O mundo corporativo é uma graça… quando você pensa que a história acabou, ela volta e derruba a mesa. O interessante é que a maioria do grande público não tem a menor ideia do que acontece nessa seara, mas ela influencia diretamente aquilo que as pessoas curtem: os produtos finais, filmes, séries de TV e HQs… E vamos lá! Hoje, o The Hollywood Reporter noticiou que o ex-CEO da Marvel Entertainment, Isaac “Ike” Perlmutter arranjou um lobby para ingressar a mesa diretora da Disney e, com isso, se vingar de Kevin Feige (presidente do Marvel Studios) e Bob Iger (CEO da Disney). Eita! É briga de cachorro grande!!!

Bom, é o seguinte: um dos mais importantes acionistas da Disney, Nelson Peltz (que tem nada menos do que US$ 3 bilhões investidos na empresa) está acionando uma campanha entre outros investidores para ganhar um assento na Mesa Diretora da Disney, que é composta por um grupo seleto de 12 megainvestidores. Peltz já fez isso antes, pedindo dois assentos, e não foi bem-sucedido. Mas agora, ele está tentando de novo e pedindo três assentos, um deles para ninguém menos do que Ike Perlmutter, o bilionário recluso que já foi dono da Marvel e era o CEO da Marvel Entertainment até o início desse ano.

O contexto da solicitação de Peltz – e Perlmutter – tem lastro: a Disney vem perdendo receita com bilheterias baixas de seus filmes nos anos recentes, além de críticas negativas aos seus produtos de cinema e TV, o que inclui as marcas Marvel e Star Wars. Indiana Jones também conta. Claro, a empresa está em um contexto: o exato mesmo problema acomete a concorrente Warner Discovery (dona das marcas DC Comics e Harry Potter, por exemplo). É uma questão de remodelação do mercado pós-pandemia unido às facilidades tecnológicas do streaming que tiram as pessoas das salas de cinema. Mas isso não parece entrar na cabeça dos executivos, que querem as altas receitas de bilheterias de mais de 1 bilhão de dólares da década passada de volta. A todo custo!
Peltz e sua empresa, a Trian Partners, quer “ajudar” a resolver o problema e, por isso, insiste na aquisição dos três assentos da Mesa Diretora da Disney, colocando o experiente Ike Perlmutter em uma delas.
O problema é a história de Perlmutter com a Marvel e o que isso pode representar para o futuro da companhia e sua empresa-mãe, a Disney. O HQRock já detalhou isso antes (leia aqui), mas em poucas linhas: Perlmutter comprou parte da Marvel Entertainment nos anos 1990 por meio de sua empresa de brinquedos, a Toy Bizz, e quando a empresa declarou concordata, em 1996, Perlmutter foi o “salvador da pátria”, pois adquiriu o controle da companhia e traçou um plano de recuperação, que envolvia vender a preço de banana os direitos de adaptação cinematográfica dos personagens da Casa das Ideias. O plano deu certo e a receita da Marvel voltou a crescer, possibilitando, também, a criação do Marvel Studios e da onda de adaptações cinematográficas do início dos anos 2000, com X-Men, Homem-Aranha, Hulk, Demolidor, Motoqueiro Fantasma etc.
Contudo, quando os executivos do Marvel Studios decidiram investir nos próprios filmes e ganhar mais controle criativo, o então presidente do Marvel Studios, Avi Arad, sócio de Perlmutter, foi contra e terminou afastado do cargo em lugar de seu vice-presidente, o jovem Kevin Feige. Perlmutter apostou na ousadia do jovem e lucrou com isso: Homem de Ferro foi um sucesso absoluto e deu partida no MCU.

Então, a Disney, comandada pelo CEO Bob Iger, deu uma cartada de mestre: se ofereceu para comprar a Marvel por um preço robusto, em 2009. Perlmutter achou um bom negócio e vendeu a companhia à Casa do Rato, garantindo apenas que ficasse no cargo de CEO da Marvel Entertainment, o que foi feito. Mas de dono, Perlmutter passou a “empregado” de Iger e isso tornou as relações muito tensas, ainda mais porque a visão conservadora (e mesquinha, diriam alguns) de Perlmutter entraram em choque com as de Feige. Como resultado, em 2016, Iger promoveu um “golpe” e tirou o Marvel Studios da Marvel Entertainment, colocando-o como uma empresa autônoma respondendo diretamente à Disney.
E se começou uma campanha interna para “queimar” Perlmutter e tirá-lo do cargo. Foram anos até, finalmente, Iger conseguir a demissão de Perlmutter, efetivada meses atrás.
Mas o bilionário não ia deixar barato, claro, e agora, articula uma ação com os peixes grandes, os tubarões, os grandes executivos que financiam o estúdio, para ganhar um assento na Mesa Diretora, ou seja, se tornar um dos administradores não da Marvel, mas da Disney, e fontes ouvidas pelo THR garantem que a agenda do bilionário israelense é pessoal: uma vingança contra Iger e Feige.
O fato é que se Perlmutter for bem-sucedido poderá complicar bastante a vida dos dois e até garantir que ambos saiam das respectivas empresas.

Perlmutter é uma figura controversa: recluso, tem uma vida misteriosa da qual ninguém sabe nada. Ele faz raríssimas aparições públicas (inclusive, ia para as estreias dos filmes da Marvel disfarçado!) e nunca deu uma entrevista. É famoso por ser um grande “mão de vaca” e um conservador que lutou para que Pantera Negra e Viúva Negra não tivessem seus próprios filmes, porque eram negro e mulher, respectivamente, e “ninguém estaria interessado em comprar brinquedos deles”, palavras atribuídas a ele. Ademais, foi um árduo apoiador de Donald Trump e sua última aparição pública foi, inclusive, um ato de apoio ao ex-presidente.
Perlmutter nasceu em Israel e emigrou para os EUA – ninguém sabe exatamente quando, provavelmente, nos anos 1970 – onde enricou em um serviço de funerais, antes de fundar sua vencedora fábrica de brinquedos, que lhe permitiu comprar a Marvel anos depois.

Bob Iger foi CEO da Disney por 20 anos antes de se aposentar em 2020 e foi o grande responsável pelas aquisições da Marvel e da LucasFilm (Star Wars e Indiana Jones) pela Casa do Rato, em 2009 e 2013, respectivamente, liderando a companhia na década de 2010 que rendeu inúmeras bilheterias acima do 1 bilhão de dólares aos filmes da empresa, incluindo principalmente as duas marcas. Após sua aposentadoria, veio a crise da pandemia e a Disney o chamou de volta em 2022. Sua missão é recuperar os anos de glória da empresa.
Quem sairá vencedor dessa batalha?

