Houve algum rebuliço na internet há alguns meses atrás quando o ex-Beatles, Paul McCartney revelou em uma participação em um programa de rádio que a lendária banda lançaria uma canção nova com a ajuda de Inteligência Artificial em recuperar a qualidade de uma velha gravação com a voz de John Lennon, que morreu em 1980. Daí, houve toda uma discussão sobre IA e muita desinformação: McCartney explicou que não irão “simular” a voz de Lennon (tal qual as pessoas fazem nas redes sociais e lançam coisas desse tipo feitas com IA), mas que apenas usaram os recursos computacionais para melhorar a qualidade de uma gravação danificada e separar a voz do piano em um registro de pista única (na qual voz e piano foram gravados juntos em vez de separados como em uma gravação profissional).

Ele não revelou que canção era, mas todos apostam em Now and them (também chamada às vezes de I miss you ou I don’t wanna lose you), que Lennon gravou como uma fita demo k7 em sua casa, por volta de 1978, e nunca a terminou. Entre 1994 e 1995, como parte do projeto Anthology (uma autobiografia coletiva em vídeo e livro, que ganhou uma “trilha sonora” de gravações inéditas, como out-takes de estúdio, ensaios, faixas ao vivo etc.), os então três Beatles vivos, McCartney, George Harrison e Ringo Starr, se reuniram para gravar três novas canções, usando demos que Lennon deixara inacabados. Free as a bird e Real love foram lançadas, fizeram sucesso e são apreciadas pelos fãs. Contudo, a terceira canção nunca viu a luz do dia.

E era Now and them, cuja qualidade da gravação estava bem pior do que as outras, pois o gravador k7 foi “contaminado” pelo circuito elétrico do apartamento, deixando um ruído de fundo alto e insistente. Seguindo o desinteresse de Harrison pela faixa, os Beatles vivos interromperam os trabalhos e o Anthology só teve duas canções com o “retorno” dos Beatles. Mas McCartney relatou em várias entrevistas depois o desejo de retomar essa gravação, finalizá-la e lançá-la. E o momento parece ser agora.
Contudo, uma questão ficou em seguida e é sobre ela que falaremos agora… Now and them vai ser lançada como?

De início, a questão mais óbvia seria algum tipo de relançamento relacionado ao Anthology, não? Talvez os três CDs duplos, lançados em 1995 e 1996 (e realizados com uma tecnologia já muito defasada) poderiam passar um tratamento mais tecnológico e serem remasterizados com as novas tecnologias? Com certeza seria uma possibilidade.

No entanto, os fãs dos Beatles pelo mundo apostam em outra proposta: Now and them chegaria aos ouvintes no contexto de um relançamento das famosas coletâneas The Beatles 1962-1966 e The Beatles 1967-1970, conhecidas como Red (Vermelha) e Blue (Azul) pela moldura de suas capas, e lançadas originalmente em 1973 (três anos após o fim da banda) e, portanto, comemorando 50 anos este ano. E não apenas isso: que o lançamento seria já em breve, em setembro!
Será?
Os fãs encontraram várias evidências por aí, com um famoso insider (aquele cara cuja identidade não é conhecida, mas que divulga novidades como “rumores” aos jornalistas antes da confirmação das informações) colocando uma foto da varanda que compõe a capa de ambos os discos nos fóruns de discussão.

E além disso, e mais estranhamente, o comediante e mágico Penn Jillette revelou uma série de informações em seu podcast na Apple Music em julho e causou tanta comoção entre os fãs mais atentos que precisou tirá-lo do ar. Jillette afirmou que durante a apresentação de seu show em Londres teve Giles Martin (o filho do falecido produtor George Martin dos Beatles, e que hoje, ocupa o lugar do pai como coordenador de todos os materiais relacionados à banda e seus relançamentos) na audiência, que o levou a uma visita aos estúdios da EMI em Abbey Road e revelou os segredos do novo lançamento.
É uma história estranha, para dizer o mínimo… a menos que Jillette e Martin sejam amigos íntimos, por que o produtor iria revelar tanto segredo a esse cara?

Mas o pior é que as informações do mágico batem com o que circula na deep sobre o caso: Ringo Starr não queria participar a princípio da regravação de Now and them, mas foi convencido; George Harrison (que faleceu em 2001) gravou guitarras e violões para a canção nas sessões de 1995; McCartney usou a IA para rejuvenescer sua voz para casar melhor com a de Lennon (afinal, Lennon tinha uns 38 anos quando gravou a faixa e McCartney tem hoje 80); Martin usou parte dos vocais de Because (faixa do álbum Abbey Road, de 1969) para montar backing vocals à nova faixa; McCartney e Martin foram a Los Angeles e gravaram orquestra e trompas para um arranjo da canção; e que as coletâneas Vermelha e Azul seriam remasterizadas.
E por que a coletânea? Os argumentos são de que a nova tecnologia de mixagem inventada pelo time do cineasta Peter Jackson para o documentário The Beatles – Get Back (que estreou em 2021 no Disney+), que é capaz de separar sons dentro de gravações de uma mesma faixa. É essa a tal da IA que separou voz e piano de Lennon da faixa Now and them e permitiu mixá-las separadamente como numa gravação profissional.

Mas essa tecnologia vem bem a calhar para remixar os tapes antigos dos Beatles, porque os álbuns pré-1967 foram gravados em apenas 4 canais (e Please Please Me, o primeiro, de 1963, apenas em 2 canais!), o que significa que naquelas canções guitarras e baterias estão misturados nas mesmas trilhas sonoras e não era possível mixá-los separadamente. Agora é possível separar cada guitarra, cada peça da bateria e mixá-los como se fazem nas gravações modernas. O potencial da técnica é incrementar o som e dar mais qualidade sonora e potência aos velhos registros de 1963 ou 1965, como já foi ensaiado na nova versão do álbum Revolver, de 1966, lançado no ano passado e já mixado na nova tecnologia.

A limitação dos 4 canais tinha feito com que os Beatles até agora tivessem relançado em edições especiais (com muitas faixas bônus) apenas os álbuns de sua “segunda fase”, com Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band (de 1967 em 2017), The White Album (1968/2018), Abbey Road (1969/2019), Let it Be (1970/2021 – atrasado pela pandemia), até a invenção da nova tecnologia (usado neste último lançamento pela primeira vez) permitir a chegada de Revolver (1966/2022).
Toda a discografia inicial dos Beatles – Please Please Me (1963), With the Beatles (1963), A Hard Days Night (1964), Beatles For Sale (1964), Help! (1965) e Rubber Soul (1965) – permanece disponível apenas com a remixagem de 2009, que já foi um grande incremento à época em relação à tecnologia anterior. E, convenhamos, o apelo dessa parte da obra é menor para o grande público e pode não ensejar o lançamento separado em box sets como a parte final de sua obra. Talvez até sejam lançados todos juntos como um box set no futuro.

Por ora, os rumores apontam para Red and Blue serem lançadas no lugar, o que seria a oportunidade de “testar” essas faixas mais antigas dentro da nova tecnologia, especialmente aquelas do álbum Red (1962-1966). Faz sentido, mas guarda algum grau de redundância, afinal, a coletânea 1 (originalmente de 2000), que tem um único disco, foi relançada com a tecnologia da geração anterior em 2015.

De qualquer modo, 1 é mais restrita, pois coleta apenas as 27 canções dos Beatles que chegaram ao 1º lugar das paradas do Reino Unido e EUA, enquanto Red and Blue coletam cerca de 50 faixas.
Uma curiosidade que ainda resta é que, se for verdade o lançamento de Now and them para promover o relançamento de 1962-1966 e 1967-1970 qual será a real conexão entre elas? Apenas um single à frente dos álbuns? Ou algo mais?
Afinal, via de regra, a nova faixa não tem nada a ver com a coleção das faixas da coletânea original.

A menos que… bom, os Beatles incrementem as coleções… Não é impossível Red and Blue virem com mais faixas, tanto do período que cobrem quanto dos lançamentos posteriores (explorações dos arquivos da banda, como Live at BBC ou os out-takes de Anthology e as bonus tracks dos box sets recentes) e, incluindo, aí sim, para dar o contexto correto, Free as a bird e Real love.
Como será esse pacote é algo que ainda veremos… talvez a banda simplesmente acrescente outro disco. O disco Green (Verde) – ou Yellow (Amarelo), algo assim – com o período 1970-2023 pelo menos no sentido de lançamentos, já que as únicas gravações dos Beatles pós-1970 são Free as a bird, Real love… e Now and them. Por isso, um dos rumores diz que as coletâneas serão lançadas apenas com os títulos Red and Blue mesmo, sem as datas 1962-1966 e 1967-1970, justamente para expandir o período de tempo. Neste sentido, os álbuns seriam ampliados para versões triplas (em vez de duplas) incluindo o material já apresentado em Anthology, Live at BBC e nas bônus tracks dos relançamentos de 2017 a 2022. Quem sabe até alguma coisinha totalmente nova para puxar um pouco mais a atenção?
Se é verdade que o prazo do lançamento – Now and them será lançada com certeza, de qualquer modo – será em setembro, então, devemos saber em breve.
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As coletâneas The Beatles 1962-1966 e The Beatles 1967-1970 foram lançadas em abril de 1973 como dois álbuns duplos, apelidados de Red and Blue Albuns. Até aquele momento, a banda tinha duas coletâneas originais – The Collection of Goldies But Oldies (1966) e The Beatles Again [também chamada de Hey Jude em alguns mercados] (1970) – mas uma versão similar à Blue havia sido lançada de forma pirata sem a permissão do grupo, então, a Apple Corps. decidiu criar essa coleção, com capa dupla e mais de 50 canções no total.
As capas espelhadas de ambos os discos foram produzidas no mesmo local (as escadarias internas do prédio da EMI na Machester Square, em Londres) e pelo mesmo fotógrafo, Angus McBean, em 1963 (para a capa do álbum Please Please Me) e em 1969 (para o álbum Get Back, que nunca foi lançado e foi “substituído” pelo Let it Be, em 1970). Contudo, as coletâneas trazem outras fotos que não aquelas exatamente usadas para cada uma das ocasiões.
Os dois álbuns duplos fizeram bastante sucesso, com Blue chegando ao 1º primeiro lugar da parada de álbuns dos EUA e Red ficando em 3º, enquanto no Reino Unido elas ficaram, respectivamente, em 2º e 3º lugar das paradas. Ambos os álbuns foram lançados em CD em 1993 e foram remasterizados em 2010.


Uma outra possibilidade é Red e Blue serem acompanhadas das coletâneas Beatles Paßt Master Vol. 1 (Black) e Past Masters Vol. 2 (White), que tem algumas músicas menos famosas, takes com versões diferentes das músicas dos discos originais e também algumas gravações bem raras, como She Loves You e I Wanna Hold Your Hand cantadas em alemão. Uma nova música cairia bem nesses dois discos e daria até pra incluir Free as a Bird e Real Love nelas também.
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