Renato Rocha hoje, nas ruas do Rio de Janeiro, e nos tempos da Legião Urbana, nos anos 1980.

O programa televisivo Domingo Espetacular, de caráter extremamente sensacionalista, da rede Record exibiu uma matéria no domingo revelando que Renato Rocha, ex-baixista da Legião Urbana, a banda de rock de maior sucesso da história do Brasil, vive hoje nas ruas do Rio de Janeiro.

Renato Rocha nasceu em São Cristovão, no Rio de Janeiro, em 1961, mas emigrou para Brasília aos nove anos porque o pai era militar. Na Capital Federal terminou se envolvendo com o nascente movimento punk balizado na região conhecida como Colina, que deu origem a muitas das principais bandas da cidade. Lá, ficou amigo de Renato Russo e de Marcelo Bonfá, que tocavam em bandas diferentes. Rocha teve várias bandas até ser convidado para ingressar na Legião Urbana em 1984.

Renato Rocha (dir.) em destaque na capa do álbum “Que País é Este?”, de 1988.

Renato Russo havia fundado o Aborto Elétrico em 1978, a banda pioneira e seminal do movimento punk brasiliense. Dois anos depois, Russo deixou o grupo – que prosseguiu sem ele com outro nome, Capital Inicial, e seria outra das bandas mais famosas do Brasil nos anos 1980 – e passou um tempo se apresentando sozinho ao violão até retomar a veia punk e fundar a Legião Urbana com o baterista Marcelo Bonfá, em 1982. Após alguns guitarristas passarem pela nova banda, Dado Villa-Lobos se consolidou no instrumento e cristalizou o núcleo principal do grupo.

Em 1984, por intermédio dos Paralamas do Sucesso, a Legião Urbana assinou um contrato com a poderosa gravadora EMI, mas paradoxalmente, Renato Russo entrou em uma crise de depressão e cortou os pulsos. Ele não morreu, mas ficou impedido de tocar o contrabaixo por uns tempos. Assim, a banda decidiu contratar um baixista fixo para que Russo ficasse livre para cantar nos shows e o convidado foi justamente o velho amigo Renato Rocha.

Em seus primeiros tempos, ainda em Brasília: filhos da revolução.

Mesmo tendo entrado mais tardiamente, Rocha terminou assinando algumas faixas importantes da banda, juntamente com Russo, como Mais do mesmo, Ainda é cedo, Daniel na cova dos leões e Quase sem querer. Rocha tocou baixo nos três primeiros álbuns da banda – Legião Urbana (1985), Dois (1986) e Que País é Este? (1988) – e terminou expulso em 1989, segundo os outros membros, porque estava totalmente desinteressado, faltando ensaios, shows e gravações. Rumores sempre apontaram para um sério envolvimento com drogas.

Fora da Legião, Renato Rocha participou de outros grupos e até gravou um disco, mas depois, parece que perdeu tudo. Segundo a reportagem do programa, ele vive como morador de rua no Rio de Janeiro e alega que não recebe os direitos autorais por suas composições desde 2002, embora aquela banda seja a que mais vende discos no país, mesmo tendo encerrado suas atividades em 1996, por causa da morte de Renato Russo causada por complicações geradas pelo vírus HIV.

A reportagem sensacionalista causou uma grande repercussão no twitter, mas Marcelo Bonfá respondeu a alguns comentários, escrevendo:

Nós sempre tentamos ajudá-lo [Renato Rocha], mesmo quando ele ainda era um músico ausente dentro na banda. (…) Depois disso ele se distanciou e se envolveu em problemas que iam além das nossas possibilidades de ajudá-lo. Muito depois, o Dado, que tem um estúdio, tentou ajudá-lo oferecendo uma participação em uma gravação. Mas ele não conseguiu realizá-la. (…) Algumas pessoas aqui [no twitter] estão bastante equivocadas sobre a ideia de qualquer culpa que possamos ter, eu e Dado, na vida que ele escolheu para si. Posso dizer que eu faço a minha parte quanto a ajudar pessoas dentro do meu raio de ação e que ainda assim vão além da minha própria família.

Capa do primeiro álbum, de 1985: Renato Rocha assina algumas canções, mesmo recém-egresso.

Segundo se apurou, a família de Rocha – mulher e dois filhos – o abandonou e voltou para Brasília. Seu pai, que hoje é advogado, disse à imprensa que se esforça para ajudar o filho, apesar dos graves problemas com as drogas em que está envolvido.

A reportagem, contudo, questiona o não recebimento dos direitos junto ao ECAD, órgão responsável por esse tipo de recolhimento. Segundo os cálculos da Record, a venda e a execução pública das canções nas quais Renato Rocha é coautor deveriam render pelo menos R$ 916,00 mensais.

Talvez, o ECAD tenha algum tipo de responsabilização pelo fato do ex-músico não receber seus dividendos, mas o grande fato à tona é mesmo uma reflexão sobre o poder devastador das drogas em alguns indivíduos e as consequências sociais disso.