Não foi nenhuma grande surpresa, mas o CEO da Disney, Bob Iger, anunciou nesta terça-feira, dia 05, em uma conferência da companhia financeira Morgan Stanley, em San Francisco, Califórnia, que discretamente cancelou filmes e séries do Marvel Studios para focar mais nos Vingadores e recuperar o sucesso (e o prestígio) dos filmes de super-heróis, refutando, ainda, a tal “fadiga” desse tipo de produção nos dias atuais, noticiou o The Hollywood Reporter.

CORPORATE – Disney/ABC Television Group. (DISNEY/ABC/ Heidi Gutman)

Já faz alguns meses que Iger vem comentando sobre o tópico, o que é uma postura inteligente dele, de abordar um problema real com determinada clareza e evitar “disse me disse” desnecessários que podem criar problemas de imagem. Com uma fala franca, ainda que positiva sobre o futuro, o executivo aborda o tema central – a diminuição drástica das bilheterias de cinema, que ele já deixou claro em outros comunicados, é a principal fonte de renda do estúdio (a produção televisiva é secundária, portanto) – que exigem a tomada de decisões difíceis e o redirecionamento de esforços.

Ele explica sua posição:

Você tem que encerrar coisas nas quais você não mais acredita, e isso não é algo fácil nesse negócio, porque uma vez que você começa [um projeto], você tem custos, ou uma relação seja com seus funcionários, seja com a comunidade criativa. Não é uma coisa fácil, mas você tem que fazer aqueles telefonemas difíceis, e nós fizemos mesmo essas ligações difíceis. Não vamos ser muito públicos sobre isso, mas nós já encerramos alguns projetos que sentimos que não eram fortes o suficiente.

Iger também adicionou que vem gastando bastante tempo assistindo esses filmes e fazendo notas sobre eles e distribuindo aos criadores, apontando o que acredita serem problemas que podem ser melhorados, e lembra aos investidores – que afinal são quem sustentam esse negócio – que estão, sim, em uma má fase (ele não doura a pílula, e isso é interessante), mas que o sucesso da Marvel não foi um acidente, e que os primeiros 33 filmes do Marvel Studios renderam só um pouco menos de US$ 30 bilhões, o que é o melhor resultado que um estúdio de cinema já conseguiu em toda a sua história.

Perguntado sobre a tal fadiga dos filmes de super-heróis, também afirmou que ela não existe:

Um monte de gente acha que há uma fadiga com a audiência, mas a audiência não está fatigada: eles querem grandes filmes! E se você constrói um, eles vêm, e há incontáveis exemplos sobre isso. Alguns dos nossos e alguns dos outros. Oppenheimer [um filme da Universal Pictures] é o perfeito exemplo disso. É apenas um filme fantástico.

E voltou a comentar especificamente sobre a Marvel (o principal ativo da Disney, é verdade):

Foco é realmente importante. Nós reduzimos a produção da Marvel, tanto em número de filmes que eles farão, quanto no número de TV shows, e aquilo realmente se tornou crítico, mas eu me sinto bem pela equipe. Me sinto bem pela PI (propriedade intelectual) que estamos fazendo. Eu falei sobre um monte de projetos, nós miramos há anos à frente, de verdade. E é interativo.

Você não olha apenas aos filmes que estamos fazendo, você olha a cada parte do processo, quem os diretores são, quem está sendo escalado, lendo os roteiros, eu pessoalmente assisto filmes de três a cinco vezes com a equipe e criamos uma cultura de excelência e respeito, o que é realmente muito importante com a comunidade criativa. E de novo, os feitos que conseguimos falam por si.

Por fim, ele comentou sobre Deadpool & Wolverine que, por causa da pandemia e da greve dos roteiristas e atores de Hollywood do ano passado, será o único filme do Marvel Studios lançado em 2024:

Será um dos maiores sucessos entre os filmes da Marvel que tivemos em um longo período.

Ah, o executivo também foi questionado sobre a investida das empresas Blackwells Capital e Trian, do executivo Nelson Peltz, que buscam acumular mais assentos na mesa diretora da Disney como parte de um plano de “vingança pessoal” do ex-dono e CEO da Marvel Entertainment, Ike Perlmutter, para tomar o controle da própria Disney (que saber mais? Clique aqui!). Iger minimizou a ação e disse que esse tipo de coisa só existe para distraí-lo, e se ele se deixar distrair, isso não é bom para o negócio.

Bom, a fala de Iger é clara como água: ele acha que houve um excesso de produções nos últimos anos (especialmente na TV) e o investimento em produtos que, em última instância, não eram bons o suficiente. E que agora, em meio à crise, eles vão investir em menos produtos e em mais qualidade, cancelando uma série de produtos (tanto da TV quanto do cinema) que eles não julgaram suficientemente fortes.

Atente à ideia de que ele citou “foco”. O executivo não explicitou, mas os jornalistas do meio já cravaram: ele quer dizer Vingadores. Eu até penso que uma “pausa” aos Vingadores é benéfica no sentido de não cansar a marca e fazer as pessoas terem saudades deles, porém, por um sentido narrativo – e, obviamente, condicionado pelo fim dos contratos com alguns dos principais atores, nominalmente, Robert Downey Jr. e Chris Evans – a equipe dos “maiores heróis da Terra” simplesmente sumiu do MCU depois de Ultimato, no já distante 2019.

E temos que convir… o MCU existe para os Vingadores. É assim que o público vê as coisas. Filmes de personagens “secundários” como Pantera Negra e Capitã Marvel fizeram muito sucesso porque estavam não somente associados aos Vingadores, mas porque o público sabia que eles iriam, depois, se reunir à equipe. É o que sustenta o empenho da audiência nesse universo.

E sem a equipe… e o pior, com o tópico sendo ou ignorado ou escondido no plot dos filmes seguintes, criam confusão e frustração no expectador. Em Os Eternos, uma personagem pergunta quem vai liderar os Vingadores agora que Homem de Ferro está morto e o Capitão América desaparecido, há risos, uma piada “vai ter que ser eu”, diz outro, mas a questão fica no ar. Em Homem-Aranha – Longe de Casa, o Skrull Talos, aliado da SHIELD, pergunta a Nick Fury sobre o que responder às pessoas sobre os Vingadores, e não há resposta. A equipe mal é mencionada em Doutor Estranho no Multiverso da Loucura, em Homem-Aranha – Sem Volta para Casa ou As Marvels… mas o público se pergunta: onde estão os Vingadores? O que aconteceu com eles?

O presidente do Marvel Studios, Kevin Feige disse em uma entrevista que os Vingadores acabaram e foram substituídos pelos Thunderboltsmas já se passaram cinco anos e, além disso nunca ter sido realmente mencionado nos filmes, Thunderbolts nem sequer foi filmado ainda! O público não vai esperar tanto assim. E se questiona: mesmo sem Tony Stark ou Steve Rogers (ou T’Challa)… Hulk, Thor, Gavião Arqueiro, Falcão, Máquina de Combate, Capitã Marvel estão por aí e aparecendo em filmes (ou séries) e como é possível não responderem ao que ocorreu em produções como Os Eternos (um Celestial emergindo do oceano) ou WandaVision (a Feiticeira Escarlate, uma vingadora[!!!] sequestrar uma cidade inteira por vários dias)?

De novo: isso frustra o público. O Marvel Studios criou um monstro… e agora precisa alimentá-lo.

Bob Iger pode estar certo… Deadpool & Wolverine pode ser um sucesso como há tempos não vemos, SE conseguir captar o mesmo sentimento nostálgico emocional que fez Homem-Aranha – Sem Volta para Casa a última grande bilheteria do MCU. E ele vai abrir os caminhos para os dois próximos filmes dos Vingadores.

Então, voltamos ao foco: Vingadores. As mudanças que Iger está se referindo devem dizer a respeito em focar nos Vingadores, esclarecer onde estão ou até mais provavelmente, apresentar uma equipe, ainda que meio substituta. É isso o que os rumores apontam: o final de Capitão América – Admirável Mundo Novo apresentará uma nova equipe, os Novos Vingadores, com os personagens que sobraram: Capitão América (Sam Wilson), Máquina de Combate, talvez, novos nomes como Shang-Chi, como uma maneira de acender a fagulha e colocar uma equipe atuante, que provavelmente, será aquela que iniciará o 5º filme da equipe, cujo título era A Dinastia Kang e que prepara o terreno para o 6º e mais grandioso Guerras Secretas, que irá encerrar a fase atual do MCU (e segundo rumores, gerar um soft reboot que permitirá a troca do elenco para que continuemos a ter filmes dos Vingadores pela próxima década).

Outras produções complementares serão escolhidas a dedo e muitos projetos que circularam nos últimos anos devem estar entre os que estão cancelados, como provavelmente, Guerra das Armaduras, a HQ do Homem de Ferro que, na ausência do personagem no atual MCU, seria estrelado por James Rhodes (Máquina de Combate) primeiro como uma série de TV e, depois, como um filme. Algumas sequências também devem ter caído, talvez, Doutor Estranho 3 ou Pantera Negra 3, e séries do Disney+ como uma segunda temporada de WandaVision ou uma solo do Visão não devem mesmo acontecer, com o streaming talvez focando em personagens que não têm força para um filme solo, mas ainda assim podem causar uma grande sensação na telinha, a exemplo do Demolidor e mais alguns outros, tipo o Cavaleiro da Lua. Duvido que um personagem controverso como o Justiceiro, por exemplo, irá ganhar uma série de TV nesse contexto.