria dos recém-chegados na nave são falsos, mas a Hárpia (ex-esposa do Ronin) considerada morta há alguns anos, era verdadeira. Ou seja, aquela que morreu havia sido uma Skrull impostora. Outra tripulante da nave era a verdadeira Mulher-Aranha, também abduzida há muitos anos.
Em meio às batalhas e investigações, os Novos Vingadores descobrem que quando os Iluminati foram ao planeta Skrull, anos antes, e terminaram capturados, os alienígenas puderam analisar em detalhes o DNA dos superseres terráqueos e copiá-los sem deixar vestígios. Assim, os invasores já estavam agindo há muito tempo e os estragos eram grandes. Grande parte das ações que envolveram os Novos Vingadores eram, na verdade, consequência dos planos dos Skrulls, como a fuga em massa da prisão de supercriminosos; a facção excusa da Shield atrás de vibranium e a própria Guerra Civil, já que o falso Hank Pym insuflou os acontecimentos e incentivou atitudes antiéticas.
Deixando as diferenças momentaneamente de lado, os Novos Vingadores se unem aos Vingadores legais de Stark e até aos Thunderbolts de Norman Osborn para enfrentar os Skrulls. Mas a batalha tem baixas: a vingadora fundadora, Vespa (ironicamente, a esposa de Hank Pym) é morta no conflito.
E, para piorar, enquanto a batalha final é filmada e transmitida pelas TVs do mundo todo, é justamente Norman Osborn quem consegue se aproximar da Rainha Skrull e matá-la com uma arma especial. Com isso, o Duende Verde, um dos maiores vilões do Universo Marvel, é alçado à condição de “herói mundial”.
A invasão Skrull é debelada, mas o custo é altíssimo. Tony Stark transforma-se no grande “culpado” pela invasão, já que era o líder dos Iluminati. Com isso, o presidente dos EUA o exonera imediatamente do cargo de Diretor da Shield. Além disso, o presidente decide extinguir a própria Shield e coloca justamente Norman Osborn para liderar uma nova agência, chamada de Hammer. (Shield quer dizer “escudo”, Hammer, “martelo”, o que ilustra a ação da agência). Desse modo, o Duende Verde se transforma não somente “na lei”, mas também na autoridade máxima em termos de segurança mundial.
Colocar o vilão no lado dos mocinhos, (aliás, como o maior dos mocinhos) amparado pela lei e pelo governo, termina funcionando como uma parábola da Era Bush, que vivia seus últimos tempos quando da publicação de Invasão Secreta. Assim como a Guerra Civil, os eventos da Invasão Secreta e da saga posterior – objeto do próximo post – funcionam como uma trilogia crítica da política externa e interna dos Estados Unidos na segunda metade dos anos 2000.
O que pode acontecer quando um dos homens mais poderosos e malígnos do mundo consegue tanto poder e legitimidade?
Esse é o tema do capítulo final desta série, que narra os eventos do arco Reinado Sombrio.
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