
O escocês Grant Morrison é hoje um dos maiores nomes da indústria dos quadrinhos. Adorado pela crítica e polêmico com o público – alguns o amam, outros o odeiam – Morrison é o responsável por algumas das histórias mais importantes das últimas décadas e seu nome é sempre uma sensação. Atualmente, é o responsável por duas revistas mensais da DC Comics: Action Comics (onde reconta os primeiros dias da carreira do Superman e é uma das de maior sucesso da atualidade) e Batman Incorporated (que traz o homem-morcego liderando outros vigilantes ao longo do mundo). Contudo, os dias do roteirista à frente dos quadrinhos de super-heróis podem estar contados. Pelo menos dos quadrinhos mensais. O próprio autor disse isso em uma entrevista ao site Comic Book Resource:
A ideia era que eu sempre continuasse fazendo isso pelo tempo em que isso me desse um monte de prazer e eu conseguisse me expressar. E eu ainda consigo, mas eu posso ver o fim chegando próximo. Eu estou chegando ao fim de longas temporadas e histórias que eu tinha planejado em meus cadernos por anos e as coisas que estou desenvolvendo agora são um pouco diferentes.
A temporada de Action Comics irá concluir na edição 16; minha história em Batman Incorporated termina na edição 12 e depois disso eu não tenho nenhum plano para revistas mensais de super-heróis por um tempo. Multiverso é uma minissérie de oito edições e eu estou em um projeto de 30 páginas da Mulher-Maravilha, mas este são projetos de histórias finitas.
Não estou dizendo que jamais escreverei super-heróis de novo. É apenas que o meu relacionamento com elas tem mudado especialmente após terminar as revistas e eu não estou certo se quero manter o mesmo tipo de alto nível de produção

Action Comics está mais próxima de ter o fim do arco de Morrison, mas Batman Incorporated só teve duas edições publicadas até agora, ou seja, faltam 10.
Grant Morrison nasceu em Glasgow, na Escócia, em 1960, e já em 1978 estava escrevendo quadrinhos para revistas alternativas. Após passar um tempo como membro de uma banda de rock, The Mixers, Morrison voltou aos quadrinhos, publicando para editoras britânicas, inclusive, a Marvel UK que produzia versões britânicas dos heróis da Marvel. Em 1988, seu trabalho chamou a atenção da DC Comics, que se beneficiava da chamada Invasão Britânica, com os trabalhos de artistas como Alan Moore, Neil Gaiman e Alan Grant.
Grant Morrison estreou na DC na revista Animal-Man, sobre o desconhecido super-herói Homem-Animal, onde fez um trabalho surpreendente, brincando com a metalinguagem e constantemente quebrando a “quarta parede”, ou seja, com os personagens sabendo que estão em uma história em quadrinhos. Imediatamente, se tornou um artista cult, o que permitiu a publicação da graphic novel Batman: Asilo Arkham, pintada por Dave McKean (de Sandman), em 1989, uma visão alucinada do universo do homem-morcego. O autor também assumiu Doom Patrol, com as aventuras da equipe pouco conhecida Patrulha do Destino. Ele voltou ao Batman outra vez, no arco de histórias Gothic, na revista Batman: Legends of the dark knight 06 a 11, destinada a aventuras no passado do herói.

O autor iniciou os anos 1990 de novo mais ligado às revistas britânicas, embora tenha contribuído para a introdução no mercado norteamericano de um colega de Glasgow: Mark Millar. Em 1996, Morrison voltou ao mainstream da DC para assumir a nova revista JLA, com aventuras da Liga da Justiça. pela primeira vez desde Crise nas Infinitas Terras, de de anos antes, o grupo reunia os maiores heróis da editora: Superman, Batman, Mulher-Maravilha, Flash, Lanterna Verde, Aquaman e o Caçador de Marte. Os 40 primeiros números da revista, escritos por Morrison e desenhados na maior parte por Howard Porter, entre 1996 e 2000, é para muitos a melhor fase entre todas a que a equipe teve e influenciou diretamente a produção de Justice League – The Animated Series, o desenho animado de grande sucesso exibido na TV entre 2001 e 2004. Várias histórias de Morrison foram diretamente adaptadas para as telinhas.
Morrison encerrou sua temporada na DC com a graphic novel JLA: Earth 2, desenhada por Frank Quitely, na qual introduz uma versão moderna do Sindicato do Crime, uma versão maligna da Liga da Justiça. Esta história seria a base fundamental do desenho animado em longa metragem Liga da Justiça – Crise em Duas Terras.

Mudando-se para a Marvel Comics, em 2000, Morrison assumiu a revista New X-Men, onde desenvolveu uma versão extrema dos X-Men, com desenhos de Quitely, Porter e outros. Sua fase foi, como sempre, polêmica e introduziu novos vilões, como Cassandra Nova e Xorn, além de ter matado – até agora definitivamente – Jean Grey. Uma de suas marcas na revista foi tirar os uniformes tradicionais da equipe e colocá-los usando jaquetas de couro.
Na Marvel também produziu duas minisséries: Marvel Boy e Fantastic Four: 1234.
Voltou à DC Comics em 2005 para produzir outra equipe pouco conhecida, Os Sete Soldados da Vitória, mas logo ingressou novamente o mainstream ao escrever a maxissérie 52 uma ousada publicação semanal de um ano que mostrava semana a semana um ano inteiro na cronologia da editora.

No mesmo ano, também começou a publicação de All-Star Superman, maxissérie que teria 12 edições, com desenhos de Frank Quitely, que para muitos é a melhor história do personagem em décadas, uma visão da essência do homem de aço. A história seria premiada com dois prêmios Eisner (o Oscar dos quadrinhos) de Melhor Nova História e Melhor História Continuada em 2006 e 2009, respectivamente e também seria adaptada como um longametragem animado.
Em 2006, Morrison assumiu o comando do Batman, iniciando na revista Batman 655, ponto de partida para uma longa temporada que duraria até 2011, na qual o herói passa por diversos arcos marcantes como Batman e Filho, que introduz Damian Wayne, filho de Bruce Wayne com Talia Head, a filha do vilão Ra’s Al Ghul, recém-publicado como um encadernado no Brasil pela Panini Comics, e a batalha contra o Dr. Hurt e a organização Luva Negra, que resultou no desaparecimento do herói por um ano, quando foi substituído no papel de Batman por Dick Greyson, o primeiro Robin, oportunidade em que foi lançada a revista Batman & Robin, de grande sucesso, no qual Greyson (como Batman) age ao lado do novo Robin, Damian Wayne. Algumas edições e as capas foram desenhadas por Frank Quitely.

Em 2008, Morrison escreveu a minissérie e megaevento Crise Final, uma das mais compelxas de suas histórias, envolvendo um ataque de Darkseid à Terra e na “morte” do Batman, desenhada por J.G. Jones. Quando o herói retorna, em The Return of Bruce Wayne, Morrison desenvolveu a ousada ideia de passar a haver dois Batman: Dick Greyson e Bruce Wayne, cada um com um uniforme ligeiramente diferente, agindo ao mesmo tempo no Universo DC.
Em 2010, encerrou sua temporada em Batman & Robin no número 16 e lançou uma nova revista: Batman Incorporated, na qual Bruce Wayne anuncia ao mundo que é o financiador do Batman e monta uma empresa de ação global para treinar novos vigilantes mundo à fora, criando vários novos personagens, como Batwing, o Batman da África.

Com o reboot cronológico e editorial da DC Comics em 2011, oficialmente chamado de Os Novos 52, Morrison deixou as revistas do Batman e assumiu o controle de Action Comics, onde passou a contar as aventuras de um Superman jovem e raivoso em início de carreira, com desenhos de Rags Morales, que se tornou um dos maiores sucessos da empreitada.
Em 2012, retomou uma nova série de Batman Incorporated, para terminar a história que tinha planejado desde o início e foi interrompida pelo reboot. O autor também tem planejada uma versão radical da Mulher-Maravilha – com muito sexo, ele diz – que pode (ou não) ser lançada como parte da empreitada chamada Earth One, dedicada a aventuras modernas dos icônicos personagens da editora, que já teve edições de Superman e Batman publicadas.
As histórias complexas, cheias de referências literárias e da cultura pop, carregadas de metalinguagem e metáforas não são fáceis de agradar ao grande público – embora constantemente o façam – e o afastamento de Grant Morrison dessa mídia pode realmente criar um vazio.


Os quadrinhos de super-heróis vão ficar mais pobres.
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