A Warner Bros. Discovery, empresa que é proprietária da DC Comics, está interessada em instalar uma estátua do Batman no Beco do Batman, na Vila Madalena, em São Paulo. O local é famoso por suas pinturas, grafites e artes gráficas e é um ponto turístico de destaque. A ideia da empresa é colocar uma representação de dois metros de altura e 400 quilos representando o super-heróis dos quadrinhos como parte das comemorações de 100 anos da Warner. E já que o local foi espontaneamente batizado de Beco do Batman pela população, então, por que não colocar o cavaleiro das trevas lá?

A estátua original, em bronze, instalada em Burbank, Califórnia.

A estátua em questão seria uma réplica da original forjada em bronze criada pelo escultor Alejandro Pereira Ezcurra e instalado na cidade de Burbank, na Califórnia, que é onde está a sede (e os estúdios cinematográficos) da Warner, e foi instalada em 2020. (O HQRock noticiou o evento, leia aqui!). A imagem é baseada no traço do desenhista Jim Lee, um dos mais famosos da DC Comics, e que, inclusive, atualmente é o presidente da editora e também seu publisher e diretor criativo (saiba mais aqui), usando como referência particular uma edição da série Batman: Black & White, na qual artistas são convidados a retratar o personagem em histórias narradas em preto e branco. Contudo, ao contrário da original, a versão paulista seria em fibra de vidro e pintada com tinta automotiva. A Warner se compromete a assinar um termo de doação e também um contrato de manutenção e limpeza do artefato por um prazo a ser definido em conjunto com a Prefeitura de São Paulo.

A proposta, diz o Estadão, foi apresentada à gestão de Ricardo Nunes em novembro do ano passado e está em discussão na Comissão de Proteção à Paisagem Urbana (CPPU) da Prefeitura de São Paulo. Segundo o jornal, a proposta está causando controvérsia entre os Conselheiros do órgão acerca de sua adequação à Lei Cidade Limpa, bem como alguns pontos negativos, tais quais: ser uma propaganda de uma empresa privada, não ter ligação com a cultura paulistana, a pretensa má qualidade material do artefato e “os impactos para o erário público após o fim do termo de cooperação”, diz o Estadão.

O Beco do Batman.

A proposta da Warner seria efetivada pela RG Produções e incluiria, além da estátua, dez luminárias, 10 bancos de concreto e 10 lixeiras, todas com temática do cavaleiro das trevas e de sua fictícia cidade de Gotham City.

A discussão da Comissão é válida, é claro, e vale à pena discutir sobre o caráter de propaganda de empresa privada que violaria a Lei da Cidade Limpa. Por outro lado, é importante entender que, mesmo sendo propriedade da DC Comics (e em consequência da Warner Bros. Discovery), o Batman é uma referência essencial da cultura mundial dos séculos XX e XXI, e sua importância extrapola (e muito) o caráter comercial, pois ele se transforma em uma referência cultural e simbólica significativa, inclusive, com elementos mitológicos, como dizem os estudos sociológicos e antropológicos sobre os super-heróis.

O argumento da não identificação do Batman com a cultura paulistana é tão fajuto que o nome do espaço em que ele se pretende instalar é Beco do Batman. O motivo é um grafite pintado nos anos 1980 no local que terminou por batizar espontaneamente a região. Hoje, o grafite não existe mais, porém, diversos outros fazem referência ao homem-morcego, juntamente com outras temáticas variadas nos vários murais que compõem esse trecho da Vila Madalena. Por ser um personagem intrinsicamente ligado à cultura urbana, em vista sua atuação na grande e decrépita Gotham City, o Batman tem bastante apelo em cidades grandes, e mais ainda, numa metrópole como São Paulo e seus mais de 12 milhões de habitantes.

Ainda que não originário da cidade, o Batman é uma referência cultural mundial e é um personagem representativo para uma significante parcela da população, uma representação mitológica dos feitos possíveis da humanidade e uma referência aos problemas típicos das grandes cidades (como a violência) e as formas de combater esses problemas.

A preocupação com erário público, sim, é fundada, mas vale à pena o Estado discutir formas de manutenção de peças ou obras de arte públicas (no sentido de serem facilmente acessíveis à população em geral, como uma estátua do Batman no meio de um passeio), bem como espaços públicos em geral (como praças, logradouros e parques), incluindo parcerias com a sociedade e iniciativa privada que tornem viáveis iniciativas do tipo.

Sem dúvidas, uma estátua do Batman no Beco do Batman ampliaria a visitação turística ao local e seria um point certo de fotografias dos visitantes – seria, portanto, instagramável, como se diz hoje em dia. Reforçaria uma vinculação cultural do lugar com a cultura urbana – da qual os quadrinhos (e os filmes baseados neles) são uma parte importante – e criaria um espaço divertido, além de ser uma representação desse tipo de arte em uma galeria a céu aberto que sempre teve, desde o seu início, um vínculo especial com a arte gráfica dos quadrinhos.

O Batman foi criado pelo cartunista Bob Kane e o roteirista Bill Finger em 1939 e estreou na revista Detective Comics 27 publicado pela DC Comics.