A representação do ápice da condição humana, um defensor da democracia. O “sentinela da liberdade”! Um dos mais experientes e respeitados heróis da Marvel, e mais um daqueles que é “o melhor”. O líder máximo dos Vingadores e seu rosto mais público. Os filmes dos Vingadores e a interpretação competente de Chris Evans ajudaram ao Capitão América se tornar um dos super-heróis mais populares da atualidade, ocupando um patamar inédito. Tudo isso é mais do que suficiente para termos este Dossiê Especial com sua trajetória nos quadrinhos.

O Capitão América sempre foi um gigante nos quadrinhos, sua mídia de origem, embora sua popularidade com o grande público fora das HQs variou no tempo. Sua vinculação patriótica com os EUA e a posição política belicista e imperialista daquele país com certeza não contribuíram para que Steve Rogers fosse amado em terras estrangeiras.

Mas a arte é um veículo incrível e complexo. Portanto, embora sem dúvida muitos escritores e desenhistas tenham pensado no Capitão América como um veículo do American Way of Life conquistado por meio do domínio militar ao redor do mundo, que se reveste de elementos culturais desejáveis; as melhores representações de Steve Rogers nas HQs são justamente críticas a tal modelo. Por isso, se a sentinela da liberdade pode ser vista como um símbolo do imperialismo; por outro lado, também aparece como crítica da política externa dos EUA e se foca em algo muito mais universal: o ideal de liberdade e de justiça social que advém da Revolução Francesa e embasou a fundação dos Estados Unidos como nação. Assim, o herói é a representação desse ideal e de seu povo, enquanto o país (enquanto unidade política) e seus políticos e governantes são não raras vezes tratados como inimigos!

Vamos investigar mais e conhecer a longa e rica história do Capitão América nos quadrinhos – e alguns lampejos fora deles? Portanto, pegue seu escudo, defenda a liberdade e lute contra os nazistas e fascistas e embarque na longeva história de Steve Rogers e os artistas que o criaram.
É importante destacar que este post foi originalmente escrito em 2011, mas atualizado em 2014 para o lançamento de Capitão América – O Soldado Invernal e outras vezes depois.

Um Herói Patriótico
O herói foi criado na aurora da Marvel Comics, quando a editora sequer ainda tinha esse nome e foi um grande sucesso nos tempos da II Guerra Mundial até cair em decadência e ser trazido de volta nos anos 1960 após o surgimento do Universo Marvel como conhecemos e ser inserido naquele mundo que continha os Vingadores e outros heróis.
O personagem foi criado por Joe Simon e Jack Kirby e estavam tão certos do sucesso que o colocaram em uma revista própria, o que era incomum. O supersoldado da Marvel estreou em Captain America Comics 01, em março de 1941, numa revista de 60 páginas, com quatro histórias.
Sucesso imediato! Os EUA estavam prestes a entrar na Segunda Guerra Mundial, Hitler era o grande vilão de seu tempo e o Capitão América cumpriu o papel de representar simbolicamente todo aquele contexto.

O Capitão América começou a ser publicado ainda antes da entrada dos Estados Unidos na II Guerra Mundial. Mas após a declaração de guerra em 1939, quando em sequência a uma forte campanha armamentista e a expansão forçosa de seu próprio território, a Alemanha nazista invadiu a Polônia, todos sabiam que era uma questão de tempo até o Tio Sam entrar com tudo, pois já se conhecia a história do conflito anterior.
Paralelo à emergência da Alemanha Nazista, do füher Adolf Hitler e máquina de guerra espalhada pela Europa, surgia o ramo dos super-heróis em 1938 com o lançamento do Superman em Action Comics 01, nas mãos da editora National Periodicals, mais tarde conhecida como DC Comics.
Rapidamente, muitas editoras pequenas surgiram visando os sonhos de grandeza alçadas pela concorrente e uma delas foi a Timely Comics, de propriedade de Martin Goodman, um experiente editor de revistas pulp baratas. Cercado de talentosos escritores e desenhistas, Goodman lançou a Timely em 1939, com uma revista chamada Marvel Comics, que coincidência ou não seria o nome que a empresa adotaria mais de 20 anos depois. Na capa daquela primeira revista estavam os primeiros heróis desse novo universo fictício: Tocha Humana, Namor e o Anjo.
Pouco tempo depois, Goodman contratou uma esperta dupla de artistas para se encarregar do aspecto editorial da empresa: Joe Simon e Jack Kirby; ambos escritores e desenhistas, mas com texto e arte sendo o forte de cada um, respectivamente. A dupla passou a ser responsável pela criação na editora, com Joe Simon no cargo de Editor-Chefe e Jack Kirby no de Diretor de Arte.
Joe Simon & Jack Kirby: Os Criadores
Nascido Hymie Simon, depois rebatizado de Joseph Henry Simon, Joe Simon nasceu em 11 de outubro de 1913, em Rochester, no estado de Nova York, nos EUA, filho de um alfaiate que produzia ternos numa pobre família de origem judaica. Destacando-se no desenho desde a infância, no ensino médio passou a ilustrar o jornal de sua escola e o livro do anuário, o que o levou aos seus primeiros empregos ilustrando jornais locais. Em 1936 ele emigrou para a cidade de Nova York, onde também trabalhou em jornais antes de criar cartazes para a Paramount Pictures e começar a ilustrar revistas de contos, o que o levou ao trabalho nos quadrinhos através da editora Funnies Inc.

Aquele era o exato momento em que as editoras de quadrinhos migravam do modelo que apenas republicava o material das tiras advindas dos jornais para a produção de material original, o que deu origem ao ramo dos super-heróis, cuja primeira incursão de Simon foi o Fiery Mask para a Timely Comics, em 1939, e terminou por se tornar editor da Fox Feature Syndicate, uma das maiores editoras de quadrinhos da época.
Já Jack Kirby nasceu Jacob Kurtzberg em 28 de agosto de 1917, no Lower East Side de Manhattan, em Nova York, também em uma pobre família judia na qual o pai era um alfaiate que produzia calças. Autodidata, aprendeu a desenhar na infância e demonstrou um grande talento, o que o levou, depois de se formar no colégio, a cursar o prestigioso Pratt Institute de artes, porém, não se adaptou ao ambiente rígido e formal da escola e optou por abandoná-la e buscar por trabalho, e aos 19 anos já estava ilustrando cartoons e anúncios em pequenos jornais, o que o levou a se tornar ilustrador secundário no renomado Fleischer Studios, o mais importante estúdio de animação da época, responsável pelos desenhos animados de Popeye (no qual trabalhou) e Betty Boop.

Mas com o mercado de quadrinhos em franca expansão, em 1936, Kirby se uniu ao primeiro estúdio independente de produção de HQs, o Eisner & Iger Studios, de Will Eisner (criador do The Spirit) e Jerry Iger, que aceitavam encomendas de várias editoras, uma das quais a Fox Feature Syndicate, que contratou Kirby para desenhar a revista Blue Beetle, estrelada pelo Besouro Azul, o primeiro super-herói ao qual ele ilustrou, a partir de janeiro de 1940.
Como editor da Fox, Simon ficou impressionado com a arte expressiva de Kirby e propôs que os dois fizessem trabalhos free-lancers paralelamente às demandas da editora, nascendo a parceria Simon & Kirby, na qual ambos escreviam e desenhavam. Após meses produzindo material para várias editoras, dentre as quais o super-herói Blue Bolt, publicado na revista de mesmo nome para a Funnies Inc., da qual a dupla produziria com sucesso as 10 primeiras edições a partir de junho de 1940. Eles trambém criaram alguns personagens para a Timely Comics no mesmo período, mas nenhum deles conseguia a mesma popularidade que Tocha Humana e Namor, o príncipe submarino, criações de Carl Burgos e Bill Everett, respectivamente, e nomes fortes da casa.
Ainda assim, impressionado com o trabalho da dupla, o publisher da Timely, Martin Goodman, contratou Joe Simon para atuar como editor-chefe da editora e lhe incumbiu da tarefa de criar um super-herói patriótico…
Criando o Sentinela da Liberdade
Mas na medida em que o ano de 1940 avançava, mais clara ficava a percepção de que logo, logo, os EUA ingressariam na guerra. Então, Martin Goodman pediu que Simon e Kirby criassem um super-herói patriótico. A dupla se reuniu e criou o Capitão América, pensando em um personagem que fosse nobre e, refletindo a lógica da guerra, usaria um escudo como arma, um objeto de defesa, para mostrar que os Estados Unidos estavam apenas se protegendo das ameaças crescentes da Alemanha e do Japão. Goodman gostou tanto que garantiu a estreia do personagem em uma revista própria – o que era absolutamente incomum na época. E não apenas isso! Uma revista com 64 páginas de material inédito.

O mais comum era um herói surgir nas chamadas revistas de antologia – como Action Comics (na qual surgiu o Superman) ou Detective Comics (na qual surgiu o Batman) – e depois do sucesso estrelar um título com o próprio nome. Algumas editoras mais ousadas até batizavam uma revista com o nome de um personagem forte desde a estreia – como era o caso da Blue Bolt da qual Simon & Kirby trabalharam ou da Flash Comics da All-American Comics (um selo da National, ou seja, da DC) que era estrelada pelo velocista Flash – mas nesses casos, a revista também era uma antologia, com o personagem-título estrelando a primeira história e o restante com outros personagens.
Mas não era o caso de Captain America Comics, que foi projetada para trazer 64 páginas mensais totalmente estreladas pelo sentinela da liberdade, em quatro histórias próprias, tanta era a fé de Goodman de que o herói seria um sucesso. E ele estava certo.
Simon chegou a contratar os desenhistas Al Avison e Al Gabriele para auxiliarem na criação da revista, por causa do tempo curto (Goodman a queria publicada para o Natal), mas Kirby bateu o pé e fez tudo sozinho na primeira edição, virando noites e mais noites, porém, entregando o material há tempo para a gráfica. Ele era um artista rápido. Mas para as edições seguintes, os desenhistas auxiliares começaram a trabalhar de verdade.

Captain America Comics começou a circular nos EUA ainda em dezembro de 1940, mas com a data de capa de março de 1941, que é o que ficou para as comemorações.
A ousadia de fazer uma revista própria com um único herói em quatro aventuras valeu o risco: a primeira tiragem da edição esgotou rapidamente nas bancas. A segunda tiragem precisou imprimir nada menos do que 1 milhão de unidades para dar conta da demanda. Captain America Comics se tornava, desde o número 1, uma das revistas em quadrinhos mais vendidas dos EUA, batendo frente a frente Superman e Batman, os dois maiores sucessos da DC Comics.
O Nascimento de uma Lenda
O novo herói mostrava a que vinha logo na estreia: a primeira capa de Captain America Comics trazia o personagem esmurrando Adolf Hitler em pessoa. O número 01 tinha a origem, confrontos com espiões nazistas e, também, as primeiras aparições do parceiro mirim/sidekicks (moda da época) Bucky Barnes e o arquiinimigo Caveira Vermelha.

Captain America Comics trazia quatro histórias e mostrava bem claro o clima nos EUA pré-guerra, com espiões nazistas (chamados quinta-colunas) infiltrados no governo e fazendo atos terroristas, como explodir fábricas, ao mesmo tempo em que os jovens corriam para se alistar (como mostra o primeiro quadro) e ficarem disponíveis para lutar por seu país assim que ele entrasse na guerra. A chamada de abertura deixa bem claro que a história se passa em 1941 e esse se tornou um elemento cronológico do herói, também.

A revista de estreia trouxe a origem do Capitão América e esta é uma das mais definitivas dos quadrinhos, não tendo sido alterada desde então. Apenas ampliada ou detalhada. Na trama, já em suas primeiras páginas, é situada a história em 1941 e explicado que os Estados Unidos não estão envolvidos na guerra que assola a Europa, mas isso não quer dizer que estão incólumes ao que está acontecendo no mundo: enquanto os jovens são chamados para se alistar nas forças armadas na esperança de defender seu país, vemos o alto escalão do exército discutir com o presidente (representado como o real Franklin Delano Roosevelt, ainda que seu nome não seja explicitamente citado) uma estratégia de se defender da ameaça do Eixo (a união da Alemanha nazista de Adolf Hitler, da Itália fascista de Benito Mussolini e do Japão autoritário do imperador Hiroito), em particular, da ação de espiões e sabotadores, e o presidente lhes indica J. Arthur Grover, o diretor do FBI (uma caricatura do real J. Edgar Roover), que é o responsável pela defesa e contra-ataque dos espiões e suas sabotagens e atos terroristas.
Este é um aspecto interessante, pois a ação futura do Capitão América teria muito pouco a ver com a alçada do FBI como nos acostumamos a ver, e o envolvimento do FBI seria omitido nas versões futuras da origem, colocando o desenvolvimento do herói como uma ação das agências especiais do esforço de guerra. Na história, é Grover quem os leva a um experimento secreto que ocorre em um “bairro decadente” (mais tarde identificado como o Brooklyn, nas histórias dos anos 1960).

Em uma loja de Curiosidades (mais tarde, modificada para de Antiguidades) que serve de fachada, o corpo de militares é recebido por uma idosa rabugenta armada com uma pistola, mas que identificados os visitantes, são liberados a passar e a velhinha tira uma máscara de borracha para se revelar uma bela moça de cabelos pretos, chamada X-13, “uma das agentes mais confiáveis”.

E então, vemos o Doutor Reinstein – uma clara alusão a Albert Einstein, o maior físico da época – que nos apresenta o franzino e doente Steve Rogers que, diz ele, tentou se alistar no exército e foi negado por causa de sua condição física. Reinstein injeta por meio de uma seringa um soro especial (que será chamado nos anos 1960 de Soro do Supersoldado) no rapaz, capaz de multiplicar em milhares de vezes as células humanas, aumentando “sua força, estatura e inteligência”, fazendo-o se transformar em um jovem alto e forte como um atleta de altíssimo nível.
É o próprio cientista quem diz que ele se chamará “Capitão América” e que é o primeiro de um exército de “superagentes” (é usado o termo “agente”, e não “soldado”, pois na época, o que valia era a espionagem, afinal, os EUA não estavam em guerra ainda).

Mas um espião nazista infiltrado no teste consegue assassinar o doutor, perdendo-se o segredo da fórmula para sempre. O novo Steve Rogers incide sobre o espião e lhe dá grandes socos, e ao tentar fugir, o nazista tropeça no exótico maquinário e morre eletrocutado. “Sobraram só cinzas… um fim merecido”, é o que diz o superagente.
Com isso, Steve Rogers é o único supersoldado criado e se transforma no Capitão América para defender a democracia e deter os nazistas. O uniforme do herói em sua primeira revista tem algumas singelas diferenças em relação ao que usaria depois: sua máscara se sobrepunha às orelhas, como um tipo de capacete militar (ideia adaptada ao cinema décadas depois), e portanto, deixava o pescoço descoberto. As faixas vermelhas e brancas do abdome estão apenas na frente e não há estrela nas costas, apenas no peito. Contudo, a maior distinção era seu escudo triangular, que refletia o brasão das forças armadas dos EUA.

A história de origem mostra uma “passagem de tempo” com o herói lutando contra espiões e sabotadores, enquanto notícias de jornais noticiam seus feitos. Isso servia para estabelecer o Capitão América como um combatente experiente no momento em que suas aventuras começassem para valer. Ao mesmo tempo, Steve Rogers é disfarçado como um recruta em um acampamento militar (mais tarde identificado como Campo Lehigh), garantindo o elemento da identidade secreta obrigatório aos super-heróis. No acampamento nem mesmo os oficiais graduados sabiam que Rogers era o herói, apenas o Alto Comando. É aí onde aparece Bucky Barnes.
Desde a criação do Robin na DC Comics, em 1940, o parceiro mirim era quase uma obrigação aos super-heróis da época (o Tocha Humana da Marvel tinha o seu: Toro, traduzido como Centelha no Brasil) e Simon e Kirby fizeram um para o Capitão América, com Bucky. Era um recurso narrativo para fazer o protagonista ter a quem se dirigir e não ter que ficar “falando sozinho” o tempo todo. Também um recurso de possibilitar aos jovens leitores de 8 a 12 anos se identificarem mais com a história. Na trama, mostram rapidamente como James Buchanan “Bucky” Barnes – um adolescente que era o “mascote” do acampamento – presencia Rogers se vestir de Capitão América, sendo treinado para ajudá-lo em combate, assumindo o codinome simplesmente de Bucky, um apelido comum da época.

Como dissemos, Captain America Comics 01 tinha quatro histórias. Em seguida à origem, Capitão e Bucky já mergulham direto em suas aventuras contra espiões e sabotadores nazistas. Na segunda história, temos a ameaça de Sandro e Omar, com o primeiro sendo um espião nazista que organiza ataques ao país (explosão de tanques, demolição de pontes) que são previstas pelo mítico Omar. Essa história traz a estreia do sargento responsável pelo recruta Rogers (logo mais batizado de Sgt. Duffy) e estabelecendo a relação dos dois, com o oficial sempre irascível com a fama de incompetente e atrapalhado de Rogers e lhe mandando descascar batatas, trabalhar na cozinha e ficar uma semana de guarda como punições.

Mas o importante mesmo é que quando Capitão e Bucky descobrem a armação de Sandro e Omar são auxiliados por uma jovem agente secreta loira que logo se apresenta como Betty Ross (nome derivado da mulher que criou a bandeira dos EUA). Ela também será chamada de Betsy de vez em quando. O interessante é que o recordatório do quadro diz que vemos “uma garota familiar”, o que dá a entender que ela é a mesma X-13 da história anterior, apesar da cor do cabelo diferente. Todavia, essa informação é contraditória, pois as próximas histórias mostram que Ross não sabe que o Capitão é Steve Rogers, ao passo que a X-13 presenciou o momento em que ele ganhou os seus poderes, então, elas não poderiam ser a mesma mulher…
Ross é apresentada como uma garota ligeiramente “para frente” (afinal, ela é uma agente secreta!) e pede para “agradecer” o herói no fim, ficando implícito que ela quer um beijo (eram tempos machistas, sim, eu sei), mas o Capitão recusa educadamente, a despeito de Bucky insistir em como ela é bonita.
A terceira história traz outro espião que assassina uma série de oficiais do alto comando numa trama repleta de violência.
A quarta história da primeira edição trouxe a estreia do Caveira Vermelha, aquele que se tornaria o maior inimigo do herói. O personagem foi uma colaboração do roteirista Ed Herron com Simon e Kirby. Na trama, o vilão é na verdade um espião, o engenheiro aeronáutico John Maxon, que usa a máscara do Caveira Vermelha, que traz um misterioso artefato embutido que mata as pessoas que mirem os olhos horrendos e esbugalhados da máscara (o que era um embuste, a história revela no fim, com ele aplicando discretamente um veneno por meio de uma seringa).
A máscara do Caveira Vermelha traz um crânio ligeiramente exagerado de olhos grandes e assustadores e o que é interessante é que, quando o Capitão golpeia bem forte a cabeça do vilão, ela se quebra, como se fosse feita de cerâmica, e não como se fosse um tecido, o que fazia (e ainda faz) total sentido, mostrando como Simon & Kirby se esforçavam para realçar aspectos realísticos nessas aventuras.

O vilão tem uma lista de pessoas importantes a serem mortas (incluindo Capitão & Bucky, claro), sequestra o parceiro do herói e chega a vencer o Capitão América num primeiro round no mano a mano, mas com a ajuda de Bucky, o herói consegue vence, descobrindo que o Caveira não é o verdadeiro Maxon (o verdadeiro pretensamente foi morto e substituído) e o vilão morre no final ao rolar por cima da seringa e ser envenenado. Mas o Caveira era uma criação boa demais para ser desperdiçada e retornaria já no número 03 da revista.

Aparentemente, a estreia do vilão causou bastante impacto entre os leitores, mas é preciso salientar que esta aventura de Simon e Kirby (mais Herron) era bastante similar à estreia do Coringa, em Batman 01, publicada apenas alguns meses antes.
Kirby imprimiu um visual assustador e terrível para o Caveira Vermelha, com seus grandes olhos, bocarra aberta cheia de dentes e mãos gigantes, com dedos bem finos e unhas grandes, o que remetia ao mal e ao medo.
Sucesso Imediato
Captain America Comics foi um grande sucesso desde o início. A edição 01 atingiu a marca de um milhão de unidades vendidas, o que era um fenômeno incrível e a colocava numa estreita faixa das revistas mais vendidas dos EUA, ao lado de Superman. As edições seguintes, pelo menos até mais ou menos 1943, mantiveram uma vendagem próximo à linha do milhão de unidades, que era uma tiragem maior do que a revista Time, por exemplo.
Mas também houve problemas.

De imediato, a Timely foi processada por outra editora porque o escudo triangular do Capitão América era muito parecido com o símbolo de um herói chamado The Shield, criado por Harry Shorten e Irv Novik e publicado a partir de janeiro de 1940 na revista Pep Comics 01, da editora MLJ Comics (mais tarde, parte do conglomerado da Archie Comics) do editor John Goldwater. O Escudo foi o primeiro super-herói patriótico dos quadrinhos e tinha alguma popularidade naqueles tempos.

Antes mesmo de Captain America Comics 01 chegar às bancas dos EUA (pois o visual do herói foi adiantado por imagens promocionais) a Timely recebeu uma notificação judicial da concorrente. Para evitar dores de cabeça, Jack Kirby redesenhou o escudo, criando o icônico artefato circular do personagem. A página de esboço de Kirby sobreviveu, na qual ele anota que o escudo deveria ter aparência elíptica quando visto de lado (para dar mais profundidade), aproveitando para cobrir o pescoço do Capitão América com uma peça do uniforme e ainda estabelecendo a altura definitiva de Bucky em relação ao herói.
Outra modificação discreta foi que as listras brancas e vermelhas do abdome passaram a circundar as costas, mas ainda não havia a estrela traseira que seria incluída depois.

A estreia do novo escudo se deu já na edição 02 de Captain America Comics, sem nenhum tipo de explicação. Histórias futuras, inclusive, ignoraram a mudança, como se o herói sempre tivesse ostentado o escudo circular.
A capa é tão sensacional quanto a anterior e o publisher Martin Goodman decidiu mirar no que deu certo e encomendou uma ilustração que de novo mostrava o Capitão avançando contra Hitler. E para não dizer que eram fogo de palha, a gravura de Kirby tinha correlação com as histórias: a segunda aventura mostrava os nazistas sequestrando um financista americano e Steve e Bucky se fantasiando de mãe e filho (isso mesmo!) e viajando de avião comercial à Europa – por toques de preciosismo histórico o roteiro mostra que eles desembarcam em Paris (já ocupada pelos nazistas então, mas sob um governo “francês”), e de lá se infiltram na Alemanha, pois não era possível um voo comercial entre EUA e Alemanha em pleno tempo de guerra de 1941 – e encarando não somente o füher Adolf Hitler em pessoa, mas também seu braço direito Hermann Göring.
A chamada de página (splash page, a gravura de abertura, que normalmente ocupa a página inteira e serve como uma subcapa) já mostrava Capitão e Bucky aplicando uma “cama de gato” e fazendo Hitler cair sentado em uma lixeira, mas na história, os líderes nazistas levam um chute duplo de Bucky e são humilhados.
À título de curiosidade, os dias que ficaram ausentes do quartel para essa aventura têm um custo: acusados de fugirem, Steve e Bucky ganham uma semana de guarda das mãos do raivoso sgt. Duffy.

A edição 02 tem três histórias e todas têm destaques narrativos. Na primeira há a primeira ruptura fantástica em meio a tramas que tinham uma pegada mais realista. Um nazista usa de uma raça de gigantes fortes e invulneráveis que viviam escondidos nas altas montanhas do oriente (presumivelmente, o Himalaia) e há novamente a participação da agente Betty Ross, desenvolvendo mais a relação dela com os heróis: ela querendo “agradecer” o Capitão e ele a mandando para casa quando a garota o pergunta qual o próximo passo da missão… Puxa, eram os anos 1940…
Mas há uma novidade: por um motivo qualquer Betty visita o quartel (para ver um general) e interage com o recruta Steve Rogers pela primeira vez, e replicando o paradigma das identidades secretas de então, ele banca o bobo diante dela, criando aquela típica dualidade da mocinha apaixonada pelo herói e que despreza sua identidade civil, como na relação Lois Lane e Clark Kent.
Aliás, falando em DC Comics, é preciso salientar que os tais monstros gigantes guardam uma semelhança mais do que demais com os homens-monstros do vilão Hugo Strange das histórias do Batman da época.
A terceira história é muito interessante, com um misterioso assassino serial chamado Homem de Cera que deixa assustadoras cabeças de cera de suas vítimas nos locais onde as sequestra ou mata suas vítimas. Bucky é sequestrado (nessas aventuras, todo mundo parece saber que ele é o parceiro do Capitão América…) e o herói vai resgatá-lo, descobrindo um elemento macabro: ao encontrar uma coleção de cabeças das vítimas em uma estante, percebe que não são de cera, mas são as cabeças de verdade dos mortos! Esse era o material de crianças da época…
O Capitão derrota o Homem de Cera e ainda descobre que ele é o prefeito de Nova York?, Dobbs!

Captain America Comics 02 firmou o sucesso e a qualidade daquelas aventuras de Simon e Kirby, mas a dupla não podia dar conta da demanda de 64 páginas mensais para o personagem, por isso, passaram a usar escritores e desenhistas auxiliares, como os já citados desenhistas Al Avison, Al Gabriele, France Herron, e mais Syd Shores, Al Lieberman, Alex Schomberg, Reed Crandall, Bernie Klein, e também os roteiristas assistentes Ed Herron e Martin A. Burstein.
Infelizmente, refletindo as práticas da época, apenas os nomes de Simon e Kirby saíam nos créditos, com os demais ficando anônimos.
Um detalhe curioso dessas aventuras, que terão implicações no futuro, é a questão: quais os limites das habilidades do Capitão América? Ou melhor: ele tem superpoderes ou é apenas um atleta perfeito? O conjunto de sete histórias das duas primeiras edições demonstram claramente: o sentinela da liberdade é mais do que humano. Na história de Hitler e Göring da edição 02, o Capitão para um carro em movimento segurando pelo seu para-choque e se apoiando em um poste de rua, que entorta pela pressão, numa cena que alude àquela famosa do cinema de 70 anos depois com Steve Rogers impedindo um helicóptero de decolar apoiado nas grades de um heliporto. Na história dos gigantes, ele salta por cima dos fios de alta tensão de um poste. Guarde isso, você vai precisar depois…
Forjando uma Lenda
Captain America Comics 03, de maio de 1941, traz uma série de eventos importantes: a espiã Betty Ross aparece pela primeira vez na capa (ocupando o tradicional local de “donzela em perigo”, embora, curiosamente, não apareça nem na história principal e nem nas outras), temos o retorno do Caveira Vermelha, pavimentando seu caminho para se tornar o principal e mais recorrente inimigo do herói nos tempos da guerra e outras duas estreias.

Seguindo a orientação mais realística do Capitão América, o vilão volta dos mortos com uma explicação direta: a cena mostra que Maxon não morreu pelo veneno (da aparição anterior) por ser parcialmente imune à substância e volta a tramar contra o esforço bélico dos EUA. Embora menos famosa do que a primeira a aventura, esta é ainda mais épica e grandiosa… O Caveira Vermelha agora usa um recurso do “golpe da morte”, na qual quem o golpeia na cabeça morre imediatamente (outro truque devidamente explicado: eletrodos escondidos eletrocutavam quem o tocasse) e rouba os planos de uma máquina perfuradora (daquelas que cavam túneis de metrô) especial e gigante, que destrói alguns prédios e mata milhares de pessoas. A trama também deixa mais claro que o falso Maxon é um agente alemão infiltrado e não um americano traidor, como poderia ser interpretado pela aventura anterior.

Outro elemento interessante dessa história é sua violência: uma gangue de bandidos decide se passar por Capitão & Bucky para ganhar alguns trocados em um show de variedades para as crianças verem (e tocarem!) seus heróis, e são desmascarados pelos verdadeiros paladinos da justiça, porém, os farsantes terminam sendo sequestrados pelo Caveira e são enforcados!!!! Os heróis não conseguiram salvá-los, mas na batalha final, em Long Island, usam uma bomba do próprio vilão para destruir a máquina em uma explosão colossal (que “abalou a cidade inteira”, diz um jornal), com o vilão pretensamente morrendo.
As outras duas aventuras da edição 03 não foram tão memoráveis, com a ação de um assassino nas filmagens de uma produção hollywoodiana e a aparição de um vilão uniformizado (o que era até então muito raro nessas histórias), com o Butterfly (Pernilongo).


Captain America Comics 03 também trouxe a estreia de Stan Lee como escritor do personagem. Stanley Lieber era apenas um menino de 19 anos na época e era o office boy da editora, assistente de Simon e Kirby. Mas o garoto tinha talento para escrever e Joe Simon o contratou para escrever um conto em prosa do Capitão América, apresentado em duas páginas da revista. Foi a estreia de Lee nos quadrinhos – aquele se tornaria o maior monstro consagrado da indústria – e também a primeira vez em que o herói usava seu escudo para arremessar contra um vilão, gesto que seria bastante incomum naqueles primeiros tempos.

Mas no primeiro momento, o mérito do sucesso do Capitão América era de Joe Simon e Jack Kirby mesmo. Os textos cheios de suspense de Simon e a arte dinâmica de Kirby faziam a revista ser muito elogiada. Kirby causou uma pequena revolução no mercado, com seu enquadramento ousado e personagens cheios de fúria e movimento. Foi Kirby também quem criou as páginas duplas, transformando as splash pages (as páginas de abertura, que traziam ilustrações representativas, como um tipo de “segunda capa”) em algo ainda mais impactantes. Logo, todos os editores de quadrinhos da época estavam estudando a Captain America Comics em busca de novidades gráficas.

A obra The Little Book of Captain America, de autoria de Roy Thomas, uma das fontes deste texto, traz uma interessante explicação de Kirby sobre o modo como retratava o Capitão América em ação e a violência ao qual era sujeito:
Eu gosto de mostrar a violência de um modo gracioso, de um jeito dramático. Não violência, basicamente uma violência representada. Eu não busco por violência e não a tolero e nunca a colocaria em meus desenhos. Você pode notar que não há realismo em nada do que eu faço, porque essas são as formas como eu gosto de ver as coisas. Eu gosto de vê-las desse jeito, essa é minha bagagem, minha fantasia.

Kirby não respeitava o padrão de noves quadros por página, remodelando-os, fazendo os personagens saltarem no espaço e até transitarem de um quadro para outro. Na edição 01, ainda é comum ver páginas com nove quadros (o padrão das HQs da época), mas com Kirby variando seu tamanho e orientação, por vezes até mudando a lógica de leitura e usando setas para indicar a ordem em que o leitor deve lê-los. Mas o mais importante, fazendo os personagens transbordarem dos quadros, aumentando a dinâmica de movimento.

O sucesso estrondoso do Capitão América logo motivou o publisher Martin Goodman a instigar a criação de mais revistas e mais super-heróis que ampliaram o panteão da Timely Comics. Em abril de 1941, a revista Daring Mystery Comics 07 trazia um punhado de super-heróis, como Barbatana (Fin), criado por Bill Everett, The Challenger, Blue Diamond e Thunderer, e em agosto, chegou às bancas a revista USA Comics 01, trazendo uma série de novos personagens, como o Defensor, o velocista Whizzer (Ciclone, no Brasil), criado por Al Avison, e Jack Frost, um homem capaz de manipular o frio e o gelo, criado por Stan Lee. Aliás, o garoto de 19 anos rapidamente emergiu como um dos principais criadores da editora e, em breve, lançaria outros super-heróis como Father Time (que estreou em uma história de Captain America Comics 06) e o mais bem sucedido daqueles tempos, o Destruidor (Destroyer), que estreou em Mystic Comics 06, de outubro daquele ano.
Quando Captain America Comics 04 trouxe um conto em prosa (de Simon & Kirby) na qual Bucky é ajudado por um time de meninos da idade dele (Jeff, Knuckles, Tubby e Whitewash), a ideia pareceu tão boa que nasceram os Jovens Aliados (Young Allies) e isso motivou Goodman a lançar a revista quadrimestral Young Allies 01, no verão de 1941, que trazia as aventuras do grupo, com Bucky, Jeff, Knuckles, Tubby e Whitewash reforçados pelo Centelha (Toro), o parceiro mirim do Tocha Humana, que tinha os seus mesmos poderes. A revista foi um sucesso e garantiu a curiosa efeméride de ser o primeiro super-grupo de heróis da futura Marvel.

Além disso, Martin Goodman comissionou Simon e Kirby a criarem uma nova revista que reunia os principais heróis da Timely, uma forma de fazer os leitores conhecerem os demais personagens, como Tocha Humana, Namor, o príncipe submarino, Anjo e Black Marvel. Assim, chegou às bancas a revista All Winners Comics 01, também no verão de 1941. Infelizmente, apesar dos heróis aparecerem juntos nas capas, cada qual ganhava histórias individuais, sem nenhuma interação. Simon e Kirby contribuíram para as histórias do Capitão nas duas primeiras edições de All Winners Comics.

Aos olhos de hoje é estranho ver as belas capas de All Winners Comics com os heróis da Timely/Marvel reunidos em batalha e imaginar que eles nunca se encontravam nas histórias em si. Esse aspecto seria mudado no futuro distante, quando nos anos 1960 foi introduzida a ideia dos Invasores, um grupo de heróis como o que aparecia nessas capas que foi introduzido à continuidade da Marvel, conforme se verá adiante. A arte daquelas capas era quase sempre de Alex Schomburg, que se tornaria o principal capista da Timely.
Com os três primeiros números explosivos de Captain America, Simon e Kirby criaram a fórmula-padrão das aventuras do sentinela da liberdade e passaram a se dedicar às variações dela, mantendo a ação dos sabotadores e espiões, um toque de terror e alguns vilões mais fantasiosos, quase sempre mortos na primeira oportunidade. Daí, em diante, as histórias continuam eletrizantes, mas já é possível perceber com mais clareza a participação de outros artistas auxiliando Kirby na arte, o que traz alguma irregularidade.

Captain America Comics 04, de julho de 1941, traz de novo quatro aventuras, com a primeira mostrando um grupo de nazistas se passando por mendigos e desvalidos e a segunda trazendo um conto fantástico, no qual Capitão e Bucky estão em algum reino europeu e enfrentam um vilão chamado Ivan, o Terrível, que destronou o legítimo rei, sir Pete Ross, ninguém menos do que o pai de nossa agente secreta favorita, Betsy. Mas claro, tudo isso era apenas um sonho de Bucky…
A terceira mostra a dupla desbaratando um esquema de lavagem de dinheiro e vemos, no fim, mais uma vez Steve Rogers e Bucky Barnes sendo punidos por se ausentarem do quartel, condenados a descascar cebolas (e chorarem), humilhados na frente de Betty Ross, que mais uma vez visita o Campo Lehigh. Na quarta história, Bucky se machuca em ação e é levado ao hospital, onde o médico realiza experimentos horríveis e manipula um monstro que parece um minotauro, numa trama que traz novamente o auxílio de Betty e a aparição de um amigo de Steve no quartel, chamado Pete, que cobre e acoberta suas ausências… ainda que no fim o sgt. Duffy descubra outra vez e a dupla seja punida de novo.

A edição 05 trouxe o Circo do Crime, uma trupe circense de criminosos nazistas liderados pelo Mestre do Picadeiro (Ringermaster), um conceito e vilão que Kirby reaproveitaria no Universo Marvel Moderno 20 anos depois… O curioso é que a capa dessa revista trazia a ilustração do Caveira Vermelha, embora ele não aparecesse e, na história, a “roda da fortuna” usada pelo vilão para decidir suas vítimas traz apenas um crânio comum. A trama mostra novamente a participação de Betty Ross, ajudando e sendo salva pela dupla, e de novo, frustrada por não poder “agradecer” ao herói. Mas o interessante é que, dessa vez, vemos uma interação direta da agente com Steve Rogers e Bucky Barnes, com o “soldado” contando a moça “o que sabe” (de ouvir falar) sobre os eventos, o que a dá algumas informações importantes que ela transmite ao Alto Comando.
A interação Roger-Betty-Capitão, portanto, assumia o clichê da mocinha que não sabe que seu amigo atrapalhado é o herói que ama platonicamente, tal qual definido pelo paradigma Clark Kent-Lois Lane.

A segunda história coloca a dupla de heróis contra as forças japonesas (talvez refletindo o crescimento das tensões entre EUA e Japão naquele ano de 1941), com um vilão chamado Capitão Okada, o mestre oriental do mal, um comandante que lidera um monstruoso dragão do mar, um enorme submarino em formato de dragão, capaz de fagocitar um porta-aviões inteiro! Os heróis chegam a pensar ser um monstro de verdade até chegarem perto… É uma grande aventura. A terceira história tem uma boa cena de ação do Capitão roubando um avião nazista para participar de uma batalha aérea e saltar de um avião para outro para derrubar o inimigo, enquanto que na quarta história ele luta contra um tubarão em um tanque.

Captain America Comics 07, de outubro de 1941, finalmente traz o Caveira Vermelha de volta, pela terceira vez, agora, usando a Marcha Fúnebre de Chopin como um hino de morte para seus assassinatos. Há uma mudança significativa, porém, em relação ao monstruoso bandido: Kirby o redesenhou mais horrendo e exagerado, com seus olhos esbugalhados e dezenas de dentes, além de dedos longos e finos e unhas grandes, como garras, parecendo mais um demônio do que um homem. Um visual aterrador!


Além disso, praticamente não é feita nenhuma menção a sua identidade de George Maxon (apenas que ele escapou da morte) e o elemento dessa identidade falsa inicial meio que seria esquecido dali em diante. Por causa disso, muitos historiadores consideram que esta é a primeira aparição do Caveira Vermelha verdadeiro, ao passo que aquele das edições 01 e 03 seria um farsante, algo que seria “confirmado” pelas histórias dos anos 1960, conforme veremos adiante.

O sucesso prosseguia e, auxiliados por seus colaboradores, incluindo o jovem Stan Lee, Simon e Kirby cuidaram da revista até Captain America 10, publicada em novembro de 1941, mas com data de capa de janeiro de 1942. A edição 11 chegou às bancas para o período de Natal num contexto totalmente diferente: os EUA foram atacados em Pearl Harbor em 07 de dezembro pelas forças do Japão e declararam guerra ao país e à Alemanha por tabela, entrando definitivamente na II Guerra Mundial; ao passo que Joe Simon e Jack Kirby já não estavam na Timely e seus textos e arte não apareciam no número 11.

A saída de Simon e Kirby
O sucesso do Capitão América foi enorme e a influência também, mas Simon e Kirby achavam que não estavam sendo devidamente pagos por aquele trabalho tão magistral. Por isso, começaram a secretamente vender trabalho anonimamente para outras editoras, especialmente a DC Comics. A dupla também trabalhou no Capitão Marvel (hoje conhecido como Shazam), um dos maiores sucessos da época, da editora Fawcett. Coube a Simon e Kirby produzir a primeira edição de The Adventures of Captain Marvel, que fez um grande sucesso.

Martin Goodman descobriu tudo, por volta do fim de 1941, e demitiu a dupla sumariamente. Era uma infração “grave”, pois Simon era o editor-chefe e Kirby o diretor de arte da Timely, e estavam vendendo secretamente material a editoras rivais. A operação era muito sigilosa e não se sabe, até hoje, como Goodman terminou por descobrir o feito, ainda que existam algumas suspeitas. Como consequência, a edição 10 foi a última produzida pela dupla Simon e Kirby, encerrando a explosiva fase do duo na Timely, assim como seu trabalho mais famoso.
É preciso dizer, antes de mais nada, que Simon e Kirby não se deixaram abater pelo golpe. A dupla continuou trabalhando e foi imediatamente contratada pela DC Comics, na qual assumiram alguns super-heróis – em especial The Sandman (transformando um vigilante urbano e violento em um super-herói mais clássico) – e criaram The Boys Commandos, uma trupe de adolescentes envolvidos (por motivos distintos) na II Guerra Mundial, como que multiplicando o conceito de Bucky. Publicados na Detective Comics do Batman, já em 1942, a nova tira foi um sucesso imenso e ganharia uma revista própria em breve.

Em Captain America Comics, a dupla Simon e Kirby foi substituída de imediato por seus colaboradores, com Stan Lee e Ed Herran nos textos, e Al Avison, Al Gabrielle, Syd Shores, Don Rico, Ernie Hart, George Klein, Vince Alascia na arte. Alguns dos desenhistas também escreviam suas próprias histórias, como Rico ou Shores.
Stan Lee também herdou o cargo de Editor-Chefe, embora tivesse apenas 19 anos. Goodman lhe disse que o cargo seria temporário, devido à sua juventude, mas Lee terminou ocupando a função por mais de 30 anos! Lee teria o auxílio imediato de Don Rico e Syd Shores como editores assistentes e comandaria a redação da (futura) Marvel não apenas em relação ao Capitão, mas a toda a sua vasta produção quadrinística da época.

Nascido em Nova York, em dezembro de 1922, filho de uma família de imigrantes judeus da Romênia, Stanley Lieber fora considerado um “escritor prodígio” na infância (ainda que o próprio escritor tenha supervalorizado suas conquistas dessa época em declarações futuras). Após trabalhar na entrega de jornais, como escritor-júnior em jornais locais e entregando sanduíches, Lee terminou empregado na Timely aos 16 anos, indicado por um tio que já trabalhava lá, ao passo que, é importante afirmar, o próprio Martin Goodman era casado com uma prima do garoto. Primeiro como faz-tudo, office boy e assistente direto de Simon e Kirby, sua escrita e seu carisma devem ter sido basilares para a indicação ao cargo de editor-chefe, com esse garoto de menos de 20 anos comandando uma das maiores editoras do país naqueles tempos.

Al Avison assumiu a função de desenhista principal e faria a maior parte das capas de Captain America Comics naqueles tempos. A arte de cada edição ou história é até identificada pelos historiadores, mas a autoria dos textos é algo mais controverso, pois não havia o hábito das editoras em dar crédito aos artistas. Apesar da longa lista de colaboradores já citada, a produção de uma revista com 3 ou 4 histórias mensais demandava muito trabalho e, por isso, logo, alguns colaboradores externos foram chamados, especialmente para o roteiro: Bill Finger (um dos criadores do Batman) e Otto Binder (um dos principais escritores do megassucesso Capitão Marvel e, futuramente, do Superman) são nomes conhecidos por produzirem anonimamente histórias do Capitão América a partir da saída de Simon e Kirby. Ray Cummings, veterano escritor de ficção científica de sucesso na década de 1920, foi outro que escreveu histórias.
O público em geral não sentiu tanto o impacto da saída de Simon e Kirby, pois Lee e seus desenhistas e escritores se esforçaram para manter o padrão pré-estabelecido e a revista continuou sendo a mais vendida da editora nos anos seguintes.
Um Herói de Guerra
Em 07 de dezembro de 1941, quando Captain America comics 10 estava nas bancas, os Estados Unidos sofreram o Ataque de Pearl Harbor, quando o Japão bombardeou uma base militar no Havaí e à destruiu. Foi o ultimato para que os EUA declarassem guerra ao Japão e, logo em seguida, também à Alemanha, com o país finalmente entrando efetivamente na II Guerra Mundial.

Uma coincidência triste que Simon e Kirby tenham deixado o personagem justamente antes desse momento. Todavia, mesmo com a produção das revistas em antecedência à chegada às bancas, a influência do ingresso na guerra veio bem rápido: a primeira revista do herói a ser produzida após o ataque foi Captain America Comics 13, que chegaria às bancas em fevereiro de 1942 (com data de capa de abril), com uma representação desrespeitosa e caricatural dos japoneses que seria proibitiva nos dias de hoje, com arte na capa de Al Avison.
Ter os EUA efetivamente na guerra foi “bom” para o Capitão América, que agora, podia ter aventuras diretas na Europa e em meio aos conflitos reais. Isso tornou o personagem um dos preferidos dos militares estacionados no velho continente, que recebiam as revistas pelo correio. Stan Lee, Don Rico, Syd Shores, Al Avison e companhia colocaram o herói e Bucky diretamente no meio das batalhas, com aventuras na Europa e norte da África, em meio a conflitos de guerra (com militares, tanques, aviões e submarinos) engradecidos com elementos fantásticos e toques de terror, mas também, refletindo os avanços e retrocessos reais da II Guerra quase em tempo real, como a disputa pelo Egito ou a retomada de Paris e o Dia-D. Para os leitores da época, isso era um deleite.
Uma coisa curiosa é que a partir da edição 19, de outubro de 1942, a revista se estabilizou com três histórias do Capitão e passou a trazer uma aventura bônus do Tocha Humana, primeiramente, e depois, também de Namor, o Príncipe Submarino, como uma estratégia da Timely de interessar os leitores de uma revista pelas demais.

Alguns críticos destacam a edição 19, pois traz uma das melhores aventuras do Capitão América na Era de Ouro (e infelizmente, os historiadores não sabem afirmar quem a escreveu – a arte de Al Avison), com o herói e Bucky precisando resgatar um oficial aliado atrás das linhas inimigas até Berlim, um exemplo das aventuras situadas no mundo real da II Guerra.
Mas os tempos de guerra são tempos perigosos e tanto Stan Lee quanto Joe Simon e Jack Kirby foram realmente convocados pelo Exército dos EUA para se somarem ao esforço de Guerra, pois era necessário o maior contingente de jovens saudáveis possíveis. Os três foram convocados no ano de 1943. Àquela altura, Simon e Kirby permaneciam na DC Comics, surfando no sucesso na revista Boy Commandos, mas ainda emplacaram outros dois hits: The Newsboy Legion, com meninos que distribuíam jornais e davam informes via rádio e, por isso, me metiam em muitas confusões, e Boy’s Ranch, algo similar aos Commandos, mas situado no velho oeste.

Convocados, Lee terminou trabalhando no Exército como escritor de notícias, de manuais de treinamento e roteiro de filmes de treinamento ou documentários do conflito. Seu serviço permitia que, vez por outra, enviasse roteiros para a Timely, mas claro, o impedia de continuar como editor-chefe, e o cargo foi assumido interinamente por Vincent Fargo, até sua volta. Simon ficou estacionado em Long Island como parte da Guarda Costeira, e também terminou assumindo funções de escritor.

Mesma sorte não teve Kirby, que terminou alocado como soldado comum e foi para a guerra de verdade. Cientes de suas habilidades como desenhista, o exército deu a Kirby a missão de atravessar sozinho as linhas inimigas, acampar e mapear o terreno, de modo que pudessem avançar. Nesta perigosa missão, o desenhista terminou com as pernas congeladas no inverno de 1944 e foi hospitalizado, quase tendo que amputar as pernas. Realocado, Kirby ganhou uma medalha por seu sacrifício e passou a servir como mecânico de caminhões até ser dispensado em 1946.

De volta a Captain America Comics, sem Lee na liderança, Syd Shores, Don Rico e Al Alvison se tornaram os principais artistas do título, trabalhando com vários escritores rotativos (Bill Finger, Otto Binder, Ray Cummings, dentre vários outros). Mas ter suas aventuras em meio à guerra foi produtivo ao personagem, inclusive, com as histórias ganhando uma pegada mais violenta e agressiva. As capas continuavam a trazer Bucky em situação de resgate com frequência, mas passaram a mostrar o rapaz (sempre retratado como se tivesse uns 12 anos de idade) empunhando uma metralhadora (a primeira vez na edição 22, de janeiro de 1943, mas também na 27/junho de 1943 ou 31/outubro de 1943) e o próprio Capitão também empunhando a arma (41/agosto de 1944) ou uma granada (25/abril de 1943).

Há um destaque à Captain America Comics 25, de abril de 1943, com a história The Princess of the Atom, que é uma adaptação da mais famosa história de Ray Cummings (publicada como uma história seriada em 1919 e como livro em 1922), produzida pelo próprio escritor (com arte de Syd Shores), e que inaugurou uma estratégia de ter uma história publicada em duas partes, com 20 páginas cada, em edições consecutivas, que se manteria por bastante tempo dentro da revista.
A maioria dos historiadores, contudo, costuma analisar que Captain America Comics começou a perder força em 1943, quando Stan Lee foi convocado e se afastou da redação. Talvez não por coincidência, a coleção Marvel Masterworks que reimprimiu essas aventuras iniciais aos leitores contemporâneos parou sua publicação no Volume 5, em 2012, coletando até Captain America Comics 21, de dezembro de 1942. Em 2021, celebrando os 80 anos do personagem, a Marvel publicou Golden Age Captain America Vol 1 (edições 1 a 12) e o Volume 2 saiu no ano seguinte (com as edições 13 a 24, a última datando de março de 1943). Não há informações se haverá um terceiro volume.

Isso significa que as edições de Captain America Comics a partir do número 25 não estão disponíveis aos leitores atuais de forma impressa, embora ainda seja possível ler algumas delas nos aplicativos e lojas digitais da própria Marvel.
A Guerra Chega ao Fim
No mundo real, os aliados fizeram sua maior ofensiva em 06 de junho de 1944 e invadiram a Normandia, uma região do norte da França, o Dia-D, iniciando a jornada rumo à retomada de Paris das mãos dos nazistas (em 25 de agosto de 1944), à queda de Mussolini e da Itália ainda naquele ano e ao avanço no sentido de Berlim. Foram os soviéticos quem invadiram a capital da Alemanha em abril de 1945, o que levou à morte de Hitler e à rendição alemã em maio de 1945.

A guerra não acabou, porém: o Japão permaneceu no esforço de guerra e (com sérios desdobramento a países como China e Coreia) o conflito se polarizou entre Estados Unidos e a terra do sol nascente. Mas os EUA desenvolveram a bomba atômica e dispararam duas delas em agosto de 1945, nas cidades de Hiroshima e Nagasaki, resultando na rendição japonesa no mês de setembro, encerrando a II Guerra após seis anos de intensos conflitos.
O declínio da II Guerra pós-1944 teve claros impactos na narrativa de Captain America Comics. Coincidência ou não, no mês de julho de 1944 (ou seja, em seguida ao Dia-D), a revista não chegou às bancas, quase como se os editores da Timely estivessem decidindo o que fazer. Esses meses intervalares começaram a se tornar gradativamente mais comuns dali em diante.

A partir de por volta da edição 45, de março de 1945, começaram a ficar mais comuns histórias não relacionadas à guerra, com foco principal no crime e no terror, quase como um desmame aos leitores. Porém, no mês de maio de 1945 em que a Alemanha caiu, novamente, a revista não chegou às bancas. Ironicamente, o número 47, publicado em junho e com data de capa de agosto, trouxe uma história (de roteirista desconhecido e arte de Vince Alascia) na qual Hitler é o vilão principal, criando um plano de enviar soldados nazistas disfarçados de americanos de volta aos EUA e despertar o mal no país dos inimigos. Este número também é o último a trazer uma capa diretamente relacionada à guerra, com Capitão e Bucky em meio a uma batalha aérea.
A Timely realmente decidiu esperar o desenrolar dos eventos. Por isso, o Capitão América só voltou às bancas no mês de agosto (com data de capa de outubro), que foi o número 50, porém, o ataque nuclear daquele mesmo mês já paralisou a publicação novamente e Captain America Comics 51 só chegou às bancas em outubro de 1945 (com data de capa de dezembro), que foi a primeira edição publicada após o término oficial da guerra. Sua capa não traz uma situação de guerra explicitamente falando, mas ainda é ilustrada por um militar como refém.

O número 51, inclusive, trouxe uma história (provavelmente escrita por Bill Finger e com arte de Vince Alascia) na qual Capitão e Bucky descobrem que os inimigos estão desenvolvendo uma bomba atômica e revelam ao Alto Comando, com os militares americanos lhes contando que já se adiantaram e estão com as suas próprias bombas prontas para acabar com a guerra.

Inclusive, o número 51 dá início a uma pequena fase na qual Finger desponta como o roteirista principal, tendo a arte de Alascia, e principalmente, Clem Weisbecker. Uma das características do momento são as histórias divididas em partes: apesar de continuarem a publicarem cerca de três aventuras do Capitão por edição, as histórias principais passaram a se dividir em duas partes, cada qual em uma edição distinta. O fato de Finger assumir um maior número de histórias talvez esteja relacionado ao fato do Capitão estar combatendo o crime em tempo integral, de modo que poderia se beneficiar da expertise do cocriador do Batman.
O Pós-Guerra
Até ali, o herói tivera a fase de Simon e Kirby, aquela liderada por Stan Lee e a ausência deste pela Guerra. Com o fim do conflito (e a volta de Lee, em 1946), a revista viveria a sua última fase, no pós-guerra. O impacto do fim da II Guerra Mundial foi imediato: da noite para o dia, o Capitão América perdeu muito de seu apelo e as vendas decaíram rapidamente. A partir de Captain America Comics 56, com data de capa de maio de 1946, a revista já começou a refrear sua distribuição nas bancas, saltando meses entre uma edição e outra com alguma frequência. Foi só um prenúncio para a publicação se tornar bimestral a partir do número 58, de setembro de 1946.
A editora teve que investir em outros públicos e outros tipos de publicações para permanecer em alta. Desde 1942, Martin Goodman vinha investindo nas histórias e revistas humorísticas com animais falantes, tais quais os da Disney ou Timetoonies, que faziam bastante sucesso na época, numa linha editorial comandada por Vincent Fago que, por volta de 1945, já correspondia ao principal material da editora. Na mesma época, Goodman também investiu no público feminino, ao notar que as histórias da super-heroína Miss America (criada em 1943) e, mais ainda, as aventuras adolescentes de Patsy Walker eram muito populares entre as garotas. Publicada inicialmente como histórias secundárias na revista Miss America, Patsy Walker ganhou não uma, mas uma linha inteira de revistas, e se tornou em uma das principais atrações da Timely. O sucesso do público feminino levou ao surgimento de outra super-heroína, a Fantasma Loira (Blonde Phantom), em All Select Comics 11, no outono de 1946, que fez tanto sucesso que o número 12 daquela revista foi rebatizada com seu nome.
Todavia, Martin Goodman precisava levantar a venda de sua linha original de super-heróis e teve a ideia de reunir os principais heróis da Timely como um grupo de super-heróis, tal qual a DC Comics fizera com a Sociedade da Justiça cinco anos antes. Até então, os heróis de maior sucesso, como Capitão América, Tocha Humana e Namor compartilhavam constantemente as capas da trimestral All-Winners Comics, mas nunca haviam atuado como um grupo nas histórias em si. Como editor-chefe já de volta à função após a baixa do exército, Stan Lee pensou que Bill Finger deveria ser o nome certo para escrever a história e lhe passou a missão.

Assim, foi Finger quem criou o All-Winner Squad (no Brasil, o Esquadrão Vitorioso), o primeiro supergrupo de heróis da editora que um dia seria a Marvel, que estreou em All Winners Comics 19, no outono de 1946. Com sete capítulos, a história teve vários desenhistas: Vince Alascia, Al Alvison, Bob Powell, e Syd Shores. Chamá-los de Esquadrão Vitorioso fazia todo o sentido, afinal, os aliados haviam mesmo vencido a guerra.
Na trama, já no pós-guerra, Capitão América, Tocha Humana, Namor, Bucky, Centelha, Miss América e Whizzer (Ciclone) se unem para combater o vilão Isbisa, um hábil criminoso capaz de manipular a radiação atômica.
O Whizzer era Bob Frank e estreara em USA Comics 01, de agosto de 1941, criado pelo desenhista Al Avison, e não é conhecida até hoje a identidade do roteirista de suas primeiras histórias. Com poderes de supervelocidade (tal qual o The Flash da DC Comics), o Ciclone aparecia com frequência na USA Comics até seu cancelamento na edição 17, de setembro de 1945, e também em aventuras solo na All Winners Comics desde o número 02.
Já a Miss América era Madeline Joyce, que foi atingida por um raio enquanto manipulava um dispositivo experimental e ganhou superpoderes de voo e superforça, criada pelo roteirista Otto Binder e pelo artista Al Gabriele como uma versão feminina do Capitão América. Ela estreou em Marvel Mystery Comics 49, de novembro de 1943, e foi a segunda super-heroína da Timely, após a primeira Viúva Negra. É importante salientar que o editor Vincent Fago afirmou em entrevista ao Alter-Ego que o uniforme da heroína, na verdade, foi criado pela cartunista Pauline Loth e teria sido ela quem ilustrou a capa e as histórias de Miss America 01.

Curiosamente, houve apenas outra história do Esquadrão Vitorioso, em All Winners Comics 21 (não existiu a edição 20 por qualquer motivo!), no inverno de 1946, agora, escrita por Otto Binder (escritor do Shazam) e de novo com o time de desenhistas em sete capítulos. O cancelamento do grupo veio, talvez, porque as vendas não foram o esperado e eram histórias caras de produzir, por envolverem vários artistas diferentes. Mas o conceito de um grupo de heróis da Era Timely seria recriado nos anos 1970, conforme veremos mais adiante.
Com os super-heróis em declínio, aquela edição 21 terminou sendo a última aparição do Whizzer na Era de Ouro. Miss América continuou com suas aventuras solo por algum tempo.
Uma amostra de que as coisas não iam mesmo bem… a revista Young Allies foi cancelada após o número 20, de outubro 1946, encerrando as aventuras do grupo liderado por Bucky e Centelha.

De volta a Captain America Comics, do ponto de vista narrativo, uma questão interessante era apresentar o que fazia Steve Rogers agora que não era mais um soldado. Desde sempre, as aventuras do Capitão América nunca davam espaço à sua vida pessoal, a despeito do interesse amoroso com Betty Ross e a velha dinâmica tensionada pela manutenção da identidade secreta do herói no batalhão do Sgt. Duffy. Mas isso mudou em Captain America Comics 59, de novembro de 1946, no qual a trama escrita por Bill Finger e com arte de Mike Sekowski (futuro cocriador da Liga da Justiça e desenhista da Mulher-Maravilha na DC Comics) que demonstra Steve Rogers agora como um professor de Inglês em uma escola de ensino médio (inclusive, usando óculos!), chamada Lee School (uma piada com Stan Lee?) e Bucky Barnes como um aluno na mesma instituição. A história dá a entender que Steve era professor já antes da guerra, uma informação até então inédita.
A escola passa a ser um cenário constante das histórias dali em diante e as tramas procuravam criar um clima familiar aos leitores, pretensamente, em sua maioria formada por secundaristas. Ah, e incrível coincidência, Betsy Ross também se torna professora na mesma escola!

Captain America Comics 61, de março de 1947, traz o retorno do Caveira Vermelha pela primeira vez desde o fim da guerra, numa história sem autor conhecido, mas provavelmente desenhada por Al Avison. O criminoso causa uma fuga em massa em uma prisão e termina caindo “para a morte” em uma represa, com o herói imaginando se essa seria a última vez que veria seu inimigo. A resposta você já sabe… Nessa época, Otto Binder se torna o mais constante escritor da revista.
O pós-guerra trouxe um momento difícil para os super-heróis e sua popularidade caía… A partir de Captain America Comics 64, de outubro de 1947, a revista se tornou quadrimestral, ou seja, com um novo número somente a cada quatro meses!
Era necessário buscar novos rumos: Longe da guerra, o Capitão América atuava em Nova York combatendo o crime organizado e vilões espalhafatosos, o que o aproximava das histórias de crime e detetive que eram bastante populares então.

Alguns novos artistas chegaram para contribuir nesse novo momento, como o escritor Bill Woolfolk, que escreveu as três histórias de Captain America 65, de janeiro de 1948, que contou com uma bela capa de Syd Shores.
Mas a principal adesão nesse quesito foi o artista Gene Colan, que desenhou alguns números da revista entre 1948 e 49. Dez anos mais tarde, Colan se tornaria um dos principais artistas da Marvel Comics, ilustrando as aventuras de Demolidor, Namor, Vingadores, Capitão Marvel e do próprio Capitão América, como veremos adiante. Mas aqui, neste contexto, era apenas um jovem promissor com uma arte dinâmica e cheia de movimento.

Um bom exemplo é Captain America Comics 68, de setembro de 1948, no qual a história desenhada por Colan não tem ação, mas mostra o Capitão América dando uma lição em um menino que comete travessuras com uma ganguezinha de rua, inclusive, quebrando a vidraça de uma loja de doces. O herói aparece para o rapaz e demonstra as consequências de seus atos, fazendo o rapaz ter uma atitude mais positiva.
Não é conhecida a autoria do texto, mas o estilo parece bastante com o de Stan Lee, particularmente, no aspecto mais mundano da história.

Talvez em busca de novos ares, a revista passou por uma significativa mudança naquele mesmo período, com a inclusão de uma nova heroína para acompanhar o protagonista. Captain America Comics 66, de abril de 1948, traz O Caso da Golden Girl, com texto de Bill Woolfolk e arte de Syd Shores, no qual enquanto perseguem uma vilã chamada Lavander, Bucky é baleado e vai parar no hospital em situação grave.

Acostumado a agir em dupla, o Capitão vai atrás da agente Betty Ross para ajudá-lo, e ela se torna a Golden Girl, sua parceira no combate ao crime, usando um provocante uniforme com minissaia, adornado com asinhas na cabeça e uma capa. E, curiosamente, o uniforme guarda bastante semelhança com o do Whizzer/ Ciclone.

A história dá atitude à garota, inclusive, no final, ela rouba um beijo do herói, numa postura que não era muito comum na representação feminina nos quadrinhos mainstream de super-heróis. O fato de mostrar uma dupla de combatentes ao crime que são um casal e dividem não somente as aventuras, mas presumivelmente a cama, também, era mesmo uma novidade. Outra quebra de paradigma é que, para que tudo funcionasse, na mesma história, o Capitão revela para ela que sua identidade secreta é Steve Rogers, acabando com o mistério que ali já durava sete anos.

Bucky dá sua benção para que Capitão América e Golden Girl sejam a nova dupla de combate ao crime, enquanto ele permanece no hospital se recuperando de seu ferimento e com a esperança de regressar às suas funções dentro de alguns meses.
Mas Bucky não voltaria mais à ação de modo efetivo. O herói sai do hospital na primeira história de Captain America Comics 71, de março de 1949, e serve ao seu velho papel de refém para ser resgatado, porém, não aparece em nenhuma outra história dessa fase do fim da década, ao contrário da Golden Girl que permanece como parceira do Capitão até o fim.
O surgimento da heroína era mais um esforço de Martin Goodman e Stan Lee de tentar reavivar os super-heróis da editora, pois a Timely tinha um forte público feminino que consumia à exaustão as revistas temáticas de Patsy Walker ou Millie, a Modelo. Por isso, na mesma época, os outros principais heróis da editora também ganharam parceiras femininas: a prima de Namor, Namora, surgira em Marvel Mystery Comics 82, de maio de 1947, e até ganhou uma revista própria, The Sea Beauty Namora, lançada em agosto de 1948, embora só tenha durado três números. O Tocha Humana também ganhou uma parceira: a Garota Solar surgiu em uma revista própria, Sun Girl, em agosto de 1948, e também só durou três números, embora tenha continuado a aparecer na revista The Human Torch por um tempinho. Unindo o mercado de super-heróis com as HQs de romance que se tornavam cada vez mais populares, estreou também a heroína Vênus, a deusa do amor, publicada em sua própria revista, Venus, que logrou mais sucesso do que as demais e continuou publicada na década seguinte.

O Herói Sai das Bancas
Sem a guerra para alavancar suas histórias, os roteiristas tentaram de tudo, de histórias de crime à aventura ou ao fantástico. Por vezes, uma pegada infantil também era tentada, como em Captain America Comics 69, de novembro de 1948, e a história The Weird Tales of the Wee Male e seus anõezinhos. Uma curiosidade dessa história é que Steve Rogers é chamado de “professor” (em inglês) e não teacher, sugerindo que a Lee School é uma faculdade e não uma escola – porque no inglês há uma separação clara: teacher é o professor da educação básica e professor do ensino superior. Isso tinha uma implicação séria para Bucky, que precisaria ter mais de 17 ou 18 anos para estar lá… embora fosse retratado como se tivesse apenas 14, por vezes, 16 anos, com boa vontade.
Com a popularidade em baixa, as revistas de super-heróis perdiam espaço nas bancas dos EUA do final dos anos 1940 para histórias de terror, a nova febre do momento. O publisher da Marvel (então ainda Timely), Martin Goodman era um afiado editor que sabia surfar no mercado, portanto, começou a comissionar que as histórias do Capitão América tivessem a pegada do terror, um elemento que – verdade seja diga – foi bastante explorado nos primeiríssimos números da revista, lá em 1941 por Simon e Kirby.
A revista Captain America Comics teve seu último número tradicional na edição 73, de julho de 1949 (que traz também a última aparição da Golden Girl), e na edição seguinte mudou o título para Captain America’s Weird Tales (continuando com a numeração 74), de outubro, trazendo contos de terror. Agora, a primeira história da revista trazia o herói, mas as outras eram genéricos contos de terror sem nenhuma ligação com o personagem.

Captain America’s Weird Tales 74 traz uma assustadora história na qual o herói combate seu arqui-inimigo, o Caveira Vermelha, no próprio Inferno! Na trama, o vilão está no Inferno (tendo morrido na edição 61), mas consegue colocar o nome do herói no livro das almas perdidas, o que leva o Capitão ao reino das trevas. Percebendo o ardil, Satã impõe que os dois inimigos lutem, quem vencer volta ao mundo dos vivos, quem morrer desaparecerá do tempo. Na batalha, o Caveira chega a usar a foice da Morte, mas o Capitão o golpeia até a beira de um abismo de fogo. Ainda que segure o vilão pela roupa, a vestimenta rasga e o vilão cai para seu destino.

Steve Rogers acorda em seu apartamento pensando que tudo se tratou de um sonho, mas ainda tem o pedaço da roupa do Caveira nas mãos! Não se conhecem os créditos da aventura, mas se costuma apontar Stan Lee como o roteirista. A capa da revista é atribuída a Marty Nodell e traz Betty Ross, que não aparece na história. A trama serve – num olhar em retrospecto – como uma batalha final entre o herói e seu inimigo dentro do contexto de suas versões da Era de Ouro.
Mas o público queria histórias de terror e não mais do sentinela da liberdade. Goodman sabia disso e Stan Lee, o editor-chefe, também. Por isso, Captain America’s Weird Tales 74 trouxe a última aparição do Capitão América em sua versão original da Era de Ouro dos quadrinhos.

Captain America’s Weird Tales 75 chegou às bancas em fevereiro de 1950, e apesar do título, não trazia nenhuma pista ou sombra do Capitão América em suas páginas, apenas contos de terror. Na publicação seguinte, a revista mudou o título definitivamente para Weird Tales e Steve Rogers ficou no passado. Um triste e decadente fim para um personagem que fora tão popular apenas alguns anos antes.
Pelo menos por enquanto…
Na verdade, todo o mercado de super-heróis estava em crise, sendo substituído pelas histórias de suspense, terror, faroestes, policiais e de romance. Nessa fase difícil, praticamente todos os heróis da Timely deixaram de ser publicados. O Tocha Humana encerrou sua vitoriosa carreira na Era de Ouro em The Human Torch 35, de março de 1949, e sua revista foi substituída por Love Tales, seguindo a numeração a partir do 36. Nas mesmas datas se encerrou a carreira da Fantasma Loira, com sua última revista sendo The Blonde Phantom 22 substituída por Lovers 23. Namor acabou em The Sub-mariner Comics 33, em agosto daquele mesmo ano, e foi substituída em outubro por Best Love 34.
Isso quer dizer que, quando Captain America’s Weird Tales 74 chegou às bancas, em outubro de 1949, trazendo a última aparição do Capitão América em sua abordagem original, o sentinela da liberdade era o último dos gloriosos heróis da Timely a resistir de pé. E caiu.
O mesmo se deu nas concorrentes: o Capitão Marvel (Shazam) deixaria as bancas em 1953 e a maioria dos heróis da DC Comics (como The Flash, Lanterna Verde, Gavião Negro etc.), também sumiu das bancas, mantendo-se praticamente apenas Superman, Batman e Mulher-Maravilha. E nada mais.
Os quadrinhos agora eram uma terra de HQs de romance, faroeste, policial e terror e os super-heróis apenas uma lembrança de um passado glorioso.
O Esmagador de Comunistas
Passaram-se quatro anos. No início da década de 1950, a Timely mudou o nome para Atlas Comics, como maneira de se reciclar no novo mercado de HQs, investindo principalmente em revistas de terror, policiais, faroeste e romance, mas ainda em declínio, com vendas baixando e sendo mal vistas por educadores e pais em geral pelo conteúdo excessivamente violento das revistas policiais e de terror. Os super-heróis foram considerados carta fora do baralho até o publisher Martin Goodman perceber o persistente sucesso (embora menor do que no passado) de Superman, Batman e Mulher-Maravilha na DC Comics, que àquela altura, mantinham ainda duas revistas mensais cada um deles, com uma sétima revista publicando histórias do Superboy (a versão adolescente do homem de aço). Então, Goodman comissionou seu editor-chefe Stan Lee a trazer de volta o trio principal de heróis após uma ausência de quatro anos.

A ideia era publicá-los em uma revista-teste chamativa para em seguida cada qual retomar sua publicação solo, embora agora, em um esquema bimestral e não mensal, e depois, avaliar as vendas. Assim, a revista Young Men 24, de dezembro de 1953, trouxe novas aventuras do Capitão América, Tocha Humana e Namor, o príncipe submarino. Como se pode perceber, o destaque da capa e da chamada é o herói flamejante, pois no final da década de 1940 eram suas histórias as que ainda vendiam mais dentre os heróis, enquanto Namor e Cap & Bucky aparecem em quadradinhos no pé da página.
Existe alguma controvérsia a respeito dos créditos da aventura de reestreia do Capitão, pois durante muito tempo se atribuiu o mérito ao próprio Stan Lee, porém, mais recentemente, se considera que a aventura desse retorno teve Don Rico como roteirista e um novo desenhista que teria bastante sucesso no futuro: John Romita. Mas Lee esteve envolvido, obviamente, afinal, era o editor-chefe e deve ter discutido com Rico os termos gerais da trama.

Nascido no Estado de Nova York, em 1912 (portanto, tinha 41 anos na época) como Donato Francisco Rico II, em uma família de descendentes de italianos, seu talento o levou a ganhar uma bolsa para estudar arte na Universidade de Rochester quando ainda estava no ensino fundamental, e se destacou trabalhando com várias habilidades artísticas até chegar aos quadrinhos em 1939, na Fox Publications, onde ganhou destaque no Daredevil (que não é o mesmo personagem que a Marvel criaria décadas depois), e em 1942 chegou à Timely onde passou a compor a equipe de desenhistas, mas também, se tornou o principal assistente do jovem editor Stan Lee.
Após se ausentar da editora por três anos, Rico retornou em 1949 e continuaria contribuindo por uma década e meia, embora tenha passado a escrever para TV e cinema, bem como livros baratos. No futuro, ele seria o criador da Viúva Negra.

Na trama da aventura intitulada Back form the death, Rico e Romita mostram que Steve Rogers e Bucky Barnes continuam na Lee School e, como professor de História, Steve narra aos seus estudantes a origem do Capitão América (sem revelar sua identidade secreta e um recurso narrativo para reapresentar o personagem aos novos leitores), mas os jovens “daqueles tempos” não o levam a sério e desdenham o herói do passado para irritação de Bucky. Porém, quando o Caveira Vermelha retorna, tentando criar um sindicato internacional do crime, se aliando a espiões comunistas, e invade o prédio da ONU (Organização das Nações Unidas, em Nova York), Steve percebe que é hora de voltar e o Capitão e Bucky regressam à ação, vencendo seu velho inimigo.
Não é feita a menção ao vilão estar no Inferno, onde foi visto pela última vez, embora o título da história diz que ele voltava da morte.

Em sequência, Young Man 25, de fevereiro de 1954, trouxe uma continuação, de novo com Rico e Romita, na qual Capitão e Bucky atendem a um chamado do exército para auxiliar na proteção de um experimento atômico que é alvo de espiões comunistas. E o velho estilo das histórias de 13 anos antes continuavam, com ameaças de espiões e sabotadores: na Young Man 26 (tendo se tornado uma revista mensal), o Capitão finge ser vítima de uma porção que o torna adepto do comunismo para encurralar os espiões, numa trama ruim que tem o mérito de trazer participações especiais e breves do Tocha Humana e de Namor.
O Caveira Vermelha já retorna em Young Man 27 e Capitão e Bucky enfrentam ele e seu bando e o vilão escapa, com a história avançando meses no futuro com a dupla procurando seu inimigo até um novo confronto no qual são capturados e torturados para informar planos secretos da defesa, mas o Capitão atrai os bandidos a uma armadilha e o Caveira e seus homens aparentemente morrem quando o herói força o caminhão deles a se chocar contra um muro.
Um detalhe que chama a atenção nessa aventura é que, sem nenhuma explicação, Steve Rogers e Bucky estão de volta ao exército em uma das cenas do interlúdio. Como assim?
Young Man viu seu último número ser publicado na edição 28, de junho de 1954, ainda com as aventuras dos três heróis e uma história genérica do Capitão e Bucky parando em um barco que leva produtos à África do Sul e, de novo, se envolvem com agentes comunistas.

A revista foi encerrada porque seus protagonistas ganharam novas revistas individuais… Assim, Captain America 76 chegou às bancas em maio de 1954, continuando o mesmo ritmo de aventuras e mantendo a numeração da encarnação anterior da revista (mesmo que o herói não tenha aparecido no número 75 e ignorando a numeração subsequente de quando a primeira revista se tornou apenas Weird Tales). Ah, e repare que a revista não é mais chamada de Captain America Comics, mas foi encurtada para apenas o nome do herói, embora tivesse um subtítulo: Commie Smasher (“o esmagador de comunistas” ou de “comunas” no diminutivo pejorativo). A estratégia era, claramente, tentar criar o mesmo frisson de 13 anos antes com os nazistas.
De novo, normalmente se creditam essas histórias a Don Rico e John Romita, mas sabe-se que Bill Benulis e Jack Abel também trabalharam na arte e outros roteiristas possivelmente também escreveram algumas histórias, inclusive, Stan Lee.

Tal qual como no passado, a nova revista tinha quatro histórias, embora a terceira sempre fosse uma aventura do Tocha Humana, não relacionada ao sentinela da liberdade. Era uma estratégia de Stan Lee de que os leitores de uma revista fossem atrás dos personagens em outras e, assim, vendessem mais.
Todavia, a partir daquele ponto, as coisas ficam bem confusas do ponto de vista narrativo… Logo na primeira história da edição, vemos Steve Rogers e Bucky Barnes de novo no exército, e pior, o primeiro como recruta e o segundo como mascote. As aventuras constantemente fazem menção às ações da dupla na II Guerra Mundial, mas isso implicava que estavam na ativa há mais de 10 anos e Bucky continuava a ser retratado como um menino de 14 anos de idade (no máximo).
E para piorar, até é feita uma menção ao fato de Steve ter sido um professor, ou seja, lecionando em uma faculdade (o que requer uma formação mais complexa e maior qualificação) ao mesmo tempo em que Bucky era seu aluno (e, portanto, um jovem adulto de 18 ou 20 anos e não um menino). [Se houvesse alguma lógica, Bucky teria algo como 25 anos de idade naquele ponto]. Como alguém como Steve, que lutou na guerra e era professor universitário, seria um recruta dez anos depois? E porque Bucky era um mascote e não um soldado raso comum? Não fazia o menor sentido.

E a bizarrice continuava: a mesma primeira história mostrava o atrapalhado recruta Rogers às turvas com um sargento rabugento, agora chamado Shanty Trucks (substituindo Duffy), e Betsy Ross também reaparece, mas… ela está ruiva dessa vez e, mais uma vez, desconhece a identidade secreta de Steve e o acha um trapalhão, apesar de ter sido sua namorada e parceira no combate ao crime até a última edição de sua revista (número 74) em 1949. O que estava acontecendo?
O fato é que Goodman, Lee e Rico decidiram tratar as novas aventuras como um tipo de reboot, voltando ao status quo mais conhecido dos personagens. Um cenário familiar para a maioria dos leitores que já conhecessem minimamente o personagem. Em defesa dos criadores, é importante pensar que naqueles tempos não se republicavam as histórias como hoje (essas aventuras estão disponíveis aos leitores dos EUA de hoje na coleção Marvel Masterworks: Atlas Heroes vols 1 e 2 e também online no Comixlogic), então, tinham que simplificar as coisas para os novos leitores que eram maioria.
A primeira aventura trata justamente de um espião comunista tentando incriminar Betsy Ross, que aparentemente ainda é uma agente do FBI. Enquanto a garota ainda aparece em clima de romance com o herói, o Capitão tem uma ação curiosa quando localiza os dois espiões: nocauteia um deles para morrer nas chamas de um incêndio enquanto salva o segundo para limpar o nome de Betsy.

Na segunda história, a tropa de Steve acompanha uma viagem diplomática a um país insular anônimo para os heróis descobrirem que o ministro da guerra é um agente comunista infiltrado; e na quarta Steve e Bucky vão para a Indochina e também enfrentam os comunistas por lá.

O mesmo tipo de aventuras prossegue nas edições seguintes… No número 77 Capitão e Bucky se envolvem com a Guerra da Coreia, cruzando o planeta enquanto são perseguidos por inimigos para inocular um antídoto em prisioneiros chineses; e na 78 enfrentam seu último supervilão (o Electro), um dragão em meio à Guerra da Coreia e os chineses comunistas; e desmascaram um atleta nacionalmente famoso como outro espião.

Mais histórias de Capitão e Bucky foram contadas na revista Man’s Adventures 27 e 28, mas o fato é que as revistas não estavam vendendo. Captain America 78, de setembro de 1954, foi o último número do herói. A revista foi cancelada e encerrou definitivamente a versão da Era de Ouro do Capitão América.
Apesar da boa vontade de Lee, Rico e Romita, aquele era o pior momento possível para a retomada de super-heróis, pois as infames declarações do psiquiatra Fredric Wertham (cujo livro, A Sedução do Inocente foi um enorme sucesso) de que os quadrinhos eram os responsáveis pela delinquência juvenil nos EUA, causaram tanta comoção que gerou uma perseguição à mídia, investigações no Senado e um declínio na indústria.
Como forma de reconstruir a imagem das editoras, foi criado o Comic Code Authority (CCA), um órgão colegiado de autocensura para controlar rigidamente o material que chegava às bancas, proibindo qualquer imagem de terror ou nudez, referências explícitas à violência gráfica e a proibição de cenas de sexo ou morte violenta. Histórias de terror e suspense ficaram proibidas, monstros grotescos também, e não era permitido publicar alguns personagens clássicos do repertório, como vampiros e lobisomens.

Ainda assim, as vendas de quadrinhos diminuíram a um terço na indústria como um todo, várias editoras fecharam as portas (inclusive, gigantes como a Fawcett, que publicava o megassucesso Capitão Marvel/Shazam e a EC Comics, especializada em terror) e os super-heróis sumiram do mapa totalmente. Para se ter uma ideia, das centenas de personagens que eram publicados por várias editoras nos anos 1940, os únicos que continuaram nas bancas após a crise de 1954 foram Superman, Batman e Mulher-Maravilha, todos da DC Comics.
A Atlas também quase fechou as portas, se especializando em histórias de faroeste e romance e sobrevivendo como uma pequena editora. O apogeu da crise se deu em 1957, quando Martin Goodman foi obrigado a demitir praticamente todos os funcionários da casa, inclusive, roteiristas e desenhistas, e passando a realizar suas atividades a partir dos contratos por free-lancers. Mas o jovem Stan Lee permaneceu como editor-chefe.
Cancelado de novo em 1954, o Capitão América amargaria uma década inteira no esquecimento.
A Moderna Marvel Comics
A história moderna da Marvel começa em 1961, quando Stan Lee e Jack Kirby criaram o Quarteto Fantástico. Em seguida, novos personagens surgiram: Hulk, Thor, Homem-Aranha, Homem de Ferro, Os Vingadores, X-Men…
Era o desenvolvimento da Era de Prata dos quadrinhos e a Marvel emergia como uma editora nova, cheia de gás e inovação, tomando o mercado da toda-poderosa DC Comics.

Stan Lee permanecera como Editor-Chefe na Timely/Atlas e vivenciara a grande crise nos meados dos anos 1950 que quase levara a empresa à falência. Mas a editora conseguira se estabilizar com HQs de monstros e faroeste na segunda metade da década. Jack Kirby gozara do sucesso em várias outras editoras, mas sua fama de “brigão” e casca-grossa começaram a fechar muitas portas, o que casou com o encolhimento do mercado e o deixou em uma situação difícil. Isso levou ao fim da parceria com Joe Simon, por exemplo, que preferiu seguir fazendo trabalhos para a publicidade, que pagava melhor do que os quadrinhos.
Daí, que, após uma temporada fazendo alguns trabalhos avulsos para a DC Comics, em 1959, Jack Kirby bate novamente nas portas da editora e volta a trabalhar na Casa das Ideias após 17 anos, agora tendo seu ex-assistente Stan Lee como seu patrão.
Não foi uma relação fácil, mas Lee e Kirby terminaram descobrindo uma grande parceria, de modo que terminaram por criar um universo inteiro de novos super-heróis: a Marvel Comics (nome que a Timely/Atlas adotou a partir de 1961).

Além dos sucessos esmagadores de Quarteto Fantástico, Homem-Aranha, Thor e Doutor Estranho, a Marvel imitou a Liga da Justiça da DC e reuniu seus principais heróis em um grupo: os Vingadores estrearam em setembro de 1963, com Homem de Ferro, Thor, Hulk, Gigante e Vespa, em The Avengers 01, de setembro de 1963, por Lee e Kirby. O Capitão América não estava presente neste momento, mas terminaria, no futuro breve, se tornando o principal de seus membros.
O Método Marvel de Criação de HQs
Fruto da crise de poucos anos antes, a Marvel ainda era uma editora pequena, mesmo com suas vendas crescendo a ritmo galopante. Mas a estratégia do fim dos anos 1950 persistia: o material era produzido por free lancers como forma de cortar custos. Os desenhistas e escritores ganhavam por página produzida. E Martin Goodman, o publisher, ainda encontrara uma forma de baratear ainda mais a produção: pagava o preço padrão aos desenhistas, mas tendo em vista que o editor-chefe Stan Lee era um escritor, fez um pacto com ele de que Lee escreveria os roteiros (fora do expediente, como um trabalho freelancer) e, embora recebesse um valor abaixo do mercado, manteria um tipo de contrato de exclusividade, garantindo um grande volume de produção. E ganho pessoal, pois se somava ao seu salário mensal.
Isso funcionou bem enquanto a Marvel era realmente uma empresa pequena, publicando somente oito revistas mensais, de modo que Lee só empregava outros escritores que não si próprio quando realmente não dava conta de produzir o material por questões de tempo. Mas na medida em que lançaram a nova linha de super-heróis e o sucesso aumentou e o número de revistas também, a coisa complicou um pouco.

Então, Lee criou o que ele chamou de Método Marvel: ele não fazia roteiros completos, mas produzia apenas uma sinopse do que seria a história (algo curto, entre dois parágrafos e duas páginas) e entregava ao desenhista para desenvolver a história a partir daquilo, criando cenas e sequências de ação, para depois da arte pronta, Lee voltar e escrever os diálogos e recordatórios (quadros de narração). Esse método tornava o desenhista mais partícipe do processo e, via de regra, coautor da trama. Porém, como parte do acordo, Lee mantinha o crédito de roteirista e o desenhista apenas o de sua função.
Trabalhando com um artista imaginativo, criativo, com grande senso visual e de narrativa e experiência na escrita de roteiros como Jack Kirby, Lee podia se dá ao luxo de dar apenas premissas muito breves de uma história, quase apenas um conceito ou ideia, e Kirby a desenvolvia sem problemas como uma HQ de 22 páginas, deixando os diálogos e recordatórios para Lee.
Na medida em que a máquina da dupla Lee & Kirby se azeitou, chegou ao ponto em que Kirby nem precisava mais de uma premissa básica e ele mesmo desenvolvia a trama inteira, no máximo, conversando com Lee por telefone sobre o que iriam fazer naquela história.
De qualquer modo, a velocidade de Kirby e a estratégia de Lee permitiram que ambos assinassem várias revistas ao mesmo tempo e, em 1963, produzissem as aventuras de Quarteto Fantástico, Thor, Hulk, Homem-Formiga & Vespa, Vingadores, X-Men, Sgt. Fury and the Howling Commandos consecutivamente.
Lee e Kirby não apenas criavam uma penca de novos heróis, mas também traziam de volta alguns personagens do passado. O Quarteto Fantástico incluía uma nova versão do Tocha Humana – os mesmos poderes e aparência, mas uma identidade totalmente distinta. E a edição 03 de Fantastic Four trouxe a volta de Namor, o príncipe submarino, apresentado quase como um vilão, desesperado de ódio contra a humanidade por ter destruído sua Atlântida natal.
Faltava o maior de todos do passado: o Capitão América. E Lee e Kirby o fizeram.
Um Pequeno Teste
O Capitão América era um personagem precioso tanto para Lee (que escrevera muitas aventuras do herói) quanto para Kirby (que o cocriara), portanto, decidiram fazer a coisa com cuidado.

Afinal, a sentinela da liberdade tinha amargado uma longa decadência entre 1946 e 49; e um retorno mal sucedido em 1953 e 54. Não podiam correr o risco de queimar o personagem em mais outro fracasso. Por outro lado, em meio as novas maravilhas da Marvel, o que poderia dar errado?
Primeiro, estabeleceram um teste, criando um embuste.

O Tocha Humana do Quarteto Fantástico era um personagem tão popular que tinha histórias solo publicadas na revista Strange Tales, a mesma nas quais saíam as aventuras do Doutor Estranho. em novembro de 1963, a edição 114 publicou uma trama na qual o Tocha persegue um ressurgido Capitão América que está cometendo crimes. Enquanto lembra o histórico herói que lutou na II Guerra Mundial, Johnny Storm pega o larápio para descobrir que era apenas um farsante que se passava pelo velho herói dado como morto.
No fim da história, sem fingimentos, Lee questiona aos leitores se eles queriam ver o verdadeiro Capitão América de volta.
A revista foi bem vendida e o público aprovou. Era a senha para Steve Rogers finalmente retornar!
O Retorno de um Vingador
O retorno do Capitão América foi anunciado com alarde na capa de Avengers 04, de março de 1964: a chamada dizia “Captain America Lives Again!”. A clássica capa de Kirby, com o sentinela da liberdade à frente (passando uma ideia de liderança) e ladeado pelos outros heróis que formavam o grupo – e compunham o centro fundamental do nascente Universo Marvel – criou uma imagem duradoura entre leitores, críticos e historiadores. Essa imagem seria copiada e recriada ad infinitum, algumas das quais veremos aqui nesse texto mais adiante.

Hoje, parece incrível pensar que os Vingadores foram criados sem o Capitão América, mas de qualquer modo, ele já apareceu em sua quarta aventura. Então, vale à pena contextualizar um pouco o que veio antes… Como já dissemos, a primeira edição de Avengers mostrou o quinteto se reunindo a partir de uma tramoia mal sucedida de Loki, o deus da mentira. Em Avengers 02, o grupo enfrenta o Fantasma do Espaço, um alienígena que assume a aparência dos heróis e os coloca para lutar uns contra os outros, estratagema que termina por revelar a grande desconfiança que os outros membros sentem do Hulk e sua fúria descontrolada. Por isso, o mostro verde termina aquela aventura indo embora e deixando a equipe.
Na edição 03, um frustrado Hulk termina por encontrar Namor, o Príncipe Submarino, que tinha enfrentado o Quarteto Fantástico um par de vezes e estava furioso com a humanidade. Os dois se unem e lutam contra os Vingadores, mas o Hulk se cansa do jogo e vai embora, enquanto os heróis seguem no encalço do Rei da Atlântida… E é isso que nos leva ao Capitão América!

Na edição 04, Lee e Kirby mostram Namor chegar ao Ártico (mais tarde, esse lugar será precisado como a Terra Nova, no norte do Canadá) e encontrar os esquimós inuit venerando uma figura humana presa no gelo. Furioso, o Príncipe Submarino arranca o bloco de gelo e o lança no mar, espantando os inuit.
Na medida em que o bloco de gelo avança pela maré e vai chegando a águas mais quentes, o bloco de gelo derrete e os Vingadores vêm atrás seguindo os rastros de seu oponente e encontram o corpo que está sendo descongelado. À princípio, vemos um jovem loiro em roupas militares, mas na medida em que a equipe traz o corpo para o interior de seu submarino, o movimento rasga aquelas vestes velhas e duras pelo gelo, revelando que: 1) ele está vivo; 2) ele usa um uniforme colorido por baixo daquelas roupas verde oliva…

O grupo – Thor, Homem de Ferro, Gigante (Hank Pym) e Vespa – ficam intrigados com aquilo e é a heroína quem mata a charada: aquelas são as vestes do lendário Capitão América! Todos ficam um pouco confusos, pois o herói desapareceu há muito tempo, até que o jovem acorda gritando o nome de Bucky e, sem saber onde está, confuso e desorientado, termina travando a básica luta entre super-heróis tão ao afeito de Lee e Kirby, conseguindo debelar o ataque por tempo o suficiente para impressionar os herói.
Com todos mais calmos, Steve Rogers confirma que é o Capitão América e os Vingadores lhe informam que ele está dado como morto há 20 anos! Então, o sentinela da liberdade ficou em animação suspensa por duas décadas, congelado no gelo, mas em consequência, estava tão jovem quanto antes, mas em um mundo totalmente diferente. (O conceito de “linha do tempo deslizante”, ou seja, a adequação da cronologia para que os heróis permaneçam jovens, fez com que esse intervalo de tempo fosse gradativamente aumentando, ao ponto das histórias começarem a se referir que ele passou “décadas congelado”).
Por meio de flashbacks do próprio herói, os narrando aos Vingadores, o Capitão América conta a sua última missão, em 1945 (presumivelmente, no mês de maio, imediatamente antes da rendição alemã), ele e seu jovem ajudante Bucky se agarraram a um avião experimental para impedi-lo de explodir sobre Londres, mas o avião termina explodindo antes, nos céus. O herói escorrega pela fuselagem antes, mas Bucky permanece e morre na explosão, enquanto o Capitão é arremessado inconsciente nas águas gélidas e termina congelado.
Stan Lee sempre declarou que odiava os parceiros juvenis e a nova trama era uma maneira de se livrar de Bucky definitivamente.
Há um claramente um vilão responsável pela ação, mas a história não revela quem é essa figura, ficando a informação para o futuro breve.

Claro, Steve Rogers sequer tem tempo de se adaptar a esse novo mundo (ele despertou no futuro!) e já precisa combater um criminoso e seu bando, terminando por descobrir que o homem é um alienígena que quer ir embora para sua casa. Enquanto os Vingadores ajudam na empreitada, confrontam Namor de novo numa ilha remota do Atlântico.
Imediatamente integrado ao grupo, o Capitão América é agora um novo personagem: um homem fora do tempo. Alguém jovem – pois não envelheceu nas décadas em que ficou congelado em animação suspensa – mas totalmente deslocado, pois cresceu em outra época e não entende os novos tempos e seus valores. Alguém arrasado ao descobrir que seus amigos envelheceram ou morreram. Um solitário.
Stan Lee soube muito bem optar por não repetir a velha fórmula, mas usar um personagem do passado para criticar o presente. Pelos olhos de Steve Rogers e sua visão antiquada, vemos as grandes mudanças dos anos 1960. Lee usa seu talento para o drama para aprofundar a psiquê do personagem e seu senso de isolamento de maneira fantástica.
E além disso tudo, havia a arte ainda mais fantástica de Jack Kirby no auge absoluto de sua forma. Mais raivoso, mais dinâmico, mais fluído! Quadros de ação de encher os olhos! O artista estava incrivelmente feliz em “reencontrar” sua maior criação.
Vale destacar, porém, que Lee e Kirby pareciam mesmo estar criando uma nova trama, independente das antigas, ou seja, uma nova cronologia que não era presa às aventuras publicadas nas décadas de 1940 e 50, especialmente, porque Kirby só esteve envolvido com o Capitão América em seus primeiros meses, e portanto, renegava tudo o que fora feito depois. Daí, que a dupla de criadores optou por mostrar que, quando se enfrentam na batalha final daquela edição 04, Capitão e Namor não se conhecem.
Mas histórias antigas já os tinham mostrado em ação conjuntamente, inclusive (mas não somente), aquelas edições de All-Winners Comics com o Esquadrão Vitorioso. Mas aquilo tinha sido em 1946… Com o passar do tempo, os leitores iriam cobrar explicações ao que pareciam inconsistências cronológicas e a Marvel buscaria soluções. Fique ligado.
Destaque entre os Vingadores
Como editor-chefe, Stan Lee gostava de alardear aos quatro ventos os novos feitos da Marvel, por isso, os Vingadores fizeram uma participação especial na revista do Quarteto Fantástico, promovendo não somente o primeiro encontro dos dois times, mas também, a apresentação do Capitão América para um público mais amplo. Assim, Fantastic Four 25 e 26 mostram o Hulk descobrindo que foi “substituído” nos Vingadores pelo Capitão América e, enciumado, corre a Nova York para se vingar do grupo, enfrentando o Quarteto antes de reencontrar os antigos colegas.

É mera desculpa para Jack Kirby ilustrar furiosas batalhas cinematográficas dos heróis contra o gigante de jade. Fantástico!

Avengers 05, por sua vez, traz a nova formação do grupo enfrentando os Homens-Lava (oponentes do Thor) e uma curiosidade: pela primeira vez, o Capitão lança seu escudo e ricocheteia para pegá-lo de volta, uma das maiores marcas do herói desde então. Até ali, o Capitão lançava seu escudo para golpear inimigos, mas ele não voltava às suas mãos como Kirby passou a desenhar, lembrando os efeitos de um bumerangue.
As histórias daquele tempo definiam que os Vingadores tinham uma liderança rotativa a cada mês ou algo assim, mas logo ficou claro que o Capitão América exercia uma liderança natural (sendo o mais experiente deles, à exceção do milenar Thor) e a revista começou a girar em torno de sua figura, explorando sua adaptação aos tempos modernos, suas habilidades e seu caráter heroico.
Por isso, a verdadeira primeira grande ameaça da equipe é o supergrupo de vilões Mestres do Terror, liderado por um personagem novo, o Barão Zemo, que é apresentado como o responsável pela morte de Bucky, em Avengers 06, de julho de 1964, por Lee e Kirby.
Um detalhe curioso é que a dupla queria que o responsável pela morte de Bucky e pela reunião dos Mestres do Terror fosse o velho Caveira Vermelha, mas o Comic Code Authority, o órgão de autocensura das editoras, proibiu o uso do vilão, por causa de seu visual assustador. Não estávamos mais nos anos 1940 e nos quadrinhos pós-macartismo dos anos 1960 não era aceitável aquele tipo de visual. A dupla ainda apelou, mas a recusa e a pressa em publicar a história os fizeram preferir criar um personagem novo para ser um “grande oponente do passado” – reforçando outra vez que estavam adotando uma nova cronologia ao herói e não apenas “continuando” as aventuras pretéritas.
Na trama, ao descobrir que seu velho oponente ainda está vivo, o Dr. Henrich Zemo, 12º Barão Zemo (título nobre da velha monarquia alemã), um genial cientista nazista, decide deixar seu esconderijo nas selvas tropicais da América do Sul e voltar à ativa, reunindo um grupo de vilões para auxiliá-lo: Derretedor, Cavaleiro Negro e Homem-Radioativo, cada um dos quais tinha enfrentado os outros membros do time de heróis.

Zemo é revelado como criador do terrível raio da morte e do poderoso Adesivo X, que inclusive, nos tempos da guerra, o Capitão fez explodir em seu rosto, de modo que o vilão nunca pode tirar a sua máscara, porque ela está colada definitivamente à sua face. Como em 1964 ainda só haviam passado 20 anos do fim da guerra, ainda é possível vermos uma acirrada luta “mano a mano” entre o Capitão e Zemo, ilustrada de modo incrível por Kirby.
A partir dali, refletindo o protagonismo do Capitão, Zemo e seus Mestres do Terror se tornam os principais oponentes dos Vingadores nessa primeira fase e são a mola-mestra das aventuras pelo próximo ano de publicação, com uma nova formação do time de vilões (adicionando Encantor e Executor) na edição 07 e com Zemo criando o Magnum (Wonder-Man, no original) na edição 09, enquanto os Vingadores também enfrentam Kang, o conquistador (edições 08 e 11), Immortus (10), Topeira (12) etc. Nesse meio tempo, Jack Kirby deixou de ilustrar a revista da equipe – permanecendo apenas nas capas – enquanto a arte passou às mãos de Don Heck, que fazia as histórias do Homem de Ferro.
Mas Kirby voltou para as edições 15 e 16. Na primeira, houve a batalha final contra os Mestres do Terror, com os criminosos atacando os heróis em Nova York, e o Capitão indo até à Floresta Amazônica para enfrentar o Barão Zemo, numa batalha que resulta na morte do vilão.

A jogada da dupla Lee e Kirby de tornar o Capitão América o protagonista em uma revista cheia de estrelas foi um grande sucesso. Por isso, em Avengers 16, de maio de 1965, os membros originais do grupo (Homem de Ferro, Thor, Gigante e Vespa) saem da equipe, deixando o Capitão América para liderar uma nova formação, com Gavião Arqueiro, Feiticeira Escarlate e Mercúrio, três ex-criminosos advindos das aventuras do Homem de Ferro e dos X-Men.
O fato era que o Capitão América passou a dominar toda a revista e Stan Lee achou por bem afastar os outros personagens que tinham suas próprias aventuras, mantendo apenas a sentinela da liberdade com um grupo de personagens recentes e pouco experientes.

O novo quarteto de Vingadores passa a ser conhecido como “A Quadrilha do Capitão” e esta nova fase apresentou uma equipe mais humana e carregada de drama, com Gavião Arqueiro, Feiticeira Escarlate e Mercúrio brigando o tempo inteiro. Inicialmente, o Capitão era visto como uma “velharia” autoritária, o que ensejava ataques histéricos do Gavião Arqueiro questionando sua autoridade ao mesmo tempo em que despertava paixão na Feiticeira Escarlate, o que deixava enciumados tanto seu irmão gêmeo Mercúrio, quanto o Gavião, que também gostava dela.
A fórmula foi um grande sucesso entre os leitores, apesar desta versão dos Vingadores ser bem menos poderosa do que a anterior (que contava com Thor e Homem de Ferro, por exemplo, enquanto Capitão e Gavião sequer tinham poderes). A equipe enfrentava vilões como Espadachim (edição 19), Mandarim (ed. 20) Power Man (Poderoso, no Brasil, ed. 21), o retorno de Kang (23 e 24), Attuma e os Atlantes (26), o Colecionador (ed. 28), Viúva Negra mais Espadachim e Poderoso (29), os Filhos da Serpente (32)… todas entre 1965 e 1966, e com a metade final dessas histórias readicionando Vespa e o Golias (novo nome do Homem-Formiga/Gigante) ao quarteto.
Novas Aventuras Solo
O motivo da saída de Kirby dos Vingadores foi justamente porque o sucesso do Capitão América motivou a Marvel a produzir histórias individuais do herói nesse novo contexto, na revista Tales of Suspense , a partir do número 58, de outubro de 1964. A revista foram lançada em 1959 e era uma antologia de duas ou três histórias mensais de suspense com foco em ficção científica até a estreia do Homem de Ferro no número 39, de 1963. A partir daí, Tony Stark virara o protagonista da publicação, enquanto outras histórias eram publicadas de modo avulso. Então, na edição 58, o vilão Camaleão – que usa disfarces – força o vingador dourado a combater a sentinela da liberdade. Tudo se resolve no final, sendo apenas uma boa desculpa para um grande quebra pau entre os dois nas mãos de Stan Lee e Don Heck e uma grande capa de Jack Kirby.

A partir do mês seguinte, com Tales of Suspense 59, Homem de Ferro e Capitão América passam a dividir a revista, cada um em histórias de 11 páginas. Essa artimanha aumentou bastante a vinculação entre os dois personagens. Kirby criou um estilo dinâmico de capas que dividiam a imagem na vertical ou na horizontal para mostrar o que acontecia nas aventuras de cada um dos dois.
Contudo, apesar do hype criado com essas novas aventuras, o fato é que Lee e Kirby erraram a mão no primeiro momento: pareciam não saber bem o que fazer com o herói fora do contexto dos Vingadores. A edição 59 traz uma quadrilha de criminosos comuns invadindo a Mansão dos Vingadores, onde o Capitão mora, para derrotá-lo, porque ele era o “mais fraco” dos membros do grupo. Essa informação, no fim, é importante, porque fica definido que o herói não tem realmente superpoderes, e que é apenas um homem no apogeu da forma física humana. Essa será uma questão polêmica em relação ao personagem – seu nível de habilidade – como se verá ao longo do texto. No número 60, o Capitão (acompanhado por Rick Jones) vai a uma apresentação beneficente, mas o Barão Zemo infiltra bandidos reais para lutar contra ele.

Essas duas primeiras histórias trazem pouquíssimo desenvolvimento de personagem e são pura desculpa para porradaria do início ao fim. Apenas a primeira delas ainda mostra Steve Rogers entediado e tentando se ajustar ao mundo “moderno” ao qual recém-ingressou.
Uma porradaria um pouco mais excêntrica ocorre na edição 61, na qual o Capitão vai até o Vietnã – na época em guerra com os EUA – para resgatar um piloto afroamericano chamado Jim Baker, que está prisioneiro de uma figura chamada “general”, e que é irmão de outro militar que salvou a vida do herói na II Guerra. Disposto a retribuir o favor, o Capitão vai até lá resgatá-lo. Talvez, Lee e Kirby tenham pensado que colocar o herói no cenário da Guerra do Vietnã poderia aquecer o coração dos leitores naqueles tempos em que a maioria da população era favorável à guerra, mas a reação não deve ter sido calorosa, pois eles não repetiram o artifício. Ainda bem.
Mas o cenário inóquo retorna na edição 62, na qual o Capitão é convidado a visitar uma prisão (hein?) e termina lidando com uma rebelião de presos. Pelo menos há uma grande demonstração de Kirby da habilidade do herói com o seu escudo… Esta edição, inclusive, deixa claro que todo o uso do escudo – incluindo ser lançado e voltar às suas mãos – derivava da pura habilidade de Steve Rogers e não de apetrechos magnéticos como davam a entender algumas edições anteriores com os Vingadores.
Enfim, essas primeiras histórias pareciam apenas uma desculpa para por o Capitão em ação. Talvez fosse isso mesmo. Mas têm a sua vantagem: Jack Kirby realmente sabia colocar o sentinela da liberdade em grandiosas cenas de luta. Porém, fora isso não há nada.
Nos Tempos da Guerra…
Lee e Kirby sabiam que tinham ouro nas mãos, mas pareciam não saber o que fazer com ele. De fato, essas aventuras no presente careciam de risco, de atratividade e não tinham a grandiosidade que o texto tentava transmitir. Então, a dupla decidiu mudar a estratégia.
Lee e Kirby voltaram ao passado para recontar histórias do personagem nos tempos da II Guerra Mundial, entre as edições 63 e 71 de Tales of Suspense. Inicialmente, recontaram algumas das antigas aventuras de Captain America Comics, de 1941 e depois trariam aventuras inéditas.

Assim, Tales of Suspense 63, de março de 1965, reconta – pela primeira vez no Universo Marvel – a origem do herói, repassando bastante fielmente a trama contada em 1941 e desenhada naquela oportunidade pelo mesmo Kirby: o jovem doente e magérrimo Steve Rogers se submete a um experimento dentro do Projeto Renascimento, cuja apresentação é cercada de segredos e vemos de novo a velhinha que, na verdade, é uma jovem de cabelos castanhos tal qual na história original, mas dessa vez, ela ganha o nome de Agente R (e não o X-13 da história original). Rogers ingere por via oral o Soro do Supersoldado (que ganha um nome pomposo típico de Stan Lee, enquanto na trama original era apenas “uma fórmula especial”) criado pelo cientista Dr. Erskine. Repare que Lee e Kirby abandonaram o paródico nome Reinstein usado originalmente e criaram esse novo. Seu primeiro nome, Abraham, seria revelado anos depois.
Apesar da fidelidade, a origem ganha algumas pequenas diferenças… Na história de 1941, Steve recebe o Soro por uma injeção, mas agora ele o bebe, o que foi uma curiosa imposição do CCA, que não permitia ilustrar injeções. Na original, o presidente Roosevelt mais o chefe do FBI J. Arthur Grover, têm uma reunião com dois graduados militares, cujos nomes e patentes não são revelados, mas um deles termina sendo o traidor que mata o Dr. Reinstein. Em 1963, um dos militares é nomeado general Phillips e o outro é um subordinado e a figura do líder do FBI é substituída por um cientista, chamado Dr. Anderson. O traidor já está no complexo secreto onde o experimento é realizado.
Após esses eventos, Kirby inclui quadros novos mostrando o Capitão contra sabotadores e espiões e fingindo ser um cecruta trapalhão no Forte Lehigh sob o comando do irascísvel sargento Duffy (o velho personagem das histórias antigas) e fazendo amizade com o jovem James Buchanan Barnes, cujo pai era um militar que morreu em treinamento e, por isso, ele foi adotado como mascote do quartel. Kirby reproduz fielmente o momento em que Barnes descobre a identidade secreta de Steve e ele decide treiná-lo como seu parceiro.

A aventura termina com uma cena de ação inédita da dupla combatendo mais sabotadores. Também é importante frisar que estas aventuras eram as primeiras histórias modernas a trazer o personagem Bucky Barnes como alguém vivo e atuante, e não somente um flashback como naquelas aventuras dos Vingadores.

Na edição 64, Lee e Kirby recontam a aventura contra Sando e Omar que compôs a segunda história de Captain America Comics 01, de 1941. Esta nova versão é ligeiramente fiel, mas adiciona alguns elementos novos. Na trama, um espião nazista se passa por Sando, que usa o idiota útil Omar para criar falsas previsões do futuro, eventos que depois sua equipe de sabotadores realizava. Após alguma interação com o sgt. Duffy, os heróis investigam e desbaratam o plano.

Mas o principal dessa aventura é um elemento curioso que ocorre no meio. Quando Capitão e Bucky invadem o show e enfrentam os espiões são testemunhados por uma bela “repórter” loira, mas que no fim, se revela como uma agente secreta que os auxilia a vencer os vilões. O Capitão pergunta seu nome e ela não revela, dizendo que pense nela como Agente 13 até se encontrarem de novo.
O código “Agente 13” seria reutilizado muito em breve – como veremos logo – mas fica uma grande questão sobre quem é essa mulher. Seria Betsy Ross, a agente que namorou o herói nas aventuras dos anos 1940 e que se tornou a Golden Girl? Na trama da história original, de 1941, sim, era ela, que diz logo seu nome civil na ocasião, em vez de um código. Mas se ela se tornou a Golden Girl em 1948 no pós-guerra, como isso foi possível, se Avenger 04 diz que o Capitão desapareceu em 1945? Dá para ver que Lee e Kirby planejavam algo, mas não fica claro o que era, pela maneira como esse subplot foi desenvolvido a seguir.

Outro conto de Captain America Comics 01 ganha uma releitura em Tales of Suspense 65, de maio de 1965, trazendo a (re)estreia do Caveira Vermelha, o maior inimigo do herói na Era de Ouro. Era a primeira aparição do vilão no Universo Marvel Moderno. Para viabilizar o feito, Kirby redesenhou o visual do vilão para algo mais compacto: os olhos não eram mais grandes e esbugalhados e o supercílio era avantajado no mesmo estilo do Hulk; com os dentes agora emoldurados por grandes lábios; e seu porte físico não era mais magérrimo, mas corpulento e sem os dedos longos e finos como garras. Embora ainda lembrasse um crânio efetivamente, era suficientemente estilizado para ser aprovado pelo Comic Code Authority e esse passou a ser o visual padrão do vilão dali em diante.

Na nova versão da trama, o Caveira ataca vários membros do alto escalão do exército e promove sabotagens, mas não usa o “olhar da morte” que aparecia na história de 1941, fazendo dessa versão menos assassina, pois usa um gás para “apagar a memória recente” (consequências do CCA?). No mais, a trama é basicamente a mesma, com Capitão e Bucky descobrindo que o vilão é na verdade o engenheiro John Maxon. Aliás, ele diz em dado momento que não é “o verdadeiro John Maxon”, mas no fim, quando derrotado pelos heróis, Bucky nota que ele não é muito habilidoso. E ao contrário da história original, o vilão não morre, mas escapa fugindo.
Tudo fica um pouco mais confuso a seguir: Tales of Suspense 66, de junho de 1965, mostra que Lee e Kirby estão construindo uma nova cronologia e não seguindo fielmente os eventos publicados pela Marvel na década de 1940 e indo bem além de uma simples “modernização” das velhas histórias. Aquela edição largava a mão das histórias originais dos anos 1940 e partia para uma série de tramas originais totalmente novas.
A trama avança um pouco – é dito que se passou um mês desde a anterior – e o Capitão tentou entrar escondido na Alemanha e foi capturado pelo Caveira Vermelha, que o tortura e confessa que John Maxon não era o verdadeiro vilão, mas um impostor. O herói diz que tinha percebido isso, pois já tinha ouvido falar da grande habilidade física do vilão. Carregado de empáfia e arrogância, o Caveira ainda conta sua origem ao herói (e é a primeira vez que isso acontece): mostrando que era um jovem pobre na Alemanha do início do século XX, que vivia de pequenos roubos e truques e em subempregos até ver Adolf Hitler e desejar ser poderoso como ele. Quando os dois se encontram – o vilão é um copeiro no hotel em que ele está hospedado – Hitler reconhece nos olhos dele a fúria, a inveja e a maldade que precisa para criar um superagente e transforma o rapaz no Caveira Vermelha. Mas a trama também revela que o Caveira criou uma reputação tão poderosa que passara a rivalizar com a de Hitler e que, embora agisse ao lado dos nazistas, consistia praticamente em um poder paralelo no cenário da guerra e temido por seu “líder”.
A sequência em Tales of Suspense 67 e 68 mostra o Caveira conseguindo dominar a mente do Capitão e lançá-lo contra as forças aliadas na Grã-Bretanha e Bucky se infiltrando no exército alemão para salvar seu amigo. Mas criam uma bela inconsistência histórica, pois se aquelas aventuras de origem se passavam em 1941 (antes do Ataque de Pearl Harbor), com os EUA ainda fora da guerra e combatendo espiões e sabotadores em território americano, como é que no número 68 a companhia de Steve e Bucky (e o sgt. Duffy) estão estacionados na Inglaterra, participando da guerra?

Essas tramas parecem mostrar que Lee e Kirby não tinham um planejamento de médio ou longo prazo, como parece provar a confusão dos dois Caveiras e a questão do tempo. Mas o fato é que, ignorados esses equívocos, o trio de aventuras das edições 66, 67 e 68 levaram o Capitão a um patamar de qualidade então desconhecido em suas aventuras solo modernas. São tramas divertidas e Kirby se mostra muito à vontade colocando o herói dentro do cenário “real” da II Guerra (oportunidade que não teve nos anos 1940), tanto em vista de sua vasta experiência em HQs de guerra desde a década anterior, quanto pelo fato de Kirby ter sido um soldado de verdade no conflito, ao contrário da maioria de seus colegas.
Todavia, há uma pequena mudança de cenário a partir da edição 70, quando – talvez por estar muito ocupado com as várias revistas da Marvel que desenhava ao mesmo tempo – Kirby faz apenas os layouts da arte (ou seja, ela cria a história a partir de desenhos rústicos, posicionando os personagens e a ação) para que a arte seja finalizada no lápis por George Tuska (em um de seus primeiros trabalhos na Marvel). Tuska era um veterano da indústria, nascido em 1916, e portanto, sendo um ano mais velho do que Kirby, trabalhara no estúdio de Eisner & Iger nos anos 1930, desenhou o Capitão Marvel (Shazam) e trabalhou em histórias de western, terror e guerra em várias editoras, inclusive, na célebre tira de jornal de ficção científica Bucky Rogers. Após essa passagem pelo Capitão América, Tuska ficaria mais famoso por seu trabalho no Homem de Ferro.
Apesar de ser um bom desenhista, o ingresso de Tuska no lugar de Kirby diminuiu um pouco a qualidade da arte, mas conseguiu manter o ritmo, pois Kirby (fazendo os layouts) ainda estruturou a história toda. Na trama dos números 69, 70 e 71, temos uma aventura bem ao estilo da velha Captain America Comics na qual Capitão e Bucky, já confortáveis em meio à II Guerra, enfrentam conluios científicos e traições no assombroso Greymoor Castle.
De Volta ao Presente
O arco seguinte mostra que Lee e Kirby tinham pegado o fio da meada ao colocar alguma centralidade na herança da II Guerra Mundial: Tales of Suspense 72, de dezembro de 1965, dá início à Trilogia dos Hibernantes, durante a qual se manteve o esquema de Kirby nos layouts, Tuska na arte e Lee nos diálogos. A trama volta ao presente e vemos o Capitão contando histórias da II Guerra para seus “pupilos” Vingadores (Feiticeira Escarlate, Mercúrio e Gavião Arqueiro), e então, meio atormentado pelas memórias relembra sua última batalha com o Caveira Vermelha, quando descobrimos que o vilão terminou soterrado em um bunker em Berlim, quando os Aliados tomaram a cidade. Mas ainda anunciou o seu plano final: o despertar dos Hibernantes dentro de 20 anos para tocar o terror no mundo.

Então, o herói percebe que é por isso que lembrou da história: chegou o momento dos 20 anos! O Capitão voa para a Alemanha e testemunha o despertar dos três Hibernantes: poderosos robôs com alta capacidade destrutiva, ativados por velhos agentes nazistas e brotando dos confins do solo, um novo em cada edição, na 72 um gigante meio humanoide, que esmaga tudo com suas poderosas pernas e dispara rajadas; o no número 73, o segundo, parecendo uma arraia voadora, produzindo ventos devastadores; e na 74 o terceiro, no formato da cabeça do Caveira Vermelha. Cada novo se acopla ao antigo, fazendo um conjunto terrível, que obriga ao Capitão subir em um avião e atacar por cima destruindo o maquinário no fim, mas caindo para a morte certa no meio do mar.

Com essas tramas, Lee e Kirby (e Tuska) modificavam a cronologia original do personagem mais uma vez, pois nunca houve uma batalha final entre os dois, tendo em vista que o personagem foi publicado ininterruptamente até 1949 e ainda retornou em 1953, inclusive, combatendo o Caveira Vermelha de novo.
Mas Lee e Kirby passavam – desde as aventuras inéditas na II Guerra Mundial – a construir uma cronologia própria do personagem para a Era de Prata, sem levar em consideração o material dos anos 1940, apesar de parte considerável daquele material ter sido criado (pelo menos sob a liderança editorial) pelo próprio Lee.
IMA, HIDRA, SHIELD… Muitas Siglas

Após o arco dos Hibernantes, Jack Kirby retorna à arte completa para Tales of Suspense 75, de março de 1966. Ao contrário das anteriores, nota-se claramente que Kirby está “entregue” ao trabalho, pois dessa vez há uma bela construção de personagem no início da história. Sem querer perder tempo, Kirby (que sabemos era o autor dessas aventuras, pois desenvolvia as tramas a partir dos desenhos para Lee vir depois criar os diálogos, seguindo a lógica do Método Marvel) quase ignora o gancho da edição anterior e mostra o Capitão América sendo resgatado do mar por marujos que o vêm cair dos céus após a batalha com os Hibernantes e, corta, Steve Rogers está de volta à Nova York, ocupando um apartamento antes pertencente a Tony Stark (a primeira vez que este imóvel aparece, e que nas histórias futuras será chamado de Yorkville), lamentando suas perdas do passado e sua inadequação aos tempos “modernos”, sendo a mais incisiva demonstração desses sentimentos em suas aventuras solo até o momento.
Steve relembra Bucky, sgt. Duffy e… uma misteriosa mulher. Em seu rápido flashback, vemos o casal em um jipe à distância, o que não nos permite enxergar o rosto dela. Ele não a nomeia… quem ela será? Dolorido com as memórias, o herói resolve vestir roupas civis e andar pela cidade. E é quando a trama se desenvolve…
Em sua caminhada, Steve esbarra com uma bela loira que – vamos adiantar as coisas – hoje sabemos ser a estreia da personagem Sharon Carter, a Agente 13 da SHIELD, embora nenhum desses nomes seja revelado nesta primeira aventura: ela passa a história como uma agente anônima. Na trama, o Capitão América a acha muito parecida com a mulher que teria amado na época da II Guerra Mundial e fica aturdido e confuso. Poderia ser ela, mas ela estaria 20 anos mais velha, não é mesmo? Para complicar a cronologia posterior, Kirby desenha a jovem praticamente idêntica àquela outra Agente 13 de 1941.
No presente, Steve termina seguindo a bela loira e vê o que parece alguém roubando o misterioso objeto cilíndrico que ela está carregando, descobrindo depois que ela é uma agente da SHIELD e, pior, sem querer estraga uma ação secreta sobre um agente explosivo superpotente, o Inferno-42, que pode explodir a cidade inteira, o que leva o herói a confrontar pela primeira vez Batroc, o saltador, um mercenário francês que é contratado pela misteriosa agência THEN (ELES, em português) – que será apresentada como um braço da HIDRA, não muito tempo depois.
Enquanto Steve se questiona sobre seu amor perdido, os pensamentos da agente da SHIELD nos revelam que ela tem uma irmã mais velha que também falava de um cara que conhecera no conflito e que o nome dele era Steve Rogers! A jovem é impactada por Steve (ela diz que sentiu como se eles se conhecessem), mas ao mesmo tempo, considera que o homem que sua irmã amou seria 20 anos mais velho do que o jovem loiro.
O mistério está lançado…

A trama prossegue à edição 76, agora desenhada por John Romita (sobre o layout de Kirby). Sim, ele mesmo: o artista que desenhara o retorno do Capitão nos anos 1950. Ainda falaremos mais dele adiante… Nesse número descobrimos que Batroc tem um estranho código de honra. Quando descobre que o tal Inferno 42 é um artefato que pode destruir toda a cidade de Nova York, o mercenário francês termina por auxiliar o Capitão América na missão de destruí-lo. Essa inversão de valores do vilão como um auxiliar irá se repetir diversas vezes no futuro.
A misteriosa agente loira da SHILED (Sharon Carter) termina a história envenenada pelo Inferno-42 e indo para o hospital desenganada pelos médicos, com Steve Rogers lamentando que aquela podia ter sido uma segunda chance (amar uma mulher tão parecida com o seu angio amor). Mas claro, era apenas o começo para Sharon Carter e isso era o início de uma longeva relação com aquela que será o seu principal par romântico dos quadrinhos.
Mas havia alguns planos na manga. Tales of Suspense 77, novamente com layouts de Kirby, arte de Romita e diálogos de Lee, traz o Capitão assistindo na TV um documentário sobre a libertação de Paris das mãos dos nazistas em 1944, que foi o momento em que ele perdeu a mulher que amou. Vemos suas lembranças, dele se unindo à Resistência Francesa e namorando uma bela loira – desenhada com a típica belíssima arte de Romita – cujo nome ele também não sabe, pois em vista da ação secreta necessária para o sucesso no conflito, todos preservam suas identidades. Os designíos das missões os obrigam a se separar momentaneamente, mas eles combinam de se reencontrar em Paris. E a trama mostra que, apesar da vitória, a jovem termina sendo atingida por uma bomba e perde a memória, incapaz de lembrar os eventos recentes. Por isso, o Capitão a procura e não a encontra, ficando desesperado e sem saber que fim teve o seu amor.
Na trama, os pensamentos de Steve revelam que ele acha que, com a notícia pública do retorno do Capitão América, essa mulher viria atrás dele, mas isso não aconteceu. E nem acontecerá. Vamos adiantar de novo: as aventuras futuras revelarão que essa mulher é Peggy Carter, hoje bastante famosa por sua versão nos cinemas. Mas essa revelação só ocorreria muito tempo mais tarde, em Captain America 161 e 162, como veremos mais adiante. Anote isso, é assunto para mais tarde.
O aparecimento dessa misteriosa mulher deixou vários “senões” à cronologia, mesmo naquele momento. Primeiro, os diálogos dão a entender que a bela jovem loira é francesa, já que atua na Resistência, embora essa informação (ou sua negação) não sejam explícitas. Outra questão é que ela é parecida demais com a Agente 13 lá da edição 64, mas os diálogos de Lee dão a entender que eles somente se conheceram “nas últimas semanas”, ou seja, naquele mesmo ano de 1944 e não três anos antes, como seria o caso daquela misteriosa agente que poderia ser a personagem Betsy Ross, que aparecia nas antigas histórias dos anos 1940.
A leitura dessas histórias passa a impressão de que Kirby pretendia criar um “círculo perfeito” no qual a Agente 13 de 1941 (que talvez fosse Betsy Ross, afinal, ela foi criada por Simon e Kirby) seria a mesma mulher que vemos em Tales of Suspense 77, e na certa, a irmã mais velha da misteriosa agente loira da SHIELD no presente, todavia, um ruído de comunicação no Método Marvel – Lee e Kirby tinham acaloradas discussões e, segundo John Romita, que dava carona a ambos na saída do trabalho em 1966, eles pareciam nunca se entender – Stan Lee pode não ter entendido a trama (ou mudado de propósito) e foi o seu diálogo quem impediu que as coisas transcorressem daquela maneira.
De qualquer maneira, o imbróglio parece ter causado algum mal estar na dupla Lee e Kirby, pois o subplot da tal irmã mais velha e do velho amor da guerra simplesmente desapareceu depois dessa história. E um pouco mais adiante, quando Steve e Sharon Carter começaram a namorar, ela não fez mais referências à essa irmã que amou “Steve Rogers” na guerra, nem mesmo quando ela (veremos à frente) descobrir a identidade secreta dele. Muito estranho, não?

Mas sigamos: em Tales of Suspense 78 (com Kirby de volta à arte completa) o Capitão se reúne com o Diretor da SHIELD, o coronel Nick Fury, para discutirem informações sobre a THEM e são atacados pelo braço científico da organização: a Ideias Mecânicas Avançadas (IMA), que muito em breve se tornará uma entidade autônoma, uma das principais organizações terroristas da Marvel e inimigos clássicos do herói, reconhecidos de longe por seus uniformes amarelos, capacetes quadrados e visores de renda, um visual excêntrico criado espertamente por Kirby. É nessa ocasião em que Fury presenteia o Capitão com um cartão especial de Acesso-A da SHIELD, o que cria uma linha direta entre eles dois e, para fins práticos, torna o sentinela da liberdade uma espécie de agente honorário da SHIELD.
Aqui vale um longo parênteses sobre Nick Fury, que será um importante personagem coadjuvante nas histórias do Capitão dali em diante. O personagem foi criado por Stan Lee e Jack Kirby dentro da linha de histórias de guerra da Marvel, estreando na revista Sgt. Fury and His Howling Commandos 01, de maio de 1963, ainda bem na aurora da Era Marvel. O gênero de guerra era bastante popular naqueles tempos e a dupla seguiu a corrente, inclusive, quase como uma piada, inspirados no superpopular Sgt. Rock da DC Comics. Naquelas tramas, o sargento Nicholas “Nick” Fury era o líder de um destacamento militar na II Guerra Mundial, lutando contra os Nazistas no território europeu. O diferencial do Comando Selvagem (como foi batizado no Brasil) era ser um grupo racialmente diverso, com o irlandês Dum-Dum Dugan, o afroamericano Gabe Jones e assim por diante, o que foi um grande avanço e inovação na época. Aliás, Jones era o primeiro personagem afroamericano fixo da Marvel!

Tendo em vista que apenas 20 anos separavam a guerra do presente, Lee e Kirby não se furtaram de, desde o início, acenarem as histórias do Comando Selvagem com o Universo Marvel que começavam a montar naqueles tempos, daí que um jovem Reed Richards (o Sr. Fantástico do Quarteto Fantástico) aparece na edição 03 da revista de Fury. E não demorou nada, eles “devolveram” o favor: um Fury mais velho, com os cabelos das têmporas grisalhos e usando um tapa-olho, tendo perdido o olho esquerdo, aparece como um agente da CIA em Fantastic Four 21, de dezembro de 1963. E tendo em vista que o Capitão América foi reintroduzido na Era Marvel, Sgt. Fury and his Howling Commandos 13, de dezembro de 1964, mostra o Comando Selvagem lutando na guerra ao lado do Capitão e Bucky, forjando uma duradoura amizade entre os dois personagens.
Com o sucesso dos filmes de James Bond e séries de TV como Man of UNCLE, Lee e Kirby tiveram a ideia de tornar Fury o seu agente secreto, então, o personagem foi reapresentado como um coronel em Strange Tales 135, de agosto de 1965, convidado pelo Governo dos EUA para se tornar o líder da SHIELD, dali iniciando suas aventuras solo, que fizeram muito sucesso na época, além de frequentar constantemente as histórias do Capitão América e do Homem de Ferro, ambas em Tales of Suspense.
A Volta do Caveira Vermelha

De volta à nossa revista, temos a introdução no presente do Caveira Vermelha, que se deu a partir de Tales of Suspense 79, de setembro de 1966, ainda por Lee e Kirby. Até então, o vilão só tinha aparecido em flashbacks ou nas histórias retroativas. Agora, enquanto o Capitão continua no encalço da IMA, descobre que o seu velho inimigo ainda está vivo, e vemos o flashback que revela que, após ser soterrado no bunker alemão em 1945 (como mostrado na edição 72), houve a liberação de uma gás experimental que deixou ele e dois capangas em animação suspensa. Apesar de repetir quase o mesmo artifício do Capitão América, a manobra permitiu que a rivalidade histórica dos dois permanecesse nos dias atuais.
Com isso, Lee e Kirby acrescentaram outro fantástico vilão ao Universo Marvel moderno. Sem mais servir ao nazismo, o Caveira Vermelha se dedica exclusivamente à morte, à destruição e à dominação mundial. Na trama, o vilão engana a IMA e rouba um artefato poderosíssimo que a organização construíra: o Cubo Cósmico, uma peça de poder infinito, capaz de transformar em realidade o pensamento de uma pessoa. (Artefato que o cinema transformará no Tesseract).

A batalha do Capitão com o Caveira Vermelha é uma ótima amostra do excelente trabalho de Lee e Kirby com o personagem: Kirby fornecendo uma arte dramática, cheia de ação épica e grande destruição (a batalha final simplesmente destrói uma ilha inteira!); enquanto Lee enche as páginas com as reflexões existencialistas do herói, se questionando sobre a desumanidade de seu inimigo e de seu papel incerto em um mundo que não é o seu. Clássico! Usando o ego do vilão contra si próprio, o herói consegue derrotá-lo mesmo de posse do Cubo, e com a destruição da ilha, aparentemente, o Caveira e o Cubo se perdem para sempre no meio do Oceano.
Não mesmo…

Seguiram mais frenéticas aventuras, com o surgimento do Adaptóide (edição 82), um robô criado pela IMA com a capacidade de imitar as habilidades de quem está próximo dele. Infelizmente para o herói, ao ficar próximo dos Vingadores, ele se transforma no Super-Adaptóide, que se soma à ameaça do Salteador [Tumbler] (edição 83). No número 85, o Capitão vai visitar a Agente 13 no hospital, o que dá início efetivamente ao vínculo entre os dois personagens. O curioso é que, embora não use máscara, a Agente 13 é uma agente secreta, e portanto, sua identidade é desconhecida do herói, que desconhece o nome verdadeiro dela, do mesmo modo que ele se esconde de seus aliados atrás de uma máscara, uma dualidade que termina por incomodar Steve Rogers.
Além disso, o herói é atacado de novo por Batroc, o saltador, que agora está empregado pela HIDRA para derrotar o herói. É a oportunidade para Jack Kirby ilustrar uma grande batalha dos dois, mas quando o ladrão francês percebe que a HIDRA quer matar o Capitão, seu código de honra age novamente e ele ajuda de novo o herói. A HIDRA era o equivalente maligno da SHIELD: uma organização terrorista com raízes no Nazismo, que usa uniformes verdes com máscaras e visores de vidro, e liderada inicialmente pelo Barão Wolfgang Von Strucker e que surgira nas aventuras solo de Nick Fury, mas terminará como uma oponente destacada do Capitão dali em diante.

O Caveira Vermelha já regressa no arco de Tales of Suspense 88 a 91, terminado em julho de 1967, e com a arte temporariamente assumida por Gil Kane em vez de Kirby, onde o vilão o coloca contra os inimigos dos Vingadores, Espadachim e Poderoso, e contra um robô com a aparência de Bucky, antes de tentar sequestrar um submarino nuclear, ao qual o herói destrói novamente pretensamente matando seu inimigo num novo ambiente subaquático.
O herói também participou da história de Nick Fury em Strange Tales 159, com texto e arte de Jim Steranko, no qual auxilia no treinamento de novos recrutas da SHIELD e é contada a longa história conjunta do Capitão e Fury desde os tempos da II Guerra Mundial, efetivando a amizade e aliança dos dois personagens.
A guerra contra a IMA prossegue e a organização cria o MODOK (Mental Organism Designed Only for Kill), uma mistura de ciborgue, robô e inteligência artificial com uma cabeça imensa emoldurando um corpo diminuto, que se torna um dos mais clássicos vilões do Capitão América, que aparece em Tales of Suspense 93 e 94, terminando em outubro de 1967. O vilão também teria uma longeva carreira enfrentando outros heróis, como Namor, Hulk, Homem de Ferro, Miss Marvel e vários outros.

Uma mudança de rumo é ensaiada na edição 95, de novembro de 1967, na qual o Capitão tem um encontro romântico com a Agente 13 e a pede em casamento mesmo sem saber seu nome, o que ela nega, afinal, está muito comprometida com seu trabalho na SHIELD. Mesmo com a recusa, o herói pensa que seu dever está sempre acima de sua vida pessoal e decide se aposentar da função de Capitão América, algo que comunica a imprensa e termina por revelar diante de todos a sua identidade secreta: Steve Rogers.

Mas a aposentadoria tem a consequência de que vários imitadores procuram ocupar seu lugar e são mortos pelo crime organizado, o que leva Rogers a retomar sua carreira na edição 96. Não é exatamente claro o que Lee e Kirby queriam com esse par de edições. A abrupta decisão e o voltar atrás deixam de legado apenas o fato de que é o fim da identidade secreta do herói, algo que era muito raro naqueles tempos. No panorama da Marvel, poucos tinham identidades públicas (Quarteto Fantástico, Doutor Estranho) e apenas o Hulk tinha revelado a sua identidade, algo que ocorrera somente um ano antes.
Por outro lado, é difícil de pensar que após Steve Rogers ter sido dado como morto em 1945, algum historiador não tivesse revelado seu verdadeiro nome nas décadas que se seguiram antes dele ser descongelado. Mas isso é assunto para depois…
Uma Nova Revista Própria
Uma vez que Lee e Kirby encontraram o fio da meada nas aventuras solo do Capitão América – em particular a partir da edição 75 – a revista Tales of Suspense teve um grande incremento nas vendas e as seções de cartas elogiavam as histórias do sentinela da liberdade.
O sucesso das aventuras do Capitão fizeram, assim, com que a partir do número 100, de abril de 1968, a revista Tales of Suspense tenha mudado seu título para Captain America – mantendo a numeração – e trazendo apenas as aventuras do supersoldado, agora com 22 páginas. O Homem de Ferro ganhou também sua própria revista, a partir do número 01.

Naqueles tempos, ter uma numeração alta adicionava prestígio a uma publicação, o que foi o motivo de manter a numeração de Tales of Suspense para Captain America. Contudo, para fins bibliográficos, não se tratava da reativação da velha revista do herói, cujo título era Captain America Comics, que permaneceu encerrada. A numeração alta – a partir de 100 – da nova Captain America dava a impressão de certa continuidade, mas na verdade, se somadas as 41 edições de Tales of Suspense estreladas pelo sentinela da liberdade à velha revista dos anos 1940, teríamos um número bem maior do que 100.
De qualquer modo, a mudança no nome da revista veio no contexto de ampliação da linha de revistas da Marvel Comics, que encerrara o contrato com a velha distribuidora que restringia seu espaço em bancas e marcava o momento em que deixava de ser uma editora “pequena” para rivalizar com a gigante DC Comics pela liderança do mercado de HQs.
A rebatizada Captain America inicia sua carreira (já no número 100) com uma batalha do Capitão, Agente 13 e Pantera Negra contra o Barão Zemo, que todos pensavam ter morrido nas primeiras revistas dos Vingadores. De fato, o herói termina descobrindo que este Zemo é um impostor, um dos criados do vilão original, que estava realmente morto.

Em seguida, temos mais um retorno do Caveira Vermelha, liderando o ataque do Quarto Hibernante na edição 101, agora, um robô de aspecto humanoide e apenas um pouco maior do que um humano, embora com força devastadora. É no meio dessa saga – que envolve os Exilados (velhos nazistas aliados do Caveira Vermelha, ainda vivos no presente e que viviam em uma ilha no meio do Atlântico, chamada de Ilha dos Exilados) – que os leitores descobrem, pela primeira vez (!), que o real nome da Agente 13 é Sharon Carter, o que ocorre em Captain America 103. Na trama, em vista do envolvimento romântico dos dois e pelo fato do Capitão ser um aliado destacado da SHIELD, Nick Fury permite que ela revele seu nome verdadeiro para o herói, o que é mais um passo no envolvimento dos dois.
O Capitão enfrenta Batroc, Espadachim e o Laser Vivo numa corrida para obter uma bomba sísmica, na edição 105, e de novo, Batroc termina por auxiliar o herói.

Outra adesão importante, o vilão Doutor Faustus, um psiquiatra maligno com uma longa barba ruiva, aparece pela primeira vez em Captain America 107, de novembro de 1968. O Capitão busca o psiquiatra para auxiliar nas dolorosas lembranças sobre a morte de Bucky e na incessante sensação de solidão que sente por ser um homem “fora do tempo”, e o vilão se aproveita para usar drogas e hipnose para manipular o herói e controlar sua mente, mas ele percebe e o prende.
Este será outros dos mais tradicionais vilões típicos do Capitão.
Enquanto isso, nos Vingadores…
Enquanto via seu universo particular ser construído por Lee e Kirby em suas aventuras solo, o Capitão América continuava como um dos principais membros (e líder) dos Vingadores.

Stan Lee continuou escrevendo a revista The Avengers, com desenhos de Don Heck, até 1967, quando passou a batuta para o jovem Roy Thomas, que o editor vinha treinando para ser seu sucessor. E pouco depois, a arte passou para o fabuloso John Buscema, um dos maiores ilustradores da história da Marvel.

Nascido em 1940, em Jackson, Missouri, (portanto, tendo apenas 26 anos em 1966), Thomas estudara História e Sociologia e se tornou um membro ativo do fandom – a comunidade organizada de fãs – que passou a se mobilizar nos anos 1960 e a criar fanzines de grande circulação, organizar clubes com redes de correspondência (sim, por carta, não havia internet naqueles tempos) e a promover as primeiras convenções de quadrinhos. Após trabalhar rapidamente na DC Comics, Thomas terminou na Marvel, onde se tornou o principal assistente de Stan Lee e começou a ser testado na escrita de revistas secundárias da editora até alçar ao primeiro escalão justamente com The Avengers.
Thomas era um apaixonado pela Era de Ouro dos quadrinhos, um fã ferrenho da Marvel e alguém com uma visão mais política do mundo, o que transparecia claramente em seus escritos, mais antenados ao mundo dos anos 1960. Ele seria um escritor fundamental para a cronologia do Capitão América, como veremos daqui em diante.

Primeiramente, ainda com a arte de Don Heck, as aventuras de Thomas em Avengers mostraram participações especiais da Viúva Negra (Avengers 36) e do semideus Hércules (edição 38), quando a arte passa para John Buscema e vemos a introdução do Guardião Vermelho (edição 43), que é a versão soviética do Capitão América, seguindo o retorno do Super-Adaptóide (edição 45) e o Capitão América deixar a liderança e a participação nos Vingadores pela primeira vez (na edição 47, de dezembro de 1967), atendendo a determinação do editor-chefe Stan Lee de que o herói (e também Homem de Ferro e Thor) só deviam participar esporadicamente das aventuras do grupo.
Ainda assim, o Capitão é o membro dos três grandes que mais participa da revista do grupo, vez por outra retornando para acompanhar as aventuras dos colegas.
Mesmo sem seus velhos protagonistas, a fase Thomas-Buscema nos Vingadores alçava grandes voos e ia se firmando como uma das melhores dentre todas as do grupo, trazendo o ingresso do Pantera Negra no time (na edição 52, em consequência dos eventos de Captain America 100 a 102), a introdução do vilão Ultron (a partir de Avengers 54), do herói Visão (na edição 57).

Mas em meio a essas aventuras, houve algumas histórias com a participação do sentinela da liberdade em tramas fundamentais para sua cronologia pessoal. Em Avengers 56, de setembro de 1968, Thomas e Buscema contam uma aventura em que o Capitão América usa a máquina do tempo pertencente ao Dr. Destino para voltar ao dia de 1945 em que Bucky Barnes morreu e ele mesmo terminou congelado (onde ficaria por décadas até ser resgatado pelos Vingadores).
Ao lado dos Vingadores (Pantera Negra, Gavião Arqueiro, Golias e Vespa), o Capitão América termina voltando no tempo e presenciando os eventos de um ataque da dupla ao castelo do Barão Zemo, que culminam, claro, na morte de Bucky. Entretanto, é um momento importante, já que é a primeira vez em que os acontecimentos que levaram à morte de Bucky são mostrados em detalhes.
Vale ressaltar que Roy Thomas era um fã incondicional da Era de Ouro e um profundo conhecedor dela. Por isso, tinha grande interesse em contar histórias sobre o período, o que lhe levou a ter significativa importância na montagem do passado do Capitão América para a cronologia moderna da Marvel.
Após mais uma série de aventuras dos Vingadores (com ou sem a participação do Capitão), como o retorno de Ultron (nas edições 67 e 68), temos a estreia do desenhista Sal Buscema, o irmão caçula de John, e um artista que terá uma longeva e importantíssima vinculação com o sentinela da liberdade, como veremos adiante. Foi sob a mão do Buscema mais novo que Roy Thomas criou uma das adesões cronológicas mais importantes ao Capitão América.
Entre Avengers 69 e 71, começando em outubro de 1969, os Vingadores combatem Kang, o conquistador, o viajante no tempo que já se consolidava como um dos principais oponentes da equipe, que entra em uma disputa com o Grão-Mestre (um dos Anciões do Universo) que coloca os membros dos Vingadores viajando por várias linhas temporais distintas. É na edição 71 que é citada pela primeira vez a existência dos Invasores, o grupo de super-heróis da Marvel nos tempos da II Guerra Mundial, com Capitão América, Tocha Humana, Namor, Bucky, Centelha e alguns outros.
Na verdade, é o mesmo Esquadrão Vitorioso criado por Bill Finger em 1946, mas agora colocado no contexto da guerra. E como aquela era apenas a primeira vez que esse grupo era mostrado, o nome Invasores ainda não foi usado – pois o nome só seria criado anos depois. Mas na trama, os Vingadores Pantera Negra, Jaqueta Amarela e Visão são lançados pelo Grão-Mestre na Paris de 1941 (então, ocupada pelos nazistas) e são confundidos como inimigos por Capitão América (usando seu escudo triangular – que faz sua primeira aparição na Marvel moderna!), Tocha Humana original e Namor. Há uma batalha entre os times e os surpreendentes poderes do Visão (que incluem se tornar intangível e atravessar objetos e endurecer como diamante) garantem uma vitória ao time do presente.
De qualquer modo, a partir daqui, a ideia dos (ainda não nomeados) Invasores, os heróis que lutaram juntos na Guerra (algo que fora apenas sugeridos por aquelas belas capas de All-Winners Comics), passou a ser parte oficial do passado do Universo Marvel, algo que seria bastante explorado no futuro.
O Fim da Era Kirby
Jack Kirby era o principal arquiteto visual do Universo Marvel, mas não somente isso. Por causa do Método Marvel, na verdade, era Kirby quem desenvolvia a trama das histórias – muitas vezes sem nem discuti-las antes com Stan Lee – para apenas depois o escritor (e editor-chefe) vir adicionar os diálogos e recordatórios. Com isso, Kirby tinha uma participação maior nas histórias – algo como 70 por 30 – mas nem era pago por tal nem recebia os créditos. E isso deixava o Rei dos Quadrinhos insatisfeito. Aliás, os créditos das revistas colocavam Lee como o roteirista e Kirby como colaborador e desenhista, mesmo tendo ele próprio criado a trama e os personagens e vilões.

Em 1969, a vida de Kirby passou por uma mudança quando uma de suas filhas teve problemas respiratórios e os médicos recomendaram que a família se mudasse para o clima mais ameno da Califórnia para ajudá-la, e o artista se instalou em Los Angeles, longe do escritório da Marvel em Nova York. Com o contato reduzido apenas a chamadas telefônicas e dependendo do FedEx para enviar seus desenhos à editora, a relação com Lee esfriou e o desenhista decidiu se concentrar basicamente apenas no Quarteto Fantástico e Thor, que produzia também ao lado de Lee. Não é claro porque Kirby abandonou a arte do Capitão América, o seu personagem favorito desde sempre.
Talvez prevendo o desligamento do cocriador, em Captain America 109, já em janeiro de 1969, Lee e Kirby resolvem recontar a origem do Capitão América (que tinha sido apresentada pela última vez em Tales of Suspense 63). Desta vez, é um conto mais detalhado, em que Lee e Kirby criam alguns elementos novos… Na trama, após reencontrar Nick Fury em mais uma de suas missões, os dois velhos amigos conversam sobre os tempos da guerra e o herói narra uma aventura contra os nazistas situada em 1944 numa praia europeia, uma oportunidade para mostrar Bucky em ação e lamentar sua morte de novo. Depois, Steve conta sua origem…

Dessa vez, Lee e Kirby mostram o jovem se alistando no Exército e sendo recusado por causa de seu porte físico até um coronel perceber sua dedicação à causa e o leva até o general Phillips, que por sua vez, o leva ao Dr. Reinstein (no que parece ter sido um lapso de Lee em usar o velho nome e não aquele novo que criaram quatro anos antes, Erskine). Mas o mais importante foi a adesão dos Raios Vita: no experimento, dessa vez, vemos Steve beber o Soro do Supersoldado e depois receber uma dose dessa radiação especial e invisível, o que era ceder ao clichê da radioatividade como responsável pelos poderes de muitos super-heróis da época, como Quarteto Fantástico, Hulk, Homem-Aranha, Demolidor etc.
No fim, Fury se despede e Steve lhe agradece por deixá-lo desabafar, mas o Diretor da SHIELD pede que Steve se divirta um pouco por aí. Quando só, o “homem fora do tempo” reflete que após todo esse tempo, ele simplesmente não sabe mais como fazer isso, o que era o contínuo recurso dramático de Lee e Kirby de explorar a solidão e a falta de sentido da vida “civil” do sentinela da liberdade. E se você achou precoce a necessidade de recontar sua origem meramente quatro anos após a última vez, lembre que naqueles tempos não existia o hábito de republicar as histórias mais célebres, pois a cultura dos encadernados só surgiu no fim dos anos 1980! Assim, era preciso refrescar a lembrança dos leitores de tempos em tempos.

Após o Capitão América ser dado como morto (explicamos abaixo, calma), a edição 112, de abril de 1969, serve como um tipo de interlúdio, no qual o Homem de Ferro encerra seu arquivo nos computadores dos Vingadores e, para isso, relembra toda a história de Steve Rogers, desde a II Guerra Mundial até o presente. Esta edição é desenhada (e roteirizada seguindo o Método Marvel de Stan Lee) por Jack Kirby e é a maior retrospectiva que o personagem já havia tido até então. É um interessante complemento ao número 109, com Kirby, então, recontando sua origem e sua trajetória.
É interessante que Kirby aproveita para realinhar vários eventos da antiga Captain America Comics à nova cronologia do herói, mostrando vilões e eventos que não fizeram parte do retcon daquelas velhas edições de Tales of Suspense nos tempos da II Guerra Mundial. Ainda assim, Kirby concentrou sua recontagem dos tempos da guerra aos fatos dos números 03 a 09 de Captain America Comics, que são aqueles que ele produziu ao lado de Joe Simon nos anos 1940 e ignorando as histórias contadas depois de 1942 por outros autores (Lee incluso), dali saltando para a morte de Bucky, por exemplo.

Com sua arte no auge, é um deleite ver Kirby rememorando a trajetória de sua mais querida criação, recapitulando rapidamente a aventura contra o Caveira Vermelha publicada originalmente em Captain America Comics 03 (aquela na qual ele usa uma superbroca como arma) e outros capítulos daquelas aventuras iniciais, como as aparições de Borboleta, do Mestre do Picadeiro e seu Circo do Crime, os mendigos nazistas, a Morte Branca e o Homem-Sapo. Em seguida, temos um quadro de ação para exemplificar Capitão e Bucky em ação na Guerra (com o “detalhe” do rapaz usando uma metralhadora, como naquelas capas antigas).

Kirby, então, dá espaço para uma mostra mais detalhada daquela batalha final contra o Barão Zemo, na qual vemos a dupla (em trajes militares e não em seus vistosos uniformes coloridos) avançar em uma moto contra o avião experimental e a tragédia da morte de Bucky, o avanço de décadas no tempo (naquele tempo, “apenas” 20 anos) e seu “resgate” acidental nas mãos do furioso Namor, contado em quadros maiores e ligeiramente mais detalhados desta vez, com a história acelerando para dizer que ele se aliou aos Vingadores e a Nick Fury da SHIELD, assim como a namorada Agente 13, Sharon Carter, e Kirby recapitulando algumas das aventuras de desenhara em anos recentes, com destaque para o confronto contra MODOC e a IMA, a batalha contra o Quarto Hibernante, lutas contra Baltroc, o Saltador, Espadachim, Laser Vivo, os Exilados, Ardiloso e o Doutor Faustus.
É um momento importante e simbólico, já que representa a despedida de Jack Kirby da revista Captain America e do personagem, por muitos anos. (Ele voltaria sete anos mais tarde, aguarde um pouco). Mas de qualquer modo, foi a última vez que retratou o personagem no contexto da Era de Prata. O fim de uma era…
E foi a última vez que o desenhista trabalhou com Stan Lee no personagem. Kirby ainda continuaria na editora por pouco tempo, fazendo Quarteto Fantástico e Thor, mas terminaria afastado da Marvel em 1970, indo para a concorrente DC Comics, desenhar o Superman e criar o Quarto Mundo e toda a saga dos Novos Deuses e o vilão Darkseid. Kirby só voltaria à Marvel cinco anos depois.
A saída de Kirby da revista ocorreu em meio à tentativa de sua substituição com a arte deslumbrante de Jim Steranko, artista que causava grande sensação na época com seu trabalho nas aventuras da revista Nick Fury, Agent of SHIELD. Com uma arte dinâmica, cheia de movimento e inovação, Steranko tinha apenas 31 anos de idade e foi um substituto à altura de Kirby, mas infelizmente, ficou por apenas três números de Captain America.

Provavelmente, o plano era que Steranko ficasse por mais tempo, já que nenhum outro artista da época – nem mesmo Kirby – causara tanta impressão nos críticos e no público, mas ele entrou em uma disputa de ego com Stan Lee (ainda o editor-chefe da Marvel, lembrem), que constantemente fazia ajustes e modificações em sua arte e se afastou do trabalho contínuo na editora (e passando a fazer apenas capas e ilustrações especiais). Em uma entrevista, Steranko revelou que sua vida na época era uma loucura: fazendo o trabalho na Marvel pela manhã, trabalhando em uma agência de publicidade à tarde e tocando em uma banda de rock à noite… Quando a tensão cresceu na redação, ele realmente largou mão. Uma pena, pois foi um artista revolucionário!
Mas vamos ao começo, antes de chegar ao fim… O fato de Steranko escrever os roteiros – com as histórias trazendo a assinatura de Lee apenas como editor e não escritor – também causou ressentimentos em Kirby, que (com razão) achava que merecia mais créditos.

As edições com Steranko foram Captain America 110, 111 e 113, começando em fevereiro de 1969, e envolveram uma histórica batalha contra a HIDRA. Na primeira edição, um amargurado Steve Rogers, lidando com sua solidão, termina entrando em um confronto rápido contra o Hulk (numa aparição algo gratuita), que tem o propósito apenas de colocá-lo em contato com Rick Jones, o jovem adolescente que era o único amigo do gigante verde e também fora coadjuvante das histórias dos Vingadores.

O reencontro com o Capitão faz com que Jones reacenda a vontade de ser o parceiro de seu ídolo no combate ao crime e ele até usa o uniforme do Bucky… apenas para ser rejeitado por Steve. Mas após uma pequena lição de moral do jovem, o sentinela da liberdade volta atrás e resolve dar uma chance ao garoto e os dois já saem em ação contra uma ameaça indicada pelo alarme dos Vingadores.

A ameaça termina sendo a HIDRA, com uma operação secreta nos subterrâneos de Nova York, e é a oportunidade do Capitão conhecer a nova líder da organização: a Madame Hidra, mais tarde também conhecida como Víbora. Com seu uniforme sensual e o cabelo preto e liso sempre cobrindo um dos lados do rosto, a vilã tinha um visual incrível e parece terrivelmente maligna.

Os heróis vencem – a despeito da inexperiência de Rick, mas os vilões escapam, apenas para a edição 111 mostrar o Capitão cair em uma emboscada da HIDRA, escapar e tentar treinar Rick, que se julga incapaz de atingir o nível de agilidade do velho James Barnes, quando o herói sai, um depressivo e raivoso Rick recebe um bilhete envenenado e sofre do que parece uma viagem psicodélica do tipo bad trip.

As impressionantes duas páginas de Steranko mostrando a consciência de Jones se desfazendo em meio a um pesadelo surreal é simplesmente uma das coisas mais maravilhosas que a Marvel criou nos anos 1960 e um exemplo o altíssimo valor artístico que a editora alçara naqueles tempos. Os críticos ficaram simplesmente embasbacados e a imprensa séria notou e noticiou o feito!

Cabe ao Capitão sair ao resgate de seu novo Bucky, mas na batalha que se segue no cais, o herói salta para a água e é alvo de uma saraivada de tiros de metralhadora, o que dá a impressão a todos que o sentinela da liberdade foi morto. E o último quadro da revista mostra a polícia conseguindo resgatar apenas o uniforme – todo furado – do herói e, o mais surpreendente, uma máscara de borracha trazendo o rosto de Steve Rogers!!!! O policial logo conclui: “Steve Rogers” era uma identidade falsa, então, quem é o verdadeiro Capitão América?

Esta aparente morte foi o gancho para a edição 112 e a narração biográfica do herói por Kirby que já mencionamos, servindo como sua despedida e uma interrupção à temporada de Steranko. A edição 113, de maio de 1969, mostra a impressão da mídia de que “Steve Rogers” era uma farsa e que a verdadeira identidade do Capitão América continuava a ser um mistério.


A aventura é marcada pelo velório do herói com os Vingadores, Nick Fury, Rick Jones e Sharon Carter murmurando por ele até que a HIDRA ousadamente os ataca com gás, fazendo todos esses – à exceção de Rick, que tinha saído da sala – como reféns e os levando a um cemitério para enterrá-los vivos! O novo Bucky tenta o resgate, mas então, o Capitão América reaparece vivo e tem uma esganiçada batalha contra os agentes terrorista, com vários deles sendo mortos, e a própria Madame Hidra aparentemente tendo o mesmo fim, quando dispara um míssil de captura térmica que, quando o sentinela da liberdade e Jones desviam (se escondendo numa cova), retorna para ela e a explode junto a um mausoléu.

Rick fica confuso sobre o que aconteceu e o Capitão lhe explica que bolou esse artifício da máscara para fazer o público pensar que “Steve Rogers é uma farsa”, como uma estratégia dele voltar a ter uma identidade secreta, pois percebera como era perigoso todos saberem que ele era (o que era evidente nessa aventura, com a HIDRA o atacando em casa e em sua identidade civil).

Era uma “volta atrás” do que Lee e Kirby haviam feito há apenas um ano e meio antes, ao se revelar ao mundo inteiro, e tornou o lance da identidade secreta do herói ainda mais confuso. E ia piorar…
A Madame Hidra, ou Víbora, iria se tornar uma das mais conhecidas e importantes vilãs do Universo Marvel, combatendo também vários outros personagens, inclusive os X-Men. É por causa disso que a vilã aparece no filme Wolverine – Imortal, de 2013, por exemplo.
As Fases de Gene Colan e John Romita
Stan Lee continuaria a escrever as aventuras de Steve Rogers por um tempo. A partir de Captain America 114 (que é desenhada por John Romita e volta a ter Stan Lee creditado como roteirista) dá-se início a mais uma saga envolvendo o Caveira Vermelha. Vemos uma briga entre Rogers e Sharon Carter, que não aceita abandonar sua carreira de operadora da SHIELD, e o herói usando coloração no cabelo e maquiagem para não ser reconhecido em sua identidade civil e buscando construir uma nova identidade secreta.
Descobrimos que o Caveira Vermelha reencontrou o Cubo Cósmico e troca de corpo com o Capitão América (na edição 115, com desenhos de John Buscema), para deixar o herói isolado na Ilha dos Exilados no corpo do vilão na edição 116, já com desenhos de Gene Colan, que se torna o desenhista fixo da revista. Colan havia desenhado o personagem nos anos 1940, e agora, era um artista em ascensão na Marvel, trabalhando com Demolidor, Namor e os Vingadores.

É na Ilha dos Exilados que o Capitão América conhece Sam Wilson, o Falcão, que se tornaria o primeiro super-herói afrodescendente dos quadrinhos, em Captain America 117, de setembro de 1969, nas mãos de Stan Lee e Gene Colan. A Marvel (leia-se Stan Lee) já havia sido pioneira em criar o primeiro super-herói negro – o Pantera Negra, em 1966 – mas o Falcão é o primeiro herói negro norteamericano (o Pantera Negra é africano).
O Falcão adota um uniforme inspirado pelo Capitão América e o ajuda a derrotar os Exilados e, finalmente, o Caveira Vermelha, em Captain America 119, contando também com a ajuda de MODOK e da IMA, que perceberam o perigo do Cubo Cósmico e o destroem. O Caveira é novamente dado como morto. A partir de então, o Falcão se torna um personagem recorrente na revista e chegará, inclusive, a ter seu nome incluído no título no futuro breve.
O Capitão América adentra os anos 1970 por meio da fase de Stan Lee e Gene Colan, que infelizmente, não é uma das mais chamativas do herói. Havia certo cansaço nessas aventuras, em parte, talvez, por Lee estar muito ocupado com outras atividades editoriais na Marvel. São tramas com participações frequentes da SHIELD e de Nick Fury, além da IMA, claro. O fato é que Colan ainda não era totalmente versado no Método Marvel nem tinha a capacidade criativa e narrativa de Kirby (ou Steranko) e Lee precisava criar premissas básicas para o artista desenvolver, mas o escritor-editor estava muito ocupado para isso e já não dava ao Capitão o devido espaço em sua agenda, ao contrário de revistas como do Quarteto ou do Homem-Aranha.

Todavia, ainda há alguns momentos interessantes… na edição 130, de outubro de 1970, vemos que mesmo o Capitão América de Stan Lee (pelo menos naquele ponto da história) não é um ufanista alienado e quando uma manifestação de estudantes resulta em revolta, o herói é convidado para condenar aquela ação. O Capitão condena a violência dos estudantes, mas profere um discurso contundente:
Me pediram para falar com você hoje… para alertar esse país a respeito daqueles que tentam mudar nossas instituições… mas, de jeito nenhum, vou avisá-los. Esta nação foi fundada por dissidentes… por pessoas que queriam algo melhor! Não há nada sagrado a respeito do status quo… e nunca haverá!
Naqueles tempos, várias revistas da Marvel – como do Homem-Aranha, por exemplo – mostravam protestos estudantis, refletindo o clima real de turbulências políticas que sacudiam os Estados Unidos e que atingiram o pico nas manifestações de Kent State, nas quais os policiais mataram quatro pessoas, o que resultou na canção Ohio de Crosby, Stills, Nash & Young; assim como na turbulenta prévia do Partido Republicano que resultou no julgamento dos sete de Chicago.
Na parte da ação daquela edição, o Capitão enfrenta o Esquadrão de Batroc, que além do mercenário francês traz o Tufão e o Porco Espinho, mas a grande ameaça mesmo é o Barão Von Strucker, arqui-inimigo de Nick Fury e ex-líder da HIDRA, cuja batalha resulta na sua prisão na edição seguinte (131).
O Falcão apareceu em várias edições, mas é oficializado como parceiro de combate ao crime do Capitão América na edição 133. No número seguinte, 134, de fevereiro de 1971, acontece algo histórico: a revista muda oficialmente seu nome para Captain America & the Falcon, o que torna Sam Wilson o primeiro super-herói negro a ter seu nome como título de uma revista em quadrinhos! Esse seria o título oficial da revista até o número 222.
Um ponto importante da união entre Steve Rogers e Sam Wilson é que este trabalhava como assistente social no Harlem, em Nova York, o que fez Lee e Colan explorarem bastante as tensões sociais que ainda ebuliam naquele início da década de 1970, com o fortalecimento da Nova Esquerda, do Movimento dos Panteras Negras, do feminismo e da luta pelos direitos civis. Esse pano de fundo político atribui uma importância histórica a parte significativa da dupla Capitão América e Falcão ao longo da maior parte da década.

Na edição 134, por exemplo, a criminalidade pós-máfia – ou seja, as organizações criminosas de outros grupos étnicos que não somente os italianos de outrora – é hiperbolizada na figura do chefão criminoso Stone Face, que domina o Harlem, e cuja missão a dupla empreende para finalizar sua era de crimes, o que ocorre na edição 138, também o fim de um arco de dois números nos quais Capitão e Falcão contam com a ajuda do Homem-Aranha.
Mas no meio disso, o desenhista Gene Colan encerrou sua temporada de 21 edições, em Captain America & the Falcon 137.

Os desenhos passaram a John Romita, outro veterano do personagem, em Captain America & the Falcon 138, de junho de 1971. Naquele ponto, Romita tinha 41 anos de idade e era um gigante dos quadrinhos, o principal desenhista da casa, em par com John Buscema, e em muitos sentidos era o responsável pelo visual geral dos personagens da Marvel.
Filho de descendentes de italianos, John Romita nasceu em 1930, no Brooklyn, em Nova York, e cursou o ensino médio técnico na School of Industrial Art, começando a trabalhar como ilustrador logo após o colégio, aos 17 anos, e dois anos depois, estreou nos quadrinhos (sua grande paixão), trabalhando com histórias de romance, crime e westerns para editoras como Timely, Funnies e Trojan Comics. Em 1951, ele foi convocado pelo exército, mas evitou de ir à Guerra da Coreia porque seu talento de desenhista o designou para criação de posters e material impresso. Ainda no exército, começou a trabalhar como free-lancer para o editor Stan Lee na (agora) Atlas Comics, o que o levou ao seu primeiro trabalho com super-heróis: o revival do Capitão América entre 1953 e 54.

Com a crise da Atlas, em 1958, Romita migrou para a DC Comics, onde trabalhou exclusivamente na linha de histórias de romance, um gênero muito popular na época, mas a queda nas vendas em favor dos super-heróis na década de 1960, motivou o artista a deixar os quadrinhos e ir trabalhar na publicidade, fazendo storyboards para comerciais de TV. Quando Stan Lee soube disso, convidou Romita para ir trabalhar na Marvel, igualando o alto salário que tinha na agência. Desapontado com o mercado de HQs, Romita aceitou relutantemente, trabalhando primeiro com o nanquim sobre o desenho de Jack Kirby nos Vingadores e no Capitão América em 1965, antes de regressar totalmente ao lápis no Demolidor, o que foi um trampolim para assumir a arte do Homem-Aranha, em 1966, cujo belíssimo trabalho de Romita transformou no maior sucesso da Marvel.
Com sua chegada ao Capitão América em 1971, a revista dá um salto de qualidade, pois Romita era um ótimo narrador visual e trabalhava confortavelmente no Método Marvel, tal qual havia feito com Lee no Homem-Aranha. Sem dúvidas, a arte de Romita foi uma das responsáveis por tornar o aracnídeo o maior sucesso da editora na segunda metade dos anos 1960, e além… E é interessante notar que, após desenhar o sentinela da liberdade em seu retorno dos anos 1950 e cobrir a ausência de Kirby em algumas ocasiões no fim da década de 1960, essa curta temporada de 1971-1972 foi a única vez em que Romita foi o desenhista regular do Capitão.
Inclusive, para sua estreia como artista fixo da revista do Capitão, como era típico Marvel, que tal colocar o Capitão América e Falcão contra o aracnídeo? Ainda que há um pretexto bobo para a trama, rendeu uma bela capa do artista. Romita fez um trabalho sensacional no sentinela da liberdade, com seu traço elegante e bonito.

Na primeira edição, o número 138, John Romita apenas fechou as pontas da trama que estava e desenvolvimento, portanto, sua estreia para valer foi no número 139, na qual promoveu três grandes marcos para impulsionar as histórias dali em diante. O primeiro deles foi fazer Steve Rogers adotar uma nova identidade secreta como policial de patrulha nas ruas de Nova York, logo na edição 139, um movimento inusitado. O recruta Rogers fica sob a supervisão de um irascível chefe, o sargento Brian Muldoon – que talvez como uma rusga pelo ruído dos problemas editoriais de não muito tempo antes, é desenhado por Romita com o rosto (e algo da personalidade) de Jack Kirby, mantendo inclusive o hábito de fumar charutos.

Esse passo é interessante, pois Romita – que seguindo a lógica do Método Marvel era quem desenvolvia as tramas para apenas depois Stan Lee colocar os diálogos e recordatórios – vinha da revista do Homem-Aranha, que era pautada por uma abordagem mais realista. Assim, se era estabelecido que os Vingadores não eram remunerados em sua atividade heroica, Steve Rogers precisava ter um emprego para sobreviver. A escolha de ser um policial foi realmente inusitada, mas talvez fosse uma reminiscência do fato dele ter sido um soldado e colocá-lo como um agente da lei em sua identidade civil tinha certo apelo. E Romita aproveitou para mimetizar a relação de Steve com Muldoon com a que tinha com o Sgt. Muffy nas velhas histórias de guerra.
Ademais, Romita sabia muito bem que a dinâmica de ter um emprego causava identificação com os leitores mais velhos e adicionava bastante drama pela manutenção da identidade secreta.

Outra questão é que Romita era uma narrador muito esperto e o modo como o Capitão América termina se tornando um policial é muito bem sacado: na trama da edição 139, o Comissário de Polícia Nathan Martin convoca a ajuda do Capitão para promover uma investigação sobre o desaparecimento de sete policiais e dúzias de oficiais do Departamento de Polícia de Nova York. Sem saber quem está fazendo isso e com suspeitas de envolvimento interno, o Comissário requer que o Capitão atue disfarçado como um recruta de patrulha à pé, o que o herói aceita. Somente Martin e o próprio herói sabem do embuste.
Disfarçado de policial e trabalhando sob as ordens do irascível Muldoon, o patrulheiro Rogers termina descobrindo que o vilão Gárgula Cinzento (surgido nas aventuras do Thor e capaz de transformar pessoas temporariamente em estátuas de pedra) está colecionando policiais como estátuas em seu jardim.

Claro, Lee e Romita estavam aproveitando o fato de que o Capitão voltara a ter uma identidade secreta após aquelas histórias de Steranko dois anos antes.
Após essa aventura, Steve acha que pode ser útil à sociedade como policial em sua identidade civil, e portanto, mesmo após o fim da missão, decide continuar sendo o policial Rogers em seu tempo livre.

E a revista ainda ganhou outra adesão importante também no número 139: Romita cria a personagem Leila Taylor, a namorada de Sam Wilson. Como já dissemos no caso de Peggy Carter, Lee sempre usava Romita quando precisava criar mulheres bonitas para as HQs, e Leila é criada a partir do visual da ativista Angela Davis, e retratada como uma mulher madura, consciente, crítica e muito antenada com as pautas do movimento negro e do movimento feminista, o que lhe transformava num tipo de canal com aquelas questões políticas para com os leitores. Algo muito interessante naquela época.
Além disso, Leila é engajada – como sua inspiração – e tensiona sempre Sam sobre as questões específicas dos negros do Harlem. Na visão dela, o trabalho dele como assistente social termina por servir aos brancos, ou seja, à manutenção do poder e dominação dos negros pelos brancos (um tipo de ação que espelha sua ação como Falcão também, o que lhe leva a pensar) e que ele precisa dar mais atenção aos seus “irmãos” e às questões necessárias para uma atuação mais efetiva. Leila desconfia das pessoas brancas e será a representação do radicalismo do movimento negro nessa fase do início dos anos 1970.

Por fim, a terceira adesão de Romita já naquela edição foi a garra do gavião, o gancho que o Falcão passa a usar inspirado pelo encontro com o Homem-Aranha (que usa teias para se balançar entre os prédios). Já explicando ao leitor como se dá seu funcionamento – um cabo de aço preso a um gancho de três pontas (simulando as garras de uma ave) ativado por um sistema de molas que o dispara longe e o recolhe quando necessário – Romita faz o Falcão ter mais movimento, podendo se balançar pelos postes, escalar e se mover mais rápido, dando uma simulação de voo ao herói.
Hoje estamos acostumados a ver o Falcão voando – ainda chegaremos lá, tenha paciência – mas nesse momento, o herói ganhou os ares de um modo mais efetivo do que fora retratado até ali e lhe dando um diferencial em relação ao Capitão América, por exemplo.

A trama com o Gárgula Cinzento se amplia dali, após o recruta Steve Rogers conseguir libertar os policiais – e outras pessoas ilustres que o vilão mantinha em seu jardim – o criminoso sai em busca do misterioso Elemento X que será capaz de tornar seu efeito de petrificar as pessoas permanente, o que provoca o envolvimento da SHIELD, Nick Fury e Agente 13 (Sharon Carter) no meio da batalha que só irá concluir na edição 142.
O Fim da Era Stan Lee
Todavia, no meio do arco do Gárgula Cinzento aconteceu um evento editorial importantíssimo: Stan Lee deixou de ser o roteirista do Capitão América, cargo que ocupara desde 1964, quando o herói foi trazido de volta à Era Marvel Moderna! Naquele momento, a Marvel passava por mudanças editoriais e Lee estava cada vez mais ocupado com o trabalho na redação e com a representação da editora ao mundo exterior, ou seja, mídia e público, então, foi se desligando da maioria das revistas, inclusive, de algumas principais, como do Homem-Aranha. Para evitar fins traumáticos, o editor escolhia desenhistas de absoluta confiança para fazer transições tranquilas, como era o caso de John Romita, que podia tocar a revista ao lado de um roteirista menos experiente.

Isso praticamente comprova que colocar John Romita como artista do Capitão América era um gesto calculado do editor-chefe para que ele pudesse legar a revista a outro escritor após sete anos consecutivos de feitos gloriosos. Afinal, o sentinela da liberdade era uma das principais atrações da Marvel naqueles tempos e precisava manter a qualidade em alta.
O último número assinado por Lee foi Captain America & the Falcon 140, de agosto de 1971. Não muito tempo depois, Lee seria promovido a publisher da Marvel (o cargo mais alto da editora), e também vice-presidente da companhia, enquanto o papel de editor-chefe – que ocupava desde 1942 – passou às mãos de Roy Thomas, seu braço-direito na redação.
De qualquer modo, aquele ponto foi uma ruptura, pois Lee estivera, em muitos sentidos, no comando do Capitão América desde 1942, ou seja, todo o tempo de existência do personagem à exceção da primeiríssima fase de Simon e Kirby. Lee persistiu como uma voz ativa na redação da Marvel pelo menos até o fim da década de 1970, pois seu cargo de publisher o colocava acima do editor-chefe, porém, dali em diante, não estava mais associado ao direcionamento criativo dos rumos do personagem, papel que durante a maior parte dos anos 1970 coube a Roy Thomas.
As Fases de Gary Friedrich e Gerry Conway: A Juventude no Comando
O escolhido para assumir a revista do Capitão América das mãos de Stan Lee foi Gary Friedrich, um jovem de apenas 28 anos de idade que vinha ganhando destaque nos quadrinhos recentemente, tanto em histórias da DC Comics como na própria Marvel, como na revista de Sgt, Fury and the Howling Commandos e do Hulk. Friedrich nasceu em 1943 e cresceu na mesma Jackson, no Missouri que era a terra-natal de Roy Thomas. Os dois se conheceram ainda jovens e Friedrich tocava em uma banda de rock local da qual Thomas foi convidado para ser o vocalista, antes deste se mudar para Nova York, em 1965, em busca de sua carreira nas HQs.

Friedrich era o editor do jornal local quando Thomas o convidou para também ir a Nova York e o ajudou a conseguir trabalho na DC e na Marvel. Sua temporada no Capitão América seria relativamente breve, mas ele seria um dos criadores do Motoqueiro Fantasma alguns anos depois.
Friedrich iniciou sua temporada na edição 141, de setembro de 1971, sendo ele quem colocou o Gárgula Cinzento contra a SHIELD. Friedrich não trabalhava exatamente no Método Marvel, mas seguia as diretrizes de John Romita, que de certo modo, continuou a ser o principal narrador da revista. Era o modo de fazer a “transição segura” que Lee queria, uma forma dos leitores não perceberem uma mudança criativa nem a queda da qualidade da revista.
Ademais, Lee fazia um bom movimento, pois a juventude de Gary Friedrich tornava-o ainda mais conectado às questões sociais e políticas de seu tempo – Romita tinha 41 anos e Lee estava na beira dos 50 – o que o deixava mais qualificado para explorar as dinâmicas entre Steve Rogers, Sam Wilson e Leila Taylor.
O texto de Friedrich já mostra algumas diferenças: apesar da veia liberal que Stan Lee vinha apresentando em anos recentes, o jovem escritor tinha ligação mais forte com o momento em que viviam e a edição 142, por exemplo, traz uma longa discussão entre Sam Wilson e Leila Taylor, com ela acusando o Falcão de fazer o jogo dos brancos e favorecê-los em vez de seus irmãos negros. Leila o chama de “Pai Tomás” (algo como “capitão do mato”, no Brasil, ou seja, negros que agiam em prol dos brancos contra outros negros) e também de “macho chauvinista”.

Fechado o arco iniciado por Lee, Friedrick realizou seu primeiro grande feito em Captain America & the Falcon 143, de novembro de 1971, que comemorava (com atraso!) os 30 anos de publicação do Capitão América numa revista especial, com 42 páginas (quase o dobro do normal – ainda que ao preço mais elevado de 25 centavos, 5 a mais do normal) numa trama batizada nada menos do que “Poder para o Povo”, tomando de empréstimo a canção recém-lançada de John Lennon (Power to the peolpe) e a tônica dos fervilhantes movimentos políticos do início dos anos 1970!
Na trama de Friedrick e Romita, apresentada em três capítulos na mesma edição, um grupo pretensamente revolucionário ganha força em Nova York, em particular no Harlem, apenas para Capitão e Falcão descobrirem que o líder é ninguém menos do que o Caveira Vermelha, aproveitando as tensões sociais dos EUA para tocar o seu reino de terror. A edição também introduz o radical ativista dos direitos dos negros Rafe Michel, que será um coadjuvante secundário da revista pelos anos seguintes.
O leitor talvez tenha notado que a edição 143 introduziu um novo logotipo à revista, com as imagens do Capitão e do Falcão, o que era uma forma de Lee (como editor) de marcar uma fase totalmente nova. E há um detalhe… repare que o Falcão está usando um uniforme diferente no logo!

John Romita aproveitou a ocasião para redesenhar o uniforme do Falcão, que ganhou uma roupa mais “leve” nas cores branco e vermelho, uma combinação de cores mais agradável do que a anterior e mais orgânica com a paleta de cores do uniforme do Capitão América. O novo uniforme de Sam Wilson seria a base fundamental para todas as variações criadas posteriormente, inclusive, no cinema, mas apesar de aparecer primeiro na logo da edição anterior, a estreia oficial da nova roupa é na história de Captain America & the Falcon 144, de 1971.
Mas não terminou aí… A edição 144 traz algumas surpresas mais… A SHIELD apresenta para o presidente (retratado com as feições de Richard Nixon) uma empreitada chamada Femme Force (Força Feminina) que é uma iniciativa para atrair mais agentes femininas à agência. A Femme Force combate uma série de robôs mimetizando agentes da HIDRA e tem em seus rankings não somente Sharon Carter, mas também a Condessa Valetina Allegra de la Fontaine, uma importante agente da SHIELD, interesse amoroso de Nick Fury e coadjuvante das antigas aventuras solo dele.
E seguindo a novidade do número anterior – embora agora com o tamanho normal de páginas – a revista tem uma segunda história, focada no Falcão encerrando a parceiria com o Capitão (claro, só falácia) para se reencontrar com suas raízes afroamericanas e seu papel como assistente social e herói do Harlem, instigado por Leila Taylor.

Todavia, o grande marco da passagem de Gary Friedrick e John Romita no título foi um grande confronto com a HIDRA, que se inicia para valer na edição 145, de janeiro de 1972, num arco chamado HIDRA Acima de Tudo. A partir do sequestro de um avião e de um confronto envolvendo a Femme Force, Friedrick e Romita mostraram uma história onde há um novo líder da organização.
Duas pequenas notas editoriais são interessantes nesse número: primeiro, Gil Kane desenhou as 14 primeiras páginas da aventura, com Romita fazendo as 7 finais; e mais importante ainda, um leitor chamado Fred Janssen escreveu na seção de cartas criando uma teoria de que o escudo do Capitão seria feito de uma liga combinando o indestrutível adamantium (criado por Roy Thomas nas aventuras dos Vingadores como um metal indestrutível) com o vibranium (criado por Stan Lee e Jack Kirby como um metal capaz de absorver energia cinética nas histórias do Pantera Negra junto ao Quarteto Fantástico).
Lembrem: Thomas e Lee eram editores da Marvel e ficaram impressionados com a sugestão. Não demorará nada e as revistas da Marvel irão assumir justamente isso: de que o escudo do Capitão é feito de uma liga especial com a combinação de adamantium e vibranium, portanto, indestrutível e absorvente de energia cinética.
A batalha contra a HIDRA prossegue na edição 146, e vemos que a organização se envolve com um misterioso milionário que vive recluso em Las Vegas. As cenas na qual não vemos esse “novo” vilão, apenas a cadeira em que está sentado e sua mão remetem diretamente aos filmes de James Bond. No número 147, é revelado que o novo líder da HIDRA é o jovem Richard Fisk, o vilão conhecido como Planejador e que o recluso milionário é revelado como sendo ninguém menos do que o seu pai, Wilson Fisk, o Rei do Crime, vilão que surgira nas histórias do Homem-Aranha em 1967, e fora cocriado por Romita (junto a Stan Lee).

A edição 148 relembra que Richard Fisk tentara acabar com a carreira criminosa de seu pai nas aventuras pregressas do Homem-Aranha, e que o Rei do Crime não sabia que o novo líder da HIDRA com quem vinha tratando, e considerava um rival, era na verdade o seu filho rejeitado. E para piorar tudo, todos descobrem que o Caveira Vermelha vinha atuando como um agente das sombras, manipulando Fisk e a HIDRA. O Rei se mostra indignado que seu filho tenha se deixado iludir pela ideologia nazista e termina por ajudar o Capitão e o Falcão a derrotar os terroristas e o Caveira.
E se isso tudo ainda era pouca ação, o Caveira ainda libera um novo Hibernante, o quinto, como um robô gigante que Capitão, Falcão, a Femme Force e a SHIELD precisam derrotar nas ruas de Las Vegas. Um clássico! É um dos melhores arcos do Capitão América!

Este arco também marca a transição para a arte de Sal Buscema, que assumiu a revista no número 146, de fevereiro de 1972, e passaria quatro anos consecutivos no título. Nascido em 1936 (tinha 36 anos de idade), no Brooklyn, em Nova York, em uma família de emigrantes italianos, Salvatore Buscema estudou na High School of Music and Art e terminou convocado pelo exército, onde trabalhou como ilustrador até dar baixa e ingressar no mercado de quadrinhos por um tempo, fazendo o nanquim (arte final), antes de engajar uma longeva carreira na publicidade.
Mas seu amor pelos quadrinhos o levou a trabalhar na Marvel, por meio de um “empurrãozinho” de seu irmão mais velho, John Buscema, um dos três principais desenhistas da editora no fim dos anos 1960 (ao lado de Jack Kirby e John Romita). Trabalhando inicialmente com nanquim e depois desenhando alguns faroestes, Sal terminou assumindo o nanquim da arte do irmão em Silver Surfer, o que chamou bastante atenção e terminou por se tornar o desenhista dos Vingadores em 1969 (como já vimos), fazendo um trabalho espetacular. Logo, se tornaria um dos principais desenhistas da Marvel, assumindo a revista dos Defensores e, então, trabalhando longamente com Hulk e Homem-Aranha. Sal seria o principal artista do Capitão América pelo restante dos anos 1970 e sua imagem retilínea se firmou no imaginário dos leitores.
Contudo, apesar do envolvimento de Sal Buscema no fim do arco entre os números 146 e 148, o envolvimento de Richard e Wilson Fisk deixa muito claro que a trama foi desenvolvida por John Romita, já que serviu inclusive, para dar um final ao arco deixado em aberto nas histórias aracnídeas. Romita fez o nanquim da arte de Sal Buscema naquelas edições, como uma forma de deixar sua marca e seu estilo numa transição mais suave ao estilo mais duro e reto do novo desenhista. Mas, infelizmente, sob os auspícios do Método Marvel, Romita não é creditado como corroteirista do arco e o texto é apresentado como sendo apenas de Friedrich. Romita saiu da revista do Capitão para regressar às histórias do Homem-Aranha.
Aliás, Friedrich também encerra sua passagem no número 148.
Captain America & the Falcon 149, de maio de 1972, dá início a uma curta passagem sob o comando do escritor Gerry Conway, um menino de apenas 18 anos de idade (!) que logo se transformaria em um dos maiores escritores dos quadrinhos em todos os tempos.

Naquela primeira edição, temos uma visão de Rogers compreendo a brutalidade de Muldoon pela necessidade de forjar policiais “durões” que Nova York precisa, e Conway e Buscema colocam Capitão e Falcão contra Batroc, o salteador, ao mesmo tempo em que o policial Steve Rogers é promovido a rádio-patrulha, ou seja, passa a atuar não mais à pé, mas a bordo de uma viatura com um parceiro, que, aliás, não é nomeado ainda nesta edição, mas terá em breve seu nome revelado como Robert “Bob” Courtney, que será um personagem coadjuvante constate da revista pelos anos seguintes.
Em seguida, Capitão e Falcão precisam lidar com o vilão Jakkar se passando pelo Estranho (um poderoso alienígena das histórias dos X-Men e dos Vingadores) na comemorativa edição 150, e os números 151 e 152, com a dupla precisando lidar com a união dos vilões Mr. Hyde e Escorpião (surgidos nas aventuras de Thor e Homem-Aranha, respectivamente). Hyde era um cientista que descobrira uma fórmula que o deixou superforte, monstruoso e complemente louco, enquanto o Escorpião era outro maluco superforte com uma armadura mimetizando o animal que lhe dá nome. Ambos serão inimigos com os quais o Capitão irá enfrentar algumas vezes no futuro, mas especialmente o Mr. Hyde.

O arco dos dois vilões colocam Falcão e Capitão em meio às artimanhas do crime organizado de Nova York e revelam a emergência de um novo chefão no Harlem: um homem chamado apenas Morgan, que continuará a ser um coadjuvante na revista pelo restante da década de 1970.
A edição 152 encerrou meio abruptamente a fase de Gerry Conway, mas isso ocorreu por um motivo nobre: o jovem escritor se mostrou tão eficiente em seu ofício que logo substituiria Stan Lee nas histórias das duas revistas mais vendidas da Marvel: Homem-Aranha e Quarteto Fantástico.
Uma Fase de Ouro: Steve Englehart
Em Captain America & the Falcon 153, de setembro de 1972, a revista é assumida pelo escritor Steve Englehart, enquanto a arte continua com Sal Buscema. Englehart era um escritor em ascensão e tão talentoso que se tornou o responsável por uma miríade de personagens da Marvel consecutivamente, como Hulk, Capitão América, Doutor Estranho, os Defensores e os Vingadores, se tornando um dos maiores escribas da editora em sua fase clássica dos anos 1970.

Nascido em 1947, em Indianopolis, Indiana, Englehart estudou Psicologia na Wesleysian University e chegou a servir ao exército dos EUA (sendo dispensado por ser contrário à Guerra do Vietnã), e começou a carreira como desenhista, fazendo histórias de terror para a Warren Publising, antes de ir trabalhar no Continuity Studios de Neal Adams, onde começou a se dedicar integralmente à escrita. Esse corpo de trabalho o levou a conhecer Gary Friedrick, que começou a contratá-lo para escrever algumas de suas histórias (muitas vezes como “fantasma”, ou seja, sem ser creditado), o que lhe colocou no radar de Roy Thomas, que ainda não era efetivamente o editor-chefe da Marvel, mas já o era de fato. Após escrever as histórias do Fera (dos X-Men) em Amazing Adventures, ele terminou realizando vários trabalhos, em revistas de romance e de guerra até ser escolhido por Thomas como o responsável pela revista própria dos Defensores (The Defenders) – grupo que já havia sido testado em um punhado de aventuras. Dali, ele foi para Captain America, The Avengers, The Incredible Hulk e muito mais. Ainda assim, Englehart tinha apenas 25 anos quando se tornou o escriba do sentinela da liberdade.
Sua obra mais memorável nessa etapa foi justamente nos Vingadores e no Capitão América, criando uma fase sensacional repleta de grandes histórias que marcaram a cronologia do sentinela da liberdade até os dias de hoje e são referência obrigatória. O fato dele já ter trabalhado com Sal Buscema nos Defensores tornou tudo ainda mais fácil. A dupla Englehart e Buscema desenvolveria uma longa parceria que se estenderia até o número 186, em 1975.

O primeiro arco da dupla resolveu um problema cronológico do personagem: se o Capitão América desapareceu no fim da II Guerra Mundial e foi resgatado décadas mais tarde pelos Vingadores, como explicar aquelas aventuras dos anos 1950?

Assim, na edição 153, como um passe de mágica, Capitão América e Bucky estão reunidos no presente e vão ao Harlem, onde espancam de modo indistinto um punhado de negros, o que gera a indignação de Leila Taylor (e de Rafe Michel, claro) com aqueles dois “branquelos” atacando o “nosso povo, nossos irmãos”. Enquanto Steve Rogers está ocupado em seu trabalho como policial, o Falcão vai investigar essa história e termina o número frente à frente com a nova dupla, que clamam ser os verdadeiros Capitão e Bucky, mas fica a dúvida, inclusive para os leitores: o que está acontecendo?

Outro elemento interessante da edição 153, é que cansada de aventuras, a Agente 13, Sharon Carter, pede uma vacância da SHIELD, saindo da ativa da agência por um período, porque ela quer se dedicar a seu relacionamento com Steve Rogers.
Na edição 154, a batalha prossegue e o Falcão não é bem sucedido, e a notícia se espalha e os Vingadores (Homem de Ferro, Visão, Feiticeira Escarlate e Gavião Arqueiro – e lembrem, Englehart também escrevia a revista do grupo) partem atrás do Capitão América e Bucky, tentando entender o que está acontecendo, até que Steve finalmente sabe o que está acontecendo e intervém, o que demostra que existem dois capitães Américas! Mas a loucura da dupla de atacantes os deixam muito fortes e imprevisíveis, e Capitão, Falcão e Sharon Carter são feitos reféns dos vilões.

E é o “novo” Capitão quem esclarece tudo aos heróis na bombástica edição 155, narrando em detalhes a sua origem. Nesta edição, como expressão da paixão de Roy Thomas pela Era de Ouro dos quadrinhos, Englehart e Buscema abrem espaços para quadros e páginas inteiras tiradas das revistas da Atlas (de Lee e Romita).
Toda a trama de fundo do Capitão América e Bucky dos anos 1950 foi baseada em uma ideia do então editor-chefe Roy Thomas, Englehart criou uma história que mostra que nos anos 1950, um professor de História chamado William Burnside descobriu a fórmula do supersoldado de Abraham Erskine (no diário do cientista guardado num arquivo em Munique, na Alemanha) e convenceu o Governo dos EUA a transformá-lo em um novo Capitão América para frear a “ameaça comunista” que se avizinhava na Guerra Fria e na nascente Guerra da Coreia. Fanático pelo Capitão, Burnside convence o Governo a ser submetido a uma cirurgia plástica para ficar com a mesma aparência do herói desaparecido, mas quando ele está pronto para sua missão, a Guerra da Coreia terminou (em 1953) e o novo Capitão América se tornou supérfluo e foi dispensado.

Burnside, então, foi ser professor na Lee School, em Maryland (soa familiar?), e lá conhece o estudante Jack Monroe, como ele, fanático por Capitão e Bucky. Empolgado pelo rapaz, lhe conta sua história, e Monroe o tenta convencer a se tornar o Capitão independente do Governo, o que o professor recusa inicialmente, até o Caveira Vermelha – na verdade, o farsante Albert Malik, um agente soviético – atacar o prédio da ONU e os dois se submeterem ao soro do supersoldado que guardavam em seringas.
A dupla vence o vilão e começam a agir como se fossem os velhos Capitão América e Bucky por um tempo, mas logo em seguida, os dois ficaram loucos tornando-se violentos, agredindo inocentes e assumindo personalidades esquizofrênicas, o que obriga ao Governo detê-los e confiná-los em animação suspensa em um laboratório secreto até que se encontre uma cura. Mas no fim, eles ficaram meio esquecidos por décadas!
Essa trama esclarece, por fim, como foi possível existirem histórias do Capitão entre 1953 e 1954 – a tentativa frustrada de Stan Lee e John Romita. Embora em seu contexto original essas histórias simplesmente eram uma sequência das aventuras dos anos 1940, o retcon de Englehart e Thomas definiu que o conceito geral daquelas histórias aconteceu, mas com Burnside e Monroe no lugar de Rogers e Barnes.

Ao mesmo tempo, Capitão, Falcão e Sharon Carter conseguem se libertar, quando são levados por Burnside e Monroe à Flórida, em Miami, e tem início a batalha final. É o momento para Sal Buscema mostrar sua incrível habilidade para cenas de ação, luta e golpes de impacto, uma de suas marcas registradas. A acirrada batalha acontece já no número 156, e mesmo o Falcão, como mostra a bela capa do artista, fica em dúvida em quem é quem.

Tão interessante quanto a coreografia da luta criada por Sal Buscema, é o discurso do Capitão por Englehart, condenando a hipocrisia da direita, que alega a superioridade de uns contra outros, define quem pode ser livre e quem não pode, e sob a desculpa da “proteção” ao seu estilo de vida, promove a opressão e destruição daqueles que são diferentes de si. Colocar tais palavras na boca de Steve Rogers era uma interessante maneira de mostrar que o sentinela da liberdade não era um ufanista alienado, mas ao contrário, alguém dotado de grande humanidade e respeito ao próximo, especialmente, àqueles diferentes deles, como os afrodescendentes.
Era um discurso que iria ecoar nas décadas à frente sempre que um escritor mais consciente assumia o personagem.

Mas à despeito da loucura e da força, Burnside não tem a experiência de Rogers, e na verdade, uma vez que a luta se estabiliza do efeito surpresa, o Capitão dos anos 1950 não tem chance. Um detalhe interessante da luta mostra Rogers usando o seu escudo para quebrar a réplica inferior de Burnside, e novo fim, ele e Monroe são derrotados. Os heróis entregam a dupla à SHIELD e eles são devolvidos ao estado de animação suspensa, enquanto se busca uma cura para a condição deles. Ambos os personagens seriam importantes adesões ao cânone do herói e voltariam no futuro…
O leitor deve ter notado que, se essa aventura “corrigiu” o “erro” cronológico de haver um Capitão América em 1953 quando o herói (e Bucky) foram dados como mortos em abril de 1945, uma outra questão tão grande ainda permanecia: como explicar as aventuras do sentinela da liberdade entre 1945 e 49? Roy Thomas também tinha uma ideia para isso, mas demoraria alguns anos para conseguir colocá-la em prática. Aguarde…
Além de escrever Captain America, como dissemos, Englehart também assumiu The Avengers e na edição 107 daquela revista, de janeiro de 1973, com arte de Jim Starlin e George Tuska, criou uma história que teria grande impacto na cronologia do herói: a volta de uma identidade secreta.
Antes um parênteses: o Capitão América tinha uma identidade secreta claramente definida em suas velhas aventuras dos anos 1940, e a ideia continuou quando o herói retornou a partir de 1964, por Lee e Kirby. Escritores posteriores passaram a considerar que, por ter sido dado como morto em 1945, eventualmente, o verdadeiro nome do Capitão terminou sendo revelado e foi parar nos livros de história, de modo que todo mundo sabia que ele era Steve Rogers. Mas as tramas dos anos 1960 não abordaram isso dessa forma, Steve Rogers tinha uma identidade secreta até revelá-la publicamente na Tales of Suspense 95, como vimos. Mas nas histórias de Jim Steranko se criou aquela confusa trama de 1969 na qual o Capitão forja a própria morte para que todos pensem que “Steve Rogers” era apenas um embuste e ninguém sabia quem o herói era.

Olhando friamente, Steranko pôs dúvida de que Rogers fosse o Capitão por causa da tal máscara com suas feições, mas objetivamente, ninguém teria esquecido o rosto ou o nome de Steve Rogers por causa disso, mesmo que pensassem que ele era uma farsa. Então, como apenas algum tempo depois, Steve podia ser um policial em Nova York e ninguém pensar que ele seria o Capitão América? Na verdade, Stan Lee preferiu ignorar o imbróglio e fazer de conta que o herói tinha assegurado uma identidade secreta de verdade.
Mas um escritor jovem como Steve Englehart, antenado com o público mais crítico do início dos anos 1970, sabia que aquilo não colava mais. Então, buscou uma solução.

Avengers 107 mostra uma batalha dos Vingadores contra a dupla de vilões Ceifador e Fantasma do Espaço, e o Capitão América descobre uma série de memórias que haviam sido artificialmente suprimidas de seu cérebro. Englehart estabelecia outro retcon: no meio daquela aventura contra a HIDRA criada por Steranko, o Fantasma do Espaço esteve presente e auxiliou a organização e sua líder, Madame Hidra (futura Víbora), mas visando dominar a mente do Capitão, usou sua tecnologia alienígena para fazer o mundo inteiro esquecer que seu nome era Steve Rogers. E por isso, ele tinha de novo uma identidade secreta.
É, continuou confuso…
Superforça… Sim ou Não?
De volta à revista, Captain America & the Falcon 157 dá início a um novo ciclo de aventuras, na qual Capitão e Falcão enfrentam uma organização criminosa chamada Onda de Crimes (Crime Wave), liderada pelo misterioso Cowled Commander (Comandante Encapuzado), que contrata o vilão Viper (Víbora) para matar a dupla. Ao mesmo tempo, os sumiços do policial Steve Rogers geram suspeitas, e o Sgt. Muldoon pede para que Bob Courtney investigue seu parceiro de patrulha.

Englehart aproveitou a oportunidade para dar superpoderes de verdade ao Capitão América, em Captain America & the Falcon 158, de fevereiro de 1973. Até este ponto de sua história nunca ficara claro qual era o nível de força do herói, sempre sendo dito de que ele era o apogeu da forma humana, o que por si só não explicita se é algo “além do humano”, ou seja, sua força e agilidade estariam algo dentro dos parâmetros “normais” de um atleta olímpico e não alguém superforte como o Homem-Aranha por exemplo. Mas nessa trama, o veneno do vilão Viper interage com o soro do supersoldado e o Capitão passa a ter superforça de verdade. Ele ficaria nessa nova condição diferenciada por alguns anos.
Era uma forma de deixar o herói mais poderoso num mundo habitado por outros heróis como Thor, Hulk ou mesmo Homem de Ferro, ao passo que o velho Capitão seria apenas um “atleta excelente”, mas sem nada de “super”. Essa inconsistência seria resolvida apenas no futuro distante. Mas neste contexto específico, teve consequências para as tramas.

Na passagem para a edição 159, Steve Rogers está saindo de seu apartamento quando é desmaiado pelo ataque de Muldoon e Courtney, que suspeitam que o misterioso policial é o Cowled Commander. Ao mesmo tempo, o Falcão tenta descobrir algo sobre o misterioso líder criminoso e pede ajuda ao chefão Morgan, do Harlem, que sabe onde fica a base do vilão, mas só irá revelar se o Falcão trabalhasse a seu favor.
Sam recusa, claro, e continua sua investigação por conta própria, onde consegue descobrir a identidade secreta do Viper e, a partir disso, a localização do QG do chefe dele, o Cowled Commander, que lança sobre os heróis o quarteto de vilões Espantalho, Porco-Espinho, Homem-Planta e Eel; e ainda sequestra Sharon Carter e Leila Taylor, mas Capitão e Falcão se juntam, derrotam os criminosos e descobrem que o sargento Brian Muldoon é o vilão encapuzado, que vai preso, junto com Courtney, que agiu fora da lei quando sequestrou Rogers. (Essa revelação criou uma curiosa situação em vista de Muldoon ter o rosto de Jack Kirby).
Para fins práticos, essa trama meio que finalizou a fase de Steve Rogers como policial. As histórias seguintes não mostram o herói se desligando da polícia, mas tampouco o mostram usando essa identidade secreta.
Na edição 160, o Capitão vence facilmente o vilão Solarr, por causa de sua nova força aumentada, o que faz com que o Falcão comece a pensar que o sentinela da liberdade não precisa da ajuda dele, agora que tem superforça. Ao mesmo tempo, vemos Sharon Carter ir embora de seu apartamento e deixar uma nota de despedida para Steve, dizendo que não quer mais vê-lo. A garota estava decepcionada porque, ao deixar a SHIELD, esperava que Steve fizesse o mesmo com sua carreira heroica, mas ele continuava firme e forte como Capitão América, então, Sharon decidiu ir embora para a Virginia, onde moravam os seus pais.
E Sam presencia uma cena de intimidade entre Leila e Rafe Michel, o que o deixa enciumado, mas ao menos serve para que, a partir deste ponto, Sam e Leila se tornem efetivamente um casal.

As edições 161 e 162, terminando em junho de 1973, mostram a volta do Dr. Faustus, que arma um jogo mental para quebrar a mente do Capitão América, sequestrando Sharon Carter e usando truques psicológicos para fazê-la pensar que está com amnésia, e ao mesmo tempo, usando os pais dela, Harrison e Amanda, como parte do plano. No fim, Capitão e Falcão, conseguem desarmar os planos do vilão e Steve descobre que Sharon tem uma irmã mais velha: Peggy Carter, justamente aquela mulher que ele amou nos tempos da 2ª Guerra e conheceu em meio à Resistência Francesa, como mostrado naquela aventura de Tales of Suspense 77, de sete anos antes. Na trama, ela está em uma instituição psiquiátrica desde o fim da II Guerra, o que a coloca numa situação de despertar no “presente” similar à que o Capitão passou. Mas ela envelheceu!
Uma série de curiosidades envolve essa escolha de Englehart em resolver outro mistério do passado do personagem. Claro, ele estava explorando o fato do Capitão achar Sharon parecida com a tal mulher, como informado naquela primeira aventura que introduziu a Agente 13. Mas esse lance de amar duas irmãs, realmente, ficou bem estranho. Ademais, TS 77 dava a entender que a tal moça (retratada como loira) era francesa, ao passo que esta história a coloca como americana (com cabelos pretos, grisalhos). Outro ponto é que os avanços dos anos fizeram com que fosse muito complicado que uma jovem como Sharon tivesse uma irmã que fosse jovem nos anos 1940. Ao passar das décadas, a Marvel definiu que Peggy era tia, e depois tia-avó, de Sharon e não sua irmã.
Peggy continuará a ser uma personagem coadjuvante irregular da revista ao longo dos anos 1970, porém, ela nunca chegou a ser uma personagem realmente muito importante nas HQs, ao contrário do que aconteceu nos cinemas, na qual Peggy é mais importante do que Sharon.
Por fim, a solução de roteiro de Englehart levantou de novo a questão de que as histórias dos anos 1940 traziam Betsy Ross como a namorada do Capitão nos tempos da Guerra, mas a garota continuava (e continua) a ser ignorada pela cronologia da Marvel Moderna (pós-1964). Inclusive, porque quando Ross teria se tornado a Golden Girl e efetivamente namorado o Capitão, isso aconteceu depois da Guerra, e portanto, não seria com Steve Rogers, mas com seu substituto, Jeff Mace, o ex-Patriota, e terceiro Capitão.

Claro, trazer Peggy “de volta” era uma forma de colocar tensão na relação entre Steve e Sharon, e na edição 163, o trio (mais o Falcão) vão à casa dos Carter, na Virginia, para levar Peggy de volta para casa após ela passar anos na instituição psiquiátrica na qual Faustus a encontrou. Tanto Steve quanto Sharon evitam tocar no assunto de que agora são amantes (meio estremecidos, como já vimos), e ambos se sentem mal, por enganarem Peggy. Todavia, achando que isso é necessário para aclimatá-la mais tranquilamente aos tempos modernos.
E há ação: o vilão Cobra (um tradicional oponente dos heróis da Marvel, desde que surgiu nas velhas histórias de Thor) se reúne com os novatos Viper e Eel e formam (a primeira versão do) Esquadrão Serpente para se vingar do Capitão e vão atrás dele na Virgínia.

No meio da batalha, Steve e Peggy ainda conhecem David Cox, um veterano da Guerra do Vietnã, que perdeu um braço e é contrário à violência, o que foi um canal interessante para Englehart expor sua veia pacifista e contrária à guerra na história. Na trama, David se recusa a ajudar o Capitão, por causa da violência, mas quando os vilões vão à sua casa, ele não faz nada e se dispõe a morrer como forma de ajudá-lo. Mas o herói consegue salvá-lo.
Em seguida, há um quarteto de histórias (algo bizarras) do Capitão e Falcão contra o velho vilão da Era de Ouro Garra Amarela (Yellow Claw), marcadas pelo tom de terror, com lobisomens e múmias vivas, o que só pode simbolizar a paixão do editor Roy Thomas e de Steve Englehart pela Era de Ouro. Com o passar das décadas, aquele vilão passou a ser considerado como preconceituoso por sua visão depreciativa dos orientais (como era comum nos tempos da II Guerra) e seu uso passou a ser proibido. Mas nos anos 1970 ainda foi possível e a batalha contra ele ocupou os números 164 a 167, terminando em novembro de 1973. Foi bem no início desse arco que estreou a vilã Nightshade, que reapareceria algumas vezes no futuro.

A fase de Englehart teve uma pequena pausa, um número de férias, no qual aconteceu algo importante ao futuro do personagem: em Captain America & the Falcon 168, de dezembro de 1973, Roy Thomas e Tony Isabella tomam o roteiro por um número (com arte de Sal Buscema) para apresentar Capitão América e Falcão contra um novo vilão chamado Fênix, que descobrem ser ninguém menos do que Helmut Zemo, o filho do Barão Zemo. Embora o vilão caia num tonel de Adesivo X e aparentemente morra no final dessa edição, ele retornaria uma década mais tarde.

A Saga do Império Secreto
O retorno de Englehart na edição seguinte é para dar início àquela que é a sua mais famosa história na Marvel: A Saga do Império Secreto, uma trama de conspiração na qual uma organização terrorista está infiltrada nos altos escalões do Governo e obriga o Capitão América a refletir sobre pelo o quê ele luta.
Mais jovem que seus predecessores, Englehart adicionou elementos mais realistas às histórias, intimamente relacionadas aos anos 1970, e por isso, transformou a trama do Império Secreto numa analogia do escândalo do Watergate, quando dois jornalistas descobriram que o presidente Richard Nixon e o Partido Republicano usavam o FBI e outras forças institucionais para investigar (e intimidar) adversários políticos. Esse vínculo com a realidade imediata – eram coisas que estavam acontecendo no momento em que as revistas chegavam em banca – dá à Saga do Império Secreto grande importância histórica, além de ser um dos grandes marcos cronológicos do herói.

A trama inicia em Captain America & the Falcon 169, de janeiro de 1974, ainda com arte de Sal Buscema, mas com Steve Englehart passando a dividir o roteiro com o amigo Mike Friedrich (que não tem nenhum parentesco com Gary Friedrich!). Mike Friedrich era outro dos jovens escritores da Era de Bronze (tinha 25 anos na época) e iniciou a carreira aos 19 anos na DC Comics, produzindo histórias de Batman, Espectro, The Flash, Jovens Titãs e uma temporada de dois anos na Liga da Justiça antes de se mudar para a Marvel e trabalhar longamente com o Homem de Ferro, além de Capitão Marvel e Adam Warlock (ambos em parceria com Jim Starlin), Homem-Formiga e Ka-Zar.
Na época, Englehart estava assoberbado de trabalho escrevendo uma dúzia de revistas da Marvel e ainda estava se mudando para a Califórnia, com todas aquelas dificuldades de instalação de uma nova casa, e por isso, trouxe Friedrich para desenvolver os diálogos, enquanto ele criava a trama e dava mais espaço para Buscema criar a narração em imagens. Outro que estava sobrecarregado era Buscema, desenhando Capitão, Hulk e outras revistas mensais, o que fez com que ele deixasse de fazer suas belas capas. A da edição 169 é sua despedida, com a função de capista assumida dali em diante por John Romita e Gil Kane, principalmente.
Na trama da edição 169, o Império Secreto começa a mover as peças de seu jogo escondido de modo mais agressivo através de Quentin Hardman e do Comitê para Resgatar os Princípios da América, uma organização conservadora, de linhas fascistas e de extrema direita. No original em inglês, o Commitee to Regain the America’s Principles formaria a sigla CRAP, que significa “porcaria“, “lixo”, e era uma piada em relação ao real Commitee to Re-Elect the President, que existira dois anos antes na reeleição de Nixon, cujo opositores apelidavam de CREEP (esquisito, estranho, maluco). Naquele número, a organização usa o Saltador (Tumbler, que tinha aparecido na Tales of Suspense 83) e o vilão termina morto no final. E ainda há a estreia de um novo vilão: o Rocha Lunar, que tem superforça, pode voar e disparar rajadas de energia, alimentado por uma pedra mística.

Outro ponto importante é que o Falcão começa a se mover para buscar um diferencial para si, pois com o Capitão com superforça, ele se sentia meio incapaz de ajudar. Então, ele chama o Pantera Negra para lhe ajudar. A consequência disso se dá na edição 170: T’Challa usa a tecnologia de Wakanda para desenvolver asas mecânicas (que escondem microturbinas movidas a bateria) para Sam Wilson, que passa a efetivamente a voar a partir desta edição. Com isso, temos o surgimento do Falcão como todos o conhecem nos dias de hoje, singrando os céus. As asas exigiram um pequeno redesenho do uniforme do herói e o novo design também foi criado por John Romita.

Com isso, o trio Capitão, Falcão e Pantera Negra combatem as forças do Império Secreto e o vilão Rocha Lunar na edição 171, que rendeu uma das mais belas capas de John Romita. Tanto que as imagens da gravura (e de seus personagens separadamente) passaram a ser usadas na publicidade por muitos e muitos anos.
Na edição 172, os heróis precisam enfrentar o Banshee (Sean Cassidy), um antigo coadjuvante das histórias dos X-Men, e o grupo mutante – representado aqui por Ciclope, Garota Marvel e Professor X – faz uma participação especial, descobrindo que o Império Secreto está sequestrando mutantes para “sugar” seus poderes e alimentar uma poderosa arma. Vale lembrar que na época os X-Men não tinham mais suas aventuras publicadas pela Marvel, pois sua revista fora cancelada por causa das baixas vendas quatro anos antes. É por isso que Ciclope e Jean Grey aparecem com seus uniformes antigos (estilo farda), porque essa ainda era a imagem mais conhecida da equipe na cabeça do grande público, a despeito deles terem adotado uniformes mais interessantes nos anos anteriores.
Demoraria ainda um ano para a equipe mutante retornar às bancas reformulada por Len Wein e Dave Crockum.

A ação com os mutantes prossegue à edição 173, na qual o Capitão percebe que o Império Secreto está infiltrado em escalas altas de poder, e sua ação para desmantelá-lo gera um mal entendido que o leva a enfrentar seu velho amigo Nick Fury e a SHIELD. Nesse número o roteiro passa a ser novamente apenas de Englehart. Na edição 174, Capitão, Falcão e os X-Men invadem o esconderijo do Império Secreto e conhecemos os líderes encapuzados da organização, batizados por números (Número 1, Número 9 [mais tarde revelado como um agente da SHIELD infiltrado], Número 13, Número 19 etc.) e os heróis descobrem vários mutantes cativos, tanto membros dos X-Men (Homem de Gelo, Fera, Polaris, Destrutor) quanto vilões (Mesmero, Unus, Mestre Mental), e todos se unem contra o exército terrorista.
A batalha final contra o Império Secreto se dá em Captain America & The Falcon 175, de julho de 1974, quando Capitão América e Falcão seguem os rastros do Império Secreto não somente até Washington-DC, mas à própria Casa Branca! Enquanto o Falcão consegue publicizar as ações dos terroristas, o Capitão termina perseguindo o Número 1 até o Salão Oval e o vilão encapuzado tira sua máscara para o escândalo do herói, pois isso implica que o líder da organização terrorista é não outro do que o Presidente dos EUA (ainda que a Marvel tenha optado por não mostrar o seu rosto – para evitar um escândalo e um processo judicial de Richard Nixon, claro), que termina por se suicidar na sua frente.
O vilão presidente revela antes de morrer que queria mais poder, pois sua ação era restrita pelas legalidades, e daí, tentou dar um golpe, o que ressoava com suficiente similaridade ao caso de Nixon, que no mínimo tentou se fortalecer perseguindo ilegalmente seus opositores. Uma bela parábola de Nixon e o Waltergate, que terminou com o presidente da vida real sofrendo um impeachment.

Um Capitão América triste e desiludido abandona a Casa Branca e a edição 176 demonstra que ele acha que tudo pelo o que lutou a vida toda está perdido, pois a corrupção destruiu o “sonho americano”. Por causa disso, após uma edição inteira de autorreflexão e discussões com Falcão, Sharon Carter e os Vingadores, ele toma a decisão de deixar de ser o Capitão América! Como ele podia ser um símbolo da América, se esse país agora era refletido pela ideia de corrupção, desilusão e não confiança nas instituições?
Foi uma atitude corajosa de Englehart, e para surpresa de muitos, Steve Rogers mantém sua decisão nas edições seguintes (os leitores estavam acostumados a pegadinhas quando se tratava de mudanças mais drásticas…).
O Interlúdio do Nômade

No número 177, o vilão Lúcifer (um alienígena oponente dos X-Men dos anos 1960) chega ao Harlem e domina a mente e o corpo tanto de Rafe Michel quanto de Áries (membro do Zodíaco, um grupo inimigo dos Vingadores), e ainda se compromete com o chefão Morgan de matar o Falcão, o que coloca Sam Wilson em maus lençóis sem a ajuda de seu parceiro, que inicialmente permanece recluso, mas por fim, na edição 178, usa uma máscara de esqui para ajudar o Falcão a derrotar Lúcifer, ainda que a batalha resulte nas mortes tanto de Áries quanto Rafe Michel, que tinha sido um importante coadjuvante do cenário do Harlem desde o número 143!
No fim, talvez abalado pelas mortes e zangado por ter sido deixado na mão (por um tempo), Sam pede que Steve saia do caminho dele e deixe o Harlem.
Outro ponto do número 178 é que a ausência do Capitão América é sentida por todos, então, um jogador de baseball chamado Bob Russo consegue uma roupa imitando a do herói e uma réplica do escudo e tenta agir como o Capitão, enfrentando bandidos que machucam seu braço e o levam a desistir.
Na edição 179, Clint Barton, o Gavião Arqueiro, decide fazer um truque para convencer o amigo Steve Rogers a voltar a ser o Capitão América: Barton se fantasia e se faz passar pelo Arqueiro Dourado (o vilão parte do Esquadrão Supremo, que combatia os Vingadores), e o logro é parcialmente bem sucedido: Rogers decide voltar a combater o crime. Mas não como Capitão América!

E outro imitador tenta ocupar o lugar do Capitão América: o motoqueiro Sear Turin também usa réplicas do uniforme e do escudo e leva uma surra de uma gangue, também desistindo.
E ele não é o único: um jovem chamado Roscoe Simons comunica ao Falcão de que ele quer ser o novo Capitão América.

Quando chegamos à Captain America & the Falcon 180, de dezembro de 1974, já estamos a nada menos do que quatro números seguidos sem o Capitão América propriamente dito (!), e essas edições intervalares demonstraram que, como desdobramento principal da Saga do Império Secreto, Steve Rogers ficou mais cínico em relação ao seu próprio patriotismo, ressaltando a luta por um ideal e não por um governo, adotando uma postura mais crítica do próprio país e do sistema em si.

Decidido a criar uma nova identidade heroica, Steve percebe que não se desligou oficialmente da polícia e telefona ao Comissário Nathan Martin para se desculpar, mas o velho policial, apenas lhe agradece, dizendo que jamais esperou que a contribuição de Steve fosse se prolongar no tempo e que ele fez muito mais do que o esperado, agindo na força por vários meses. Livre desse peso, Rogers vai até a Virgínia, à casa dos Carters, e lá cria a sua nova identidade secreta: o Nômade!

A ideia de Steve é viajar pelo país e ir aonde for preciso, e na sua primeira parada, em Washington-DC, presencia o retorno da Madame Hidra, que mata o Viper e rouba seu uniforme e seu nome – ela passa a ser conhecida como Víbora a partir dali – e destitui o Cobra como líder do Esquadrão Serpente reunindo um “novo” grupo com ele, Eel, Krang e Princesa Píton. Eles sequestram o líder da corrupta empresa Roxxon Oil (empresa vilã em várias histórias da Marvel), Hugh Jones, o que é o início da Saga da Coroa da Serpente (um artefato místico muito antigo e poderoso) que Englehart desenvolverá na revista dos Vingadores.

A estreia do Nômade, contudo, não é bem sucedida: não acostumado a usar capa, Steve tropeça no artefato e o Esquadrão Serpente consegue escapar. Por isso, o Nômade aparece sem capa na edição 181, quando sua perseguição ao grupo de vilões leva à união dos caminhos do Falcão e Roscoe Simons, que se tornou o novo Capitão América. Isso é interessante porque, embora Steve Rogers tenha continuado a protagonizar a revista no intervalo, essa é a primeira vez que o Capitão América propriamente dito aparece na revista depois de cinco edições!
O jovem Roscoe tenta se provar como digno do papel e, embora seja até habilidoso, está muito longe da perfeição física de seu ídolo. Sam tenta dissuadi-lo de usar o uniforme, mas o jovem está determinado. E ele também vê Gabe Jones (ex-membro do Comando Selvagem e alto graduado agente da SHIELD) auxiliando Peggy Carter a se reintegrar ao mundo moderno e fica meio desconfiado.

No campo editorial, Captain America & the Falcon 181, de janeiro de 1975, também é importante porque é a última edição de Sal Buscema como desenhista regular da revista nessa fase, após sua longa temporada de quase 40 números consecutivos! Todavia, o artista ainda voltaria num par de números do futuro próximo e regressaria ao título como artista fixo no fim da década, como veremos mais tarde.
Seu substituto na arte foi Frank Robbins, um veterano artista que tinha 58 anos de idade e ficou famoso por ter criado a tira de quadrinhos nos jornais, Johnny Harzard, em 1944 (que foi publicada até 1977!), e a partir de 1968 se tornou um dos principais roteiristas do Batman na DC Comics. De mudança para Marvel, ele se dedicou apenas à arte e após algumas histórias de terror, seu primeiro grande trabalho foi no Capitão América. Robbins tinha bastante experiência, mas sua arte ainda trazia muitas reminiscências estéticas da Era de Ouro, o que lhes davam um ar de “velha”. Depois da força da arte de Buscema por tanto tempo, parecia um retrocesso.
Coincidência ou não, a saída de Sal Buscema coincide com o fim da gestão de Roy Thomas como editor-chefe da Marvel. Cansado da politicagem que o cargo exigia e querendo se dedicar de novo apenas à escrita, Thomas abdicou da função, mas terminou continuando com o cargo de editor assistente e responsável pelas revistas as quais estivesse diretamente envolvido. O cargo de editor-chefe passou a ser ocupado por Len Wein e ele é quem ficou responsável por supervisionar as aventuras do sentinela da liberdade, também.

A edição 182, com a estreia de Wein como editor e Robbins na arte, trouxe o Nômade seguindo Víbora e Cobra – que estão de posse da Coroa da Serpente – até Seattle, no estado de Washington, e uma acirrada batalha, na qual o esconderijo deles pega fogo, Víbora está disposta a morrer, o Cobra tenta fugir e é baleado por ela nas costas e a construção desaba pelo incêndio com a vilã dentro, a Coroa da Serpente caindo no esgoto (sua busca prosseguirá na revista dos Vingadores, também escrita por Englehart, a partir de Avengers 141) e o herói entregando o Cobra à polícia.

Vemos Sharon Carter triste porque Steve não deixou a carreira de combatente ao crime e Gabe Jones, da SHIELD, continuando sua ajuda a Peggy Carter. E por fim, o Falcão encontrando de novo o Capitão América/Roscoe e tentando assustá-lo para que desista de usar o uniforme, mas terminando por enfrentar assaltantes de um banco melhor equipados do que a média, cujo o líder se revela ser ninguém menos do que o Caveira Vermelha (a primeira vez que o vilão aparecia em quatro anos!).
Na edição 183, o Nômade volta à Nova York e vai ao Harlem em busca do Falcão, falando com Leila Taylor, indo atrás de Luke Cage (que não está) e até ligando para a Escola para Jovens Superdotados do Professor Charles Xavier, na qual o Fera atende ao telefone, mas ninguém sabe onde o herói alado está. Então, no fim da história, Asa Vermelha (Redwing), o falcão de estimação de Sam, faz o Nômade encontrar o Falcão bastante ferido em cima de um prédio e Roscoe Simons vestido como Capitão América, morto e pendurado em corda. Quando Sam acorda lhe conta: ele foi morto pelo Caveira Vermelha.

Steve Rogers fica chocado pela cena e sente que falhou em sua função, ainda mais porque o “desaparecimento” do Capitão América legou o surgimento dessa série de imitadores, que agora, terminava de modo trágico. Então, na última página da história, ele decide voltar a ser o Capitão América, fazendo sua reestreia no papel em Captain America & the Falcon 184, de abril de 1975, depois de oito números distante dessa identidade!
O Passado do Falcão
A edição 184 dá início à batalha contra o Caveira Vermelha, que decidiu mudar sua abordagem e implementar o terror no mundo com a volta do Reich. O roteiro de Englehart traz várias referências à primeira história do vilão lá atrás, em Captain America Comics 01, de 1941, com o vilão tendo uma lista de vítimas importantes a matar, há o toque da Marcha Fúnebre de Chopin que o vilão tocava em uma flauta em uma de suas velhas aventuras e o retorno da Poeira da Morte, um tipo de pó vermelho geralmente soprado ou inalado como fumaça que mumifica o rosto das vítimas, deixando-os com uma caveira vermelha similar à do vilão.

Também é importante mencionar que Englehart provavelmente buscou inspiração na primeira aparição do Coringa (em 1940) para essa aventura, pois tal qual o vilão do Batman, o Caveira marca a data dos assassinatos de suas vítimas como forma de provocar as autoridades e o herói.
Além disso, ao longo da edição 184 e 185, enquanto vai colecionando vitórias, o vilão domina a mente do Falcão, que passa a ser seu “ajudante” (!) e sequestra e tortura barbaramente Peggy Carter e Gabe Jones, ocasião em que descobrimos que eles estão namorando.
A trama se encerra na edição 186, de junho de 1975, com Englehart dividindo o roteiro com John Warner, enquanto Frank Robbins continua na arte, e o Caveira Vermelha faz uma grande revelação: o Falcão é sua criação! O vilão diz que antes do Capitão conhecê-lo, Sam Wilson era um bandidinho de rua conhecido como Snap Wilson, e que foi o Caveira, usando o Cubo Cósmico, quem alterou a personalidade dele para torná-lo um homem nobre e heroico como o vimos lá atrás no número 117.

Os dois (ex?) amigos lutam e o Falcão termina em um estado de coma, enquanto Peggy e Gabe conseguem fugir e chamar ajuda da SHIELD, o que leva o Caveira a fugir.
É o fim da temporada de Steve Englehart no título, que terminou aclamada como uma das melhores do personagem em toda a sua história.
Infelizmente, Englehart abandonou sua última história pelo meio. O escritor estava com estafa e decidido a largar o trabalho com os quadrinhos, o que o levou a pedir demissão da Marvel e deixar não somente o Capitão, mas também os Vingadores e outras revistas que escrevia. Na verdade, ele não ficaria longe das HQs por muito tempo: a DC Comics lhe fez uma oferta altíssima para escrever para eles, e Englehart produziu um ano de histórias do Batman e da Liga da Justiça para a Distinta Concorrente antes de realmente abandonar a indústria de quadrinhos e só retornar uma década depois.
Talvez, Englehart tivesse algum plano de médio prazo para o segredo do passado do Falcão, mas solto em sua última história (incompleta) a trama só causou controvérsia à origem do herói que era tão querido dos leitores e mais ainda do público afrodescendente. Ficou um gosto amargo na boca e o novo escritor John Warner preferiu não botar a mão no vespeiro, trazendo duas edições com a recuperação do herói, a última, o número 189, com o Falcão se livrando da influência do Caveira e voltando ao normal.
Nas edições 190 e 191, os roteiros já passam para Tony Isabella, com Capitão e Falcão reunidos para enfrentarem a Nightshade, vilã que aparecera no número 164, e que agora tenta seduzir o Capitão e levá-lo à cama, algo que ele recusa. Mas na batalha, o Falcão percebe que ele é duas pessoas: Snap e Sam Wilson! Mas Isabella não teve tempo de desenvolver nada, pois foi removido do título pelo novo editor-chefe da Marvel, Marv Wolfman.

Mas como ainda havia a lacuna de uma edição antes que o novo roteirista chegasse à revista, o próprio Wolfman escreveu a edição 192, na qual temos o retorno do Doutor Faustus, combatendo o Capitão à bordo de um avião e terminando – tal qual o vilão Goldfinger no filme 007 Contra Goldfinger – sendo sugado pela janela quebrada do avião em voo no final. (Mas claro que Faustus iria voltar no futuro…). Um detalhe importante é que nessa aventura, o vilão tem uma assistente, a também psiquiatra Dra. Karla Sofen, que se transformará (nas aventuras do Hulk) em uma das mais importantes vilãs da Marvel, a Rocha Lunar, ocupando o lugar do personagem de mesmo nome que surgira na Saga do Império Secreto.
Esse também foi o número de despedida de Frank Robbins da revista, mas o artista continuaria ligado ao Capitão América em outro projeto sobre o qual iremos falar adiante.
Ninguém estava esperando a grande virada que a revista ia ganhar em seguida…
Jack Kirby de Volta
Em 1975, após cinco anos na DC Comics, Jack Kirby voltou à Marvel causando grande estardalhaço. E como não podia deixar de ser, “O Rei” dos quadrinhos terminou por assumir a revista de sua maior criação: o Capitão América. Além disso, em um acordo totalmente fora dos padrões da época, Kirby não somente veio desenhar o título, mas também, escrevê-lo e editá-lo, tudo sozinho! Ele fez vários outros trabalhos, inclusive, uma sequência de um ano inteiro de capas para a revista Avengers (os Vingadores), na qual o Capitão América também aparecia e cuidou da revista solo do Pantera Negra, criou Os Eternos e mais alguns outros trabalhos durante pouco mais de dois anos intensos, criando com total liberdade criativa e supervisionado à distância pelo editor Archie Goodwyn, que em pouco tempo se tornaria o novo editor-chefe da Marvel.

Kirby ficaria dois anos à frente de Captain America, entre as edições 193 e 214 desenvolvendo sua mais querida criação pela primeira vez sozinho. E ainda que fosse um artista da “velha guarda” (ele tinha 58 anos na época!) e não guardasse o frescor juvenil de um Englehart, é preciso dizer que Kirby se saiu muito bem em sua tarefa: as tramas são boas, os diálogos são interessantes e ele mantém um ritmo frenético de ação e desenvolvimento conectado com os temas políticos de seu tempo, ainda que sua visão seja um pouco mais ingênua e menos radical do que de Englehart, por exemplo.

A temporada de Kirby foi marcada por muitas tensões sociais, capitaneadas pelo personagem Falcão e o Harlem. Seu arco mais famoso é Madbomb, justamente o primeiro, iniciando em Captain America 193, de janeiro de 1976, e encerrando na edição 200.
A trama é simplória: uma bomba que causa a loucura nas pessoas, mas vale cada centavo pela explosiva arte de Kirby, a raiva que pulula das páginas e aquela sensação de “o Harlem está pegando fogo!” que permeia a história. Além disso, o artista desenvolve bem seu texto, colocando dilemas éticos para Steve Rogers e aprofundando seu caráter, do mesmo modo com Sam Wilson. Outro aspecto interessante é que Kirby criou uma história utilizando praticamente apenas personagens novos, utilizando dos antigos somente Capitão, Falcão e suas namoradas (Sharon Carter e Leila Taylor). No mais, uma série de personagens foram introduzidos e conduziam a história ao lado do quarteto protagonista.

E se na revista do Pantera Negra Kirby testou a estranheza dos leitores com uma série de elementos bizarros, isso não se deu no Capitão América, onde desenvolveu uma ambientação mais tradicional e fez uma boa fase do personagem. Na trama, Capitão América e Falcão são contatados pelo Secretário de Defesa dos EUA (desenhado como o lendário Henry Kissinger) para enfrentar a misteriosa Conspiração, uma organização terrorista liderada por um grupo que se autointitula Elite para destituir a democracia e restituir os “valores antigos”, de monarquia e trabalho servil, criando um contraste violento com os ares de retomada democrática após os anos da Era Nixon e as esperanças impulsionadas pela celebração do 200º aniversário da Independência dos EUA que se aproximava. A Elite quer desestabilizar o país e trazer de volta os valores monárquicos, e usa como arma a Bomba Enlouquecedora, que transforma as pessoas em seres violentos e irracionais.
Num frenesi de ação, a dupla Capitão e Falcão se infiltra na base secreta da organização, enfrenta seus principais operativos, participa de uma corrida mortal (em skates!) e precisa impedir o ataque final em Washington coincidindo com o bicentenário da Independência. E dá tempo até para um interlúdio romântico entre Steve Rogers e Carol Harding, filha do cientista Mason Harding, o criador da bomba, mas uma mulher inocente e sofrendo de uma doença letal. Seu pai, o Dr. Harding, era um bom homem e foi pelo desespero que terminou se deixando empregar pela Elite.
Ademais, repare que Kirby se aproveitou do fato das histórias anteriores terem afastado Sharon Carter para não colocá-la na trama nesse primeiro momento, preferindo trazer interesses românticos pontuais para movimentar um pouco a vida sexual de nosso herói.

É interessante que Kirby desenvolve bem os personagens, dando espaço para os coadjuvantes e as mulheres (heroínas e vilãs) e dá um ótimo espaço ao Falcão, que não é um adereço em nenhum momento, mas um verdadeiro coprotagonista, mesmo sendo um personagem que Kirby nunca trabalhara antes, pois fora criado depois de sua saída do título em 1969.
Outro aspecto feliz é que, coincidentemente, Madbomb se encerrou na edição 200, cuja data de capa é outubro de 1976, mas que estava nas bancas no mês de julho, casando exatamente com a comemoração dos 200 anos da Independência dos EUA, o que se tornou tema da história e criou alguma comoção na imprensa e no público. Foi uma boa sacada. Na trama, o Dr. Harding ajuda o Capitão e o Falcão na derrota da Elite, mas ainda assim vai preso por seus crimes. Carol é enviada para uma clínica avançada para tratar de sua doença.
Mas o bicentenário foi um marco tão importante que a Marvel encomendou a Kirby uma edição especial do Capitão América – como um anual (que já não eram publicados há um tempo) – com mais páginas para comemorar a data. Daí saiu As Batalhas do Bicentenário, lançada em julho de 1976, numa história “papo-cabeça” em que o herói viaja no tempo e participa de vários momentos cruciais das história do país. A aventura também estabelece que um antepassado do herói, também chamado Steven Rogers, foi um herói da Guerra de Independência usando um uniforme colorido e o nome Capitão América.
Na revista mensal, Kirby continuou a criar pares românticos pontuais, e na edição 206, dá início a uma trama na qual um ditador de uma república sulamericana chamado Hector Santiago contrata bandidos para sequestrarem um opositor que se refugiou nos EUA, e os criminosos se enganam e terminam levando o Capitão América! Steve Rogers fica aturdido com a situação de miséria em que vive o povo de Rio de la Muerte e se junta ao esforço de oposição ao ditador, terminando por derrubá-lo no número 208.
No meio disso, o Capitão conhece Donna Maria, uma prima de Santiago, que é sua opositora e era feita refém em seu palácio, ocorrendo outro intercurso sexual do herói.
Além disso, era uma maneira de Kirby fazer uma analogia às Ditaduras Militares que assolavam os países da América Latina na época, como Brasil, Argentina e Chile.

E foi no meio dessa trama em que surgiu um vilão que permaneceria como um dos mais icônicos da revista: o Dr. Armin Zola em Captain America & the Falcon 208, de abril de 1977. Na trama, enquanto Capitão está em sua aventura na América do Sul, Sharon Carter (que faz seu retorno após muitas edições e, pela primeira vez, nesta fase de Kirby) é convocada pela SHIELD para auxiliar na investigação do Arquivo 116, que busca entender o surgimento repentino de vários monstros. É retorno da Agente 13 à agência após 55 edições!
Um desses monstros é o Fish-Man que persegue o Capitão América lá em Rio de la Muerte e termina por matar o ditador Hector Santiago.

Tendo Donna Maria ao seu lado, o Capitão termina descobrindo que Zola é um grande cientista nazista dos tempos da II Guerra Mundial, e criou uma tecnologia de transferência da mente para novos corpos, em especial, clones. Ele criou um clone se si mesmo para prolongar sua vida, mas o adaptou ao que considerou melhorias, com implantes cibernéticos, colocando seu rosto no tronco do corpo e a cabeça substituída por um tipo de câmera. Embora a cabeça grande emoldurada pelo corpo remeta ao visual de MODOK, que o próprio Kirby criara, Zola tinha uma personalidade mais estável e planos de longo alcance, o que o tornou um vilão secundário bastante recorrente naquela década e na seguinte.
E Zola tem um braço direito: o monstruoso Doughboy, uma criatura disforme e amarela que é transmorfa e pode assumir a aparência até de objetos e veículos.
Além disso, Zola produz uma série de monstros que dão bastante trabalho ao herói. Um ex-nazista vivendo na América do Sul era outro aceno de Kirby à realidade, pois de fato, muitos criminosos de guerra se esconderam em países como Argentina e Chile. Alguns como Adolf Eichmann (que estava escondido na Argentina) foram presos, julgados e condenados à morte, enquanto outros, como Josef Mengele viveram escondidos até a morte (neste caso, no Brasil).

Em seguida, Kirby desenvolveu uma trama com mais um bombástico combate do herói com o Caveira Vermelha, que se encerra em Captain America & the Falcon 212, de agosto de 1977, cuja consequência é que o Capitão termina temporariamente cego. Kirby ainda iniciou um novo arco contra o Night Flyer, com o herói ainda cego auxiliado por Falcão e Sharon Carter, mas as vendas da revista não iam bem e o corpo editorial da Marvel estava insatisfeito com o resultado da obra recente de Kirby – não somente no Capitão, mas também nas revistas do Pantera Negra e dos Eternos.
Olhando em retrospecto, a temporada de Kirby não é ruim, ao contrário, mas de fato, é um estilo de narrativa que não agrada a todos, além de ser realizada por um artista já ligeiramente desconectado com o contexto da época e o público mais jovem, que àquela altura era influenciado por novos comportamentos, como o Movimento Punk e o da Discoteca, por exemplo. Em vista dos atritos, Kirby se demitiu abruptamente da editora e foi trabalhar com animação pelo restante de sua carreira.

Kirby continuou a colher os frutos de sua fama como criador visual do Universo Marvel, mas exceto por trabalhos pontuais na DC Comics, ele se manteve afastado dos quadrinhos mainstream, passando a produzir um novo material autoral para editoras pequenas, enquanto mantinha sua saúde financeira como consultor criativo para desenhos animados da Hanna & Barbera. Ele faleceria em 06 de fevereiro de 1994, aos 77 anos, vítima de uma parada cardíaca. Em anos recentes, seu papel como narrador (roteirista) e não somente como desenhista vem crescendo entre o público e a crítica, percebendo que o Método Marvel fez com que a maior parte da criação do universo clássico do Capitão América (e da Marvel em geral) foi dele e não de Stan Lee, que é quem recebe o maior crédito.

Mas de volta à revista Captain America & the Falcon, talvez por ser um artista rápido, ao contrário do que ocorreu na revista do Pantera Negra, por exemplo, Kirby ainda conseguiu dar um fechamento à sua história, que não ficou inacabada, pelo menos. Sua última edição com o seu personagem favorito foi o número 214, de outubro de 1977.
Os Invasores
Paralelamente à temporada de Jack Kirby à frente da revista do herói, o Capitão América passou a participar de um terceiro título mensal (além dos Vingadores): Os Invasores ganharam uma revista própria em 1975!

O escritor e ex-editor-chefe Roy Thomas havia criado os Invasores nas aventuras dos Vingadores em 1969 (baseado por sua vez, no Esquadrão Vitorioso criado por Bill Finger em 1946). Desde então, os Invasores (a união do Capitão América com Namor, o príncipe submarino, e o Tocha Humana original nos tempos da II Guerra Mundial) eram parte oficial da cronologia do personagem, embora não tivessem sido explorados em detalhes.
Contudo, Roy Thomas era apaixonado pela Era de Ouro e decidiu contar essas histórias, aproveitando que ainda era um dos Editores Assistentes da Marvel. Assim, Thomas editou e escreveu o projeto para uma revista própria dos Invasores. A equipe estreou em um título de teste: Giant-Size The Invaders Special 01, no verão de 1975, com roteiros de Thomas e desenhos de Frank Robbins, que naquele momento também desenhava a mensal Captain America & the Falcon. O modelo Giant-Size era um substituto às velhas edições anuais da Marvel e traziam revistas com um formato maior (chamado magazine) e mais páginas.
Personagens mais famosos ganharam suas edições Giant-Size (a dos Vingadores era um título trimestral) enquanto novas iniciativas ganharam edições-teste (os X-Men voltaram a ser publicados nessa mesma iniciativa).

A história de Thomas e Robbins mostrava Capitão América, Namor, Tocha Humana e os parceiros mirins Bucky e Toro (Centelha no Brasil) salvando a vida do Primeiro Ministro da Inglaterra, Winston Churchill de um ataque dos Nazistas, e este sugerindo que todos agissem juntos em um grupo chamado de Invasores. Os heróis topam a iniciativa e passam a combater as forças do Eixo unidos, com uma base fixa na Grã-Bretanha, em Londres. Estudioso de História, Thomas inseriu uma série de elementos da vida real na trama, os misturando com acontecimentos que aconteceram de verdade em 1941.
Além da reunião do grupo, o Capitão América ganha mais uma recontagem de sua origem, com Thomas inserindo mais alguns detalhes, especialmente no nome dos personagens: o cientista reganha oficialmente o nome de Erskine, mas agora, sendo revelado seu primeiro nome: Abraham, e que Reinstein era um codinome para proteger sua identidade! O cientista americano que lhe ajuda (mostrado na Tales of Suspense 65) é chamado de Dr. Anderson e o auxiliar do general Phillips se chamará subsecretário Homer Simms. E o espião assassino de Erskine é batizado de Heinz Kruger. Todas essas adesões se tornaram canônicas dali em diante.

Na trama de Thomas, fica estabelecido que Steve Rogers se tornou o Capitão América em dezembro de 1940, entrando finalmente em ação no início do ano seguinte (mantendo uma sincronicidade com a revista original do herói que chegou às bancas em dezembro de 1940 com data de capa de março de 1941, de modo que teria sido por volta desta última data que o sentinela da liberdade estreou no combate aos nazistas), combatendo inicialmente espiões nazistas infiltrados nos EUA, após alguns meses de ação ganhou Bucky Barnes como parceiro e ingressou na Guerra após o Ataque de Pearl Harbor pelos japoneses depois de 07 de dezembro de 1941. Foi na segunda quinzena de dezembro (mais precisamente no dia 22!) que ocorreu o ataque a Churchill e a formação dos Invasores e o Capitão se mudou para Londres na véspera de Natal daquele ano. A segunda aventura dos Invasores ainda seria datada do fim de dezembro mas, depois, toda a longa temporada de Thomas com o grupo se manterá restrita ao ano de 1942.
Mas já se sabia que o Capitão agirá com a equipe somente até abril de 1945, quando sofrerá o acidente que matará Bucky e o deixará congelado em animação suspensa até o presente, quando será encontrado pelos Vingadores, conforme visto em Avengers 04.

A edição especial dos Invasores foi bem sucedida entre o público e abriu caminho para sua própria revista: The Invaders 01, de agosto de 1975, com a mesma equipe criativa de Thomas e Robbins, e inicialmente como um título bimestral, pois era uma experimentação, embora o sucesso da publicação garantiria que ela se tornasse mensal depois do oitavo número. Curiosamente, embora tenha desenhado consecutivamente a revista mensal do Capitão e os Invasores por alguns meses, Robbins deu uma abordagem ligeiramente diferente à sua arte nas histórias da equipe, adotando um estilo menos caricatural e com certa influência do estilo de Sal Buscema. É bem provável que a arte a lápis de Robbins tenha sofrido retoques de John Romita, especialmente, no rosto dos personagens. Não à toa, a bela capa da primeira edição é justamente de Romita.
O primeiro arco é O Anel das Nebulosas e, após mostrar uma explosiva cena dos Invasores em meio a uma batalha aérea sobre o Canal da Mancha, Thomas aproveita a ambiência europeia para explorar a mitologia germânica e o ataque de um vilão ciborgue chamado Dreno Mental, enquanto as edições 03 e 04 ganham capas de Jack Kirby (que por estar desenhando a revista principal do herói também fazia as capas de várias revistas da editora) e uma trama submarina calcada no vilão Netuno e na ambientação típica de Namor, inclusive, com a aparição de Betty Dean (coadjuvante dos anos 1940) e uma batalha naval e aérea no Triângulo das Bermudas, no Caribe.

Na edição 05, excepcionalmente ilustrada por Rick Buckler, os Invasores precisam lidar com o ataque do Caveira Vermelha, mas somos apresentados a alguns outros heróis que também existiram nos tempos da Timely, como Patriota, Whizzer e Miss América, o que faz o Capitão pensar que eles podiam se unir para continuar a combater espiões e sabotadores nas terras americanas, já que os Invasores estão rodando o mundo em meio à guerra. E isso de fato acontece na revista Marvel Premier 29, de abril de 1976, por Thomas e arte de Don Heck, que traz a estreia da Legião da Liberdade (Liberty Legion), reunindo Patriota, Corvo Vermelho (Red Raven), Ciclone (Whizzer), Miss América, Homem-Plano, Diamante Azul e Jack Frost. Curiosamente, todos esses heróis eram personagens obscuros, já esquecidos pelo grande público (lembre: não se republicavam as histórias antigas naqueles tempos, como se faz hoje em dia), mas Thomas era um grande colecionador e conhecia esses personagens, se apropriando deles.

Já conhecemos Miss América e Ciclone, que fizeram parte do Esquadrão Vitorioso de 1946, e os demais foram personagens de vida curta na aurora da Marvel… Corvo Vermelho tinha sido publicado em uma única revista homônima que nunca chegou a ter uma segunda edição (Red Raven 01, de 1940) e era um humano criado por uma raça de homens-pássaro que vivia em uma ilha flutuante sobre o Oceano Atlântico e um personagem que Thomas já usara numa história dos X-Men de 1969; o Homem-Plano foi o primeiro dos super-heróis capazes de esticar o corpo (categoria que geraria Homem-Borracha, Rapaz-Elástico e o Senhor Fantástico) e surgiu em Mystic Comics 04, de 1940; o Diamante Azul tinha a pele dura feito o material que lhe dava nome, podendo desviar balas e atravessar paredes e aparecera na Daring Mystery Comics 07, de 1941; enquanto Jack Frost era basicamente uma primeira versão do Homem de Gelo dos X-Men, capaz de se recobrir de gelo e usá-lo como arma da mesma forma, surgindo em USA Comics 01, de 1941.
De todos esses velhos personagens que foram trazidos de volta, nos interessa mais o Patriota: criado por Ray Gill e Sid Greene, estreou em The Human Torch 04, de março de 1941, ou seja, exatamente na mesma época em que o Capitão América estreou em sua revista. (Pelo visto, Martin Goodman encomendou um herói patriótico a mais artistas do que Joe Simon e Jack Kirby). Nunca muito popular, mas com um bom visual, o Patriota continuou sendo publicado pela Timely nos anos seguintes, tanto naquela revista quanto em Marvel Mystery Comics até o número 74 desta, em julho de 1946. Nas tramas, ele é Jeffrey “Jeff” Mace, um jornalista que sem ter superpoderes combate espiões e nazistas.
A trama de Marvel Premier com Bucky reunindo esses outros heróis na Legião da Liberdade se conectou de volta com Invaders 06, na qual os Invasores estão sob custódia do Caveira Vermelha e a Legião da Liberdade, liderada por Bucky, vai ao seu resgate, concluindo na Marvel Premier 30. Colocar um novo grupo de heróis dos tempos da II Guerra na revista da Marvel dedicada à estreia de novos personagens ou aventuras talvez fosse a tentativa de Thomas de emplacar outra série, ou pelo menos, personagens recorrentes que pudessem aparecer em outras revistas, mas o fato é que não houve mais histórias da Legião da Liberdade naquele contexto.
As aventuras dos Invasores de Thomas e Robbins eram bastante divertidas e fizeram algum sucesso. Vale ressaltar a beleza das capas das revistas, que quase nunca foram assinadas por Robbins, mas por grandes nomes da Marvel, como Jack Kirby, John Romita e Gil Kane.

Na revista, Thomas não apenas brincou com toda a vasta gama de personagens da Marvel na época da Timely nos anos 1940, mas também introduziu uma tonelada de novos personagens. O primeiro grande destaque veio em Invaders 07, de julho de 1976, que dá início a um arco de histórias que introduzem o Lorde Montgomery Falsworth e sua filha Jacquelline. Na trama, descobrimos que o primeiro – já em idade ligeiramente avançada – foi um herói uniformizado na I Guerra Mundial, chamado Union Jack, que lutou ao lado de um grupo de super-heróis, o Quinteto Liberdade (Freedom Five) – além dele, Phantom Eagle, Crimson Cavalier, Sir Steel e Silver Squire (outro conjunto de personagens criados por Thomas e que não receberam nenhum tipo de desenvolvimento na época) – enfrentando os horrores da guerra, inclusive, seu pior inimigo: o vampiro Barão Sangue.


O vilão, claro, ainda está vivo e o grupo se une para detê-lo, buscando-o por Londres, ao passo que o vampiro ataca Jacqueline. Mesmo com a idade avançada, Falsworth volta a ser o Union Jack e é aceito pelos Invasores como membro quando se mostra crucial na primeira batalha contra o vilão, na edição 08, seguindo um revide na Mansão Falsworth que termina com o herói tendo as pernas esmagadas por um soterramento de pedras e Jacqueline à beira da morte, na edição 09, quando o Barão Sangue é derrotado ao ser empalado no peito por uma estaca de pedra.

Pai e filha são levados ao hospital e Lorde Falsworth recebe a notícia que nunca mais irá andar e viverá em uma cadeira de rodas, o que aceita com resiliência, mas Jacqueline está em uma situação tão precária que o Tocha Humana se vê obrigado a fazer uma transfusão de sangue de emergência para ela, na edição 10, lembrando que o herói flamejante é um ser artificial (basicamente, um androide). Quando os heróis são atacados pelo vilão Bala Azul, Jacqueline Falsworth demonstra poderes de supervelocidade, então, na edição 12, de janeiro de 1977, ela ingressa oficialmente as fileiras dos Invasores como a heroína Spitfire, a primeira adesão feminina da equipe.
Membro da Câmera dos Lordes, Falsworth se tornará, a partir dali, em grande medida, o patrono dos Invasores, e sua mansão, no norte de Londres, serve como QG principal do grupo.

E a série de criações de Thomas e Robbins não parou por aí. Logo em seguida, Invanders 14, de março de 1977, introduz outro super-grupo de heróis: os Cruzados (The Crusaders), que consistem de Independente (Spirt of ’76), Captain Wings (outro herói alado), Tommy Lightining, Ghost Girl, Thunderfist e Dinamite (Dyna-Mite, um herói com apenas 30 cm de altura e força ampliada). Na trama, após serem atacados pelos Cruzados, os Invasores vão a uma reunião com o Rei George VI da Inglaterra no Palácio de Buckingham para se tornarem a Guarda de Honra do Rei, porém, no caminho até lá, há uma explosão e vão investigar, de modo que os Cruzados salvam o rei de um ataque e são eles próprios instituídos como a Guarda de Honra, mas os Invasores ficam desconfiados de uma armação e conseguem provar, na edição 15, que o grupo age sob as ordens de Alfie, que na verdade, é um espião nazista infiltrado com um plano de desacreditar os Invasores e matar o rei.
Contudo, a história revela que, apesar de cinco membros dos Cruzados serem britânicos que ganharam (sem saber) os poderes nas mãos de cientistas nazistas, um deles, o líder Independente é obviamente americano (Spirit of ’76, literalmente, “o espírito de ’76” é uma referência a 1776, o ano da Independência dos EUA, sendo uma referência ao movimento libertador) e estava alheio a todo o plano. Todos foram enganados no fim das contas e isso representa o fim dos Cruzados. Mas Lorde Falsworth parece conhecer o Dinamite…

Após combaterem o Grande Mestre (edição 16) e o surgimento da Mulher-Guerreira (edição 17), se inicia outro importante arco para os Invasores, quando encontram outro herói criado na aurora da Marvel: o Destruidor (The Destroyer), criado por Stan Lee e Jack Binder em Mystic Comics 06, de 1941. Em Invaders 18, ainda em batalha contra a Mulher-Guerreira na Alemanha, o Capitão América é auxiliado pelo Destruidor, da qual ele havia ouvido falar apenas por rumores, como um vigilante que combatia os nazistas atrás das linhas inimigas. O herói revela sua identidade para o Capitão, o que o surpreende, mas o leitor não vê quem ele é… E a dupla precisa ir a Berlim, onde os demais Invasores irão sofrer uma execução pública, ao mesmo tempo em que Lorde Falsworth, Spitfire e o Dinamite também ingressam na Alemanha em busca de recuperar as memórias do diminuto herói, perdidas no processo que o transformou em um superser. Quando em perigo, Falsworth chama o Dinamite de “Roger”…
A explosiva edição 19 mostra Capitão e Destruidor tentando salvar os Invasores em Berlim, mas o sentinela da liberdade é também capturado e seu misterioso amigo aparentemente é morto por uma granada, enquanto Falsworth, Spitfire e Dinamite presenciam isso e vão tentar salvar os heróis cativos no Centro de Ciências Nazistas, onde terminam descobrindo a verdade sobre o diminuto herói: ele era Roger Aubrey, o melhor amigo de Brian Falsworth, o filho mais velho de Montgomery, e irmão de Jacqueline. Quando os britânicos lançaram uma campanha de apoio ao Regime Nazista, em 1938 (sim, isso aconteceu mesmo na vida real…) os dois amigos foram para a Alemanha como parte da comitiva britânica (na vida real, a comitiva envolvia o pai do príncipe Phillip, futuro consorte da Rainha Elizabeth II, pai do Rei Charles III), mas quando a guerra começou, os dois “mudaram de ideia” e foram feitos prisioneiros pelos nazistas. (É bom adiantar que histórias futuras retroativas adicionaram que a ida dos dois à Alemanha era parte de uma missão secreta de ambos como espiões para investigar o regime de Hitler, algo criado para dar uma base mais heroica a ambos).
Presos no mesmo Centro de Ciências Nazistas, tanto Roger quanto Brian foram feitos cobaias em experimentos científicos: Aubrey foi inserido no Projeto Cruzados, sofreu lavagem cerebral e participou de um experimento que lhe diminuiu de tamanho e aumentou sua força e o transformou no Dinamite; enquanto Falsworth teve uma sorte um pouco melhor… compartilhou a cela com o Dr. Erik Schmitt, que havia trabalhado com o Dr. Abraham Erskine, e fora capaz de sintetizar uma versão incompleta do Soro do Supersoldado, ao qual Brian ingeriu, fugiu e se tornou o Destruidor! E quando os Invasores vão ser executados… são salvos pela aparição de um novo Union Jack!

Invaders 20, de julho de 1977, então, revela que o novo Union Jack é Brian Falsworth, que concorda em, dali em diante, seguir a identidade do pai e se tornando, a partir daqui, um membro oficial dos Invasores, ao passo que os heróis continuam combatendo Hitler, Grande Mestre e Mulher-Guerreira até o fim da edição 21. Dali em diante, o Dinamite permanece um tempo como um coadjuvante da revista – sem integrar oficialmente o time – e, na edição 26, de março de 1978, Roger Aubrey tem sua condição como Dinamite revertida ao tamanho normal, mas mantendo algo de uma condição física superior e ele assume, portanto, a identidade de Destruidor, tecnicamente se tornando o herói publicado pelas aventuras da Marvel nos anos 1940.

Um fato muito importante ocorreu ao mesmo tempo em que esse arco era publicado, quando do lançamento de uma história “alternativa” dos Invasores. Em 1977, a Marvel lançou a revista What If…?, na qual o alienígena O Vigia (que mora na Lua e tem como missão registrar todos os eventos da vida na Terra) narra histórias que transcorrem em universos paralelos ou realidades alternativas; por exemplo: “O que aconteceria se o Homem-Aranha entrasse para o Quarteto Fantástico? O que aconteceria se os Vingadores não tivessem se formado?” Era uma maneira de escritores e desenhistas brincarem com conceitos e até mesmo fazer alguns pequenos testes.
Em agosto de 1977, saiu What If…? 04 com o seguinte título: “O Que Aconteceria se os Invasores permanecessem unidos após a Guerra?”. Os próprios Thomas e Robbins escreveram a aventura que imaginava a sequência de eventos seguidos após o desaparecimento do Capitão América e Bucky em 1945, mas a história tinha uma porção “canônica”, pois pela primeira vez detalhava o que se sucedeu após aquele desaparecimento. A trama mostra que Capitão e Bucky enfrentam seu destino nas mãos do Barão Zemo no dia 16 de abril de 1945, e que, após o Tocha Humana matar Adolf Hitler na tomada de Berlim, os Invasores são convocados para uma reunião de emergência com o Presidente Henry Truman (substituindo Roosevelt, que já havia falecido), no dia 07 de maio, onde são comunicados pelo próprio presidente do falecimento de seus amigos. Mas o Governo dos EUA acha que a morte da dupla irá “baixar a moral” dos aliados nos momentos finais e decisivos do conflito, afinal, a Alemanha ainda não tinha se rendido e o Japão seguia forte na campanha do Pacífico. Assim, criam um embuste: colocar substitutos!

O herói conhecido como Independente (William Naslund) e um jogador de baseball chamado Fred Davis (este tinha aparecido na Marvel Premier 30) se tornam os novos Capitão América e Bucky. Os Invasores aceitam a proposta, incorporam os novos heróis e lutam o restante da Guerra, especialmente no Pacífico até a rendição japonesa, em setembro de 1945. Com o fim do conflito, o Presidente Truman sugere que permaneçam unidos como O Esquadrão Vitorioso (exatamente o grupo criado por Bill Finger em 1946, lembram?), agora, reunindo os novos Capitão e Bucky, Tocha Humana, Namor, Miss América e Ciclone, enquanto Spitfire e Union Jack permanecem na Inglaterra. De volta aos EUA, o Esquadrão Vitorioso passa a combater uma onda de supercrime incentivado pela Era Atômica.

Porém, o “mandato” de Naslund como Capitão América é relativamente curto, pois em outubro de 1946, o grupo encara um vilão chamado Adam II, outro ser humano artificial na mesma linha do Tocha Humana. O plano dele é matar e substituir por outro robô o candidato ao senado John F. Kennedy (sim, o futuro presidente) e, com isso, influenciar os rumos da política mundial. Os Invasores conseguem derrotar o vilão, mas à custa da vida do novo Capitão América, morto em confronto físico com o vilão. Participando da aventura, o Patriota (Jeff Mace) encontra Naslund à beira da morte, que lhe pede que mantenha viva a tradição do sentinela da liberdade. Assim, Mace assume o papel do terceiro Capitão América. Vencida a ameaça, ele é incorporado ao time e seguirá empunhando o escudo até 1949, quando a queda da criminalidade e ausência da guerra o levam a se aposentar da vida heroica.

O conceito complexo desses “três Capitães Américas” criado por Roy Thomas causou uma boa impressão ao público e aos editores da Marvel, de modo que essa história terminou sendo classificada como canônica, ou seja, parte oficial da cronologia do Capitão América, apesar de publicada em uma revista até então destinada apenas a histórias fora da cronologia.
Numa cajadada só Thomas resolvia definitivamente o problema cronológico das aventuras do Capitão na segunda metade dos anos 1940. Já tendo resolvido anteriormente a questão da década de 1950, ao lado de Steve Englehart (com William Burnside e Jack Monroe sendo a dupla de heróis que agiu em 1953 e 54), agora, o ciclo estava fechado. Desse modo, ficou definido que Naslund e Mace seriam o “Capitão América” das revistas da Timely na segunda metade dos anos 1940; enquanto William Burnside seria a quarta encarnação do herói em 1953 e 1954. Inclusive, escritores posteriores foram ainda mais precisos, indicando que Naslund é o sentinela da liberdade que aparece a partir de Captain America Comics 49 e que Mace o substitui a partir da Captain America Comics 59, seguindo até o último número, o 74. Uma adesão posterior, tornada canônica pela Marvel, apenas adicionou que Mace agiu como o Capitão até 1952, quando a ação do Macartismo – a perseguição moral e ideológica encampada pelo senador Joseph MacCarthy contra os comunistas – o teria forçado a se aposentar, por causa de sua ancestralidade russa e judia.

Aproveitando o parênteses, é bom mencionar que os Invasores tiveram uma edição especial anual em 1977, com Invaders Annual 01 saindo com data de capa de agosto. Na aventura, Roy Thomas explorava os detalhes daquela primeira história que introduziu oficialmente o time no Universo Marvel, em Avengers 71, de 1969 (escrita por ele mesmo). Na trama, os Invasores estão em Londres e são convocados para uma missão especial nos EUA, com Capitão América, Tocha Humana e Namor indo enfrentar Agente Eixo, Hiena e Tubarão, respectivamente (Bucky e Centelha ficam para trás com fins a garantir a presença do time na Europa).
Porém, o trio é repentinamente teletransportado pelo Grão-Mestre à Paris invadida pelos nazistas, onde enfrentam os Vingadores (Pantera Negra, Jaqueta Amarela e Visão) vindos do futuro e são derrotados. Em seguida, o vilão aparece aos Invasores e lhes explica que aqueles eram heróis do futuro. O interessante é que, como um tipo de homenagem à Era de Ouro, a revista foi dividida em cinco histórias, a primeira e a última ilustradas por Frank Robbins, e as seções solo de Capitão, Tocha e Namor em suas lutas contra aqueles agentes inimigos desenhadas por artistas dos anos 1940, com Don Rico, Alex Schomburg (que também fez a capa da revista) e Lee Elias, respectivamente.
Também é importante mencionar que Roy Thomas se preocupou em explicar por que o Capitão usa o escudo triangular naquela aventura, quando a cronologia que se consolidou desde então mostrava que o sentinela da liberdade usara a arma pontuda apenas em suas primeiríssimas aventuras (correspondentes à Captain America Comics 01), a substituindo em seguida pelo icônico escudo redondo, de modo que não era congruente que o herói empunhasse o escudo triangular naquele momento em Paris ao lado dos Invasores. Na trama, de modo prosaico, mas esperto, Thomas mostra que o Agente Eixo roubou o escudo triangular dos arquivos do Exército e acabou simplesmente que o Capitão foi teletransportado pelo Grão-Mestre no momento em que tinha o artefato nas mãos.
Apenas uma demonstração da obsessão da Marvel (e de Thomas) com detalhes cronológicos.

Retornando à revista mensal dos Invasores, Thomas e Robbins comandaram The Invaders até o número 29, de junho de 1978. Em seguida, a nova dupla Don Glut e Alan Kupperberg assumiu o título, ainda sob a supervisão de Thomas como editor, mas a revista já perdia força e leitores. Thomas terminou retornando pouco depois, a partir da edição 32, passando a alternar com Glut os roteiros enquanto permanecia como editor da revista. Glut e Kupperberg ainda deram uma renovada no time, acrescentando Ciclone e Miss América aos Invasores a partir da edição 36 (se aproximando, portanto, à nova cronologia pós-guerra), de janeiro de 1979, mas a queda nas vendas condenou a revista.

The Invaders teve sua última edição regular publicada em Invaders 40, de abril de 1979, deixando uma batalha contra o Super-Eixo (reunião dos vilões: Barão Sangue, Lady Lotus, U-Man, Grande Mestre e Mulher-Guerreira) inacabada. Por isso, meses depois, em setembro, foi publicada a edição 41, finalizando a trama e a revista definitivamente, em uma edição com o dobro de páginas. As tramas ainda estavam localizadas no ano de 1942, o que deixou a cronologia dos Invasores em aberto para novas adesões posteriores, o que no fim, não aconteceu.

Vale comentar que esta última aventura se situou no território dos EUA e, no fim da história, Miss América e Ciclone permanecem no país (o que era mais condizente com suas aventuras originais da década de 1940) e o quinteto principal se reúne com Union Jack e Spitfire em Londres, com o grupo, portanto, seguindo sua formação principal.
Como pode-se notar, as histórias dos Invasores acrescentaram bastante à cronologia do Capitão América, clarifincando os eventos dos tempos da II Guerra Mundial, que desde as velhas edições de Lee e Kirby em Tales of Suspense, mostravam seguir uma cronologia própria, independente das histórias originais da Timely nos anos 1940. A partir de então, personagens como Union Jack, Spitfire, Barão Sangue e os substitutos William Naslund e Jeff Mace tornaram-se parte fundamental do cânone do Capitão América, sempre retomados pelos escritores consequentes.
Uma Época em Baixa: as Novas “Memórias” de Steve Rogers e a Conspiração
De volta à revista Captain America, em 1977, após a saída de Kirby, Roy Thomas assumiu a revista por um curto período, com desenhos de George Tuska e capas de Gil Kane, em histórias que reorganizavam a cronologia do herói (incluindo os Invasores), resolvendo aspectos obscuros do passado do personagem. Seguiu-se, então, um período de grande variação criativa na revista, o que a faz perder leitores. Dentre os escritores que se destacaram até 1980, estavam Steve Gerber, Don Glut, Roger McKensie e Chris Claremont.
É preciso contextualizar, também, que aquele período do fim dos anos 1970 foi de uma grande baixa nas vendas de HQs, o que deixou o mercado em crise durante alguns anos. As vendas caindo resultaram no cancelamento de muitas revistas, como The Invaders, que já citamos, mas toda a linha de publicações foi afetada e diminuíram suas vendas após um ritmo incessante de crescimento que vinha desde o início dos anos 1960. Captain America foi uma das revistas que ficou na linha de crise, mas sem uma situação drástica, pois se manteve uma publicação mensal. HQs com vendagem muito baixa viraram bimestrais para diminuir custos antes de serem definitivamente canceladas. No fim, a Marvel só saiu da crise no comecinho da década de 1980, com as vendas alavancadas por boas temporadas em suas revistas, como os X-Men de Chris Claremont e John Byrne, o Demolidor de Frank Miller, o Homem-Aranha de Roger Stern e o Capitão América de Roger Stern e John Byrne. Já já chegamos lá…

De volta ao ponto em que paramos… A saída abrupta de Jack Kirby do título obrigou à Marvel a adotar medidas de emergência para conseguir manter o prazo de publicação. O editor-chefe Archie Goodwyn designou que o veterano Roy Thomas assumisse a editoria da revista, o que fazia todo o sentido, pois ele fazia sucesso com os Invasores na época. Então, Captain America & the Falcon 215, de novembro de 1977, dá início à nova fase, e como foi uma edição criada às pressas para suprimir a ausência repentina de Kirby, o próprio Thomas escreveu um roteiro “fácil” que foi desenhado rapidamente por George Tuska na qual se faz uma nova recapitulação da origem e dos primeiros tempos do Capitão América na II Guerra Mundial, aproveitando para incluir as inovações em torno dos Invasores.

Mas o número também trouxe aquela que será a principal questão que mobilizará os anos seguintes da revista: as memórias de infância e juventude de Steve Rogers. Afinal, quem ele era ANTES de ser o Capitão América? A trama de Thomas conclui a edição com Steve percebendo que não tem lembranças nítidas do período inicial de sua vida, apenas de ter crescido em Manhattan (uma informação, aliás, que será contestada em versões posteriores, como veremos). Este relativamente longo (e controverso) arco seria chamado posteriormente de The Search for Steve Rogers (A Busca por Steve Rogers).
A saída de Kirby foi tão abrupta, que os prazos ficaram atrasados, então, a Marvel cometeu uma heresia na edição 216, republicando uma história antiga para ocupar espaço: a aventura de Strange Tales 114 com o falso Capitão América contra o Tocha Humana, algo totalmente despropositado. Os fãs reclamaram muito! E isso não foi saudável para as vendas do título em curto prazo.

Daí em diante, Roy Thomas criou um plot para ser desenvolvido pelo roteirista Don Glut (que seria seu parceiro também em Invaders, como já vimos), a partir de Captain America & the Falcon 217, que teve John Buscema (o irmão mais velho de Sal) especialmente convidado para desenhar esta ocasião, na qual Steve Rogers parte em uma busca de tentar se reconectar com seu passado esquecido, ao mesmo tempo em que Nick Fury cria o Esquadrão de Super-Agentes da SHIELD, formado por Blue Streak, Vamp, Texas Twister e Marvel Man, personagens novos criados para essa ocasião. O último teria um longo futuro na Marvel, pois mais tarde seria rebatizado de Quasar e seria membro dos Vingadores nos anos 1990. A ideia de Fury é que o Capitão América assuma a liderança do grupo, mas ele recusa, por causa de seus problemas com a memória, e indica que o Falcão fique com a missão. Sam Wilson aceita, o que o torna, oficialmente, um agente da SHIELD a partir daqui.
É um passo importante também, porque tecnicamente o afastamento dele para liderar esse grupo encerra extraoficialmente a parceria fixa do Falcão com o Capitão América que havia predominado durante toda a década de 1970 até ali.

A partir da edição 218, Glut prossegue nos roteiros, e o maravilhoso Sal Buscema volta à arte depois de três anos de ausência, iniciando outra longa temporada no título. Buscema continuava desenhando o Hulk e outras revistas da Marvel, então, de novo não fazia as capas, à exceção desse primeiro número. Na trama, temos o envolvimento do Capitão América, do Falcão e dos Super-Agentes na trama contra a misteriosa organização terrorista chamada A Conspiração, que irá se desenvolver em várias revistas da Marvel, mas especialmente em Captain America e The Incredible Hulk. Além disso, o Capitão vai até a Terra Nova, no extremo norte do Canadá, em busca do local em que foi encontrado congelado.
E a vilã Veda, que está ligada à Conspiração, afirma ser a filha da Agente R, a famosa espiã disfarçada de velhinha que estava presente na transformação de Steve Rogers no Capitão América em 1941. Entretanto, as velhas histórias do personagem davam a entender que a Agente R era Betsy Ross, a mesma agente que apareceu explicitamente em Captain America Comics 02 e que, mais tarde, se tornou a Golden Girl. Todavia, como já dissemos, a nova cronologia de Lee e Kirby praticamente ignorou a moça. Este pequeno problema cronológico nunca foi resolvido pela Marvel até hoje.
Outro evento que ocorre na edição 218 é que, sem nenhum alarde, ficamos sabendo que a super-força que o Capitão América adquirira naquela história de Englehart (no número 157) se dissipou. Portanto, o personagem volta a ser apenas um humano normal no ápice de sua forma física. Essas idas e vindas demonstram que o elemento dos limites físicos do Capitão América não haviam até então sido bem definidos, com as histórias ora mostrando-o como um humano, ora mostrando-o como um superhumano. Esse problema só seria resolvido efetivamente em alguns anos no futuro.

Nas edições 219 e 220, Glut e Buscema mostram mais flashbacks das memórias do Capitão, com uma aventura contra um cientista nazista chamado Lyle Dekker que tentou sabotar um seriado de cinema dos anos 1940 baseado no herói (uma referência ao verdadeiro programa que foi exibido em 1943), mas a trama se mostra ainda mais complicada quando revela um grande segredo do passado do personagem na edição 221, que contou com uma trama inacabada de Glut, que foi assumida por Steve Gerber e David Craft, com arte de Buscema, na qual tenta explicar uma pergunta que vinha incomodando os leitores: se o acidente de 1945 com o avião automático do Barão Zemo que resultou na morte de Bucky Barnes e o Capitão caiu no mar e congelou ficando em animação suspensa ocorreu no Canal Britânico (já no Oceano Ártico, ao norte da Grã-Bretanha), como é que ele foi encontrado por Namor e os Vingadores no outro lado do Oceano Atlântico, na Terra Nova, no Canadá, como essas histórias recentes mostravam?
Então, a história mostra que após cair no mar, Steve Rogers foi encontrado pelo submarino de Lyle Dekker, que agia às ordens do Caveira Vermelha. Rogers é despertado, enfrenta as hordas do cientista e termina sendo atingido por um gás dos nervos – o mesmo que também deixara o Caveira Vermelha em animação suspensa desde a Guerra, como mostravam as histórias de Tales of Suspense – e terminou jogado ao mar para morrer, já na costa da Terra Nova. Assim, se explicava que não fora a combinação de frio com o soro do supersoldado que fizera Steve Rogers ficar em animação suspensa, mas sim, o mesmo gás que fez o mesmo com o seu inimigo. Essa confusa adesão à passagem do herói dos tempos da guerra para os atuais, contudo, foi completamente ignorada por todos os escritores subsequentes.
A saída abrupta de Don Glut, que foi demitido do título por causa das baixas vendas, encontrou o seu substituto em Steve Gerber, que decidiu aprofundar ainda mais nas origens do Capitão América, enquanto a trama da Conspiração prosseguia. Na edição 222, então, dá o passo definitivo, com o herói fazendo uma investigação e chegando até Sayville, em Maryland, que seria a cidade onde nasceu, e que seu pai seria Walter Rogers, um diplomata, e sua mãe, Elizabeth. Seu nome na verdade seria Steve Grant Rogers e ele teve um irmão chamado Mike que morreu no Ataque de Pearl Harbor, em 1941, enquanto o casal Walter e Elizabeth morreu em um acidente de avião em 1953. Ele descobre que as pessoas ainda lembram dos Rogers na cidadezinha, mas ninguém sabe o que aconteceu com Steve…

Era uma grande adesão à história pregressa do herói, mas entrava em contradição com as poucas informações de sua vida antes do soro do supersoldado que as histórias antigas haviam revelado, como ele sendo um garoto pobre do Brooklyn.
No lado da ação, Steve Rogers é atacado em seu apartamento em Manhattan (um fusca é lançado por sua janela!), o que é importante, porque marca meio que o fim da morada do herói desde o início dos anos 1970 (dali em diante, por um tempo, ele será mostrado vivendo na Mansão dos Vingadores, como fizera depois de seu descongelamento), e a história ainda mostra que não somente Veda era uma agente da Conspiração infiltrada na SHIELD, mas também Vamp, que vemos se reportando ao chefe da organização, Kligger. e o herói enfrenta um monstro chamado Animus.
Por fim, essa Captain America & the Falcon 222, de junho de 1978, tem uma importância histórica, pois foi a última edição em que o Falcão apareceu como coproprietário do título. Como se vê, Sam Wilson sequer aparecera nas histórias das duas revistas anteriores, e chegara o momento em que a Marvel decidira encerrar oficialmente a parceria e remover o Falcão do elenco fixo da revista. Claro, ele continuaria a aparecer esporadicamente por todo o tempo restante, mas não mais dividiria a casa editorial de modo fixo.

A revista volta a se chamar oficialmente apenas Captain America no número 223 e continua a aventura da Conspiração, na qual a Super-Agente Vamp tenta dormir com o Capitão, mas ele começa a suspeitar da moça, e de fato, ela comunica o paradeiro do herói a Kligger e há uma nova batalha ferrenha contra Animus, que é derrotado, mas consegue fugir. A mudança do nome da revista resultou, claro, em uma readequação do logo, que foi simplificada a partir da diagramação criada por John Romita em 1971 e renovada por Jack Kirby em 1975. Outro aspecto interessante é que a capa daquela edição trouxe pela primeira vez a arte de John Byrne ao título, um artista que teria um grande envolvimento com o personagem no futuro próximo.
Parece ter um atraso nos prazos e a edição 223 foi um “número de férias”, com uma aventura não relacionada ao arco corrente, e sim, uma pequena trama de Peter Gillis com a arte de Mike Zeck, outro artista que teria bastante vinculação com o Capitão América no futuro próximo, na qual o herói precisa lidar com reminiscências da aventura da Madbomb (ele precisa recuperar alguns componentes do artefato que caíram nas mãos de criminosos).
Outro aspecto importante é que a edição 223 também traz a estreia de Roger Stern como o novo editor da revista. Ele era um grande amigo de Byrne e talvez por isso o artista tenha feito esta capa.

O arco das memórias de Steve Rogers finalmente tem um ponto de solução numa história que teria alguma repercussão (negativa) no futuro: Captain America 225, de setembro de 1978, ainda por Steve Gerber e Sal Buscema, mostra a continuação da ameaça da misteriosa Conspiração, e cansado das confusões trazidas por suas memórias, ele convence Nick Fury a tirar da prisão o Dr. Mason Harding (ainda um dos maiores neurologistas da história) para resgatar memórias que pareciam estar soterradas em seu cérebro.
O Dr. Harding faz o procedimento e Steve recorda as várias lembranças que ele descobrira em sua investigação: que tinha o nome do meio Grant, um irmão (Mike) que morrera em Pearl Harbor, que seu pai era um diplomata chamado Walter Rogers e sua mãe se chamava Elizabeth e ele crescera em Maryland, nos EUA… enfim, uma série de informações que contradiziam a maioria das origens que o personagem já tivera. Foi uma polêmica decisão de Gerber, tentando dar continuidade à iniciativa de Thomas, mas só gerou mais confusão. A maioria dos escritores preferiu ignorar essas novas informações, mas não muito depois, essas memórias seriam classificadas como falsas numa importante história de Roger Stern e John Byrne, conforme veremos a seguir.
As mudanças de Gerber geraram estranhamento dos leitores e dos críticos da época, porque davam um background meio aristocrático a Steve Rogers, vindo de uma família de classe média alta e crescido em uma daquelas idílicas pequenas cidades do leste dos EUA, ao contrário da presumida vida difícil no Brooklyn que as origens de Lee e Kirby davam a entender. (Lembre-se: Lee crescera no Brooklyn e Kirby na baixa Manhattan, ambos em áreas degradadas e pobres). Afinal, há de se lembrar que o motivo de Steve ter sido rejeitado pelo exército em 1940 foi o fato dele ser magérrimo e doente, o que não parecia combinar com essa origem mais confortável. Qual o sentido disso?
Outro aspecto interessante é que o novo editor Roger Stern era contrário à trama das novas memórias, mas como tinha acabado de chegar à revista preferiu deixar o barco correr. Mas ele revisitaria essa trama no futuro, como veremos…
Para além das memórias, a edição 225 também mostra Dum-Dum Dugan exibindo o arquivo de Veda – a agente da SHIELD que é uma espiã da Conspiração infiltrada – para Steve, no qual se afirma que sua mãe (uma senhora idosa e com o rosto desfigurado por causa de um acidente) seria a Agente R da Operação Renascimento. O herói a reconhece, mas ele não diz se a senhora era mesmo Betsy Ross, a personagem dos anos 1940 que virou a Golden Girl, e aparentemente teria casado com Jeff Mace, o Patriota (e terceiro homem a usar o uniforme de Capitão América). Como já dissemos, esse mistério cronológico nunca foi resolvido pela Marvel. Por fim, a Conspiração mata Veda, insatisfeitos com sua missão.

Ah, e mais importante: a volta das “memórias” da infância de Steve Rogers tem o efeito colateral de seu corpo retroceder ao estado anterior ao soro do supersoldado, ficando fraco e magérrimo de novo. Essa edição foi o fim da temporada de Steve Gerber, e Captain America 226 trouxe a estreia do novo roteirista Roger McKensie, com a arte permanecendo com Sal Buscema. McKensie nascera em 1950, portanto, tinha 28 anos quando assumiu o título. Ele era, então, um escritor novato que começara a carreira nos quadrinhos de terror da DC Comics, mas foi convidado pelo novo editor-chefe da Marvel, Jim Shooter, para comandar não apenas o sentinela da liberdade, mas também o Demolidor. Sua tarefa era árdua, pois ambas as revistas estavam com declínio nas vendas. Ele foi relativamente bem sucedido, pois Captain America melhorou seus resultados ligeiramente e em Daredevil o escritor trabalhou com o desenhista Frank Miller, que em breve viraria uma lenda das HQs.
Na trama da edição 226, o Capitão tenta se provar sem o soro (e não consegue) num treinamento, mas o Aeroporta Aviões da SHIELD é atacado pelo Caveira Vermelha, que de um satélite em órbita dispara raios que transformam os agentes da SHIELD, inclusive, Dum-Dum Dugan, em um exército de caveiras vermelhas. Mas a adrenalina faz o soro do supersoldado se reativar no corpo do herói e na edição 227 ele enfrenta o exército e o próprio vilão, que tomou o corpo de Nick Fury, vencendo ao final pelo uso do cérebro mais do que da força.

Todavia, a trama da Conspiração prosseguia inconclusa e precisava ser retomada, o que acontece a partir de Captain America 228, de dezembro de 1978, continuando com McKiense e Buscema (mais Ron Wilson na capa, que irá alternar essas ilustrações nas próximas edições com Keith Pollard), ainda mais porque a saga era uma história cruzada entre várias revistas da Marvel, especialmente no arco de The Incredible Hulk 212 a 232, escrito por Len Wein e também desenhado por Buscema, de modo que só é possível entender a trama com a leitura de ambas as revistas. Aqui no sentinela da liberdade, o Capitão retoma a busca pelo Falcão – que foi declarado desaparecido em missão desde o número 222 (seis meses antes!), e descobre por meio dos Super-Agentes da SHIELD, que estão em Los Angeles, que o ex-parceiro do herói estava em busca de alguém chamado Jim – que era Jim Wilson, um jovem afrodescendente que vinha atuando como amigo e companheiro de aventuras do Hulk na revista do golias verde e que será em breve revelado como sobrinho do Falcão.
Na busca por pistas, o Capitão enfrenta o Constrictor, um agente da Conspiração que estreara pouco tempo antes na revista do Hulk, mas termina descobrindo que a organização terrorista tem um agente infiltrado nos Super-Agentes. Um detalhe curioso nessa aventura é que o agente Jasper Sitwell (um velho coadjuvante das aventuras do Homem de Ferro) comunica ao Capitão que o QG da SHIELD em Manhattan, escondido em uma barbearia (que aparecia nas aventuras da Marvel desde meados dos anos 1960) estava sendo desativado e destruído porque fora comprometido em sua localização pelos inimigos.
Na edição 229, o Capitão vai a Los Angeles e confronta os Super-Agentes, o que dá certo e descobre que Blue Streak é um agente infiltrado da Conspiração. Após a revelação, ele é quase morto por Vamp, algo que o herói impede, mas a revelação faz com que Texas Twister fique desgostoso de tudo e deixe o grupo. Mas o Blue Streak ainda revela que o Falcão está como refém na Ilha de Alcatraz, o lar da infame prisão na baía de San Francisco.

Assim, na edição 230, Capitão, Marvel Man e Vamp invadem a (já desativada e ponto turístico) Alcatraz para libertar o Falcão, mas o Hulk e seu amigo Fred Sloan também são levados até lá, criando uma grande batalha – que se conecta diretamente com The Incredible Hulk 231 e 232, por Len Wein e Sal Buscema – na qual o herói descobre que o grande líder da Conspiração é um homem chamado Curtiss Jackson e que Vamp não somente é uma agente infiltrada, como ela também é o monstro Animus, que o Capitão já enfrentara!
Infelizmente para os leitores, no fim das contas, A Saga da Conspiração é encerrada em The Incredible Hulk 232, com a fuga de Jackson e a morte de Vamp, o que marca o fim dos Super-Agentes da SHIELD. (Marvel Man aparecerá naqueça revista algumas vezes antes de adotar o nome de Quasar em Marvel Two in One 53, numa aventura do Coisa, escrita por Mark Gruenwald, mais um nome que terá grande vinculação com o Capitão América).
A Morte de Sharon Carter
Terminada A Saga da Conspiração, as vendas de Captain America não iam bem, portanto, era preciso sacudir um pouco as coisas, e daí, o roteirista Roger McKensie e o editor Roger Stern tiveram a ideia de criar um novo marco com a morte da Agente 13 da SHIELD, Sharon Carter, a namorada do herói, desde 1966!

A trama inicia em Captain America 231, de março de 1979, ainda por McKensie e Buscema, quando após retornar de San Francisco, o Capitão é alistado pela SHIELD (sob a pessoa de Peggy Carter) no novo QG da agência (escondido atrás da parede falsa de um beco em Manhattan) para combater uma organização neonazista chamada Força Nacional, que usa métodos de hipnose para conseguir mais adeptos e é liderada por uma misteriosa figura chamada, O Grande Diretor.

Enquanto o herói esteve fora, a FN organizou um comício no Central Park que gerou uma onda de ódio e perseguição na cidade, e os agentes da SHIELD enviados para investigar, Sharon Carter inclusa, sofreram hipnose e uma poderosa lavagem cerebral e se tornaram agentes da FN. Começa uma caça de gato e rato do Capitão contra o Grande Diretor e a FN e seus agentes. Ele inclusive chega a encontrar Sharon, com esperança de que ela estivesse apenas fingindo, mas não, ela realmente tenta matá-lo, o que lhe parte o coração. Mas no fim das contas, na edição 233, o Capitão descobre que Sharon foi morta por um dispositivo incinerador aclopado no uniforme dela: ao serem surpreendidos pelas autoridades, Sharon e outros agentes da FN ativaram a autodestruição de seus trajes, que levou à morte deles! O curioso é que o herói não presencia realmente o acontecimento e só tem a confirmação da morte de sua amada por meio de um videotape.
Foi um golpe baixo de McKensie – um escritor que gostava de um tom mais sombrio – de colocar a dramática cena na qual Steve vê Sharon sendo morta por uma tela de TV. É de partir o coração.

Enquanto isso, o herói termina descobrindo que o responsável pela FN é o Dr. Faustus, e outra surpresa, o Grande Diretor da FN é ninguém menos do que o Capitão América dos anos 1950, William Burnside, que foi solto e também sofreu lavagem cerebral por Faustus, que diz que matou Jack Monroe. No fim das contas, o Grande Diretor chega a se arrepender de seus atos e comete suicídio no final, na edição 236, com o Capitão prendendo Faustus.
Como todos sabem, mortes não duram muito nos quadrinhos e tanto Sharon Carter quanto o Grande Diretor seriam trazidos de volta no futuro. Ainda assim, o grande amor de Steve Rogers ficaria “fora do ar” por 16 anos!
Uma Mudança de Ares
Após a morte de Sharon, Captain America 237, de junho de 1979, com roteiro de Roger McKensie e Chris Claremont e arte de Sal Buscema, dá início a uma fase de transição que tem pelo menos um elemento muito importante à vida doméstica de Steve Rogers: triste pela morte da amada, ele decide se dedicar mais à sua vida pessoal, reassumindo uma identidade secreta “de verdade” pela primeira vez desde o início dos anos 1970. Assim, ele se muda para a rua Leaman Place, n. 569, em Brooklyn Hights, no Brooklyn, o distrito de Nova York que, a partir dali, será intrinsecamente ligado ao personagem e à sua origem. Ele aluga o apartamento da esquerda, no terceiro andar, que tem uma claraboia.

O apartamento em questão, cujo edifício é nomeado Brownstone, traz junto um novo elenco de coadjuvantes que povoarão a revista pelos anos seguintes: o bombeiro Mike Farrell (um irlandês), o professor escolar Joshua Cooper (afroamericano) e a proprietária do edifício, Anna Kapplehaum (judia), uma senhora idosa que Steve reconhece como uma sobrevivente do (fictício) Campo de Concentração de Diebenwald na II Guerra Mundial. Como se vê, é um grupo de minorias étnicas que realmente lutavam para sobreviver na dura NY do fim dos anos 1970. Essa trupe age como um grupo de amigos que cuidam um dos outros e fornecerão um ambiente humano e acolhedor no entorno de Steve a partir dali.
Outro ponto importante da mesma história é que Steve Rogers consegue um novo emprego como desenhista free-lancer de publicidade, retomando a habilidade de artista que histórias antigas haviam sugerido que ele tinha antes da II Guerra Mundial.

Todavia, o número 237 terminou encerrando a fase de Roger McKensie e Sal Buscema, com ambos saindo do título. Após quase dois anos nessa nova temporada, Buscema encerrava seu duradouro vínculo com o Capitão América e, naquele ponto, era o artista que mais edições desenhara do personagem, descontado o criador Jack Kirby.
Embora McKensie tenha dado o caminho para uma nova fase na vida de Steve Rogers, com os elementos domésticos acirrados, aparentemente, nenhum criador estava interessado, em vista do acúmulo de anos em baixa do personagem e das vendas nada exuberantes da HQ. Isso deve explicar o inacreditável período de nove meses que Captain America passou sem uma equipe criativa fixa dali em diante. Para dourar a pílula, trouxeram o já aclamado artista John Byrne (sucesso nos X-Men) para fazer belas capas, mas isso não era suficiente.

Esse período tenebroso só pirou a situação comercial da revista e começa em Captain America 238 e 239, nas quais Peter Gillis (texto) e Fred Kida (arte – famoso por seu trabalho no Fantasma) contam a história na qual o herói vai ao Himalaia enfrentar os vilões Mind-Master (advindo das aventuras de Namor) e Windowmaker, conhece um povo que ataca montando gaviões gigantes e salvar a vida de Snowfall (Gina Snow). Em seguida, no número 240, provavelmente seguindo uma recomendação dos editores Jim Shooter e Jim Saliscup, Paul e Allan Kupperberg mostram uma história no qual o Capitão enfrenta uma gangue de criminosos comuns, no que parecia um teste de abordagem para ver como o herói funcionava nesse contexto mais mundano que dava bem para personagens como Homem-Aranha ou Demolidor.
A luta contra o crime comum continua na edição 241, na qual Mike W. Barr (texto) e Frank Springer (arte), mais capa de Frank Miller, mostram o Capitão no encalço de uma reunião de quadrilhas criminosas e cruza o caminho com o Justiceiro (Frank Castle), que quer matar todos eles. Mesmo tendo que impedir que o violento vigilante exploda todos com uma bomba, o Capitão consegue prender os criminosos e o Justiceiro quase vai preso também, conseguindo escapar ao detonar a bomba (sem matar ninguém) e distrair todos.

O Justiceiro tinha aparecido alguns anos antes nas histórias do Homem-Aranha como esse anti-herói que mata criminosos e começava a ficar um personagem popular entre os leitores da Marvel e seria ainda mais no futuro.
Na edição 242, por Steve Grant (texto) e Don Perlin (arte), o Capitão enfrenta o vilão Manipulador (que combatera os Vingadores em Avengers 128), que projeta ilusões na mente das pessoas e tenta fazer o herói ter um colapso nervoso. O Capitão termina descobrindo que o vilão fora contratado pelo ex-policial Brian Muldoon para matar se vingar dele, mas Muldoon é preso de novo e o próprio Manipulador é atingido por um disparo de arma e fica surpreso ao descobrir que é um robô e não um humano, “morrendo” em seguida. Como é possível um robô tão realista? Essa questão seria em breve respondida…
Captain America 243, de janeiro de 1980, traz o escritor Roger McKensie de volta para um trio de aventuras, cada qual com um artista diferente. Nesta primeira, Rick Buckler desenha o início da trama contra o vilão Adonis, que se encerra no número 244, com arte de Don Perlin.
Na edição 245 a arte já passa a Carmine Infantino (famoso artista da DC Comics que estava na Marvel na época) numa interessante história na qual o Capitão descobre um ex-criminoso de guerra nazista vivendo em sua vizinhança, o Dr. Mandenhaus, que fora o responsável pelo campo de concentração da qual sua vizinha, Anna Kapplehaum ficara presa na II Guerra. A trama traz referência a Mandenhaus se opor à ideia de nazistas de iniciar um novo Reich na América do Sul (uma referência às Ditaduras Militares na América Latina, que tinham colaboradores nazistas fugidos da Europa). Os caçadores de nazista Aaron e Marie Hellen se somam ao esforço do herói, mas enquanto Aaron tem um ataque cardíaco, o Capitão consegue impedir que Anna mate Mandenhaus e o deixe ser julgado por seus crimes. Ela cede, mas Marie Hellen mata o velho nazista.
A última edição dessa fase incerta se dá em Captain America 246, de maio de 1980, na qual Peter Gillis (texto) e Jerry Bingham (arte) contam uma história mais mundana na qual o pai de uma criança que morreu vítima de uma doença debilitante tenta se vingar da escola dele, da seguridade social e de outras pessoas que considera culpadas pela tragédia. Mas o Capitão consegue convencê-lo a não fazer algo pior e se arrepender depois, e ele se entrega.
Outra Fase Dourada: Roger Stern e John Byrne
A necessidade de uma mudança de ares para a revista se impôs e o editor-chefe da Marvel, Jim Shooter queria sobretudo resgatar a grandeza do Capitão América e confiou ao editor de Captain America, Roger Stern, a missão de fazer isso. Stern trabalhava há alguns anos como editor nas revistas da Marvel, mas se provara como um excelente escritor na revista The Incredible Hulk, que alçou grande sucesso e tinha feito uma temporada tão boa na revista secundária do Homem-Aranha, Peter Parker: The Spectacular Spider-Man, que Shooter o designara para assumir a revista principal, The Amazing Spider-Man. Satisfeito, Shooter colocou Stern para escrever Captain America e o escritor conseguiu que o desenhista sensação John Byrne (que vinha de uma sequência de aclamação como ilustrador dos X-Men e dos Vingadores) assumisse a arte. E já que não era permitido a um editor acumular a função de escritor da mesma revista, a editoria de Captain America passou às mãos de Jim Saliscup, que tinha como assistente Mark Gruenwald, um nome que seria essencial ao personagem nas duas décadas seguintes, como veremos.

Nascido em Noblesville, Indiana, em 1950, Roger Stern viria a se tornar um dos maiores escritores de quadrinhos dos anos 1980 e 90, e além do Homem-Aranha e do Capitão América, teria uma marcante passagem pelos Vingadores, antes de se mudar para a DC Comics e se tornar um longevo escritor do Superman. Já John Byrne havia nascido na Inglaterra, também em 1950, e sua família emigrou para o Canadá quando ele tinha 8 anos de idade. Ele ganhou notoriedade primeiro como desenhista, chamando a atenção no Punho de Ferro primeiro (1975-76), antes de ilustrar The Champions (Os Campeões, 1976-77) e Marvel Team-Up (com histórias do Homem-Aranha), alçando o absoluto sucesso nos X-Men ao lado de Chris Claremont e arcos como A Saga da Fênix Negra e Dias de Um Futuro Esquecido, antes de ilustrar os Vingadores e assumir os roteiros e a arte do Quarteto Fantástico, entrando os anos 1980 como a maior estrela do mercado de quadrinhos dos EUA.

Então, após um período de baixas vendas e incentivado por uma pequena campanha de marketing que antecipara a chegada de Byrne, a dupla estreou já com sucesso em Captain America 247, de julho de 1980, com ambos creditados pelo argumento (plot), Stern pelo roteiro e Byrne pela arte, como seria em toda essa temporada. Depois de três anos de vendas baixas, como num passe de mágica, a revista voltava a ser “quente”. O duo não perdia tempo e já começava direto no que interessa: o Capitão América vai cedo ao QG da SHIELD em busca de Nick Fury para esclarecer as memórias duvidosas que ganhara nos últimos meses, e Dum-Dum Dugan lhe leva até o Forte Dix, em Nova Jersey, onde está o seu baú do tempo do exército e, além de seu velho escudo triangular (que usara em Captain America Comics 01 – e vale lembrar, até então, a cronologia da Marvel ignorava a mudança do escudo – então, esse detalhe de cena o tornou canônico), encontra seu Diário pessoal, no qual encontra a explicação do que ocorreu: às vésperas de embarcar definitivamente à Europa junto aos Invasores, no Natal de 1941, ele foi submetido a um procedimento de inserção de memórias falsas para o caso de ser capturado e torturado pelos Nazistas.
Suas memórias foram suplantadas por aquelas da família do diplomata Walter Rogers, que perdeu dois filhos no Ataque de Pearl Harbor. Portanto, fica estabelecido que tudo aquilo relacionado ao nome do meio Grant, ao pai diplomata (Walter) ou à mãe Elizabeth e o irmão que morreu no ataque, ou ter crescido em Maryland… tudo era falso. (Os detalhes reais da origem de Steve seriam mostrados em uma edição mais adiante).

E nem chegamos à ação: Nick Fury vai visitar seu velho inimigo, o Barão de Von Strucker, na prisão para saber como ele sobreviveu ao seu último confronto (e combateu o Capitão em seguida), mas o velho nazista, fundador da HIDRA, consegue escapar e sequestrá-lo e o leva ao ataque contra Rogers e Dugan, mas com Strucker derrotado e na iminência de ser extraditado para Israel e ser julgado como criminoso de guerra, o Barão se autoexplode…. e revela ser um robô!

Vemos então que há um novo vilão por trás do Strucker-robô: o misterioso Machinesmith (Mecanus, no Brasil), um cientista capaz de criar máquinas incrivelmente perfeitas, e que lança o Homem-Dragão (um monstro sintético que já havia enfrentado o Quarteto Fantástico) contra o herói na edição 248.

Mas o monstro era conduzido por um artefato esférico e quando o Capitão percebe e o destrói, o monstro se volta contra Mecanus, indo até sua base, na edição 249, onde o herói enfrenta outras ameaças robóticas e descobre a origem do vilão: ele é o antigo Sr. Medo, um grande especialista em robótica, que após enfrentar o Demolidor (em Daredevil 55, de 1969) e quase morrer, teve sua consciência transferida para um corpo robótico. É revelado ainda que ele era o responsável pelo Manipulador, que o Capitão enfrentara alguns meses antes.

Esse par de edições também tem alguns desenvolvimentos pessoais: no número 248, Steve é convidado a jantar na casa de Mike Farrell e conhece uma colega dele de faculdade que estava se mudando para o prédio da Leaman Place: Bernadette “Bernie” Rosenthal, uma menininha muito simpática e bonita. Uma conexão entre eles é imediata e Bernie já se mostra interessada, mas claro, Steve precisa sair correndo depois da sobremesa por causa da ameaça do Homem-Dragão. E quando o trio Josh, Mike e Bernie vai à rua observar as consequências da luta na vizinhança, no número 249, ela já está preocupada pelo “sumiço” do rapaz de cabelos loiros. O leitor deve notar que ela também é judia, reforçando os elementos de minorias do prédio do Brooklyn e do título em si.
As histórias seguintes mostrariam que sua família tinha uma loja de artefatos de vidro e que eram amigos de Anna Kapplehaum. E embora Bernie seja jovem, não é uma “menininha”, pois a história diz que ela cursou a faculdade (college) com Mike.

Outro aspecto importante nessas primeiras edições de Stern e e Byrne é que elas deixam muito claro que o Capitão América não é um homem comum. Ou seja, o herói tem, sim, força superhumana e uma agilidade bem além do que os seres humanos são capazes de fazer. Embora o sentinela da liberdade continue sendo descrito como o “ápice da forma humana”, na verdade, essas tramas o tratam definitivamente como superhumano. E parece que leitores, editores e artistas estavam cansados da indefinição dos limites das habilidades do Capitão, de modo que todos abraçaram esse elemento rapidamente. Dali em diante, ficou estabelecido que, embora não tivesse o nível de força de um Homem-Aranha (que pode erguer dez toneladas), Steve Rogers é muito mais forte e ágil do que um homem comum e capaz de feitos sobrehumanos, como levantar uma moto de 300 quilos facilmente e saltar 5 ou 6 metros de altura.
Os Estados Unidos estavam em plena campanha presidencial naqueles tempos – a eleição que elegeria o nefasto Ronald Reagan ao cargo – e a comemorativa Captain America 250, de outubro de 1980, vinha com uma grande surpresa: “Capitão América para Presidente!”. Isso mesmo! Na bela trama criada por Stern e Byrne, ao impedir um ataque terrorista, o herói termina conhecendo o líder de um grande partido independente – ou seja, não era o Democrata nem o Republicano – que tenta convencê-lo a se candidatar à presidência, algo que ele nega, mas o político insiste que pense no assunto. Então, enquanto Steve e Josh fazem a mudança de Bernie e conversam um pouco sobre política, o Globo Diário da tarde divulga a notícia de que o Capitão irá se candidatar!
Steve fica surpreso sobre como seus amigos pensam que o herói é alguém confiável – embora use máscara e ninguém saiba seu nome – e que votariam nele, e a edição é um bom veículo para o debate sobre o que faz um candidato e que tipo de pessoa se espera que assuma um cargo desse tipo, debate que envolve os próprios Vingadores, quando ele passa na Mansão e conversa com Fera e Vespa (que lhe apoiam) e Homem de Ferro e Visão (que discordam).


No fim, o Capitão comparece à convenção do tal partido e, diante do público e da imprensa, faz um discurso contundente no qual recusa a oferta de se candidatar, mas é uma fala interessante sobre política e uma mostra exemplar de como o tema pode se tornar uma pauta criativa em uma HQ de super-herói. Uma história realmente clássica de Stern e Byrne.
Um detalhe editorial famoso é que, quando Stern era apenas editor de Captain America, o escritor Roger McKensie e o desenhista Don Perlin haviam apresentado, quatro anos antes, a proposta de uma história na qual Steve Rogers se candidataria à presidência… e ganharia! O que deixaria a revista voltada à explorar as aventuras do presidente-herói. Era um conceito ousado demais e Stern vetou a história, pois traria muitas complicações em curto, médio e longo prazo para o personagem. Mas uma vez no comando dos roteiros, e instigado por John Byrne, Roger Stern terminou desenvolvendo a premissa básica, mas como vimos, com o herói recusando a oferta e apenas refletindo sobre o tema. Ainda assim, por questões éticas, Stern e Byrne deram créditos na história para McKensie e Perlin. Pouco tempo depois, What If? 26 explorou o tema: “o que aconteceria se o Capitão América fosse eleito presidente?”, numa trama de Mike W. Barr e Herb Trimpe.
Continuando sua saga, o Capitão América, precisa lidar com a dupla improvável Mister Hyde e Baltroc, o salteador. Na trama das edições 251 e 252, Hyde contrata o mercenário francês para libertá-lo da Ilha Ryker e como não tem o dinheiro para pagá-lo, propõe uma parceria que envolve sequestrar um navio de carga valiosa (e inflamável) da Roxxon Oil (uma empresa “vilã” das histórias da Marvel). E para melhorar, Hyde ainda exige que o Capitão se entregue a eles. Mas o louco está disposto a explodir o navio contra o cais, o que leva – tal qual nas antigas histórias de Lee e Kirby – a Baltroc discretamente ajudar a soltar o herói e une as forças contra ele para vencer Hyde, que termina perdido no fundo da Baía de Manhattan. Mas dessa vez, o Capitão consegue prender Baltroc, que acha graça disso e vê sua prisão com algum bom humor e justiça.

E no campo pessoal, o número 251 mostra Steve passar vários dias desenhando direto para conseguir cumprir um prazo de seu trabalho de artista publicitário e quando termine recebe uma visita da vizinha Bernie, que se propõe a lhe fazer um café da manhã de prêmio. É o primeiro momento realmente íntimo da dupla e os dois conversam e se conhecem um pouco mais, com Byrne e Stern explorando o gosto cultural distinto deles, mas uma fagulha bem acesa do lado dela. Tal sentimento não é tão claro em Steve, mas quando ela vê uma fotografia de Sharon Carter, ele abre o jogo e diz que era sua namorada e que morreu alguns meses antes, guardando a foto fora de vista. Antes disso, uma cena já tinha mostrado que ele estava disposto a seguir em frente com sua vida, e que era isso o que Sharon queria.

Ademais, as duas edições de Hyde e Baltroc são cheias de nostalgia, pois estava se aproximando o aniversário de 50 anos de publicação do Capitão América, então, Stern e Byrne colocaram alguns flashbacks no primeiro número, com o herói lembrando de ser descongelado por Namor e pelos Vingadores, e uma rápida recapitulação de sua ação ao lado deles, do Falcão e de Sharon. E o número 252 traz outra recapitulação dessas (agora como uma história em duas páginas) e duas páginas de pin-ups de personagens como Bucky e Sharon, do apartamento do Brooklyn (incluindo sua planta baixa) e seus vizinhos.
As histórias cheias de ação e personagens bem construídos se transformou em um dos melhores momentos do herói em sua longa trajetória.

Contudo, o melhor ainda ficou para o final. O último arco da dupla trouxe a clássica aventura contra o Barão Sangue, vilão vampiro dos tempos da II Guerra Mundial, criado por Roy Thomas na revista dos Invasores (os heróis do tempo da guerra) nos anos 1970. Com isso, não apenas introduziu aqueles personagens no cânone oficial do Capitão América, como criou uma nova versão de Union Jack, o super-herói britânico.

Antes disso tudo, vemos que Steve e Bernie saem pela primeira vez: ela queria assistir um dos velhos musicais que ele gosta e vão ver Oklahoma – que ele vira em cartaz em 1943!!! – e ela até gosta, mas preferiria ver Oh! Calcutá (um musical dos anos 1960 que trata do sexo de forma aberta), mas enquanto os dois estão conversando no sofá, vemos a intimidade crescer, um abraço e estão prontos a se beijar quando o telefone toca e é Edwin Jarvis, o mordomo dos Vingadores, informando uma mensagem em código vinda da Inglaterra, do Lorde Fallsworth. Sem muito tato, Steve interrompe o encontro e diz que precisa ir à Inglaterra imediatamente, o que deixa Bernie bem chateada.
Então, a trama se desenvolve propriamente: um estripador ataca as ricas propriedades rurais do norte de Londres e Milady Critchon, uma senhora que aparentemente foi alguém graduada na Scotland Yard (o equivalente à polícia federal do Reino Unido) requer uma investigação, ao passo que seu velho pai, preso a uma cadeira de rodas, acredita que já sabe quem é o assassino. A chegada de Steve desvenda nossos personagens: o velho é o Lorde Fallsworth (o homem que foi o primeiro Union Jack – e somos informados que seu filho, Brian, que foi o segundo Union Jack, este sim, membro dos Invasores, morreu em um acidente de carro em 1953) e que a Milady Critchon é ninguém menos que sua filha, Jacqueline, a antiga Spitfire, mas que em razão da idade, não possui mais seus poderes e é apenas uma senhora aposentada.

O reencontro caloroso dos personagens traz algum nível de desconforto: Jacqueline nutria uma paixonite pelo Capitão e era mais nova do que ele, enquanto agora, ela é uma senhora de idade e ele não envelheceu nada. Stern e Byrne aproveitam para dizer que as suas memórias estavam confusas até bem recentemente, o que servia para explicar porque nunca havíamos visto praticamente nada das tramas dos Invasores na revista do Capitão (e por que ele não os visitou antes).
O Lorde Fallsworth requer a ajuda do Capitão América, pois suspeita que o Barão Sangue está de volta. e ele seja o tal estripador, mas Jacqueline achava que o velho está senil. Stern e Byrne entregam uma ambientação muito interessante do rural britânico e suas instituições, a investigação sobre se o Barão Sangue está vivo ou não (ele é originalmente irmão de Fallsworth) e quem ele é. E ainda conhecemos Kenneth Cricthon (o filho de Jacqueline) e seu “amigo”, Joey Chapman – colega da Escola de Arte a quem ela não gosta muito, porque ele vem da classe trabalhadora.

À noite, quando o Barão Sangue ataca e é detido pelo Capitão América e consegue escapar, Joey não está presente e o herói chega a desconfiar dele. Mas Kenneth não acredita e conta ao amigo (e ao leitor) a história de sua família em detalhes. E ele está certo. O grupo se prepara para um segundo ataque e o Lorde Fallsworth insiste em voltar a usar o uniforme de Union Jack, o que o faz ter um ataque cardíaco. Mas quando o Capitão está prestes a cair nas mãos do vampiro, o Union Jack reaparece e salva o dia – mas não é o Lorde… e nem Kenneth, e sim, Joey.

A aventura com o Barão Sangue também é marcante pela cena da batalha final em que o Capitão se vê obrigado a matar o vilão, mostrando que o herói pode chegar a esse ponto se necessário. Até então, as histórias do Capitão se esquivavam dessa possibilidade – mesmo ele sendo em essência um soldado que lutou na guerra – mas Stern e Byrne contam isso de maneira leve e ligeiramente dramática: a única maneira de matar definitivamente um vampiro é decapitá-lo e queimar separadamente as partes do corpo. Encurralado pelo vilão e quase hipnotizado por ele, o Capitão não tem alternativa e usa o escudo para separar a cabeça do Barão Sangue e matá-lo!
A partir de então, a possibilidade de matar um oponente em última instância passou a pautar alguns escritores do personagem.
A cena da morte, inclusive, é um grande momento da carreira editorial do herói, especialmente, pela beleza da arte de John Byrne, que retrata o drama e a hesitação do personagem.
No fim, após eliminarem definitivamente o Barão Sangue, Lorde Fallsworth também morre vítima da idade avançada (ele lutou na I Guerra, lembrem…). E a trama deixou um importante legado: no futuro, Joey Chapman seria o terceiro Union Jack em histórias da Marvel.

A última edição desta fase foi a Captain America 255, de março de 1981, comemorativa dos 40 anos de criação do Capitão América. Por isso, trata-se de um conto da origem do herói, recontada em detalhes por Stern e Byrne, seguido fielmente aquilo definido por Simon e Kirby em 1941, mas acrescentando contribuições posteriores de Lee e Kirby, principalmente aquelas de Tales os Suspense 63 e Captain America 109, bem como de Thomas e Robbins em Giant-Size Invanders 01. A dupla fez um trabalho de síntese, transformando todas as informações disponíveis em uma narrativa coesa e mais detalhada do que qualquer uma das iniciativas anteriores. Além de mostrar enxertos da juventude de Steve pré-Soro do Supersoldado (ele vindo de uma família pobre do Brooklyn, órfão do pai Joseph, e com a mãe Sarah dando duro para criá-lo e trabalhando como lavadeira de roupa – claramente ignorando aquelas estranhas adesões do fim dos anos 1970), com o jovem trabalhando com arte antes de se alistar na Guerra e ser recusado, até chamar à atenção do General Chester Phillips (que ganha seu primeiro nome!), que o leva ao Dr. Abraham Erskine. No experimento em si, Stern e Byrne simplesmente unificam todas as versões: Steve toma uma injeção, bebe o Soro e é bombardeado pelos Raios Vita.
Por ser uma “história de verdade” de 20 páginas e por sintetizar todas as versões anteriores em uma versão coesa, a origem de Stern e Byrne é, até hoje, considerada a mais canônica e oficial origem do Capitão América. E ver a origem do personagem na beleza plástica da arte de Byrne já é um grande negócio.
A dupla Stern-Bryne planejava, em seguida, um arco em três partes com o Caveira Vermelha, mas discussões com a esfera editorial da Marvel fizeram ambos sair da revista. Stern continuaria a escrever o Homem-Aranha e faria um sucesso enorme na revista; enquanto Byrne continuava nos X-Men e no Quarteto Fantástico.
A Fase de J.M. DeMatteis
Com a saída da dupla, uma apareceu uma série de histórias “tapa-buraco”, enquanto se buscava uma nova equipe criativa; muito embora escritores de calibre como Bill Mantlo, Chris Claremont, Jim Shooter e David Michelinie tenham produzido nesse período. A arte variou entre alguns artistas – Gene Colan fez a edição 256 – mas um desenhista fixo se apresentou a partir de Captain America 258, de julho de 1981, com o ótimo Mike Zeck, que também assumiu as capas. Mas isso significa dizer que o Capitão América teve outra fase sem equipe fixa por mais seis meses!

O novo escritor fixo do título chegaria pouco depois na figura de J.M. DeMatteis. Nascido em 1953 no Brooklyn, em Nova York (portanto, um bom conhecedor da área na qual o herói atuava), o jovem John Marc começou a carreira como músico de rock (cantando e tocando guitarra com suas próprias composições) e chegou até a ensaiar uma carreira de crítico musical (publicando até na Rolling Stone), antes de enveredar pelos quadrinhos, começando em histórias de terror na DC Comics no fim dos anos 1970, e começou a receber encomendas de roteiros pontuais da Marvel Comics em 1979, até assumir seu primeiro título fixo com The Defenders, em 1980, a revista dos (Novos) Defensores, seguindo por um passo importante para Marvel Team-Up (que publicava histórias do Homem-Aranha ao lado de participações especiais), por dois anos entre 1981 e 1983.
Mas sua entrada no mainstream real da Marvel se deu com Captain America, na qual teve a oportunidade de mostrar seus grandes talentos como roteirista.
Finalmente, em Captain America 261, de setembro de 1981, estreia a nova fase, comandada por J.M. DeMatteis (texto) e Mike Zeck (desenhos). Seria uma longa temporada, que duraria quase 40 edições por mais de três anos. Zeck ainda não estava no apogeu de sua arte, mas era um ilustrador muito competente e de traço sombrio que funcionou muito bem com a pegada mais “pesada” que DeMatteis imprimiu à revista. A dupla inaugura sua fase com o Capitão precisando enfrentar um Nômade impostor que quer desacreditar o herói numa trama que se revela tendo o Caveira Vermelha por trás.

J.M. DeMatteis retomou a bola alta do personagem em aventuras repletas de abordagens psicológicas e temas delicados, como envelhecimento/morte, perseguição de minorias étnicas (negros por meio do Falcão; judeus por meio de Bernie Rosenthal) e homossexualidade (por meio de Arnie Roth, um personagem novo, retroativamente inserido como um idoso amigo de infância de Steve Rogers, que apareceu na edição 270). Para se ter uma ideia da ousadia de DeMatteis, o casal Arnie e Michael representa o primeiro par de gays dos quadrinhos de super-heróis em todos os tempos! Mesmo com alguns subterfúgios que a época – o início dos anos 1980 – exigiam, as histórias não deixavam dúvida nenhuma de que ambos formavam um casal.
E por meio de Steve Rogers, temos uma lição sobre tolerância e aceitação e DeMatteis e Zeck contam uma bonita e trágica história sobre o casal, já que Michael sofre de câncer – ambos têm a idade bastante avançada, temos que lembrar – e eventualmente irá morrer.

O roteirista também reforçou os laços de Steve Rogers com seus amigos e vizinhos do Brooklyn, elementos que não foram privilegiados na fase intermediária anterior pós Stern-Byrne. Assim, temos várias cenas dele com seus amigos, inclusive, uma ligeiramente polêmica já na estreia em edição 261 na qual Steve aparece aparentemente bêbado com Josh Cooper e alguns colegas. Por outro lado, vemos cenas como aquela da edição 269, na qual Josh, Mike e Steve são alimentados alegremente pelos waffles de Anna.
DeMatteis era um cara que gostava de deixar as coisas claras, portanto, tratou logo de resolver o panorama da amizade entre Steve Rogers e Bernie Rosenthal. Eles eram amigos ou amantes? Em Captain America 268, de abril de 1982 (numa aventura que trouxe os Defensores), a dupla vai ao cinema (assistir Indiana Jones e os Caçadores da Arca Perdida – algo próximo aos seriados de aventura dos anos 1930 que ela sabia que ele gostava) e na conversa, ela termina soltando que “o ama”. Ele não corresponde e isso gera uma crise e uma briga, deixando claro que o relacionamento entre os dois ainda não tinha começado de verdade até então.

Mas na edição 270, os dois conversam e Bernie aceita se relacionar com ele mesmo que ele não esteja pronto para sentir ou confessar que a ama. Temos acesso aos pensamentos do herói e ele está assombrado pela dúvida, pois não somente ela é muito mais nova do que ele, como também, ele nunca teve um relacionamento sério com alguém que não fosse um tipo de supertipo, como as irmãs Peggy e Sharon Carter. Na conversa, os dois se beijam pela primeira vez e, depois da aventura da edição, Steve volta ao apartamento dela, às duas da manhã (!), e bate em sua porta. Sem palavras, ela atende e os dois se beijam, com aquela típica mudança de cena para mostrar o lado de fora do edifício da Leaman Place, que é o velho truque de Hollywood para indicar que os dois transam.

No lado da ação, DeMatteis movimentou bastante as coisas: criou novos vilões, como Ratus (Vermin, no original – um rato humanoide fruto de um experimento científico, que estreou na edição 272); e resgatou alguns velhos… Captain America 275, de novembro de 1982 com a estreia do Barão Zemo II. Esta edição é importante por vários motivos: primeiro, como um tipo de celebração do sucesso inicial da temporada de DeMatteis, a revista ganha um novo logo – criado por Mike Zeck e John Beatty – que substitui o colorido criado por John Romita dez anos antes.
Em segundo, é o momento em que Bernie Rosenthal descobre a identidade secreta de seu namorado! Na trama, vemos uma série de ataques de neonazistas às sinagogas de Nova York e os amigos de Steve vão a um ato anti-nazi em Long Island, na qual os neonazistas causam confusão e um confronto até que o Capitão América aparece e faz um discurso contra o ódio. Mas é uma fala muito parecida com a que ele havia feito para Bernie antes, e ela percebe que Steve Rogers é o Capitão América.

Apesar de ser necessário alguns ajustes, o fim do segredo ajuda na relação do par Steve-Bernie, que se desenvolve mais dali em diante. E DeMatteis desenvolveu bastante a personagem, inclusive, nessa mesma edição revelando que ela já fora casada antes, o que dava um ar mais maduro à personagem e ao novo casal, deixando para trás qualquer sombra de romance adolescente.
É interessante notar a ousadia de DeMatteis de abordar esses temas diretamente quando os EUA da Era Reagan viviam efetivamente o nascimento de uma onda de discurso de ódio e organizações neonazistas, de modo que, tal qual Englehart uma década antes, o escritor estava colocando o Capitão América diretamente nos tópicos de seu tempo. E curioso que na década de 2020 vemos a ascensão dos mesmos problemas com ainda mais força do que 40 anos atrás, o que dá um toque de atualidade incrível a essas velhas histórias.

E não acabou: a edição 275 dá início a um arco no qual Armin Zola e Ratus são aliciados por um misterioso novo vilão, revelado na edição 276 como Helmut Zemo, o antigo Fênix, que adota agora o mesmo título de seu terrível pai: Barão Zemo, prosseguindo uma acirrada batalha no número 278. O novo Zemo, o 13º barão de sua família, é apresentado como um engenheiro competente e um fantástico estrategista, uma característica que o transformaria em um dos maiores vilões da história da Marvel.
DeMatteis e Zeck também fizeram uma imersão pela história pessoal de Sam Wilson, o Falcão, publicando uma trilogia de histórias secundárias nas edições 269, 270 e 271, na qual recontam detalhadamente a origem do herói. O ponto principal a resolver era que histórias antigas havia definido que, antes de encontrar o Capitão, Sam fora um capangazinho de rua sob o nome Snap Wilson, mas isso entrava em contradição com a apresentação do personagem sempre como alguém muito nobre. Nessa trama, DeMatteis define a “personalidade” de Snap Wilson fora fruto das manipulações do Cubo Cósmico que o Caveira Vermelha usara para colocar o herói na ilha na qual conheceu o Capitão lá atrás na história de 1969.
DeMatteis também trouxe de volta Jack Monroe, o Bucky louco dos anos 1950: Captain America 281, de maio de 1983, mostra Steve e Bernie voltando de um encontro romântico no cinema e sendo perseguidos por Monroe, que diz que foi curado de seu mau pela SHIELD e pede ajuda para se reestabelecer no mundo. Rogers se identifica imediatamente, pois como ele, Monroe está “fora de seu tempo”, sendo advindo da década de 1950, e oferece para que o jovem viva em seu apartamento do Brooklyn, enquanto se reestabelece.
Mas claro que nada seria simples, não é? Vemos em paralelo uma ação de Víbora contra a heroína Mulher-Aranha e sob o comando da vilã, o Constrictor atacando, fazendo Monroe voltar a usar o uniforme de Bucky e tentar ajudar o Capitão, mas o herói termina derrotado e sequestrado e Monroe é deixado para trás. Frustrado, Monroe encontra o uniforme do Nômade na casa de Steve e o veste para derrotar a Víbora, se tornando o novo detentor desse título, levando à vitória na edição 283.

As edições seguintes são mais tranquilas… E enquanto o Capitão precisas confrontar o inacreditável Porco-Espinho, na edição 285, ele também presencia a morte de Jeff Mace, o Patriota, o homem que o substituiu como Capitão América entre 1946 e 1949, o terceiro a ocupar o cargo. Mace sofre de câncer e falece com idade avançada.
O desenhista Mike Zeck permaneceu até a edição 289, e após algumas edições com arte de Ron Frenz (291) e Herb Trimpe (292), Paul Neary se firma como o artista fixo no número 293. Zeck continuaria fazendo grandes trabalhos na Marvel e voltaria à revista em um par de anos para fazer apenas as capas. No meio dessas aventuras um passo importante: Steve Rogers e Bernie Rosenthal ficam noivos na edição 294.
A partir da edição 290, de fevereiro de 1984, DeMatteis iniciou um grande arco em que o Caveira Vermelha se vê envelhecendo rapidamente e prestes a morrer. Então, arma um grande plano final para derrotar o Capitão América, numa história que introduz personagens novos, como a Madame Noite e a filha do Caveira Vermelha, Synthia Schmitd, mais conhecida como Pecado.

Bem ao estilo de histórias interligadas da época, a trama se desenvolve aos poucos, com pistas sendo deixadas aos poucos em cada número. O Capitão enfrenta a Madame Noite primeiro e, enquanto encontra um novo Saltador (edição 291) e o herói indígena Corvo Negro (edição 292), o Caveira Vermelha vai explicitando seu plano: tendo descoberto a identidade secreta do herói, vai – por meio de seus asseclas – atacando os aliados do Capitão e os sequestrando: Nômade, Falcão e até Bernie e Arnie. Enquanto isso, vemos a revelação da origem detalhada do Caveira Vermelha – cujo nome Johann Schmidt é revelado pela primeira vez.
O curioso é que DeMatteis e Neary fazem mistério sobre o rosto do vilão até ele ser revelado em Captain America 297, revelando ao público que o Caveira Vermelha é um velho decrépito!!! Vale lembrar que apesar de algum estardalhaço na época sobre a “revelação do rosto do Caveira”, é de lembrar que isso não era segredo, afinal, na aventura que introduziu o Falcão em 1969, o vilão usara o Cubo Cósmico para trocar de corpo com o herói e Steve age na história com a aparência do vilão e seu rosto. Mas de qualquer modo, aquela era realmente a primeira vez que o Caveira Vermelha tirava sua máscara em uma HQ.

E daí vem também a revelação de seu plano: o Caveira Vermelha mantivera a juventude pelo efeito do gás experimental que foi liberado durante a batalha final contra o Capitão América na II Guerra Mundial, no momento em que Berlim já era bombardeada pelos soviéticos, o que destruiu o bunker do vilão e o deixou soterrado lá. Mas o tal gás o manteve em animação suspensa, do mesmo modo que o herói também ficou na mesma condição ao longo das décadas. Mas os efeitos do gás estava se desfazendo e o Caveira havia envelhecido rapidamente.
Mas ele não queria morrer sozinho, então, desenvolveu um procedimento para envelhecer também o Capitão, na edição 299, e os dois oponentes envelhecidos têm sua batalha final em Captain America 300, de dezembro de 1984. Em vista das condições físicas dos dois, a luta não é longa, e o Caveira Vermelha sofre um ataque cardíaco e morre nos braços de seu inimigo.

O plano original de DeMatteis era fazer o Caveira Vermelha e o Capitão América morrerem em combate no número 300, colocando o herói indígena Corvo Negro (que apareceu na edição 292) para substituir Steve Rogers como o novo Capitão América. A Marvel (na figura do polêmico Editor-Chefe Jim Shooter), claro, não concordou com essa ideia, o final da história foi modificado à força e DeMatteis deixou o título em protesto.
No fim, em Captain America 300, de 1984, o Caveira Vermelha termina morrendo de velhice e ficaria muitos anos afastado das histórias até ser trazido de volta.
Após sair da revista, DeMatteis escreveria grandes clássicos dark para a Marvel, como A Última Caçada de Kraven e A Criança Interior, ambos no Homem-Aranha, embora tenha ficado mais famoso como autor de histórias cômicas na fantástica fase da Liga da Justiça Internacional da DC Comics do final dos anos 1980.
Inicialmente, o substituto de DeMatteis foi Mike Carlin, que inclusive, assina a coautoria da edição 300, por causa das mudanças. Curiosamente, o final da saga só se dá mesmo na edição 301, assinada apenas por Carlin, quando o Capitão precisa enfrentar a fúria das asseclas do Caveira. Mas o escritor ficou apenas alguns números. A arte de Paul Neary era meio desajeitada e não tinha a força expressiva de Mike Zeck, o que foi sentido pelos leitores, mas a título de compensação, John Byrne passou a fazer algumas das capas de Captain America.
A Década de Mark Gruenwald
Aparentemente, Mike Carlin não estava satisfeito escrevendo Captain America, portanto, Jim Shooter fez um arranjo para que aquele e o editor Mark Gruenwald trocassem de lugar e função, de modo que Carlin se tornou o editor da revista e Gruenwald (após cinco anos como editor) assumisse o roteiro.
Nascido em 1953 em Oshkosh, no Wisconsin, Mark Gruenwald era um amante dos quadrinhos que desenvolveu nas habilidades de escrita e desenho e chamou a atenção ao produzir seu próprio fanzine Owniverse, o que o levou a um convite para escrever e desenhar no fanzine oficial da DC Comics, The Amazing World of DC Comics. Por causa disso, ele terminou convidado pelo novo editor-chefe da Marvel Comics, Jim Shooter (que vinha de uma longa carreira na concorrente) para trabalhar como assistente de editor no início de 1978, quando tinha apenas 25 anos de idade!

Mas ele logo começou a escrever também, assumindo a revista da Mulher-Aranha (Spider-Woman dos números 09 a 20, a partir de 1978) e Marvel Two In One (que trazia as aventuras do Coisa com convidados especiais), do número 53 a 72, a partir de 1979. Sua grande oportunidade na escrita veio com a primeira minissérie da Marvel, Marvel Super Heroes The Contest of Champions, que roteirizou ao lado de Steven Grant e Bill Mantlo e foi publicada em 1982. Gruenwald se tornou o editor assistente da revista Captain America em 1980, e em 1982, quando Shooter implementou uma mudança editorial na casa, Gruenwald virou um dos principais editores sêniors (ao lado de Dennis O’Neil), responsável pelas revistas Captain America, The Avengers, Iron-Man, The Mighty Thor, Spider-Woman e What If. Além da organização e do temperamento afável, o principal atributo de Gruenwald era a capacidade de processar informações, o que lhe tornava uma verdadeira enciclopédia viva da cronologia da Marvel e uma mão na roda de todos os escritores que precisavam lidar com anos de histórias pregressas de personagens.
Ainda assim, ele deu passos consideráveis em sua carreira de roteirista, assumindo a minissérie Hawkeye (Gavião Arqueiro), que ele também desenhou, em 1983, e a maxissérie Squadron Supreme, em 1985, antes de se tornar o escritor do Capitão América também, que viria a ser seu trabalho mais conhecido.

A estreia de Mark Gruenwald nos roteiros se deu em Captain America 307, de julho de 1985, iniciando uma longuíssima temporada que se estendeu por dez anos ininterruptos à frente da revista. Após amarrar rapidamente algumas pontas soltas deixadas por Carlin, Gruenwald começou a desenvolver seu estilo, pautado em questões relevantes e temas políticos. Ainda que não fosse intenso e radical como J.M. DeMatteis, Gruenwald manteria o título relevante ao prosseguir essas temáticas.
O escritor precisava preparar a casa para suas ideias e logo na edição 309 se livra do Nômade, que era um parceiro menos fixo do que fora o Falcão no passado, mas ainda assim, uma companhia constante de aventura do Capitão nos anos recentes. Naquele número, Jack Monroe decide fazer jus ao seu nome e parte para girar o país sem rumo e fazendo o bem, aproveitando que ele não conseguiu um emprego fixo em Nova York. Demoraria um par de anos até o personagem reaparecer.
A temporada de Gruenwald começa para valer na edição 310, quando põe em movimento três eventos importantes. Primeiro, Bernie comunica a Steve que quer estudar Direito e vai se matricular na universidade, o que coloca uma sombra sobre o relacionamento dos dois. Na trama, a família de Bernie é obrigada a fechar sua loja de produtos de vidros – por causa dos aumentos exorbitantes dos preços dos alugueis de Nova York (olha vida real batendo a porta). Mas a questão ainda fica em aberto.

O segundo movimento foi dar um emprego fixo a Steve Rogers: após um tempão trabalhando como artista para publicidade, na edição 311, Steve Rogers se torna desenhista do Capitão América na Marvel Comics! O quê? Isso mesmo! Não, não era a quebra da quarta parede como o faria no futuro Deadpool ou Mulher-Hulk: no Universo Marvel existia uma editora em quadrinhos chamada Marvel que publicava aventuras de alguns dos heróis da “vida real”. O artifício – então, já esquecido – fora usado por Stan Lee e Jack Kirby nas velhas histórias do Quarteto Fantástico, para mostrar que o grupo era tão famoso que tinha sua própria HQ.
Também é importante lembrar que nos anos 1960 era muito comum famosos da vida real ganharem HQs inspiradas em si, como o comediante Jerry Lewis, por exemplo. No Brasil, o recurso foi usado à exaustão entre aquela década e os anos 1980, com Trapalhões, Pelé, Ayrton Senna, Xuxa e até Gugu Liberato ganhando suas versões em HQ.
No Universo Marvel era a mesma coisa: a Marvel publicava histórias “fictícias” do Capitão América (ainda que pretensamente baseadas na realidade), criadas com autorização dos Vingadores e baseadas nos arquivos públicos do grupo. Steve Rogers passar a ser o desenhista era apenas um pequeno toque de humor e uma piscadela ao leitor, mas ao mesmo tempo, na lógica da HQ, era um trabalho que ele podia fazer em casa, no seu horário, administrando seus prazos sem interferir tanto em sua carreira de vigilante.

O terceiro evento é a introdução da Sociedade da Serpente, um grupo de vilões com nomes e habilidades de cobras que estavam dispersos entre as revistas da Marvel e que Gruenwald reuniu sob o comando do Coral (Sidewinder), um vilão criado pelo próprio escritor nas páginas da revista Marvel Two in One 64, de 1980, que trazia as aventuras do Coisa, do Quarteto Fantástico. Steve Englehart e Sal Buscema havia introduzido a primeira versão do Esquadrão Serpente em Captain America 163, e Gruenwald havia aproveitado a ideia e criado uma segunda versão em Marvel Two in One 64, reunindo Coral, Anaconda, Princesa Piton e Death Adder. Na trama de Captain America 310, a ideia evolui: o Coral reúne os vilões-serpentes com a ideia de formar uma sociedade formal (como um sindicato), na qual todos os sócios compartilham ganhos e se tornam mais fortes, e ganha adesão de gente como Mamba Negra, Princesa Píton e Cobra, que são alguns dos mais antigos vilões da Marvel (o Cobra, por exemplo, surgira em Journey Into Mystery 98, de 1963, numa aventura do Thor e enfrentara praticamente todos os heróis da editora desde então).
Gruenwald também criou vários vilões novos para compor o supergrupo de vilões, como Rattler, Cottonmouth e Diamondback (Cascavel, no Brasil). Cascavel, cujo o nome é Rachel Leighton, será uma personagem importante na revista do herói nas décadas de 1980 e 1990. Não sabemos se é coincidência, mas a criminosa, introduzida na mesma edição em que Bernie começa a se desligar do Capitão. De qualquer modo, o roteirista estava conscientemente preocupado em criar novos vilões que forjassem uma galeria de inimigos mais digna do herói e depender menos das repetições de nomes como Caveira Vermelha ou Barão Zemo.

Na história da edição 310, o Constrictor também é convidado ao grupo, mas não apenas recusa como ainda o boicota, chamando os Vingadores para prendê-los. Mas cabe ao Capitão enfrentá-los, saindo em combate com Anaconda, Cobra e Rattler.
Matar ou Não Matar?
Outro grande ponto desse primeiro ciclo de Gruenwald foi a introdução do vilão Flag-Smasher (Apátrita, no Brasil), em Captain America 312, de dezembro de 1985. Foi um investimento no tópico político, e uma interessante forma de expor a personalidade do personagem. O Apátrida é apresentado como um anarquista que não acredita na ideia das nações e (como é um terrorista) pretende derrubá-las, o que vai de confronto direto à ideia de um Capitão América.

Porém, ao mesmo tempo, a história deixa muito claro que Steve Rogers não era um alienado ufanista, mas alguém que buscava um ideal de liberdade, intrinsicamente associado ao povo americano, mais do que ao Estado ou aos governos. Esse seria um tópico que o escritor desenvolveria diversas outras vezes no futuro.

Outro ponto importante dessas histórias foi a criação da Linha Direta (Hot-line) do Capitão América. Nas trama que vinha desenvolvendo desde o início de sua temporada, Gruenwald apresentava que o Governo dos EUA havia percebido da ausência de pagamentos e indenizações a Steve Rogers pelo período em que ficou em animação suspensa ou mesmo quando regressou à vida. Assim, como forma compensatória, o herói recebe 1 milhão de dólares de indenização, o que era muito dinheiro mesmo em 1985. Com isso, também na edição 312, o Capitão decide montar a Linha Direta, uma comunicação telefônica em rede para que o herói fosse comunicado de crimes e pudesse agir. Uma central telefônica ligada a computadores gerava relatórios que eram transmitidos para uma pasta com um terminal móvel (equivalente aos notebooks de hoje), que ele carregava consigo e deixava em seu furgão.
Vale lembrar, era uma época na qual a internet ainda não tinha uso doméstico, e portanto, era um movimento bastante avançado. A Linha Direta seria algo importante nas aventuras pelo restante dos anos 1980, antes de ser abandonada por ficar obsoleta pelo avanço da tecnologia do mundo real.

A subtrama da Sociedade da Serpente continuaria a se desenvolver na revista, com o grupo saindo atrás de eliminar MODOK na edição 313, por exemplo, (no que são bem sucedidos), colocando o grupo contra a IMA, e na edição 315, o Capitão descobre que o Porco-Espinho pretende vender sua armadura para deixar a vida de crimes e se oferece para comprá-la, desde que ele o ajude em uma armadilha contra a Sociedade: o Porco-Espinho finge ter capturado o herói e alguns membros do grupo vão pegá-lo, iniciando uma luta. Infelizmente, ao tentar fugir e se esconder, o Porco-Espinho (sem sua armadura) tropeça e é furado por uma de suas lanças no coração, morrendo imediatamente.
É importante salientar, contudo, que o número 315 traz a primeira vez que Cascavel aparece em uma capa e também a primeira vez que ela enfrenta o Capitão América. Essa história já deixa explícito que Rachel Leighton é gamada no herói e se imagina vivendo com ele uma história de amor, embora saiba que sua carreira criminosa é um empecilho.

Seguem dois números agindo ao lado de seu parceiro vingador Gavião Arqueiro (edições 316 e 317). No meio disso, na primeira, Bernie conta para Steve que realmente decidiu estudar Direito na Universidade de Wisconsin e que precisava tocar a própria vida e ter uma carreira (afinal, ela é uma mulher moderna) e não pode ficar apenas “pageando” o Capitão América ou mesmo administrando a Linha Direta, algo que ela chegou a fazer por alguns números. Mesmo dolorido emocionalmente, Steve concorda que é a melhor decisão para ela. A festa de despedida dela ocorre na edição 317, mas o herói não comparece, porque está se aventurando com Clint Barton, e termina encontrando o apartamento dela vazio e uma carta de despedida. É o fim definitivo do romance do casal.
Os dois permaneceriam como amigos íntimos por muitos e muitos anos, mas nunca retomaram o romance. Nosso herói, por sua vez, ficaria solteiro por um longo período…
Ademais, o fim do romance também encerra a Fase do Brooklyn para Steve Rogers. Já nas edições seguintes ele deixará o apartamento na Leaman Place que vivia desde a edição 237 para voltar a morar na Mansão dos Vingadores.

Depois, o Capitão tem uma batalha definitiva contra o Scourge (Carrasco do Submundo, no Brasil), um serial killer que vinha matando vilões secundários da Marvel em várias revistas da editora na época. A batalha prossegue nas edições 319 e 320, terminando em agosto de 1986, na qual o assassino termina morrendo. Ele havia matado nada menos do que 29 criminosos nos meses anteriores.
Em seguida, Gruenwald e Neary apresentam aquela que, provavelmente, foi a mais importante história da dupla: o retorno do Apátrida, que sequestra um grupo de turistas nos alpes em meio às suas ações anarquistas-terroristas. Novamente, os discursos dos personagens são apresentados e é reforçada a ideia do Capitão como alguém crítico e consciente politicamente e não um ufanista.

Mas o elemento mais importante da trama se dá na edição 321, de setembro de 1986: os capangas do Apátrida encurralam os reféns em uma caverna e um deles decide abrir fogo contra eles. Desesperado para impedir a matança de inocentes, o Capitão não tem outra opção senão pegar uma metralhadora e derrubar o criminoso, o matando deliberadamente. Essa decisão irá perseguir a consciência de Rogers pelos vários meses à frente. A estonteante capa é de Mike Zeck, que a partir daqui se torna o principal capista da revista, ainda que Neary continue com sua arte meio desajeitada nas histórias.
O Super-Patriota
Outro passo importante acontece em Captain America 323, de novembro de 1986, na qual é introduzido o Superpatriota (John Walker), um herói patriótico, mas com ideais conservadores. Gurenwald apresenta o Superpatriota exatamente como a imagem que o público (desinformado) tem do próprio Capitão América (de direita, cristão, ortodoxo, machista e xenófobo) e o contraponto dos dois serve, de novo, para mostrar que Steve Rogers é muito diferente de tudo isso.

Na trama, o Superpatriota – que tem uma superforça capaz de levantar 10 toneladas e ganhou esses poderes por meio do Mercador do Poder, que vendia o procedimento de dar superforça às pessoas em um experimento mais ou menos seguro – enfrenta os Buckies, que têm ideais similares, mas métodos mais extremos. Porém, no fim das contas, será revelado que Walker e os Buckies (Jerome Johnson, Hector Lennox e Lamar Hoskins) são parte do mesmo time e armaram a luta para chamar a atenção a si próprios, parte de uma estratégia de marketing do empresário deles, Ethan Thurm.


Os caminhos do Superpatriota e do Capitão América se cruzam em definitivo na edição 327, de março de 1987, quando os dois lutam. Contudo, de modo surpreendente para os leitores, John Walker vence a luta: ele é mais jovem e mais forte. Mas não é um vilão. A luta é mais uma discussão política – com o Superpatriota dizendo que é o que “a América precisa”, e no fim vai embora.

Mas a história do Mercador de Poder requer uma investigação, não é mesmo? Então, na edição 328, o Capitão vai à Unlimited Class Wrestling (Federação de Luta-Livre Peso Ilimitado), que é formada apenas por superhumanos (e tinha sido introduzida nas aventuras do Coisa escritas por Gruenwald), e conhece Dennis Dunphy (que tinha aparecido em The Thing 28, de 1985), que agora usa uniforme e máscara e a identidade de Demolição (Demolition-Man, no original, ou D-Man), que é seu grande fã e vai ajudá-lo na busca, que os leva a Los Angeles (edição 329), onde encontram os refugos dos experimentos que deram errado e, no número 330, descobrem que o tal Mercador do Poder é Curtiss Jackson, um dos líderes da antiga Corporação.
Um detalhe importante é que a edição 329 também é o último número com a arte de Paul Neary, que comandou a revista por nada menos do que quase 40 edições, um longo tempo para um artista aquém do nível que o herói mereceria. No número 330 estreou Tom Morgan, que ficaria por um breve período. As capas continuavam com Mike Zeck.
Esse ciclo intermediário da fase de Gruenwald se encerrou na edição 331, na qual o Capitão enfrenta o G.I. Max, uma tentativa de recriação do soro do supersoldado pelos militares que dá terrivelmente errado e deixa o operativo completamente maluco.
Uma Nova Grande Fase: O Novo Capitão América
Após essa primeira rodada de histórias, que ditou o tom, Mark Gruenwald deu início a uma nova grande fase do personagem, o que foi gradativamente aumentando as vendas da revista e tornando o personagem cada vez mais relevante no panorama da própria Marvel.
Tudo começa em Captain America 332, de agosto de 1987, por Gruenwald e Tom Morgan assumindo a arte. Na trama, após o combate com o G.I. Max, o Capitão América vai ao Pentágono conversar com o general Wexler, responsável pela divisão de pesquisas e tomar alguma satisfação. (Não era a primeira tentativa de recriação do soro recente: no ano anterior, o operativo Bazuca tinha entrado numa insana batalha contra o Capitão e o Demolidor na clássica história A Queda de Murdock, do homem sem medo, por Frank Miller e David Mazzuccheli).

O general Wexler é escorregadio e Rogers é convocado pelo FBI a se apresentar à Comissão Especial de Assuntos Superhumanos do governo, cujos os membros não são tão bem detalhados, apenas o general Halstan, os chefes do FBI e CIA, o assessor Peter Henry Gyrich (o contato direto entre os Vingadores e o governo nas aventuras do grupo) e Valerie Cooper, uma coadjuvante das histórias dos X-Men, na qual ela é responsável pela Força Federal, um time de operativos do governo que são criminosos (na verdade, a velha Irmandade de Mutantes liderada por Mística) cujas as ações podem reverter em reduções de penas. A Comissão lhe comunica que como o Capitão América foi criado pelo governo em um experimento científico para ser um supersoldado e que o contrato assinado por Steve Rogers em 1941 não estipulava um prazo final das atividades, ele deveria voltar imediatamente a “servir o país” e ter suas funções e missões estabelecidas pela Comissão.

Rogers pergunta: “e se eu me recusar?”. A resposta: ele deveria devolver o uniforme, o escudo e o título Capitão América. Com 24 horas para pensar, Rogers percebe que seria mandado para derrubar governos de países da América Latina e coisas do tipo, então, recusa a oferta e devolve aqueles itens.
Enquanto isso ocorre, o Superpatriota impede um atentado em Washington-DC e vira notícia nacional pela primeira vez, indo a programas de TV e coisas do tipo. Então, na edição 333, a Comissão o escolhe para ser o Novo Capitão América, e John Walker aceita, começando um intenso treinamento para substituir seu antecessor, o que inclui lutar contra membros da Força Federal, os agentes com armadura dos Guardiões da Gruta (uma prisão para supercriminosos) e, já na edição 334, o Treinador, um vilão surgindo nas histórias dos Vingadores. Nessa edição, o governo também dispensa o empresário de Walker e dos Buckies aprova apenas Lamar, que se torna o Novo Bucky, com um uniforme igual ao do antigo parceiro do herói.

A estreia em campo do novo Capitão América se dá na edição 335, na qual Walker precisa se infiltrar dentro dos Cães de Guarda, uma organização ultraconservadora que vem realizando atos terroristas pelo Sul do país e é enviado justamente para sua região natal, em Custer’s Grove, na Geórgia. Essa edição é boa para aprofundar um pouco a personalidade do personagem, mostrando que Walker concorda com a moral conservadora da organização criminosa, embora não de seus métodos violentos. Isso coloca algum grau de dilema em sua ação, pois não só está combatendo algo que acredita, como sabe que poderá ter que prender algum conhecido. Algo que realmente acontece.
No fim, o novo Capitão América é bem sucedido em sua missão e a edição 336, de dezembro de 1987, mostra que caçar os Cães de Guarda se tornam sua missão prioritária e é o momento em que ganha notoriedade da imprensa e do público… que ainda não sabem que ele não é o herói original.
Mas nesse ponto você deve estar se perguntando: onde está Steve Rogers? Os leitores faziam a mesma pergunta e após estar completamente desaparecido por nada menos do que quatro números completos, nosso herói reaparece (barbado!) justamente na edição 336, e ficamos sabendo que ele acompanha os feitos do Novo Capitão América pela TV enquanto roda pelo interior dos EUA buscando se reconectar com o país e seu povo e estando naquele momento no estado de Washington, no sudeste do Pacífico. Também sabemos que ele se demitiu do trabalho de desenhista da Marvel Comics. Passaram-se mais de 8 semanas desde que devolveu o uniforme e o escudo e já tinha atravessado praticamente todos os estados da nação, e termina enfrentando um terrorista ambiental, o Irmão Natureza, que tem poderes elementais relacionados ao clima e aos animais. A aventura coloca Rogers sobre o dilema parecido com o de Walker, de enfrentar um homem no qual concorda com os ideais, mas discorda do método. E começa a pensar sobre como deve agir em relação à Lei.

Ao mesmo tempo, somos informados que o Demolição (que ficou encarregado da Linha Direta) reuniu o Nômade e o Falcão para saírem em busca de Rogers, e que um grupo de criminosos com temática de serpente – Mocassino, Mamba Negra, Uruntu e Jararaca – promovem um grande assalto a um cassino de Las Vegas. É a passagem para Captain America 337, de janeiro de 1988, quando o trio Falcão, Nômade e Demolição se unem a Steve Rogers e esse ganha daquele último um novo uniforme nas cores preto, vermelho e branco para voltar à ativa. Rogers aceita e passa a responder pela alcunha de Capitão, somente.
A primeira missão do quarteto é justamente combater o quarteto de serpentes em Las Vegas, mas Rogers descobre que sem as prerrogativas especiais do Capitão América (e seu cartão de membro dos Vingadores), não lhes é permitida pela polícia a ação, o que lhe obriga a descumprir a lei e ir enfrentar os criminosos mesmo assim. Com algum trabalho eles são bem-sucedidos, mas o dilema tem um peso na consciência do herói e resulta que, na edição 338, eles são presos do mesmo modo que os bandidos. Porém, eis que o Coral, líder da Sociedade da Serpente, se teleporta à cadeia e liberta o quarteto de criminosos, convidando-os a tomar parte de seu grupo. Capitão e seus amigos não conseguem impedi-los e ficam em maus lençóis com a polícia.

Ao mesmo tempo, vemos outra missão de Capitão América e Bucky contra Maxwell Powers, um antigo vilão dos Novos Defensores. Dessa vez, a missão não é lá muito bem sucedida, pois tomado de ódio na batalha, John Walker termina esmurrando o criminoso até a morte. Ele fica mal com isso, pois percebe que o velho Capitão jamais faria aquilo.
Do ponto de vista editorial, é bom pontuar que a edição 337 foi a despedida de Tom Morgan da revista. Embora fosse um grande avanço em relação ao antecessor Paul Neary, a arte de Morgan também tinha problemas de movimento e de proporção, embora – verdade seja dita – ele era excepcional nos retratos de rosto e expressões faciais, como poucos de sua geração. Morgan passou ao nanquim na edição 338, que trouxe a estreia do desenhista Kieron Dwyer, um artista excelente, com uma arte dinâmica e expressiva, que ficaria um bom tempo na revista e trouxe a grandeza artística que essa nova fase do herói merecia.

Dwyer vinha de uma família artística: nascido em 1967, seus pais, William Dwyer e Andrea Baun eram atores de teatro em Chicago, mas a grande virada de sua vida foi que, após o divórcio deles, sua mãe se casou com ninguém menos do que o superastro dos quadrinhos John Byrne, quando o pequeno Kieron tinha apenas 13 anos. Byrne incentivou os talentos do rapaz e conseguiu o primeiro trabalho profissional dele, uma história em Batman 413 da DC Comics. Não demorou nada e Dwyer foi contratado pela Marvel justamente para assumir Captain America, quando tinha apenas 21 anos de idade!
Captain America 339 é um número de crossover, a nova política editorial da Marvel – comandada pelo editor-chefe Tom DeFalco – de interligar cada vez mais as revistas da editora por meio de grandes eventos. Naquele momento, ocorria A Queda dos Mutantes, uma saga dos X-Men e seus derivados, e a trama do sentinela da liberdade cruza discretamente com ela, quando Capitão, Falcão, Nômade e Demolição enfrentam Fome, uma dos Cavaleiros do vilão Apocalipse. O Capitão América e Bucky são designados para a mesma missão, mas quando chegam lá o confronto já terminou. Um detalhe dessa edição é que a partir daqui, as capas deixam de ser de Mike Zeck e passam para Ron Frenz, que tinha trabalhado com o Homem-Aranha e ilustrava o Thor.

Mas o mais importante desse número está em suas páginas finais: Steve Rogers vai a Los Angeles e pede ajuda ao seu velho amigo, Tony Stark (o Homem de Ferro) para que produza para ele um novo escudo. Desconhecendo a revolucionária técnica que produziu o escudo original com uma liga que combinava adamantium e vibranium, Stark produz um escudo apenas de adamantium, que ao passo que é indestrutível, não tem as capacidades absorventes de energia cinética do original. O novo escudo é totalmente prateado (sem pintura), reproduz exatamente as medidas do original e é aprovado por Rogers.
Todavia, há uma pegadinha: naquele momento (outro crossover) transcorria o arco Guerra das Armaduras (Armor Wars), na qual Stark descobrira que a tecnologia do traje do Homem de Ferro havia sido roubada por um criminoso e vendida a inúmeros vilões. Disposto a reaver o segredo de sua criação, Stark toma a decisão radical de eliminar o equipamento de todos esses vilões, saindo numa caça algo transloucada contra uma série de inimigos de armadura – como Controlador, os Caçadores, Metaloide… – e que culmina na morte do vilão Homem de Titânio em decorrência das ações de Stark. Mas sabendo que tinha licenciado parte de sua tecnologia às forças legais no passado, Stark decide eliminar essas também, para que não caíssem nas mãos erradas, o que já o tinha colocado contra os Mandroides da SHIELD, o que tornou oficialmente o Homem de Ferro um fora da lei. (Na época, vale lembrar, Stark ainda mantinha uma identidade secreta e uma pessoa como Nick Fury, por exemplo, não sabia que ele e o Homem de Ferro eram a mesma pessoa).

Então, para compreendermos os eventos é necessário nos deslocarmos à revista Iron-Man 228, de março de 1988, por David Micheline (roteiro), Mark D. Bright (arte) e Bob Layton (argumento e nanquim), na qual Stark empreende o seu mais ousado e custoso golpe: incapacitar as armaduras dos Guardiões da Gruta. Tendo tomado a notícia dos eventos recentes, Steve Rogers percebe qual o próximo passo e pede ao amigo que não faça isso. Mas ninguém diz a Tony Stark o que fazer, não é? E com a ajuda de seu fiel amigo James Rhodes, o Homem de Ferro invade a Gruta (prisão para supercriminosos) e começa a incapacitar os Guardiões, o que o leva a uma luta contra o Capitão.
No fim, o Capitão abre a guarda para salvar um dos Guardiões e é incapacitado pelo Homem de Ferro por meio de um choque elétrico de baixa amperagem que o deixa paralisado. O olhar dos dois ex-amigos se cruza, marcando praticamente o fim de uma amizade.

E a ação do Homem de Ferro tem consequências: de volta a Captain America 340, cinco supercriminosos conseguem escapar: Mr. Hyde, Titânia, Grifo, Vibro e o Armadilho, obrigando Capitão, Falcão, Nômade e Demolição a sair no encalço deles. A batalha revela algumas coisas dos personagens: Falcão nobre como sempre; enquanto o Nômade termina por matar o Vibro, derrubando-o da montanha; e o Demolição se mostra um covarde – ao encontrar Titânia, não se prepara bem e é lançado por ela para a morte montanha abaixo, até ser salvo pelo Falcão, que o uso para derrotar o Grifo, mas depois, Demolição reencontra Titânia, com medo de enfrentá-la de novo e deixando claro que tem o coração fraco e que pode morrer de um ataque cardíaco em situações de muito estresse.
Ao Capitão cabe o pairo mais duro de vencer Mr. Hyde e o Armadilho é convencido a se entregar sem luta pela Andarilha, a namorada do Nômade, que vinha acompanhando todas essas aventuras. Titânia consegue escapar.

A traição do Homem de Ferro não poderia ficar sem um revide, não é mesmo? Então, ele vem na edição 341, na qual Gruenwald e Dwyer promovem uma criativa exposição: a revista é dividida em três capítulos mais ou menos independentes entre si, em vez de uma trama cruzada. No primeiro, vemos o Capitão invadir a casa de Tony Stark para lhe devolver seu escudo e levá-lo preso, com os dois brigando, mas claro, Rogers não tinha como vencer aquela armadura num espaço confinado de uma casa e sem machucá-lo: Stark foge e diz que, quando terminar essa sua missão, virá ao encontro de Rogers para os dois discutirem ética. O Capitão fica no dilema de embarcar em uma missão de rastreá-lo (algo que consumiria muito tempo e esforço) ou esperar pelo momento prometido, e opta pela segunda opção.
Este pequeno arco tem uma grande importância, afinal, estabelece uma fundamental diferença moral entre Rogers e Stark que continuará a ecoar pelas décadas seguintes de histórias – como nos arcos futuros como Operação Tempestade Galáctica ou Guerra Civil – e algo que seria apropriado pelo cinema, também. De fato, a partir daqui, os dois serão retratados como amigos-rivais numa dinâmica similar a de Superman e Batman pós-Crise nas Infinitas Terras.

O segundo capítulo é o ponto de virada para John Walker. Primeiro, ficamos sabendo que Lemar Hoskins deixou de ser o Bucky e adota um novo uniforme e codinome: Estrela Negra (ou Battlestar, no original). O motivo é o mesmo do mundo editorial: uma reação do público àquela troca (um negro usando a identidade de um jovem branco) e o fato do termo “bucky” ser usado de maneira depreciativa para os negros em alguns lugares dos EUA. Em seguida, é o grande momento da dupla: uma coletiva de imprensa em Washington-DC na qual será revelado que aquele se trata de um novo Capitão América, e não mais o herói original que todos conheciam.

O discurso do novo herói ao público e imprensa é mentiroso: ele diz que o antigo Capitão se aposentou (de livre vontade) e o escolheu como substituto, mas ninguém na plateia tem motivos para desconfiar. O bom momento, contudo, é estragado com a entrada em cena de seus ex-aliados, Jerome Johnson e Hector Lennox, agora, sob as alcunhas de Direitista e Esquerdista (patrocinados ainda por Ethan Thurm), que de microfone em mãos anunciam para todo o mundo que o novo Capitão América é John Walker de Custer’s Grove, Geórgia. Os heróis os derrubam antes que revelem a identidade de Lamar, mas o estrago está feito.
O terceiro capítulo dá início a subtrama que irá movimentar a revista no próximo ciclo: Coral apresenta o quarteto que resgatou da cadeia ao restante da Sociedade da Serpente, mas os novos membros fazem parte de um embuste: infiltrar Víbora – sim, ela mesma, a antiga Madame Hidra – na organização e tomar o posto do líder Coral. O vilão fica gravemente ferido e auxiliado por uma das membras do time, Cascavel (Diamondback), que diante do amigo à beira da morte e sem saída não vê outra alternativa do que ligar para a Linha Direta do Capitão América.

É apenas o gancho para uma história em três partes bastante interessante, entre Captain America 342 e 344, na qual o Capitão ganha um novo escudo – nas mesmas cores de seu novo uniforme – de presente do amigo Pantera Negra (e por isso é feito inteiramente de vibranium e com algumas características distintas do original, como ricochetear bem menos, porque o metal especial absorve energia cinética, ainda que continue sendo indestrutível) – e atende ao chamado da Cascavel, impedindo a matança de Víbora no QG da Sociedade da Serpente, mas ao ainda precisando perseguir a vilã e seu misterioso plano ao lado daqueles que se aliaram a ela. Em paralelo, vemos outra desastrosa missão do Capitão América e Estrela Negra contra um grupo chamado Resistência Mutante.

O grande plano de Víbora finalmente é revelado na edição 344: o envenenamento da água de Washington-DC com uma fórmula que transforma as pessoas em seres reptiloides assassinos e, além do caos generalizado na cidade, seu alvo prioritário é o presidente (desenhado com as feições de Ronald Reagan), mas Steve Rogers consegue salvar sua vida e entrega Víbora à polícia. Mas infelizmente, o Capitão América e Estrela Negra conseguem capturar Demolição, Nômade e Cascavel, que ficam presos sob o controle da Comissão.
A virada final de todo esse arco começa então na edição 345, de setembro de 1988, na qual começamos a ver algo verdadeiramente maligno nas ações de Douglas Rockwell, o presidente da Comissão; o Falcão pedir para voltar a Nova York, pois o Harlem precisa de sua ajuda; e a Andarilha chegar junto ao Coral para libertar Demolição, Nômade e Cascavel. Mas o Demolição se recusa a ir embora (porque não seria isso que Steve faria) e a Andarilha escolhe ficar por lá também (porque ela também se interessou pelo herói), mas o Nômade decide fugir com Coral e Cascavel. Mais tarde, um totalmente bêbado Jack Monroe conta a Steve o que aconteceu e o Capitão decide se apresentar à Comissão e termina preso.
Mas o mais importe da fatídica edição é que os Cães de Guarda sequestram os pais de John Walker – agora que sua identidade é pública – e lhe armam uma cilada. O novo Capitão América se deixa render até ter certeza de que os pais estão bem e tenta se soltar para combatê-los, numa desastrosa ação que resulta em seus pais serem fuzilados no fogo cruzado.

A morte dos pais deixa Walker completamente fora de si, como mostra a edição 346, na qual ele e Estrela Negra auxiliam a Força Federal na captura da Resistência Mutante e resulta em mais mortes por suas mãos. E descobrimos que Rockwell responde a um superior misterioso… fumando uma piteira! (Quem? Quem?). E o número 347 mostra que Walker tem um plano de vingança: após ameaçar os pais de seus ex-amigos Esquerdista e Direitista, os atrai para uma luta e os deixa amarrados em uma explosão de um tonel de combustível. (A edição seguinte revela que eles sobreviveram com queimaduras em 90% do corpo). Ainda vemos outros diálogos explicitamente malignos entre Rockwell e seu chefe misterioso e Steve Rogers percebendo que está preso há dias, sem comunicação, sem advogado, ou seja, com seus direitos civis desrespeitados, se questionando que a Comissão não parece estar agindo na risca da lei, como ele pensava. E de brinde, o Carrasco do Submundo mata Albert Malik, o homem que fora o Caveira Vermelha dos anos 1950.

Na edição 348 temos o retorno do Apátrida, mas agora, fugindo pelo Ártico dos homens de sua própria organização, o Ultimato, porque acredita que eles se venderam e a burlesca cena em que a Comissão comunica John Walker de que ele não pode mais ser o Capitão América por causa de seu descontrole e são interrompidos sem aviso pela chegada de ninguém menos do que o Presidente (Reagan), que (desinformado dos eventos recentes) parabeniza Walker pelo trabalho e pede que continue. Também descobrimos que ele não sabia da substituição de Steve Rogers – esclarecendo, portanto, que não tem envolvimento no plot – e quando é informado de que Rogers está preso acusado de atacá-lo na noite das serpentes, o presidente diz que lembra que um fantasiado salvou sua vida e se aquele era Rogers ele merece uma medalha, não a prisão.

A visita deixa a Comissão com duas batatas quentes nas mãos: soltar Rogers e continuar com Walker, o que é arriscado em vista de que haverá eleições e uma nova administração a caminho, trazendo o risco político à própria Comissão. Então, enviam Walker na missão contra o Apátrida, enquanto discretamente abrem a porta da cela de Rogers e o deixam ir embora. Walker e Estrela Negra são derrotados pelo vilão, que exige que este volte e traga o verdadeiro Capitão América para falar com ele, o que ocorre na edição 349, quando Estrela Negra se une com Capitão e Demolição e retornam ao Ártico e o Apátrida diz que traiu sua organização porque ela estava sendo financiada pelo Caveira Vermelha e que precisavam desativar uma bomba poderosíssima de pulso eletromagnético, o que conseguem ao aparente custo da morte do Demolição.

Todo o longo arco do novo Capitão América se resolve na comemorativa Captain America 350, de fevereiro de 1989, culminância de praticamente dois anos de trabalho de Gruenwald. A capa entrega logo: a batalha entre Capitão e Capitão América e o retorno do Caveira Vermelha! Na trama, o comportamento de Douglas Rockwell já deixou claro aos seus colegas da Comissão que ele está incorrendo em irregularidades, o que leva seu chefe a considerá-lo inútil, mesmo no momento em que Steve Rogers chega para lhe pagar uma “visita” e devolver o escudo de Walker que usou na última missão. Desconfiado com a chamada em vídeo do misterioso homem, Rogers começa a interrogar Rockwell, mas ele é atingido por um pó vermelho e seu rosto é mumificado tal qual as antigas vítimas… do Caveira Vermelha.
O Capitão rastreia a chamada até o prédio da Smith Guard ali perto e é para lá que John Walker também é atraído. O homem que tem a aparência muito similar a Steve Rogers se apresenta a Walker e revela que estava por trás de todas as tragédias dele: a Resistência Mutante, o Ultimato, os Cães de Guarda… E após enfrentar uma amostra desses operativos, eis que o Capitão chega lá e temos a acirrada luta entre os dois capitães, com Walker ensandecido e Rogers precisando se provar, pois pensa que desde que não conseguira vencer o Superpatriota havia perdido o pique para lutas.

Rogers vence e tem um embate (apenas verborrágico) com o homem que diz ser o Caveira Vermelha, mas ao tentar envenenar o herói com o gás, o próprio vilão tem o rosto mumificado, mas não morre. (Dali em diante, o vilão não usará mais máscara, a caveira vermelha será seu próprio rosto). No fim, ambos capitães se apresentam à Comissão e eles decidem devolver o uniforme, o escudo e o título de Capitão América para Steve Rogers, mas ele recusa, afirmando que aprendeu que pode continuar seu trabalho sem aquilo, mas o próprio Walker o convence a aceitar e fazer o trabalho que somente ele pode: ser o sentinela da liberdade.
Então, Rogers aceita e reassume seu papel.
Como bônus aos leitores, a edição 350 ainda traz uma história secundária, escrita por Gruenwald e com a arte maravilhosa de John Byrne, na qual descobrimos que a mente de Johann Schmidt (o Caveira Vermelha) agora habita um clone do próprio Steve Rogers, por obra do cientista Armin Zola. E ao mesmo tempo é uma desculpa para fazer uma retrospectiva completa da vida do vilão.
Ossos Cruzados, Caveira Vermelha e Cascavel
O Capitão América entra em uma fase totalmente nova dali em diante, começando a ingressar na década de 1990 e sentir as grandes mudanças geopolíticas que ocorriam no mundo, incluindo o fim da Guerra Fria com a Queda do Muro de Berlim, em 1989, a unificação da Alemanha em 1990 e a dissolução da União Soviética em 1991.

Em Captain America 351, de março de 1989, continuando com Mark Gruenwald e Kieron Dwyer, as coisas começam ligeiramente mornas, com Nick Fury solicitando o auxílio do Capitão América para desativar uma base da SHIELD que foi corrompida por agentes mal intencionados. Era o aceno (outro crossover) à maxissérie Nick Fury versus SHIELD que começara a ser publicada na época e mostrava o líder da organização precisando desmontar a própria agência para eliminar uma facção corrupta que tomou o controle.

Mas o grande lance da edição era com os coadjuvantes John Walker, Lemar Hoskins e a Comissão de Atividades Superhumanas. É realizada uma entrevista coletiva para anunciar que Walker não é mais o Capitão América e que o uniforme e o escudo retornaram ao seu usuário original e que ele irá servir o país de outra forma. Mas Walker termina assassinado publicamente por um membro dos Cães de Guarda, para o escândalo de Lamar e Valerie Cooper.

As edições 352 e 353 começam a mostrar as mudanças políticas do mundo, com evidências da desintegração da União Soviética expressa por meio da deserção de parte dos Super-Soldados Soviéticos (um grupo de heróis russos que apareciam nas revistas dos Vingadores e do Homem de Ferro desde os anos 1970) por meio dos membros Vanguarda, Darkstar e Ursa Maior, ao passo que são perseguidos por outros membros do grupo, que termina sendo renomeado de Sovietes Supremos. O trio é acolhido na base dos Vingadores pelo Capitão América, mas ainda assim são brutalmente atacados pelos compatriotas, o que leva o sentinela da liberdade a Moscou para combatê-los.

Em paralelo, continuamos acompanhando o Estrela Negra, que vai investigar a morte de seu amigo e começa a achar uma série de elementos suspeitos, inclusive, que o agente dos Cães de Guarda e a arma usada eram falsas! Ele comunica Valerie Cooper dessas informações e os dois descobrem, em Captain America 354 que Walker está vivo: a morte foi uma farsa tramada pelo general Haywerth, o novo líder da Comissão para “limpar” Walker de suas desastrosas ações recentes. Ele fez uma ligeira cirurgia plástica e adotou o nome de Jeff Daniels (sim, outro whisky!) e agora usa o uniforme preto do Capitão e o escudo de Wakanda sob o nome Agente Americano (US Agent) para cumprir as missões que a Comissão precisa que ele realize. E não somente isso, muito em breve o Agente Americano também seria colocado – imposto pela Comissão – como um dos membros dos Vingadores da Costa Oeste, tornando Walker/Daniels tecnicamente um vingador. E pelas mãos de John Byrne a partir de West Coast Avengers 44.
E de volta ao foco, a mesma edição 354 ainda traz o retorno do Mecanus (Machinesmith) para confrontar o herói titular. A história também serve para introduzir um time de ex-agentes da SHIELD que, em consequência da queda da agência naquela história de Fury, passar a trabalhar como um tipo de corpo técnico de apoio dos Vingadores e, consequentemente, passam a aparecer também em Captain America. Esse time tem Peggy Carter (sim, ela mesma!), Michael O’Brian, Fabian Stankowics e o piloto John Jameson – este, filho do editor J.J. Jameson das histórias do Homem-Aranha.
Há de se lembrar que, nessa época, o escritor Mark Gruenwald também era editor da revista Avengers, o que o fez aumentar consideravelmente a conexão entre esta e Captain America, como na partilha desses personagens. De qualquer modo, o quarteto citado iria aparecer por vários meses como coadjuvantes aqui na revista do Capitão, apoiando suas missões.
Na edição 355 tem-se início um pequeno arco, escrito por Gruenwald, mas com a arte migrando temporariamente para Al Migrom, no qual Bernie Rosenthal telefona para Steve pedindo sua ajuda num caso: uma jovem chamada Jennifer, amiga da família dela desapareceu e a polícia não consegue pistas. O Capitão se envolve e rapidamente percebe que adolescentes vêm desaparecendo às dezenas nas pequenas cidades da região sul dos EUA e, então, o herói pede a membra dos Eternos, e agora também dos Vingadores (outra conexão), Sersi, que use seus poderes para transformá-lo em um adolescente, de modo que possa se infiltrar na região e descobrir o que está acontecendo. Sersi reduz Steve até os 15 anos de idade, e em consequência, ele perde os efeitos do soro do supersoldado em seu corpo, mas segue assim mesmo em sua missão.

Ao longo das edições 356 e 357, o pequeno Steve descobre que as Irmãs Pecado – a filha do Caveira Vermelha (Synthia Schmidt, a Pecado), Madre Noite etc. – criaram um grupo de ódio e fascista que recruta jovens e realiza um tipo de condicionamento mental por meio de técnicas de lavagem cerebral para causar uma revolta conservadora e assassina com os jovens. A trama não é tão bem conduzida dessa vez e os desenhos de Migrom não ajudam, mas o tema é interessante, e infelizmente, continua a ressoar nos dias de hoje…
De modo secundário, aquelas três revistas também mostravam as consequências do “retorno” do Agente Americano, suas primeiras missões, enquanto o Estrela Negra tenta se reconectar com o velho amigo, o que o leva a uma ação conjunta com Falcão, que gerou a bela capa da edição 355 por Ron Frenz de novo mimetizando o estilo de Jack Kirby como tinha feito seis meses antes.

Ambas as tramas se encerram na edição 357, de setembro de 1989, com uma novidade: Captain America passa a ter uma história secundária. Neste primeiro número, após a conclusão da trama das Irmãs Pecado, Kieron Dwyer retorna à arte para criar o prólogo do que será o próximo arco da revista: A Caçada à Joia de Sangue (The Bloodstone Hunt): na trama, o Barão Zemo está atrás da poderosa Joia de Sangue, que pertenceu a Ulysses Bloodstone (um personagem da Marvel dos tempos da pré-história) e que pode conferir grandes poderes ao seu usuário. Zemo usa a Brigada de Batroc, liderada pelo mercenário francês mais outros dois bandidos, Zaran e Machete. Quem descobre isso é Rachel Leighton, a Cascavel, que corre atrás do Capitão para avisá-lo desse perigo.

Para dar um ar de “nova fase”, esse arco inaugura uma mudança no cabeçalho da revista, com o quadro à esquerda do título passando a ostentar a imagem do Capitão ao lado de Cascavel, como forma de torná-la uma participante fixa da revista dali em diante, iniciando formalmente a parceria que os dois montariam por um bom tempo.
Ainda desconfiado de seu passado criminoso, o Capitão lhe dá um aviso na edição 358 para que ela não tente nenhum truque, mas de fato, Cascavel está mesmo bem-intencionada, apaixonada pelo herói e disposta a ser uma mulher melhor. The Bloodstone Hunt resgata a estrutura de filmes de aventura como Indiana Jones e seus imitadores (Tudo por uma Esmeralda, A Joia do Nilo etc.), muito em voga naqueles tempos, e termina funcionando como uma história divertida e descompromissada. Os heróis e os vilões viajam à América do Sul, onde pode estar a Joia e terminam capturados por uma civilização Inca que vive escondida na Floresta Amazônica, enquanto Zemo parece cada vez mais obcecado e Batroc arma para ele mesmo ficar com o artefato místico.
E novo jogador entra em cena: na edição 359, vemos apenas sua sombra observando a ação dos heróis e vilões à distância; na edição 360, o personagem aparece de corpo inteiro pela primeira vez; e no número 361 encontra o Capitão América e Cascavel pela primeira vez, apresentando o seu nome, Ossos Cruzados (Crossbones), o novo braço direito do Caveira Vermelha, no número 362. É uma adesão importantíssima de Gruenwald e Dwyer ao cânone do herói, o regresso de um oponente físico com o qual o Capitão possa enfrentar em grandes lutas.

No fim, após muitas idas e vindas, Zemo termina de posse da Joia de Sangue, que usa para meio que ressuscitar o corpo de seu velho pai, o primeiro Barão Zemo, o que dá certo por um tempo, mas o Capitão consegue despedaçar a Joia e o corpo cai em um poço aparentemente sem fundo, e o Zemo filho, totalmente louco àquela altura, termina saltando no vazio para a morte certa. (Claro, ninguém morre de verdade nas HQs e ele voltaria no futuro).
Um detalhe importante: paralelo a tudo isso, a revista continuava a publicar uma história secundária, agora com texto de Gruenwald e arte de Mark D. Bright mostrando as aventuras solo de Jack Daniels, o Agente Americano, perseguindo o Scourge (o Carrasco do Submundo), o que é uma oportunidade ao escritor fechar essa trama tão mal desenvolvida e dispersa pelas revistas da Marvel ao longo da segunda metade dos anos 1980. A trama termina na mesma edição 362 em que Bloodstone se encerra também.

Contudo, o Ossos Cruzados sequestrou Cascavel e o Capitão precisa ir até a ilha de Madripoor, na Ásia, para resgatá-la, na edição 363, de novembro de 1989, numa trama que continua ao número 364 e é um sutil crossover com as aventuras solo de Wolverine, que haviam sido iniciadas há pouco tempo na época. Madripoor era uma ilha-nação (ligeiramente inspirada na Indonésia e localizada na mesma região), mas uma caricatura da imagem do terceiro mundo: um país dominado pelo crime, na qual não há distinção entre Estado e Máfia, e na qual a desigualdade social é extrema, sendo ao mesmo tempo um resort de luxo para os ricaços e tomado de pobreza absoluta e favelas.


Esse par de edições foi a grande oportunidade de um primeiro embate violento entre o Capitão e Ossos Cruzados e a arte de Kieron Dwyer para o confronto é espetacular.
A revista Captain America precisa cruzar com outro grande crossover a partir da edição 365, de janeiro de 1990, com a conexão com Atos de Vingança, uma saga que se esparramou por todo o Universo Marvel na qual Loki reúne alguns dos principais vilões (Magneto, Doutor Destino, Caveira Vermelha, Rei do Crime etc.) para organizarem ataques aos heróis da Marvel de modo que cada um enfrente um oponente com o qual não está acostumado a enfrentar, o que resulta na destruição da hidrobase dos Vingadores em Avengers 311, por exemplo.
Ao Capitão, o Caveira Vermelha articula para que o Controlador (um vilão do Homem de Ferro que usa um dispositivo esférico colado à nuca das vítimas que lhe permite dominar suas mentes (e que teve associação com Thanos, no passado) o enfrente, e ele domina a mente de Namor, obrigando-o a lutar contra seu velho amigo dos tempos de Invasores (e colega vingador), uma trama que prossegue à edição 366, na qual o Capitão enfrenta diretamente o Controlador em uma luta acirrada e a arte é feita por Ron Lim.
Mas a reunião dos vilões não é um mar de rosas: na edição 367, quando Magneto descobre que o Caveira Vermelha não é um imitador, mas o vilão original da II Guerra, fica ensandecido e vai se vingar dele, amarrando-o em uma prisão no subterrâneo de Nova York para que ele passe fome, como as vítimas judias dos Campos de Concentração Nazistas, afinal, Eric Lehnsser é judeu e perdeu toda a sua família em um Campo de Concentração. Tal ação coloca Ossos Cruzados ao resgate de seu chefe, no número 368, e alicia Mecanus, que usa um robô réplica do próprio Magneto para confundir os outros vilões, mas termina destruído pelo próprio mestre do magnetismo.

Infelizmente, essa história marca o fim da passagem de Kieron Dwyer pela revista após dois ótimos anos. Uma pena, já que sua arte se tornava melhor a cada número. Dwyer faria algumas histórias do Batman e do Superman na DC Comics, mas trabalharia essencialmente nos quadrinhos fora do mainstream dali em diante, apenas regressando às grandes editoras pontualmente, como uma passagem pelos Vingadores no início da década seguinte. Seu substituto foi Ron Lim, que havia desenhado aquela outra edição. Americano com família de origem asiática, Lim vinha se destacando na revista do Surfista Prateado e logo se tornaria um dos mais requisitados artistas da Marvel no início dos anos 1990.

Na edição 369, Ossos Cruzados reúne o Esquadrão Esqueleto (Skeleton Crew), com ele próprio na liderança mais Voz, Mecanus (usando o corpo do quarto Hibernante) e a Madre Noite que na busca de resgatar o Caveira Vermelha vão no encalço de Magneto, que estaria no Clube do Inferno (os oponentes dos X-Men – um clube de ricaços mutantes malignos) e terminam enfrentando a Rainha Negra, enquanto são seguidos pela Cascavel, e quando o Capitão chega, ela realmente ajuda na batalha, que os leva, na edição 370, à velha Mansão do Caveira, no interior do estado de Nova York, o mesmo local no qual o vilão morrera lá atrás na edição 301. É nessa ocasião que o Capitão tem certeza absoluta de que o homem que enfrentou no número 350 e que liderava o Ossos Cruzados é mesmo o seu velho inimigo.
Ron Lim foi um substituto digno a Dwyer e sua arte expressiva, de personagens maciços, casava muito bem com os vilões coloridos e as cenas de ação, mas ele também sabia lidar com questões mais humanas, como aquela de Captain America 371, de junho de 1990, com a divertida história na qual o Capitão aceita sair com Rachel Leighton pela primeira vez, como um casal. Ele então revela sua identidade secreta a ela e os dois vão curtir uma noite romântica como Steve e Rachel, mas sem ele saber, Cascavel pediu uma ligeira ajuda das amigas da Sociedade da Serpente para vigiá-los e garantir que nada atrapalhe o momento, como a aparição de um supervilão. As criminosas não sabem quem é o rapaz alto, loiro e de olhos azuis e se postam a ajudar, realmente, impedindo uma série de atrapalhos, enquanto Steve e Rachel iniciar de verdade o seu romance.
É um pequeno passo importante, pois Steve estava solteiro desde o fim do relacionamento com Bernie já há alguns anos e era importante o personagem ter um vínculo mais humano e apaixonado por alguém.

Vale destacar que as histórias secundárias da revista mostraram uma trama com o Cobra, o mais conhecido dos membros do Esquadrão Serpente, tendo que lidar com seu ex-parceiro de crimes, o Mr. Hyde. E o episódio da edição 371 trouxe a origem da Cascavel, por Gruenwald e Mark Bagley, mostrando que ela nasceu no Texas e se criou no Low East Side de Nova York.
Um grande e ótimo arco tem início a seguir: Ruas de Veneno (Streets of Poison) que lidam com uma epidemia de uma nova e poderosa droga nas ruas, chamada de Gelo (Ice). Os tempos da “guerra às drogas” do governo Reagan já tinham ficado para trás – e não foram abordadas de verdade na revista do Capitão (mas sim, no Homem-Aranha de Bill Mantlo) – mas a nova história era um aceno de Mark Gruenwald à ascensão do crack nos Estados Unidos, que já começara nessa época.

Na trama de Captain America 372, de fevereiro de 1990, o Capitão percebe que um dos seus auxiliares, Fabian Stankowics, está agindo de forma muito estranha e alterada, e descobre que ele está sob o efeito da nova droga, Gelo. Partindo em uma investigação sobre esse novo tráfico de drogas, o herói termina enfrentando uma gangue e uma explosão o coloca em contato com o Gelo, sem que perceba, de modo que Steve começa a agir de modo eufórico e meio fora de si.
Vale o parênteses de que aquela edição continuava com as histórias secundárias, e trouxe uma aventura solo do Estrela Negra, mantendo a equipe criativa de Gruenwald (texto) e Mark Bagley (arte), enquanto a parti do número seguinte, essa segunda história da revista se focaria em um importante arco pessoal do Agente Americano.
Na edição 373, o alterado Capitão começa a ficar raivoso e irracional, mesmo que continue tentando desbaratar o tráfico de drogas, o que o leva a engajar uma luta contra a própria namorada Cascavel, que ganha a intervenção da Viúva Negra, que na época, era a líder dos Vingadores. No fim da edição, o Capitão persegue outra quadrilha e inicia um confronto contra o Mercenário, um dos maiores inimigos do Demolidor, que passa à edição 374, na qual descobrimos que o Rei do Crime está incomodado pela epidemia de Gelo nas ruas, pois isso é ruim para os seus negócios mafiosos.

No número 375 o caminho do Capitão cruza com o do Demolidor, que – já tendo encontrado o herói em outras circunstâncias (como na saga Guerras Secretas e no arco A Queda de Murdock) – percebe que o sentinela da liberdade está alterado, o que o leva a confrontá-lo, mas o Capitão leva a melhor. No número 376, o Capitão é novamente confrontado pela Viúva Negra, que tenta convencê-lo a fazer um tratamento com o Dr. Hank Pym (o vingador que já foi Homem-Formiga, Gigante, Golias e Jaqueta Amarela).
Um detalhe importante em meio a esse arco é que cada edição vai descortinando que o piloto do Capitão, John Jameson, está apaixonado por Cascavel. Embora ela não corresponda ou dê bola, os eventos da trama e a busca pelo herói ensandecido põem os dois juntos em ação, o que só vai deixando o rapaz cada vez mais envolvido. E não menos importante: Rachel inaugura um novo uniforme, que é mais ou menos a mesma coisa do anterior, apenas com mais volume e o uso de uma jaqueta, algo muito típico dos desenhos daquele tempo.

O tratamento é realmente realizado na edição 377, quando Pym descobre que o Gelo interagiu com o soro do supersoldado e, por isso, o efeito da droga não passava no organismo do Capitão, ao contrário dos outros usuários. Infelizmente, o único tratamento que Pym considera viável é uma filtragem completa do sangue de Steve, o que pode eliminar o soro do supersoldado do seu corpo também. O herói aceita o risco e é exatamente isso o que acontece: o soro e seus efeitos são eliminados. Para sempre?
Era a oportunidade para Gruenwald explorar aquela velha questão dos poderes e dos limites das habilidades do Capitão, trazidas à tona por Englehart nos anos 1970 e resolvidas em definitivo por Stern e Byrne mais tarde. Dessa vez, Gruenwald traz uma nova abordagem: a eliminação do soro não altera o corpo do herói (como das outras vezes, quando reduziu de idade, por exemplo), ele continua musculoso como antes, mas não tem mais as habilidades extras de superforça, agilidade ou capacidade de dar grandes saltos. Embora, o condicionamento físico de todos os seus anos heroicos lhe garanta a performance de um atleta destacado, mesmo sem o soro.
A grande questão que o roteirista coloca é: o que faz o homem? Sua habilidade (entendida como o treinamento e a prática que desenvolveu em todos esses anos) ou um anabolizante superpoderoso criado 50 anos atrás? Com isso, Gruenwald trazia à tona a questão do doping no esporte, que tinha ganhado destaque nos Jogos Olímpicos de 1988 e na Copa do Mundo de Futebol de 1990 (o caso Maradona).
O Capitão precisa resolver esse dilema na edição 378, de setembro de 1990, que encerra Ruas de Veneno, e é a melhor dessa fase: os números anteriores já haviam revelado que o tráfico de Gelo era liderado pelo Caveira Vermelha, como parte de sua nova estratégia de corromper e destruir a moral dos EUA, e isso o colocava novamente em rota de colisão com o Rei do Crime (como ocorrera na clássica história do Quinto Hibernante e também em Atos de Vingança), que é contrário à ação. A rivalidade dos dois vilões vai crescendo, e numa negociação no Estádio dos Yankees, em Nova York, decidem decidi-la como dois criminosos honrados: uma luta mano a mano sem truques. Se o Caveira vencer, o Rei sai do caminho; se Wilson Fisk ganhar, o Caveira suspende a ação e vai embora.

O Capitão vai ao estádio (sem os poderes do soro) e é confrontado pelo Ossos Cruzados em uma grande luta nas arquibancadas. Todo o ciclo de aventuras anteriores já havia demonstrado que o vilão era um oponente de altíssimo nível no campo físico e mesmo com as vantagens extras, o Capitão tinha grande dificuldade de vencê-lo. Como fazer agora, sem o soro? A questão remetia também às reticências colocadas no pique das lutas do herói desde aquele primeiro confronto com o Super-Patriota…
Mas usando de sua habilidade “natural” e da inteligência para aplicar bons golpes, mesmo em uma luta acirrada, o Capitão é vencedor e nocauteia Ossos Cruzados.

Em paralelo, Rei do Crime e Caveira Vermelha ficam só de cuecas para uma luta “limpa” e travam uma grande batalha, as habilidades de Johann Schmidt (que tem o soro do supersoldado, por ser um clone do Capitão) compensadas pela massa muscular que Wilson Fisk esconde por trás de sua aparente gordura e grande habilidade de luta, apesar de seu tamanho (ou justo por causa dele). No fim das contas, Fisk é o vencedor, e cumprindo o pacto, o Caveira suspende a distribuição do Gelo e vai embora para outros planos.
O número 379 é uma edição “de férias”, na qual o roteiro de Gruenwald é ilustrado por Chris Marrinan e o Capitão e Quasar (lembram dele, o velho Marvel-Man dos anos 1970?, que agora é um membro dos Vingadores e tem histórias solo também escritas pelo roteirista) se unem contra Nefarius, um novo vilão que roubou os poderes do velho Conde Nefária. O mais importante é a história secundária: Gruenwald e Bagley mostram Cascavel sendo perseguida e capturada pela Sociedade da Serpente!

É o gancho para a edição 380, com a volta de Ron Lim, na qual a organização criminosa quer julgar Rachel por traição, já que ela agora anda por aí como parceira do Capitão América. Isso, claro, coloca o herói de novo contra esses oponentes reptilianos, que continuam sob a liderança do Rei Cobra. E o herói tem o auxílio do mercenário Paladino, que é contratado pelas amigas de Rachel (Mamba Negra e Asp) para resgatá-la na edição 381. A dupla improvável atua junta no número 382, vencendo o bando, derrotando a Sociedade realmente pela primeira vez e prendendo a maior parte de seus membros.

Captain America 383 trouxa a data celebrativa de março de 1991, comemorando os 50 anos de publicação do herói. Por isso, é uma edição especial com o triplo do tamanho e quatro histórias! Na primeira, o Capitão enfrenta o Father Time, viajando no tempo e encontrando icônicas lendas folclóricas do imaginário americano, como o Tio Sam (uma homenagem transviada à aventura do Bicentenário de Kirby), apenas para descobrir que tudo era uma ilusão criada pela vingadora Sersi para que os Vingadores, Cascavel e a equipe de apoio pudesse comemorar o cinquentenário de ação do Capitão.


A segunda história traz a interessantíssima aventura, por Mark Gruenwald e Ron Frenz (sim, aquele que fazia as capas) recontando a história do primeiro encontro do Capitão e Bucky na II Guerra Mundial com o Comando Selvagem, que apareceu na Sgt. Fury & His Howling Commandos 13 lá atrás em 1963, só que agora, sob a perspectiva da dupla de heróis e não dos soldados. E Frenz faz uma arte maravilhosa, de novo imitando os trejeitos de Kirby.
A terceira história também é bastante importante, agora por Gruenwald e Bagley (ou seja, prosseguindo a linhas das aventuras secundárias) mostrando um conto de redenção de John Walker/Jack Daniels. Na trama, o Agente Americano investiga a pretensa morte de seus velhos aliados, o Esquerdista e o Direitista, que ele deixara para a morte na explosão de um tanque de combustível, mas sobreviveram por causa da superforça que partilhavam com ele. Porém, uma história dos Vingadores da Costa Oeste mostrara a dupla de ex-amigos como mortos-vivos da Legião dos Condenados do vilão Immortus, portanto, tinha ficado a dúvida: eles estavam vivos ou mortos?
Esta nova história mostra Daniels investigando e descobrindo, no hospital, que a dupla tinha ficado com queimaduras de 3º grau em 90% do corpo e sofrendo muitas dores e convalescência, com muito sofrimento, e decidiram se suicidar.

Daniels cava a cova dos ex-amigos e os descobre lá: eles estavam mesmo mortos!
Toda essa busca leva Daniels a repensar sua vida e sua atitudes e ele toma a decisão de ser um homem melhor, de não ceder ao limite da raiva e não virar um assassino como aqueles contra quem lutava. Era um passo importante ao personagem, que continuava (e continuaria) ligado aos Vingadores da Costa Oeste.
Por fim, a quarta história traz Gruenwald e o desenhista Ron Wilson (que desenhara várias capas da revista nos anos 1970) contando quando o Caveira Vermelha e Ossos Cruzados se conheceram: pouco depois de ser revivido como um clone por Armin Zola em seu castelo na Suíça, eles são atacados por um grupo de mercenários. O novo corpo e as novas habilidades de Schmidt permitem vencer facilmente o bando, mas ele percebe que um deles é excepcionalmente habilidoso, e decide recrutá-lo e treiná-lo como Ossos Cruzados, seu novo braço direito.
Um número explosivo para comemorar cinco décadas do sentinela da liberdade.
Na edição 384, Gruenwald e Lim contam a curiosa história em que o Capitão lê uma manchete sensacionalista sobre um homem preso no gelo adorado pelos Esquimós do Ártico e, além de lembrar dele mesmo, pensa que é uma possibilidade de ser Dennis Dunphy, o Demolição, que foi dado como morto já há algum tempo. O herói vai para lá e termina descobrindo que o tal homem preso no gelo é Jack Frost, um herói que realmente existiu nos tempos da Timely e que foi reaproveitado por Roy Thomas e Frank Robbins dentro do contexto das aventuras dos Invasores, sendo incluindo no grupo de heróis Legião da Liberdade, que estreou em Marvel Premier 30 e 31, de 1977, ao qual contava também com o Patriota (Jeff Mace, o terceiro Capitão América), Ciclone (Whizzer) e Miss America.
Jack Frost (originalmente criado a partir de uma lenda americana sobre um homem de gelo) foi a inspiração para o Homem de Gelo dos X-Men e tem mais ou menos os mesmos poderes. Stan Lee também reaproveitou o nome Jack Frost como um dos vilões clássicos do Homem de Ferro (chamado no Brasil de Nevasca).
Na trama, os velhos amigos Capitão e Jack Frost se unem contra um verme de gelo gigante e Gruenwald re-oficializa que foi a combinação de frio intenso e soro do supersoldado que resultou no Capitão ficar décadas em animação suspensa, ignorando as estranhas adesões do fim dos anos 1970. No fim, Frost termina congelado de novo e o Demolição está mesmo vivo (!): o Capitão o reencontra vivendo sem memórias (e com a mente meio morta) entre os Esquimós.
Ah, e essa história trouxe de volta os efeitos do soro do supersoldado ao Capitão, devolvendo-lhe suas super-habilidades normais.

A última aventura de Gruenwald e Lim ocorre nas edições 385 e 386, terminando em junho de 1991, na qual o velho amigo e ex-vizinho de Steve, o bombeiro Mike Farrell, confessa à amiga Bernie Rosenthal que ele é um dos membros dos Cães de Guarda, revelando ideais conservadores, mas desesperado porque uma das ações que participou resultou em uma morte. Ele pede que ela não chame a polícia, mas ela chama o Capitão América, que vai combater a já enfraquecida organização que persegue o traidor Farrell, e ganha a adesão do Agente Americano – a primeira vez que os dois agem juntos – que o ajuda a vencer o grupo sem apelar para a extrema violência. Daniels diz que é um novo homem agora. E Farrell é preso.
As histórias secundárias daquelas duas edições mostram Cascavel se unindo às amigas Mamba Negra e Asp para formar as BAD Girls Inc., como uma forma de recompensarem o mal da Sociedade da Serpente e prenderem os membros que conseguiram escapar àquela última batalha: Anaconda, Rock Phytom e Puff Adder. Todavia, a batalha as leva a serem confrontadas pela MODAM, a versão feminina de MODOK (que surgira em uma aventura do Hulk no início dos anos 1980) e captura todas as mulheres. É o gancho para o próximo grande arco.
Infelizmente, esse era o fim da ótima fase desenhada por Ron Lim. O artista terminou afastado bruscamente do título para substituir o desenhista George Perez na maxissérie A Manopla do Infinito, que deu origem à célebre batalha dos heróis Marvel contra Thanos de posse das Joias do Infinito. Perez se desanimou com o trabalho e caiu fora e a editoria da Marvel pensou que o único artista à altura para assumir a empreitada era Ron Lim, familiarizado com boa parte dos personagens (pois a trama se originara na revista do Surfista Prateado que ele desenhara). Mas não havia como Lim cumprir o prazo da nova aventura e fazer a revista do Capitão América ao mesmo tempo.
Ele deixou a revista, mas continuou um bom tempo fazendo as capas.
A Origem dos 50 Anos
A Captain America 383 não foi a única celebração dos 50 anos de publicação do Capitão América. Para marcar o primeiro de seus grandes super-heróis a virar a página do meio-século, a Marvel promoveu uma minissérie especial para marcar o momento. Em quatro edições, começando em setembro de 1991, foi publicada The Adventures of Captain America: Sentinel of Liberty, escrita por Fabian Nicieza e com a arte de Kevin Maguire. Nicieza era um escritor que vinha crescendo na editora, já tendo trabalhado com os Vingadores e ganhando projeção nas revistas dos mutantes (X-Men, X-Force, Cable…), enquanto Maguire era mais conhecido como o desenhista da célebre (e maravilhosa) fase cômica da Liga da Justiça Internacional, da DC Comics, publicada no fim dos anos 1980.

Todavia, preparada com esmero, a mini trouxe Maguire experimentando um traço ultradetalhado, que dotou sua arte já boa em verdadeiros quadros de grande beleza, dando volume ao uniforme do herói, com a máscara com elementos “duros” (como se fosse um capacete) e a cota de malha do peito realmente composta por escamas em alto relevo como os desenhistas apenas sugeriam desde os anos 1940. O resultado é um visual lindíssimo! (Essa abordagem gráfica seria resgatada 20 anos mais tarde… falaremos sobre isso!).

Na trama, Nicieza parte de uma versão relativamente fiel à origem geral do Capitão América, naquele ponto, tendo como principal referência a versão de Roger Stern e John Byrne de 10 anos antes. Porém, o intuito da mini era detalhar mais ainda o processo, focado portanto desde o momento em que Rogers foi recrutado, o seu treinamento, suas primeiras missões até, por fim, ganhar a parceria com Bucky e o uniforme mais famoso (cobrindo o pescoço e com o escudo redondo), que ocorre apenas na última página da história.
Daí que ao detalhar tanto a origem, inadvertidamente, Nicieza criou contradições ao cânone… Mas vamos lá! Em primeiro lugar, a trama mostra que Johann Schmidt, o homem que se tornou o Caveira Vermelha, não era apenas um agente de ponta dos Nazistas ou o homem forte para missões impossíveis de Adolf Hitler, mas a primeira “cobaia” do Soro do Supersoldado de Abraham Erskine, que sendo alemão e judeu, fora obrigado pelos nazistas a desenvolver o experimento até conseguir fugir para os Estados Unidos. A trama também opta por deixar dúbio se o Caveira Vermelha usa uma máscara ou aquele é mesmo o rosto dele (um elemento que só surgira nas histórias recentes do personagem).

Além de vermos uma origem pessoal bem detalhada de Steve Rogers – adotando os elementos de Stern e Byrne sobre sua pobreza no Brooklyn – seu trabalho com arte (em cartazes e coisas do tipo) e até seus amigos, vemos uma abordagem mais realista do projeto secreto que, também seguindo a linha de Stern e Byrne, inicia como Projeto Renascimento antes de ser rebatizado de Projeto Supersoldado. Daí vermos versões mais desenvolvidas do general Chester Phillips, do Dr. Murray Anderson, do Dr. Erskine (ambos os cientistas são mortos) e do espião Heinz Kruger.

Outro ponto polêmico quanto ao aspecto canônico da história de Nicieza e Maguire é que eles dão nome e vida à misteriosa agente secreta chamada de X-13 na versão de 1941 e rebatizada de Agente R em 1963, e que, também já vimos, ficava subtendida como sendo a mesma Betsy Ross que foi o interesse amoroso do herói nas aventuras originais dos anos 1940, mas que as histórias dos anos 1960 em diante apresentavam como uma personagem distinta. E não esqueçamos daquelas aventuras dos anos 1970 contra a Conspiração que mostravam que uma agente traidora da SHIELD era a filha da Agente R!
Pois bem, Nicieza e Maguire transformam a Agente R em uma personagem totalmente nova: a tenente Cynthia Glass, retratada como uma bela jovem de cabelos castanhos – ao passo, recorde, que a representação “majoritária” de Betsy Ross era loira. De qualquer modo, a dinâmica Steve-Cynthia com sua paquera na HQ é muito boa e seria (pelo menos no que equivale ao número 01 da mini) praticamente adaptada literalmente ao cinema no filme Capitão América – O Primeiro Vingador, 20 anos depois com a personagem mudada para Peggy Carter.
E a HQ também explora uma nova abordagem para James Buchanan Barnes: apresentado como um jovem mais velho do que o padrão (na casa dos 16 ou 17 anos), ele é órfão de um soldado que morreu no cumprimento do dever e, por isso, um “mascote” do Acampamento Lehigh, e um garoto esperto, desenrolado, cheio de truques e malandragens, que tornam sua futura ação como parceiro de combate do Capitão algo muito mais crível. Essa abordagem também teria grande influência nas HQs de 15 anos mais tarde escritas por Ed Brubaker, como veremos adiante.

A produção de The Adventures of Captain America passou por alguns problemas, pois a arte detalhada de Maguire consumia muito tempo e a revista atrasou algumas vezes, de tal modo que o capítulo 3 tem uma arte inferior para que ele se dedicasse mais ao capítulo 4, mas ao fim e ao cabo, é uma história excelente. Os componentes que entram em choque com o cânone, contudo, fazem com que, normalmente, esta bela minissérie não seja considerada canônica, ainda que alguns de seus elementos foram usados em histórias futuras. Mas de modo oficial, até que se prove o contrário, não é parte da cronologia oficial do personagem, mas uma origem alternativa.
Mas é uma grande história.
O Início do Declínio
De volta à revista mensal, coincidência ou não, após a saída de dois excelentes desenhistas – Kieron Dwyer e Ron Lim – iniciou-se um longo declínio em Captain America, com o roteirista Mark Gruenwald começando a entregar um material sucessivamente menos interessante. Talvez o peso dos anos escrevendo a revista estivessem se fazendo sentir… Depois de seis anos entregando algumas das mais interessantes histórias já escritas sobre o Capitão América, daqui em diante, quase nada terá real destaque em relação a sua longuíssima temporada.

O tom da nova fase se iniciou ainda na história secundária da edição 386, quando as BAD Girls Inc. (Cascavel, Asp e Mamba Negra) são atacadas e sequestradas por MODAM, o que abre a conexão para o arco seguinte: The Superia Stratagem, que começa de verdade em Captain America 387, de julho de 1991, continuando Gruenwald no texto e a arte assumida pelo fraco Rick Levins (cujo traço lembrava o de Paul Neary). Na trama, o Capitão investiga o sumiço de Rachel e descobre que ela foi levada para à bordo de um cruzeiro lotado de praticamente todas as vilãs do Universo Marvel, que são mobilizadas por uma misteriosa mulher – que descobriremos ser a Supéria do título (cuja aparição às claras ocorre apenas na edição 390) – que forma as Feminizons, um grupo de super-mulheres, das quais Blackbird, Rocha Lunar, Anaconda, Princesa Piton e Nightshade são algumas dos destaques.
Ao mesmo tempo, Rachel e suas amigas não querem tomar parte do esquema e, por isso, são perseguidas e combatidas implacavelmente dentro do navio, e conhecemos mais alguns fragmentos do passado de Cascavel através de Snapdragon, uma antiga rival sua que quer vingança. O Capitão conta com a ajuda do Falcão e o Paladino aparece de novo para auxiliar (ainda sob o contrato com a BAD Girls Inc.). Na edição 391, o navio chega à Feminizons Island e descobrimos qual o plano de Supéria: ela acredita ser a descendente de uma mulher chamada Thundra, destinada a governar o mundo, e por isso, quer garantir que aquilo aconteça, disparando um míssil que irá esterilizar as mulheres do planeta, exceto aquelas protegidas na ilha, forjando uma descendência mais “forte”.

Mas o plano é radical até para algumas das seguidoras de Supéria e, na edição 392, de setembro de 1991, o Capitão consegue impedir que o míssil faça qualquer mal ao acionar o auxílio do Quasar (de novo – lembre, Gruenwald escrevia as aventuras solo dele também), que usa seus braceletes quânticos para sequestrar o míssil e jogá-lo em Urano. As vilãs se dispersam.
Com cenas com Capitão e Paladino se travestindo para se infiltrarem no meio das Feminizons, Supéria (a história) caminha numa linha muito fina e perigosa, extrapolando alguns estereótipos do feminismo, e é um tema que dificilmente a Marvel deixaria ser produzido nos dias de hoje sem que fosse escrito e desenhado por mulheres.
Em paralelo, as histórias secundárias mostravam aventuras do Caveira Vermelha e de seu Esquadrão Esqueleto.
O número 393 traz excepcionalmente a arte de Larry Alexander (que vinha desenhando as histórias secundárias) na qual um herói alemão chamado Hauptmann Deutschland persegue o Caveira Vermelha e o vilão é encontrado já morto por ele. Ao mesmo tempo, vemos Cascavel traumatizada pelos eventos da saga anterior e anunciar que está se aposentando da vida de vigilante fantasiada, querendo continuar seu romance com Steve, mas agora, levando uma vida relativamente normal. A trama continua a mostrar John Jameson apaixonado por ele e praticamente fazendo uma investida.
Na edição 394, Rick Levins retorna à arte e descobrimos logo de cara que a “morte” do Caveira foi apenas um truque para o vilão ganhar um fôlego de seus inimigos e assistimos a mais uma reunião de seu conselho, que envolve os líderes das organizações dos Cães de Guarda, Carrascos do Submundo e outras, que estão todas ligadas a ele. Mas para se fortalecer depois dos revezes recentes, o Caveira convida a Víbora para se associar com ele, tentando seduzi-la com sua maldade.
A personalidade niilista e o passado de traições (como com a HIDRA e a Sociedade da Serpente) causam desconfianças entre os aliados, como o Treinador, mas ao manifestar isso de um modo mais ríspido, Ossos Cruzados é demitido por seu chefe!
No número 395, o Capitão se une ao novo Thor (nem pergunte…) e vai investigar a morte do Caveira, retornando à mansão do vilão no interior do Estado de Nova York e confrontando Armin Zola e suas criações. Também vemos o Caveira usar a Madre Noite para recrutar um substituto para Ossos Cruzados, no que ela comanda três criminosos uniformizados a lutarem até à morte e quem vencer será contratado. O vencedor é o Degolador.

Ao mesmo tempo em que, armando um plano para cair de novo nas graças do ex-chefe, Ossos Cruzados espia John Jameson ir buscar Rachel na saída de um curso que ela está fazendo, o que resulta no vilão sequestrá-la na edição 396, já em janeiro de 1992, ao mesmo tempo em que o Capitão consegue vencer Zola apenas para enfrentar dois novos vilões: Blackwing e uma nova versão do Halloween (Jack O’Lantern, no original – um vilão que surgiu nas aventuras do Homem-Máquina e se tornou oponente do Homem-Aranha nos anos 1980). A dupla se sai até bem contra o Capitão e Madre Noite os contrata também. Na edição 397, enquanto o Caveira Vermelha continua seduzindo Víbora e compartilhando com ela uma banheira e planos de dominação, Ossos Cruzados revela que conhece Cascavel do passado e a tortura e abusa (supostamente a estupra também) para que ela o ajude a conseguir uma amostra de sangue do Capitão e, com isso, acessar à Mansão dos Vingadores.
Operação Tempestade Galáctica
Infelizmente, aqueles eram tempos de grande intervenção editorial na Marvel, comissionada pelos grandes crossovers e essas tramas ganham uma pausa para que o Capitão participe de Operação Tempestade Galáctica, uma aventura dos Vingadores publicada em 19 partes em seis revistas diferentes e duas dezenas de criadores. Ainda assim, apesar da desigualdade de material, foi uma das mais importantes tramas envolvendo os “maiores heróis da Terra” na década de 1990 e teve consequências diretas para o Capitão América.

A trama inicia justamente em Captain America 398, de março de 1992, na qual Rick Jones (naquela época, de volta às aventuras do Hulk) toma conhecimento de uma conspiração no alienígena Império Kree, que não só está abalado pela disputa interna de poder, como também está em guerra com o Império S’hiar. Os dois times de Vingadores – os principais e os da Costa Oeste – precisam unir suas forças para abrir três frentes de batalha (na Terra e nos dois impérios) e enfrentar grandes ameaças, como vistas em Captain America 399 e 400 e em Avengers 345, 346 e 347 (por Bob Harras e Steve Epting).
Porém, o mais importante disso tudo é que após os conspiradores Kree dispararem a Nega-Bomba – explosivo que pode destruir o império inteiro e que apesar da intervenção dos Vingadores ainda mata milhões de pessoas – ocorre uma cisão no grupo dos heróis: o Homem de Ferro defende que a Inteligência Suprema dos Kree seja morta e ganha o apoio de Cavaleiro Negro, Sersi, o novo Thor, Visão; enquanto o Capitão América finca o pé que não é assim que os Vingadores agem, e recebe apoio de Quasar, Capitã Marvel, Feiticeira Escarlate e de Clint Barton (agindo não como Gavião Arqueiro, mas como Golias).

Porém, o Homem de Ferro usa o seu status diferenciado de membro fundador – e nenhum outro do quinteto original está lá presente – para seguir em frente e matar a Inteligência Suprema, criando uma forte cisão não somente entre os Vingadores, mas também entre Steve Rogers e Tony Stark. Desde aquele episódio da Guerra das Armaduras, a relação de amizade e confiança entre os dois já não era mais a mesma, e essa ação firma as diferenças entre os dois.
Demorará anos para que a dupla Rogers-Stark realmente agisse junto de novo.

Operação… tem um epílogo em Captain America 401, na qual o Capitão América está triste e desiludido com os rumos dos Vingadores, apesar da vitória naquele que foi um dos maiores desafios já enfrentados pelo grupo. Numa reunião, ele propõe que seja removido do cargo de líder, mas os demais heróis não aceitam sua saída. Ele então organiza um seminário sobre ética, mas apenas Viúva Negra, Gavião Arqueiro e Feiticeira Escarlate comparecem, o que o leva a cancelar tudo e começar a pensar em sair da equipe.
No fim, Clint Barton consegue arrastar Steve Rogers para desopilar em um bar, e os dois desabafam, mas são surpreendidos pela aparição de Tony Stark, que tenta explicar para eles por que tomou as decisões que tomou naquela missão.
A Origem de Cascavel
As edições recentes da revista tiveram, ainda, uma grande importância em suas histórias secundárias – ainda escritas por Mark Gruenwald e desenhadas por Larry Alexander – que culminaram na trágica origem de Rachel Leighton, a Cascavel. A subtrama iniciada na edição 396 prosseguia e a cada número íamos descobrindo um pedacinho do passado da ex-criminosa. Primeiro, Ossos Cruzados a chama de “ratinha” e ela o reconhece de imediato: apenas um homem a tinha chamado disso em sua vida. E as lembranças não são nada boas. Em conta-gotas vamos vendo o passado de Rachel, em como seus irmãos mais velhos – Rick, Larry e Danny – se envolvendo com gangues de rua em Nova York, o que a levará a fazer isso também.

E não podemos deixar de mencionar que Captain America 400, de maio de 1992, foi um grande feito, uma edição comemorativa que trouxe 84 páginas e 4 histórias. Além da participação do Capitão na Operação Tempestade Galáctica, tivemos mais um capítulo das origens de Cascavel; uma aventura do Falcão ao lado do Agente Americano com o Demolição e a reimpressão na íntegra de Avengers 04, com a história em que os Vingadores encontram o Capitão congelado após décadas de animação suspensa.

E parecendo querer cozinhar os fãs e prolongar o suspense – no que parece mais uma intervenção editorial – Mark Gruenwald não resolve ainda a trama de Cascavel, mas ao contrário, dá início, na edição 402, ao inacreditável arco Homem ou Lobo?, no qual enquanto busca pela namorada, o Capitão recebe o apelo do editor do Clarim Diário, J.J. Jameson, para que encontre seu filho – que tinha desaparecido junto com ela – e isso coloca o sentinela da liberdade em uma trama absurda na qual John Jameson não somente volta a ser o Homem-Lobo (um tipo de lobisomem mobilizado por causa de uma rocha lunar mística – e um vilão do Homem-Aranha nos anos 1970), mas toda uma horda de lobisomens, numa história que envolve o Caçador da Lua, o ex-vingador Doutor Druída, o x-man Wolverine (e também Cable) e a vilã Nightshade.

Mas o pior de tudo é que os efeitos da ação dos vilões terminam por transformar o Capitão em um lobisomem também e ele fica nessa condição por nada menos do que três números inteiros!!!! O desenho do herói com seu uniforme e os pelos e a cara de lobo vazando da roupa na arte desingonçada de Rick Levins é uma das imagens mais horrendas (e não no sentido de terror, mas de feias) que os anos 1990 poderiam produzir. É quase o fundo do poço.
Esse arco inacreditável durou 6 edições, se estendo até o número 407, de setembro de 1992. Mas as histórias secundárias da revista trouxeram o clímax da subtrama das origens da Cascavel, quando descobrimos que o aliciador dos irmãos dela no crime era um sujeito durão apelidado de Bing, cujo nome era Brock Rumlow. E esse cara é o Ossos Cruzados. E como isso não bastasse, Rumlow matou dois dos irmãos dela, Rick e Larry.
E mais: naquela edição 407, tendo torturado Cascavel por dias e dias – e supostamente a estuprado também – Ossos Cruzados decide levá-la ao QG do Caveira Vermelha nas Montanhas Rochosas, onde o grande vilão termina por aceitar seu velho colaborador de volta e põem a heroína em uma cela. Mas ela é liberta tarde da noite pelo substituto de Rumlow, o Degolador, que revela que é ninguém menos do que Danny Leighton, o irmão mais velho de Rachel!
Na edição 408 temos não duas, mas três histórias! Na primeira, outro conto inacreditável (e também fruto de intervenção editorial) na qual o Capitão (somente agora voltando a ser humano!!!) enfrenta uma versão maligna de si mesmo, o que é uma conexão gratuita com a maxissérie Guerra Infinita (de Jim Starlin e Ron Lim), por sua vez, a sequência de Desafio Infinito, e portanto, segunda parte da Saga do Infinito, envolvendo Thanos e a Manopla do Infinito.
Na segunda, Gruenwald e Alexander mostram o dramático momento em que Ossos Cruzados descobre a verdade sobre o Degolador e mata o terceiro irmão de Rachel!!! E na terceira (de novo com arte de Levins), o Capitão e o Falcão (usando um novo uniforme, adaptado aos exageros dos anos 1990) se unem em missão ao mesmo tempo em que, como consequência (e trauma) do arco anterior, John Jameson se demite do cargo de piloto do herói, encerrando o envolvimento que tinha com o sentinela da liberdade ao longo de mais de 30 edições! Seu substituto já se apresenta nessa história: Zach Moonhunter.
A edição 408 também marcou o fim das histórias secundárias que faziam parte da publicação nos últimos dois anos.

O longo arco de Cascavel e Ossos Cruzados – mais de um ano de histórias – se encerra apenas em Captain America 409 e 410, terminando em dezembro de 1992, no qual com a ajuda do Doutor Druída, Capitão e Falcão descobrem o esconderijo do Caveira Vermelha nas Montanhas Rochosas e enfrentam todo o Esquadrão Esqueleto (Ossos Cruzados, Madre Noite, Mecanus usando o corpo do Quarto Hibernante, Halloween, Blackwing) numa acirrada batalha para impedir que o vilão injete uma versão depravada do soro do supersoldado em Rachel.

Além disso, quando Cascavel tem a chance, dá uma surra em Ossos Cruzados e pensa seriamente em matá-lo por tudo o que sofreu, o que só não ocorre porque o Capitão a impede de fazer isso. O Caveira consegue escapar, mas todo o restante do bando é finalmente preso pelos heróis.
A Fúria de Cascavel
Mark Gruenwald dá início a um novo ciclo em sua longa temporada a partir de Captain America 411, de janeiro de 1993, quando Cascavel pede para irem atrás de Snapdragon, e descobrem que ela estará na clandestina Feira de Armas da IMA na ilha de Boca Caliente no Caribe e Capitão, Cascavel e Falcão partem para lá fantasiados como Ossos Cruzados, Madre Noite e Halloween, cortesia dos poderes de Sersi.
Numa trama que espelha mais do que demais a já não tão interessante The Superia Stratagem, o trio de heróis se vê em meio a um congresso com quase uma centena de vilões de todos os cantos do Universo Marvel – coitado do desenhista Rick Levins – e precisam travar uma luta impossível de vencer. E num recurso apenas para ganhar tempo e render algumas boas lutas, Gruenwald cria a situação na qual Batroc cobra de “Ossos Cruzados” (o Capitão disfarçado) uma aposta delutar contra cinco oponentes, e eles vão se sucedendo até a edição seguinte, o número 412, que traz até a volta (inacreditável) do general Wu, o Sumô, aquele que o herói enfrentou lá atrás em Tales of Suspense 61.
O número 412 também mostra Shang-Chi, o mestre do kung fu (sim, o velho personagem da Marvel dos anos 1970) de volta, infiltrado no evento, primeiro lutando contra os heróis e depois se unindo e Supéria de volta tramando contra a IMA e tentando aliciar MODAM para o seu lado, mas a ciborgue se mantém fiel à IMA.

A edição 413 é mais importante, porque enquanto o Capitão precisa enfrentar MODAM e Supéria, Cascavel reencontra Snapdragon e – como fruto do estresse das semanas anteriores – descarrega toda sua raiva contra a vilã e termina por matá-la afogada! Claro, Rachel se arrepende logo em seguida ao feito e fica morrendo de medo de contar ao Capitão o que fez. Por causa disso, passará as edições seguintes sendo assombrada pela lembrança da vilã e o remoço do que fez.

Do Caribe, na edição 414, o trio Capitão, Falcão e Cascavel vai parar em Wakanda, onde deveriam comparecer ao casamento de T’Challa, o Pantera Negra, mas a cerimônia não ocorre porque suergiu uma crise: alguém está manufaturando vibranium (a principal renda do país) na Terra Selvagem – a mítica região da Antártica que, em vez de coberta por gelo, abriga uma região de clima tropical habitada por dinossauros e tribos humanas. E lá vão os heróis em uma aventura que contará, ainda, com a participação de Ka-Zar, o senhor da Terra Selvagem, e combaterão os Mutantes de Lorelei.

Na edição 417, os vilões até despertam Terminus, o ciborgue gigante que já combateu os Vingadores, e o quinteto de heróis tem um trabalho danado de vencê-lo, ainda ao custo de Cascavel – que desequilibrada pelo remoço – termina lançando um ataque suicida contra o alienígena e fica gravemente ferida. Quando vencida a batalha, os heróis regressam para Wakanda e Rachel fica por lá, em coma, sendo tratada pela avançada tecnologia da nação africana.

Uma pequena mudança vem em Captain America 422, de dezembro de 1993, quando um desentendimento mais sério entre os funcionários da Mansão dos Vingadores faz o auxiliar mecânico Michael O’Brian pensar em se suicidar pulando da ponte do Brooklyn. O Capitão consegue impedir, mas reflete que talvez compartilhar seu time com os Vingadores não seja mesmo a melhor das situações. Assim, ele decide ter um QG próprio e mover sua equipe de apoio (como O’Brian, Peggy Carter e Zach Moonhunt) para lá, alugando o edifício Rokatanski & Co., o mesmo que servira de base à sua velha Linha Direta anos antes.
Tal feito vem acompanhado da decisão de deixar temporariamente os Vingadores, também, finalmente dando vazão à inadequação que vinha sentindo desde a Operação Tempestade Galáctica. Esta é a última história de Rick Levins na arte da revista.
Após um número de férias – a edição 423 na qual Roy Thomas e M.C. Wyman contam uma aventura passada no início de 1941, um ano antes da formação dos Invasores, com o primeiro encontro entre o Capitão e Namor, quando o furioso príncipe submarino sequestra o presidente Franklin D. Roosevelt, mas os dois terminam se unnindo contra os nazistas – a edição 424 (com arte de Phil Gosier) encerra o ciclo, com Rachel retornando a Nova York após sair do coma, retomando o namoro com Steve.
Mas a heroína também confessa seu crime contra Snapdragon, e o Capitão não a condena, permanecendo a seu lado, mas recomendando que ela se submeta a julgamento. Infelizmente, para fins práticos, essa ação termina por afastar Cascavel da revista após mais de 60 edições (!) como parte do elenco fixo do título e – embora de maneira não explícita – encerrando o namoro dos dois heróis.
Envenenado pelo Soro do Supersoldado
Uma fase totalmente nova dá início ao último ciclo de Mark Gruenwald à frente da revista, em Captain America 425, de março de 1994, com a estreia do novo desenhista Dave Hoover, que tinha uma arte bastante competente.

Na trama, em meio à inauguração de seu novo QG em Brooklyn Haights, que tem como fachada uma loja de roupas, o Capitão está se sentindo mais fatigado do que o normal e um exame do Dr. Keith Kincaid – parte de sua equipe de apoio e do elenco da revista já há alguns anos – descobre que o Soro do Supersoldado se voltou contra o seu corpo e o está matando, numa analogia às doenças autoimunes. Assim, se continuar o nível de estresse corrente, o Capitão estará completamente paralisado em um ano, e após isso, seu organismo também irá começar a parar até sua morte.
Mas a ameaça de um novo Super-Patriota que quer desacreditá-lo perante a opinião pública termina por colocar o Capitão em um frenesi ainda maior do que o normal…
Deve ser levado em consideração a grande intervenção do Departamento de Marketing na Redação da Marvel naqueles tempos, fazendo escritores escreverem histórias que não queriam, o que parece ser o caso aqui. De qualquer modo, pouco se aproveita desse momento da fase de Gruenwald.

O ponto mais baixo dessa fase se inicia em Captain America 438, de abril de 1995, quando em consequência das histórias acima relatadas, o herói descobre que seu organismo está sendo destruído pelo Soro do Supersoldado. Para não ficar totalmente paralisado, Steve Rogers solicita ao amigo Tony Stark que construa uma armadura como a do Homem de Ferro para que ele possa usar no combate ao crime.

O visual da armadura – criada por Dave Hooper – é horrendo marcando inegavelmente a entrada do Capitão América dentro do Efeito Muscular, a tendência dos anos 1990 de desenhos exagerados e com desprezo por anatomia. É ainda uma fase muito estranha do herói, que passa a ser auxiliado por dois jovens heróis assistentes: Jack Flag e Free-Spirit. O visual de ambos também não é nada memorável, parecendo com dois refugos da editora Image Comics, a lançadora maior da tendência.
Por isso, a longuíssima passagem de Mark Gruenwald pela revista Captain America como escritor se encerra de modo melancólico na edição 443, de setembro de 1995, na qual o herói aparentemente sucumbe à sua doença, incapaz de se mover. Gruenwald escreveu 137 edições da revista em 10 anos(!) se tornando, portanto, o escritor que por mais tempo escreveu as aventuras do Capitão América em todos os tempos. Mas Gruenwald continuaria como editor da revista por mais algum tempo.
Gruenwald terminaria morrendo de um ataque cardíaco em 1996, aos apenas 43 anos de idade, vítima de uma má formação congênita que não sabia possuir. De temperamento amigável e profissionalismo, deixou uma grande impressão em todos os que trabalharam com ele.

A Marvel convidou o escritor de sucesso Mark Waid e o desenhista Ron Garney para assumirem o título e dar-lhe novo fôlego. Deu certo e o primeiro arco da dupla, Operação Renascimento, é um clássico contemporâneo do personagem. O arco inicia em Captain America 444, de outubro de 1995, com uma grande homenagem ao personagem, que inicia a história à beira da morte, ainda em consequência dos efeitos negativos do Soro do Supersoldado. O personagem chega a ser declarado morto, mas, ao ser colocado em um tubo médico pela SHIELD e receber uma misteriosa transfusão de sangue, Steve Rogers desperta vivo e descobre para seu espanto (na edição 445), que sua ex-namorada (e grande amor de sua vida) Sharon Carter está viva!
Tendo sido declarada morta numa história de 1979, fazia então 16 anos que a agente da SHIELD desaparecera da revista. Na trama, a Agente 13 revela que sua morte foi um embuste criado por Nick Fury e a própria SHIELD para afastá-la do Capitão e torná-la de novo mais eficiente em sua missão. Steve fica chocado pela revelação e, no fundo, ainda nutre seus sentimentos por ela (afinal, ela partiu bruscamente), porém, após tanto tempo (alguns anos na cronologia da Marvel), a espiã tem uma postura fria e rancorosa em relação ao seu ex-parceiro.

Essa dinâmica tensa, num misto de esperança e rancor, é um bom tempero do arco de Waid e Garney, e os dois se unem em uma missão marcada por pequenos conflitos, carregados de humor, conflitando a visão mais niilista e pragmática dela com o ativismo e ideologia dele. Na história, o Capitão descobre que a transfusão de sangue que o salvou foi realizada por ninguém menos do que o Caveira Vermelha (que vivia em um clone do herói, não custa lembrar) para que o Capitão o ajudasse numa luta contra o Kubercult, uma organização terrorista que se apossou de uma versão do Cubo Cósmico e o usa para transformar os Estados Unidos no Terceiro Reich.
Claro, o vilão apenas quer tomar o Cubo para si e o herói sabe disso, e a trama se desenrola maravilhosamente. Com texto leve e divertido e bela arte, Operação Renascimento constituiu uma boa fase e o arco se encerrou na edição 448.

Captain America 449, de março de 1996, trouxe o arco First Sign, um crossover com os Vingadores, Thor e Homem de Ferro contra uma nova versão do Zodíaco, o velho cartel criminoso inimigo da equipe, e a celebrativa edição 450 deu início ao arco Man Without Country (Herói Sem Pátria, no Brasil), no qual Steve e Sharon enfrentam Mecanus e uma força obscura dentro da Força Aérea dos EUA, o que obriga ao herói (outra vez) a lutar contra as forças oficiais de seu pais, outro gesto crítico ao apelo pretensamente ufanista do personagem, inclusive, com o Capitão usando, por um par de números, um uniforme sem os símbolos dos EUA (a estrela e as listras) e um escudo de energia (uma ideia que será retomada no futuro breve).

Em termos editoriais, este arco de Waid e Garney foi acelerado para que se encerrasse pela direção da Marvel, que queria o personagem disponível para uma grande empreitada comercial. O arco termina na Captain America 454, de agosto de 1996, que marcou o fim do primeiro volume da revista (aquele publicado desde 1968 – não custa lembrar, a revista dos anos 1940 era chamada de Captain America Comics, por isso, representava, em termos de registro, outra publicação) e dando início a uma nova numeração, o volume 2.
Heróis Renascem
Após o boom de vendas do início dos anos 1990, a crise se instalou violentamente no mercado de quadrinhos pós-1995. Na Marvel, apenas as revistas do Homem-Aranha e dos X-Men satisfaziam o Departamento de Vendas (ainda assim, ambas em fases horríveis em termos criativos), de modo que a editora adotou uma das mais ousadas, radicais (e burras?) ações editoriais de todos os tempos: cancelou suas principais revistas de primeira linha (Captain America, Iron-Man, Fantastic Four e Avengers) e as relançou com novas equipes criativas e direcionamentos cronológicos. E não somente isso, os artífices da Image Comics – os desenhistas Jim Lee e Rob Liefeld – foram contratados para comandarem as novas versões.

A empreitada chamada Heróis Renascem partia do megaevento Massacre (Ongslaugh), na qual quase todos os heróis da Marvel morriam para doar suas forças vitais e derrotarem o vilão homônimo, que era uma combinação dos “lados negros” do Professor Charles Xavier e Magneto. (Sim, isso é tão ruim quanto parece…). Contudo, a “essência” dos heróis é transportada para um novo universo – o de Heróis Renascem – onde eles vivem novas aventuras, com novas origens e passado.
Lançado com estardalhaço, o novo Capitão América ficou a cargo do nefasto desenhista Rob Liefeld (alguém odiado na indústria dos quadrinhos), com roteiros coescritos por Jeph Loeb. A nova Captain America (vol. 2) durou 12 edições, foi um fracasso de vendas e é simplesmente horrenda. A representação do Capitão América desproporcional em termos anatômicos de Liedfeld se tornou uma das coisas mais célebres e feias da história do personagem.

Retomada
Quase como um pedido de desculpas, a Marvel retomou a publicação do Capitão América convidando Mark Waid e Ron Garney para continuar sua visão do personagem. Captain America (vol 3) 01, de janeiro de 1998, se inicia com o arco Poder e Glória, que questiona novamente a dedicação do personagem aos Estados Unidos enquanto país ou ideologia. Na trama, um desgarrado alienígena Skrull (que é transmorfo) assume uma posição de destaque na HIDRA e toma o lugar do Capitão América para desonrá-lo. A trama é boa, mas não excelente, e Garney logo deixou a revista (no número 03), substituído primeiro por Dale Englesham até o excelente Andy Kubert assumir a partir do número 08, que encerra o arco.

Um resultado curioso desse arco é que o Capitão perde o seu notável escudo de adamantium-vibranium, talvez numa tentativa da Marvel de fazer algo novo, colocando o herói para usar uma nova versão de seu velho escudo triangular original até que, a partir da edição 09, de setembro de 1998, ele passar a usar um escudo de pura energia (com a aparência do clássico escudo redondo, mas transparente e mais versátil), fruto da tecnologia avançada dos Vingadores.

De volta à revista Waid voltou a explorar a dinâmica “de cão e gato” entre Steve e Sharon Carter, e não demorou para colocar a dupla de novo contra o Caveira Vermelha, num arco que se inicia em Captain America (vol. 3) 14, de fevereiro de 1999, e que durou cinco edições, fazendo o vilão novamente se apossar do Cubo Cósmico, usar de novo sua armadura dourada (lá da aventura de 1967, lembram?) e criar um mundo à sua imagem, porém, dessa vez, auxiliado por outro oponente: Korvac, um célebre e poderosíssimo inimigo dos Vingadores. Ao fim, o Caveira é derrotado, na edição 18, mas Korvac ainda lança o herói em um futuro sombrio no meio da III Guerra Mundial.

A retomada de Waid fez sucesso e a Marvel se animou a lançar, pela primeira vez em sua história, uma segunda revista mensal para a sentinela da liberdade. Assim, em setembro de 1998, estreou Captain America: Sentinel of Liberty 01, com Waid e arte de Ron Garney de volta, numa revista focada essencialmente no passado do herói, associando aventuras retroativas com alguns elementos do presente, e que durou 12 edições até agosto de 1999.

De volta à revista principal, no meio do arco do Caveira e Kovac, Waid e Kubert apresentaram a personagem Connie Ferrari (no número 15), uma defensora pública que se torna o novo interesse amoroso de Steve Rogers, já que naquele ponto, sua relação com Sharon Carter era meramente profissional. A relação dos dois seria um pouco conturbada. Waid encerra sua segunda temporada no personagem na edição 23, de agosto de 1999. Ou seja, ele terminou sua passagem nas duas revistas mensais ao mesmo tempo.

Captain America 25, de janeiro de 2000, dá início a uma fase completamente nova, sob o comando do roteirista (e desenhista) Dan Jurgens, mais famoso por ser o principal criador da saga A Morte do Superman, da DC Comics, na década anterior, mas que em anos recentes, vinha trabalhando com a Marvel em personagens como Homem-Aranha e Thor. Mantendo Andy Kubert na arte por um tempo, as histórias de Jurgens eram um pouco mais pautadas na lógica patriótica, sem tanto o apuro crítico que autores como Gruenwald ou Waid conferiram.

A fase de Jurgens foi longa e ele assumiu também os desenhos a partir do número 33, de setembro de 2000, e em meio a uma série de aventuras, fez Connie Ferrari descobrir a identidade secreta do herói, o que, em consequência, pôs um fim ao romance dos dois na edição 44.

O último arco de Jurgens se iniciou em Captain America 45, quando o Caveira Vermelha se alia ao Monge do Ódio, uma aventura que introduzia uma irmã de Bucky Barnes. Ao fim do arco, na edição 48, Steve promove um funeral simbólico para seu amigo e parceiro de combate, que nunca tivera tal cerimônia, tendo morrido em ação mais de 50 anos antes. Esta edição passou a ostentar em paralelo o número 512, que teria sido a numeração da publicação caso mantivesse o cronograma do volume 1. Parecia uma iniciativa para retomar a velha numeração, mas isso, no fim das contas, não ocorreu.
Toda essa fase se encerra em Captain America (vol. 3) 50, de fevereiro de 2002, ainda por Jurgens, edição que marca o fim precoce do volume 3. O motivo, dessa vez, era um pouco mais complexo e associado ao contexto de sua época.
Pós-11 de Setembro
No dia 11 de setembro de 2001, os Estados Unidos foram alvo do maior ataque já perpetrado em seu território, algo que só encontra par, em termos históricos, ao ataque de Pearl Harbor, de 60 anos antes. A organização terrorista Al-Quaeda organizou o sequestro de quatro aviões de passageiros e os lançaram em ataques suicidas, que atingiram os dois edifícios do World Trade Center em Nova York (com uma aeronave para cada), o prédio do Pentágono, em Washington-DC, enquanto a quarta aeronave também se dirigia à capital do país, mas foi derrubada no estado da Virgínia por uma reação de seus passageiros, que em vista do voo estar atrasado, tomaram conhecimento dos ataques anteriores por meio de ligações realizadas de dentro da nave.

Mais de 3 mil pessoas foram mortas na ação e o choque do ataque gerou uma reação violenta dos EUA, com o país lançando intensas ofensivas militares no Oriente Médio, terminando por – em médio prazo – derrubar o longevo regime inimigo do Iraque, e por fim, eliminando o líder Osama Bin-Laden, alguns anos depois, embora, visto em retrospecto, não conseguiram efetivamente frear as várias organizações terroristas da região. Outro efeito foi o crescimento de um sentimento ufanista e patriótico naquele país, talvez similar àquele da década de 1940 que gerou a própria criação do Capitão América.
Por causa disso, a Marvel decidiu encerrar o volume 3 da revista e iniciar o volume 4 de Captain America, agora, alojada no selo Marvel Knights, uma subdivisão da editora liderada pelo editor Joe Quesada e destinada a revistas de teor mais sério, adulto e violento.

Captain America (vol. 4) 01, de junho de 2002 (repare que houve um intervalo de quatro meses nos quais o sentinela da liberdade não esteve nas bancas), com roteiro de John Ney Rieber e Chuck Austen e a belíssima arte de John Cassaday. É interessante notar que essa edição equivaleria ao número 518, caso se mantivesse a numeração do volume original.
A trama dessa fase da revista, infelizmente, foi marcada pelo ufanismo, pelo patriotismo exagerado e pelo sentimento de vingança de Steve Rogers, que se dedica a perseguir uma organização terrorista árabe responsável pelo 11/09 no Universo Marvel. Inevitavelmente, as histórias de Rieber e Austen replicaram à exaustão estereótipos contra os povos árabes ou mulçumanos e justificavam o fervor imperialista e revanchista dos EUA na época – o que na vida real gerou uma série de guerras que os EUA não podiam vencer (e não venceram, obrigados, depois, a simplesmente abandoná-las, deixando para trás um rastro de destruição, mortandade e instabilidade política ainda pior do que aquelas que sofreram e “justificavam” tal reação).

Isso é uma pena, porque a arte de John Cassaday era simplesmente maravilhosa, com ele adotando o visual que Kevin Maguire criara para o Capitão América na minissérie Adventures of Captain America, de 1991, com a mascara do herói mais estilizada (com elementos “duros”, como se fosse um capacete, em vez de um capuz de pano como era desenhada desde os anos 1960) e com a cota de malha do peito do herói fazendo jus ao nome e repleto de escamas em alto relevo, para destacar o elemento de “à prova de balas” do uniforme. Depois dessa temporada de Cassaday, ficou difícil aos desenhistas posteriores ignorarem esse alto relevo (que era apenas sugerido pela arte de Jack Kirby e seus seguidores) e a maioria dos artistas posteriores adotaram uma abordagem similar.

Essa fase terminou na edição 16, e dali para frente, veio uma sequência de arcos restritos por escritores diferentes. Captain America (vol. 4) 17, de novembro de 2003, deu origem a uma pequena fase nas mãos do célebre desenhista Dave Gibbons (mais famoso pela arte de Watchmen na DC Comics) nos roteiros e arte de Lee Weeks (replicando o estilo de Cassaday), e pouco depois, a partir da edição 21, passou para texto de Robert Morales e arte de Chris Bachalo, numa fase que introduziu a personagem Rebecca Quan, e por fim, veio o arco de Robert Kirkman (sim, ele mesmo, o criador de Walking Dead e Invencível) e arte de Scott Eaton, numa trama contra o Caveira Vermelha que trouxe de volta (após muitos e muitos anos), a personagem Rachel Leighton, a Cascavel, ao lado de nosso herói, e se encerrou na edição 32, de dezembro de 2004, que também foi o último número do volume 4.


O clima de ufanismo e revanchismo pós-11 de setembro gerou um grande sucesso para o Capitão América nos Estados Unidos, se não no resto do mundo. Resultado disso, pela segunda vez em sua longa história, o sentinela da liberdade ganhou um segundo título mensal, tal qual é feito nos quadrinhos como personagens muito populares. Assim, chegou às comic-shops Captain America and the Falcon 01, de maio de 2004, numa revista que, na verdade, tinha Sam Wilson como verdadeiro protagonista, e contava com roteiro de Christopher Priest e arte de Bart Sears.
Na trama, a dupla combate um novo vilão chamado Anti-Cap, que replicando a velha fórmula do Superpatriota de 20 anos antes, era uma versão conversadora, extremista e fascista dos ideais defendidos pelo herói, numa pegada mais crítica do que a do título principal.

A partir do número 05, a revista teve a (bela) arte assumida pelo desenhista brasileiro Joe Bennett, e se vinculou ao arco Vingadores: A Queda, publicado na revista Avengers – e que teria uma grande consequência às aventuras do sentinela da liberdade. Na trama daquela aventura, os maiores heróis da Terra sofrem um ataque devastador de um inimigo misterioso, que terminará sendo revelado como sendo a Feiticeira Escarlate.
E o que é intrigante nessa revista secundária, é que Steve Rogers desenvolve justamente uma relação com Wanda Maximoff. Isso é curioso, pois as velhas histórias dos anos 1960 mostravam Wanda tendo uma paixonite pelo Capitão, mas eles nunca desenvolveram nada, e na verdade, ela terminou se enamorando e casando com o Visão, antes dele ser “morto”.
A relação entre eles foi complicada e, obviamente, a revelação de que era a própria Feiticeira Escarlate quem traiu e se virou contra seus amigos – e até matou alguns deles – teve um efeito devastador para Steve.

Ademais, Captain America and the Falcon persistiu com a trama do Anti-Cap e a ação de Wanda gerou uma sequela: despertou em Sam Wilson a personalidade do marginal Snap Wilson, o que fez com que o Falcão assumisse uma postura mais durona e crítica, fazendo com que entrasse em um atrito ideológico e metodológico com o Capitão. No fim das contas, a relação entre Steve e Sam ficou bastante abalada, e ainda que o Falcão não apareça na última edição, a revista se encerrou na edição 14, de junho de 2005, num momento em que o Capitão já estava em uma fase totalmente nova na revista principal.
Curiosamente, os escritores posteriores ignoraram essas histórias e quando Capitão e Falcão se reencontraram em Captain America (vol. 5) 12 não houve nenhuma menção a esses problemas.
A Fase Ed Brubaker
Naquele ponto, as histórias solo do Capitão América estavam desagradando ao público e o sucesso ufanista pós-2001 tinha se evadido completamente. A Marvel de Joe Quesada pensava que era necessário chocalhar as coisas, então, zerou de novo a numeração da revista Captain America para iniciar o volume 5 e colocou uma nova equipe bombástica: o roteirista Ed Brubaker e os desenhistas Steve Epting e Mike Perkins. Esta fase caminhou junto com a série Novos Vingadores de Brian Michael Bendis.

Nascido em Bethesda, em Maryland, nos EUA, em 1966 (tendo portanto 39 anos em 2005), filho de um militar, Ed Brubaker começou sua carreira de escritor de quadrinhos 1991, em publicações alternativas da Caliber Comics, e da Dark Horse Comics, pela qual ganhou sua primeira indicação ao Eisner Awards (o Oscar dos quadrinhos), em 1993, e, chamando a atenção da crítica, trabalhou no selo adulto da DC Comics, Vertigo, onde publicou Crime Scene com uma trama de detetives, a partir de 1999, o que lhe levou ao Batman em uma aclamada fase, entre 2001 e 2003, em parceria com o escritor Greg Rucka, na qual produziram arcos como Bruce Wayne: Fugitivo, além de histórias da Mulher-Gato e, novamente com Rucka, a revista Gotham Central, entre 2003 e 2006, baseada na série de TV Nova York Contra o Crime, mostrando o dia a dia dos policiais comuns vivendo no mundo de super-heróis do Batman, que foi bastante aclamada por público e crítica. Brubaker também teve uma notória passagem pelo selo Wildstorm, da DC, onde escreveu a autoral Sleeper e a série Authority, sobre uma visão realista e violenta sobre super-heróis.

Estreando na Marvel com o Capitão América, Brubaker também escreveu histórias dos X-Men, no especial X-Men: Deadly Genesis e, depois, a revista mensal Uncanny X-Men; além de substituir Brian Michael Bendis na revista do Demolidor, numa aclamadíssima fase, a partir de 2006, época em que iniciou, em parceria com o escritor Matt Fraction, The Immortal Iron Fist, retomando as aventuras do Punho de Ferro. Brubaker ainda lançou a HQ autoral Criminal (pelo selo Icon da Marvel) e ganharia o Eisner de Melhor Escritor em 2007, 2008 e 2010, além de Melhor Edição (junto ao desenhista Gene Colan) por Captain America 601, de 2010.

Começando em Captain America (vol. 5) 01, de janeiro de 2005, os roteiros fantásticos de Brubaker e a arte realista de Epting imprimiram fortes imagens nos leitores e o Capitão América voltou a ser um dos principais personagens da editora e (um feito maior ainda) a ser uma das revistas de maior sucesso da casa. Nessa primeira edição, o escritor já coloca a ambientação que seguirá em sua fase: resquícios da Guerra Fria se somando à herança da II Guerra. Na trama, retrocedemos seis anos no passado e conhecemos um ex-general soviético chamado Aleksander Lukin que, desiludido pela Queda da União Soviética, começa a vender artefatos especiais criados ou coletados pela KGB ao longo das décadas, tendo o Caveira Vermelha como um de seus clientes. No presente, vemos o Capitão América receber uma represália pessoal da ex-namorada Sharon Carter, a Agente 13, porque anda violento e descuidado nos últimos tempos (ele se justifica pelas tensões enfrentadas – será algo relacionado a Wanda Maximoff?) e pela notícia de que o Caveira escapou da prisão.

O velho vilão está de posse de um novo Cubo Cósmico, mas enquanto o aguarda ser carregado de sua energia, surpreendentemente, termina sendo alvo de um snipper e morrendo em sua cobertura de luxo! Os responsáveis, descobrimos na edição 02, é uma dissidência da IMA chamada IDA, e daí para frente é só adrenalina, com os homens do Caveira (liderados por Ossos Cruzados) atrás de quem o matou, a IMA contra a IDA, e Steve, Sharon e Nick Fury em busca de entender o que está acontecendo (incluindo combater os terroristas em Londres – com uma participação relâmpago do Union Jack – e em Paris), ao mesmo tempo em que – por causa da ativação do Cubo Cósmico, iremos descobrir depois – o herói começa a ser repentinamente abalado por lembranças da Guerra, que nos permitem enxergar (na arte de Michael Lark, responsável pelas inserções em flashback ao mesmo tempo em que Epting cuida do presente) um novo olhar sobre Bucky, com ele mostrado como um garoto mais experiente e durão, na linha da minissérie As Aventuras do Capitão América de Nicieza e Maguire dos anos 1990.

Na edição 04, após Jack Monroe, o Nômade, ser assassinado pelo mesmo snipper (que ainda incrimina o herói pela morte do Caveira), e do Capitão ver que os túmulos de William Naslud e Jeff Mace foram danificados, uma luta contra Ossos Cruzados dá a dica de que ele está atrás de “um russo”, e finalmente, na edição 05, Steve e Fury chegam a Aleksander Lukin, a quem não conhecem, mas a SHIELD sabe que foi um maioral da URSS sob a tutela de Vasily Karpov, e o fato dele agora ser um “empresário” da Corporação Kronas, fazem o Capitão ligar os pontos: Kronas era um vilarejo próximo a Stalingrado, palco de uma das batalhas mais acirradas que ele presenciou na II Guerra Mundial, na temida Floresta Negra, durante o Inverno de 1944, quando o Caveira Vermelha e o Grande Mestre (vilão das revistas dos Invasores) destroçaram o lugar, e o herói lutou (ao lado de Tocha Humana e Namor) aliado aos soviéticos liderados por Karpov.
Os leitores ficam sabendo que Lukin era uma criança sobrevivente do massacre, que fora salva, adotada e treinada por Karpov, crescendo com o desejo de vingança contra o Capitão e o Caveira Vermelha. (Karpov morreu há mais de 20 anos e não pode estar implicado nos planos recentes).

Após vermos a primeira menção ao nome “Soldado Invernal”, a explosiva edição 06 traz a estreia às claras do personagem – após ser mostrado nas sombras nos números anteriores como o misterioso snipper – que fez Sharon Carter refém na Filadélfia, enquanto o Capitão vai à ilha no Canal da Mancha em que ele e Bucky tiveram sua batalha final contra o Barão Zemo em 1945, e que, sem necessariamente desdizer o que foi contado nas histórias de Lee e Kirby e de Thomas e Buscema, nos anos 1960, vemos uma versão bem mais brutal dos fatos, com a dupla feita refém e sofrendo torturas e Bucky morrendo porque a manga de sua camisa ficou presa no avião experimental que explodiu. Mas também vemos que Karpov estava em um submarino relativamente próximo dali… Ainda vemos o Capitão chegar à Filadélfia, ver de longe o Soldado Invernal, salvar a Agente 13, lutar contra a IMA e uma bomba alimentada pelo Cubo Cósmico explodir e destruir um quarteirão inteiro, com centenas de mortos.

Mas nisso, quando Sharon é salva, ela diz ao Capitão que acha que o seu captor era Bucky! E quando o próprio Steve finalmente enfrenta rapidamente o Soldado Invernal em meio às sombras e fumaça, pergunta se ele é Bucky… E o vilão responde: “quem diabos é Bucky?”.
Na edição 08, Fury mostra para Steve fotografias de seu arquivo sobre o Soldado Invernal para mostrar que a suspeita é que ele é James Buchanan Barnes e que trabalhou para os soviéticos por décadas durante a Guerra Fria, sendo um assassino-fantasma, temido e lendário, que nunca foi pegue. Steve reluta em aceitar a verdade, enquanto tentam pegar Lukin, que é tratado como “amigo” pelo Governo dos EUA, porque a Kronas comprou a Roxxon (notória empresa-vilã da Marvel) e irá construir um oleoduto em Madripoor (país fictício na região da Indonésia), mas na edição 11 ficamos sabendo que Lukin está ouvindo vozes e ainda usa o Cubo Cósmico para que Steve receba uma cópia da pasta da KGB sobre o Soldado Invernal, que fomenta o herói das informações sobre seu ex-parceiro de guerra.

A pasta revela que Bucky realmente morreu – pela explosão, pela queda ou pela hipotermia nas águas congeladas do Canal da Mancha em pleno inverno de 1945, mas como seu corpo estava realmente congelado, e fora congelado imediatamente após a morte, a equipe de Karpov pode aplicar simples técnicas de ressuscitação, como choque elétrico e adrenalina para que “voltasse a si” como se tivesse morrido há instantes, e deu certo! A explosão privara Bucky do braço esquerdo e ele tinha perdido a memória pelo evento traumático, mas continuava um lutador sem igual e falava quatro idiomas (provavelmente, alemão, francês, russo e mais outro), mas não tinha a Fórmula do Supersoldado como os soviéticos esperavam, então, Karpov o congelou novamente, pensando em usá-lo no futuro. Daí, em 1954, a tecnologia permitiu criar um braço biônico e foi iniciado o Programa Soldado Invernal, com Bucky usado para missões especiais de assassinato e, depois, ser congelado de novo, de modo que – como Fury já tinha dito – ele envelheceu apenas 8 anos desde 1945!
A pasta mostra, inclusive, muitos alvos importantes do Soldado Invernal a partir de 1955, como embaixadores britânicos, uma equipe de diplomatas das Nações Unidas, o ministro de Defesa francês, um general americano, um senador… a maioria deles interpretado em sua época como mortes acidentais ou por outros agentes até que, em 1973, numa missão dos EUA, Bucky parece se lembrar de sua vida anterior e some por duas semanas até ser recapturado e a KGB decide não mais usá-lo no seu país natal. Após passar boa parte dos anos 1980 como “segurança” de Karpov no Oriente Médio, a morte do general faz com que o assassino seja “desligado” (definitivamente congelado) em 1988, ficando no depósito da KGB que vimos na primeira edição.

Na edição 12, de dezembro de 2005, enquanto montam a missão para confrontar Lukin e o Soldado Invernal (e Steve insiste que ainda há algo de Bucky nele, ao passo que Fury e Sharon querem matá-lo), vemos mais do verdadeiro James Barnes: um flashback (por Lark) mostra o general Phillips mostrando Bucky para Steve antes dos dois se conhecerem, com o rapaz – de apenas 16 anos em 1940 (e Steve tem 20) – já estava sendo treinado por alguns dos melhores agentes e era um lutador sem igual. De novo, o Bucky mais velho e durão como a versão de Nicieza-Maguire. O general até fala do poder simbólico de um adolescente lutando ao lado do Capitão América, trazendo para a ficção o motivo pelo qual o personagem foi criado na vida real, além de dizer algo que Steve falara a Sharon numa das primeiras edições da fase: que Bucky podia “sujar as mãos” de um modo que o Capitão não podia. Essas cenas davam a entender que a famosa cena em que o rapaz descobre que Steve era o Capitão no acampamento foi armada para inserir “discretamente” o jovem dentro do projeto.

Vemos também que Lukin estava ficando cada vez mais descontrolado e obsessivo por causa do efeito do Cubo e a edição também mostra o Falcão aparecendo para ajudar o Capitão, a primeira vez que os dois se encontram depois daquelas tensas histórias de pouco tempo antes (e que, como já dissemos, foram completamente ignoradas), com os dois conversando como velhos amigos. Na edição 13, Capitão e Falcão recebem o reforço do Homem de Ferro para sua missão de rastrear o Cubo Cósmico, que o Soldado Invernal foi designado para enterrar, pois Lukin está perdendo o controle.


E na edição 14, de abril de 2006, Capitão e Falcão invadem uma das instalações da Kronas e temos o primeiro confronto real e direto do herói com seu ex-parceiro de Guerra, numa luta na qual Steve tenta o tempo todo lembrar seu amigo de quem ele é, de modo muito similar à forma como seria adaptada ao cinema alguns anos depois. No fim das contas, o Capitão se “rende” e pede ao Soldado Invernal para matá-lo a sangue frio caso não lembre mesmo quem ele é, e Bucky hesita…

Então, Agente 13 e Falcão chegam e a distração permite ao Capitão pegar o Cubo Cósmico e usá-lo para que o amigo lembre quem ele é. Funciona, mas Bucky fica atordoado pelo o que o Cubo fez e o destrói com sua mão metálica, dando a impressão de que morreu vaporizado em seguida.
Mas claro que não, e vemos o rapaz chorando pelo remorso de tudo o que fez. E ainda termina com uma revelação bombástica: a “voz” que Lukin vem ouvindo em sua cabeça é de ninguém menos do que do Caveira Vermelha… Por estar com o Cubo na mão na hora em que foi atingido, o vilão transportou sua consciência para a mente do ex-líder soviético!
O arco O Soldado Invernal, rapidamente lançado em encadernado, foi um grande sucesso de público e crítica, dando início a melhor dentre todas as fases que o Capitão América já teve, nas habilidosas mãos de Ed Brubaker. Não são poucos os críticos que colocam O Soldado Invernal como a melhor história do Capitão América dentre todas, ou estando abaixo apenas daqueles clássicos de Steve Englehart dos anos 1970. Mas o fato é que, sem dúvida, é a história basilar do Capitão no século XXI e um grande feito da Marvel em tempos recentes.

Após esse primeiro círculo, Brubaker continuou aprofundando os elementos de sua história, e o arco seguinte, chamado de A Ameaça Vermelha, começando com arte de Mike Perkins, mostra Capitão e Agente 13 em busca de Bucky (que logo descobrem estar vivo, atuando pelo interior dos EUA) e o Ossos Cruzados recuperando Synthia Shmidt, a filha do Caveira Vermelha, que sob a custódia da SHIELD, sofreu lavagem cerebral e esqueceu quem era. Após “reabilitá-la”, na edição 15, o número 16 mostra a dupla em ação ao mesmo tempo em que Steve fica tão feliz ao saber que Bucky está vivo que beija Sharon. Ela se deixa levar e os dois passam a noite juntos, retomando o romance depois de muito e muito tempo. Isso é importante, pois apesar da Agente 13 ter reaparecido viva nas histórias de uma década antes, a dupla não retomara até então o romance que tiveram nos anos 1960 e 70. Ainda na cama, o casal recebe um pedido de ajuda da IMA contra o Ossos Cruzados e Pecado. É neste ponto da história em que Nick Fury deixa de ser o Diretor da SHIELD e está foragido, quando suas ações mostrada na minissérie Guerra Secreta veem à tona. Maria Hill se torna a Diretora da SHIELD.

Em meio a isso, foi publicada a deliciosa edição especial Captain America 65th Anniversary, de março de 2006, celebrando as seis décadas e meia do personagem, com uma história retroativa, por Brubaker e a arte mais cartoon por Javier Pulido e Marcos Martins, que mostram Capitão e Bucky agindo ao lado de Nick Fury e o Comando Selvagem contra o Caveira Vermelha despertando um robô gigante ao estilo dos velhos Hibernantes, numa aventura com toda a cara dos clássicos da Era de Prata. A trama mostra os heróis aliados com a Resistência Alemã aos Nazistas, quando conhecem Gretchen Zeller, uma garota que Bucky amou e que fora mencionada na edição 17.

Na Captain America (vol. 5) 18, de julho de 2006, o desenhista Steve Epting está de volta, com Lukin assumindo a identidade do Caveira Vermelha – pois agora os dois dividem o corpo (e o vilão volta a usar uma máscara, o que também é legal) – e iniciando um plano de dominação, que leva o Capitão à Inglaterra para agir ao lado de Union Jack e Spitfire (ele, o terceiro com esse nome, aquele mesmo surgido nos anos 1980, e ela a heroína original, rejuvenescida), ao passo que o Soldado Invernal os ajuda nas sombras, que lutam contra o Grande Mestre (velho inimigo dos Invasores) com Lukin/Caveira reativando o Hibernante (que apareceu naquela edição especial) na edição 21, de outubro, o que leva à primeira vez que Capitão e Bucky lutam juntos desde os tempos da Guerra. Ficamos sabendo que Bucky está trabalhando com Fury e ele foge, porque não consegue encarar Steve ainda, mas no fim, Lukin/Caveira está reunido com Ossos Cruzados e Pecado.
Guerra Civil: A Morte de Steve Rogers
Em paralelo à fase de Ed Brubaker na revista do Capitão, corria as aventuras dos Novos Vingadores de Brian Michael Bendis, na qual o herói e o Homem de Ferro criavam uma nova versão da equipe de heróis, agora com membros incomuns, como Homem-Aranha, Wolverine e Luke Cage. Mas a harmonia do grupo é destruída na minissérie Guerra Civil, escrita por Mark Millar e com a bela arte de Steve McNiven, publicada em sete capítulos na virada de 2006 para 2007.

Esta minissérie, além de ter sido um dos maiores sucessos da história recente da Marvel, foi também um importante marco divisor da cronologia da casa, dando a tônica dos anos seguintes do Universo Marvel. Além disso, serviu como uma bem-sacada crítica (nada velada) à política da Era Bush nos Estados Unidos.
Na trama, o grupo de heróis Novos Guerreiros causa, sem querer, a morte de 600 pessoas, a maioria crianças, o que leva o Congresso Americano a votar a Lei de Registro de Superhumanos, que obriga aos superseres revelar suas identidades e passarem a agir como encarregados do Governo. Tony Stark, o Homem de Ferro, é o Secretário de Defesa dos EUA e se torna o grande defensor da Lei; mas inesperadamente, uma facção de heróis liderada pelo Capitão América se ergue contra o Registro, por jugá-lo contra os Direitos Humanos. Ao tornar pública sua opinião, Steve Rogers é duramente perseguido pela SHIELD, foge e vira um foragido, um fora da lei.

O pior de tudo é que cabe a Stark comandar a aplicação da Lei, e o Homem de Ferro se volta com sanha contra os seus velhos amigos, quase como se ele mesmo fosse um vilão. A batalha, então, se torna não contra um vilão, mas entre grupos de heróis que eram amigos até então, mas foram divididos pela política. A facção do Capitão (que tem Wolverine e Luke Cage como aliados e ganha a adesão do Homem-Aranha em seguida – que primeiramente apoiou Stark, mas as ações do Homem de Ferro e seus aliados se tornaram tão extremas, que ele desertou) é perseguida pela facção do Homem de Ferro (que tem Reed Richards e Hank Pym como aliados, além da Miss Marvel e Viúva Negra).
Uma grande batalha é travada em Nova York quando o esconderijo dos dissidentes é descoberto, mas o grupo do Homem de Ferro usa um clone de Thor (que estava morto naqueles tempos) e o construto bio-tecnológico termina por matar o Golias Negro, o que deixa todos em choque.

A minissérie retoma a ideia da rivalidade entre Steve Rogers e Tony Stark e os dois têm duas grandes lutas na história, a primeira Stark leva a melhor, mas na segunda, o Capitão dá uma derrota tão fragorosa ao Homem de Ferro que chega perto de matá-lo. Apesar de vencer com os punhos, ao perceber a destruição que seus Vingadores dissidentes estão fazendo na cidade, o Capitão fica desolado e se entrega às autoridades.
Em paralelo a isso, a revista Captain America começou a mostrar as consequências de Guerra Civil na edição 21, de novembro de 2006, ainda por Ed Brubaker no texto e com a arte de Mike Perkins, na qual vemos que Sharon Carter trai a SHIELD para ajudar seu namorado a se esconder, enquanto vemos as maquinações de Lukin/Caveira Vermelha se aliando aos velhos amigos Arnim Zola e o Doutor Faustus, que está infiltrado na SHIELD como um psicólogo que avalia Sharon e a manipula mentalmente.
Também há a edição especial The Winter Soldier: Winter Kills, que traz a primeira aventura solo do Soldado Invernal, por Brubaker e arte de Lee Weeks, na qual a trama se passa em dois tempos: um na II Guerra Mundial, ao lado dos Invasores (especialmente com Centelha – afinal, ele e Bucky tiveram aventuras solo na Era de Ouro em Young Allies, lembram?), e no presente, com Bucky agindo ao lado de Fury e finalmente interagindo com o elenco da Marvel contemporânea, o que inclui os Jovens Vingadores e seu velho aliado Namor, o Príncipe Submarino.

Então, chegamos à história A Morte do Sonho, na histórica Captain America (vol. 5) 25, de abril de 2007, (ainda por Brubaker e com Steve Epting de volta), na qual enquanto vemos uma recapitulação da origem do Capitão América e alguns de seus principais momentos, Steve Rogers está preso e é levado sob custódia por policiais e pela Agente 13 representando a SHIELD ao julgamento preliminar na Suprema Corte, mas é baleado nas escadarias do tribunal por Ossos Cruzados.
Enquanto é encaminhado em uma ambulância, com Sharon Carter sempre ao seu lado, enquanto Falcão e o Soldado Invernal conseguem encurralar Brock Rumlow e o prendem. Mas o herói morre ao entrar no hospital e o país entra em choque. E no hospital, Pecado está disfarçada de enfermeira e diz um comando mental do Doutor Faustus que faz Sharon lembrar que foi ela quem deu os últimos tiros no abdômen que ceifaram a vida de seu amado, o que a deixa à beira da loucura.

O lançamento da edição 25 causou uma grande repercussão na época, chegando inclusive à grande mídia. Àquela altura, ninguém esperava que o personagem permanecesse morto de verdade por muito tempo, pois o esquema d’A Morte do Superman de uma década antes permanecia sendo repetido. Mas ainda assim, foi uma história muito impactante, ainda mais na sequência do que foi Guerra Civil, e serviu como um tipo de capítulo final na história de Steve Rogers. Quer dizer, um leitor poderia pensar que, se existisse um final para a história do Capitão América, seria esse. Um belo conto.
A edição 26 explora como a opinião pública – cuja boa parte reprovava a ação do herói na Guerra Civil – termina por reverenciar seu papel como herói e seguem-se homenagens pelo país e mundo. Ao mesmo tempo, Sharon continua se martirizando pelo o que descobriu e Tony Stark, agora o novo Diretor da SHIELD, lhe mostrando que o corpo do herói reverteu à condição pré-Soro do Supersoldado, numa cena algo aterradora, com Brubaker e Epting mostrando sem pudores o cadáver do herói protagonista. Algo chocante e que seria impensável décadas antes nas HQs.
O enterro de Steve Rogers é mostrado em uma minissérie, Capitão América – A Morte de uma Lenda, escrita por Brian Michael Bendis e com arte de Leinil Francis Yu, na qual cada capítulo mostra um dos heróis (como Homem de Ferro, Wolverine e Homem-Aranha) lamentando o feito, e tem como elemento narrativo um belo discurso de Sam Wilson no momento de baixar o caixão. O velório é mostrado na mesma edição 26, com os amigos reunidos e lamentando e Sharon se demitindo da SHIELD e contemplando o suicídio (outra cena forte com ela colocando uma arma embaixo do queixo), mas ela termina embarcando numa missão ao lado do Falcão.

A questão é: Bucky Barnes visitou a exposição especial dedicada ao Capitão América aberta no Smithsonian Museum, em Washington-DC., que traz artefatos genuínos do herói para serem admirados pelo grande público e está decidido a levar consigo o escudo de adamantium-vibranium para que não fique com Stark e nem caia nas mãos erradas, mas ao perceber que o escudo do museu é falso, vai investigar onde está o verdadeiro. Isso o coloca num embate com a Viúva Negra na edição 27, pois ela é a encarregada de transportar o escudo, e temos a revelação de que Natasha Romanoff e Bucky Barnes se conhecem dos tempos em que eram espiões na União Soviética – lembrem que ela também envelhece devagar por causa de experimentos científicos – e tiveram um romance ali pelos anos 1950! Na luta Bucky vence e leva consigo o escudo, enquanto Stark fica desconfiado de que a Viúva se deixou abater. Mas ela lhe avisa de que o Soldado Invernal irá tentar se vingar dele, pois o culpa pela morte de Steve.
Mas Bucky tenta atacar Lukin/ Caveira e só tarde demais percebe que os dois agora são a mesma pessoa e é capturado, com o Dr. Faustus com a missão de “transformá-lo”, ao mesmo tempo em que Stark investiga mais a fundo o assassinato de Steve e a fuga de Ossos Cruzados da SHIELD, percebendo a farsa de Faustus e que ele também teve acesso a Sharon, de modo que tenta avisar à Viúva Negra que a Agente 13 está comprometida, mas respondendo a comandos hipnóticos de Faustus, Sharon imobiliza Natasha e o Falcão, na edição 31.

O plano do Caveira e Faustus é atrapalhado pela ação do Homem de Ferro, Falcão e Viúva Negra, ao passo que Sharon vai gradativamente recuperando o controle de sua mente, inclusive, num “ato falho”, libertando Bucky para que Stark o leve ao Aeroporta-aviões da SHIELD, e na edição 33, de agosto de 2008, Bucky tem a chance de se vingar de Stark e os dois têm uma luta ferrenha, mas o Homem de Ferro consegue trazer alguma razão, dizendo que tem uma carta que Steve deixou para eles dois.
O conteúdo da carta nunca é revelado na integridade, mas deixa claro que Steve queria que Bucky ficasse com o escudo e que Stark o ajudasse a se salvar, então, em Captain America (vol. 5) 34, o ex-Soldado Invernal se torna o novo Capitão América!
Bucky Barnes, o Capitão América
O impacto da morte de Steve Rogers foi imenso não apenas em sua revista (é claro), mas em todo o Universo Marvel. E Ed Brubaker soube explorar de modo incrível essas consequências na revista agora sem seu protagonista, mas numa trama tão boa, mas tão boa, que o título seguiu sendo um dos mais “quentes” da editora mesmo sem o Capitão, agora, com a arte migrando para Butch Guice e ao brasileiro Luke Ross.
Bucky estreia oficialmente como o novo Capitão América na edição 34, de setembro de 2008, usando um novo uniforme, pois diz na revista que não aceitaria usar o velho e não iria fingir que era Steve. O novo visual foi criado pelo artista Alex Ross, conhecido por sua arte realista, e tem o diferencial de que, além do escudo, o novo sentinela da liberdade empunha uma arma de fogo e uma faca.
Daí, a missão de Bucky é encerrar a ação de Lukin/Caveira, o que mobiliza o arco O Homem que Comprou a América, que segue até a edição 41. Na trama, o Caveira simula a morte de Lukin em um acidente aéreo, o que causa uma crise na Corporação Kronas, e pelo fato da empresa ter comprado a Roxxon e ser uma das grandes parceiras do Governo dos EUA, termina trazendo uma fortíssima crise econômica no país, o que é uma forma de Brubaker trazer a real crise de 2008 (causada pelas hipotecas, algo que também é mencionado nas tramas) para os quadrinhos.
Brubaker teve a façanha de manter o público interessado em Bucky Barnes e a revista do Capitão América como uma das mais vendidas da Marvel, mesmo com a ausência do real protagonista. Barnes se torna uma figura importante no Universo Marvel, inclusive, ingressando os Novos Vingadores fora da lei (ainda perseguidos pelas autoridades após os eventos de Guerra Civil).
Esta fase se encerra em Captain America (vol. 5) 50, de julho de 2009, e na edição seguinte, a revista retomou a numeração antiga, do volume 1, porque seria o momento em que – se não tivesse sido descontinuada no passado – atingiria o célebre número 600.
O Retorno de Steve Rogers
Claro, que Steve Rogers não ia permanecer morto para sempre, não é? Todos esperavam que o Capitão original iria retornar em algum momento, como é de praxe nos quadrinhos. Ainda assim, o herói permaneceu dois anos inteiros “morto”, longe das revistas. Mas, por fim, Captain America 600, de junho de 2009, trazia Sharon Carter descobrindo que a arma que “matou” Rogers era um artefato especial, não uma pistola comum, então, vem a minissérie Captain America: Reborn, publicada em seis episódios a partir de setembro de 2009 (e substituindo a revista mensal – depois do número 601 – nesse período), por Ed Brubaker e a bela arte de Bryan Hitch, na qual é revelado que a arma foi desenvolvida pelo Doutor Destino e que não o matou, mas congelou Rogers no tempo, só que quando Carter destruiu o artefato, o herói ficou perdido no tempo.

A trama revela um ousado (e confuso) plano do Caveira Vermelha de usar Armin Zola, Doutor Destino e o deslocamento no tempo de Steve para o vilão voltar a controlar seu corpo como fizera no passado. Eles também dominam a mente de Sharon, mas Bucky e Falcão conseguem resolver tudo e Steve, que estava preso no tempo, consegue regressar ao presente e retomar a sua vida.
O regresso de Steve Rogers é o elo que faltava para os heróis se organizarem e derrubarem o reinado de terror de Norman Osborn, resultando na saga O Cerco (Siege), publicada como uma minissérie em 7 capítulos, começando em dezembro de 2009, por Brian Michael Bendis e Oliver Coipel, no qual o ex-Duende Verde é tomado pela loucura e arrogância e tenta invadir Asgard, sendo derrotado, suas maquinações se tornam públicas e ele é destituído de seu cargo e preso. É o início à chamada Era Heroica, com a reunião dos heróis após a cisão de Guerra Civil.
Durante O Cerco, Steve usou seu uniforme do Capitão América normalmente, pois acabara de voltar à vida, mas uma vez estabelecido, veio a questão: o que fazer com Bucky Barnes, que era o Capitão até ali? A Marvel encarou essa pergunta de frente e lançou uma revista especial chamada Captain America: Who Will Wield the Shield?, em fevereiro de 2010, por Ed Brubaker, Butch Guice e Luke Ross, na qual o sentinela da liberdade é chamado à Casa Branca, com o presidente retratado como Barak Obama, que convida Steve para ocupar o papel de líder da SHIELD, no lugar que fora de Nick Fury, Tony Stark e de Norman Osborn (no MARTELO).

Steve aceita e decide que Bucky Barnes continue sob o manto do Capitão América e é Bucky quem integra a nova formação oficial dos Vingadores unificados, ao lado de Homem de Ferro e Thor na revista Avengers (vol. 4), por Brian Michael Bendis e John Romita Jr. Rogers atua como líder da equipe, mas não como agente de campo, adotando um novo uniforme azul escuro (sem máscara), chamado informalmente de Supersoldado e de Comandante Rogers.

Com isso, Steve divide os Vingadores em quatro times operacionais: os Vingadores principais, o rosto público da equipe (com a formação Homem de Ferro, Thor, Capitão América/Bucky Barnes, Wolverine e Homem-Aranha), na revista Avengers; um segundo time mais voltado à ação urbana, os Novos Vingadores, liderados por Luke Cage (na revista New Avengers); como herdeiros da Iniciativa dos 50 Estados, Rogers cria a Academia Vingadores, na revista Avengers Academy (por Christos Gage e Mike McKone) destinada a treinar novos heróis, que é liderada por Hank Pym (agora como O Vespa); e a grande novidade, os Vingadores Secretos, um time furtivo para missões secretas, na qual ele assume efetivamente a liderança de campo.

Os Vingadores Secretos estrearam efetivamente na Secrets Avengers 01, de julho de 2010, com roteiro de Ed Brubaker e arte de Mike Deodato Jr., e além do Supersoldado, contaram com um time meio rotativo de personagens mais “sombrios”, como Valquíria, Fera, Nova, Cavaleiro da Lua, Máquina de Combate, Viúva Negra, Sharon Carter e outros, de acordo com as necessidades das missões. Essa nova revista foi um enorme sucesso. O título trazia um clima mais sombrio e violento, com tramas repletas de suspense e espionagem, envolvendo o artefato místico da Coroa da Serpente, dos quadrinhos dos anos 1970. Passando por outras fases mais à frente, Secret Avengers teria 37 números.
Manter Bucky Barnes como o Capitão América e trazer Steve Rogers para ocupar outro papel foi uma estratégia esperta da Marvel em resposta à ótima recepção do público para as aventuras do ex-Soldado Invernal sob o manto do sentinela da liberdade. Assim, decidiram manter as coisas como estavam por mais algum tempo, o que foi, também, a oportunidade para explorar Rogers em situações novas em seu novo papel de líder máximo da comunidade heroica do Universo Marvel.
Dessa forma, as aventuras de Steve Rogers se desenrolam principalmente em Secret Avengers (mais participações constantes em Avengers) e a Marvel lhe deu até uma nova revista solo, chamada Steve Rogers: Super-Soldier, que estreou em setembro de 2010, por Brubaker e arte de Dale Eaglesham, aumentando a franquia do herói e dos Vingadores.
Por isso, Bucky Barnes permaneceu como protagonista da revista Captain America, continuando a empunhar o escudo e seu uniforme específico na “velha” numeração a partir de 602, de março de 2010, passando pela especial Captain America 616, de maio de 2011, com a edição comemorativa dos 70 anos de publicação do personagem, no qual Steve reflete sobre se ainda é necessário que exista um Capitão América.
Steve Rogers Volta a Ser o Capitão América

A prática dos megaeventos anuais continuou a ser um desafio à Marvel, então, no verão de 2011, chega a nova O Próprio Medo (Fear Itself), e a trama tem início no universo particular do herói: Pecado, a filha do Caveira, conseguiu escapar d‘O Cerco, e se apropriou de novos poderes asgardianos. Em consequência, ao confrontar Bucky como Capitão, termina por matá-lo, e depois, liberta um velho deus nórdico esquecido chamado A Serpente, que é irmão de Odin, e consegue contaminar “pessoas boas” com maldade. Como resultado dessas ações, Steve Rogers volta a empunhar seu escudo e assume de novo o título de Capitão América, dois anos de histórias depois de ter voltado.

Mas a posse do escudo dura pouco tempo… ele é destruído pela ação da Serpente, e depois, será reconstruído por Tony Stark, refazendo a liga de vibranium e adamantium, mas também, incorporando o mítico metal Uru, o mesmo material que faz o lendário martelo de Thor, Mjolnir. Aliás, o deus do trovão se sacrifica para derrotar seu inimigo e cabe ao Capitão empunhar (outra vez) o Mjolnir na batalha final que leva os Vingadores à vitória.

Também vale destacar que Bucky também volta dos mortos: ele é ressuscitado por Nick Fury, que usa nele a misteriosa Fórmula Destino, o mesmo composto que permite que o próprio Fury permaneça jovial mesmo tendo mais de 100 anos de idade.

Essa fase se encerra, por fim, após Captain America 619, de agosto de 2011, quando o sucesso faz com que ela se divida em duas publicações diferentes: a revista principal tem a numeração zerada de novo, começando o volume 6, em setembro de 2011, e uma secundária que traz o herói em parceria com outros personagens, sendo Captain America & Bucky por 9 números, entre setembro de 2011 e maio de 2012, depois Captain America & Hawkeye por quatro números até agosto de 2012, e Captain America & Iron-Man por três números até outubro de 2012.
O Fim da Fase de Ed Brubaker

O novo volume da revista do Capitão América começa em Captain America (vol. 6) 01, de setembro de 2011, ainda escrita por Ed Brubaker, e com arte de Steve McNiven nas primeiras edições, antes de ser substituído por Alan Davis na edição 06, numa sequência de aventuras ao lado do Falcão. O destaque desse primeiro arco é morte de Peggy Carter, já em idade muito avançada, há muito tempo retconned como tia-bisavó de Sharon (em vez de sua irmã, como nas histórias dos anos 1960 e 70). Após seu funeral, no qual comparecem Steve, Sharon, Nick Fury, Dum-Dum Dugan e outros, se desenrola outra aventura com conexões no passado distante do herói, bem ao gosto de Brubaker.

Essas tramas trouxeram novas investidas da HIDRA – usando fake news como armas! – e o surgimento de um novo Carrasco do Submundo, que o herói descobre ser o velho aliado Dennis Durphy, o antigo Demolição.
Ao mesmo tempo, Ed Brubaker continuou a narrar as histórias de Bucky Barnes, que retoma a identidade de Soldado Invernal, inclusive, em uma revista própria, The Winter Soldier, que foi muito bem recebida por público e crítica.
Infelizmente, tudo o que é bom precisa acabar, e Ed Brubaker encerrou sua maravilhosa fase na revista Captain America (vol. 6) 19, de dezembro de 2012, após oito anos de um grande trabalho! A mudança ocorreu em meio à iniciativa Marvel Now, um reformulação editorial da editora.
Nova Década, Novos Desafios, Novas Abordagens
Marvel Now era consequência de outro megaevento que foi publicado em paralelo ao final da fase de Brubaker: Avengers vs. X-Men, como diz o título, colocava os Vingadores em uma acirrada batalha contra os heróis mutantes por causa da discordância deles sobre o retorno da poderosa e perigosa Força Fênix, a entidade cósmica que deu poderes infinitos a Jean Grey no passado. O confronto deixa grandes sequelas, e Steve reconhece que os heróis não trataram da questão mutante como deveriam, fazendo nascer uma nova equipe de Vingadores – agora na revista Uncanny Avengers – mesclando membros tradicionais dos “maiores heróis da Terra” e dos X-Men.

O Capitão, por sua vez, passou a ter as aventuras comandadas pelo roteirista Rick Remender, com desenhos de John Romita Jr. (vindo da revista Avengers), um dos mais famosos e queridos desenhistas da Marvel (já tendo trabalhado com Homem de Ferro, Homem-Aranha, X-Men, Demolidor, Thor, Wolverine etc.) e também filho do lendário Romita que trabalhou com o Capitão nos anos 1950, 60 e 70, mas cujo filho famoso jamais trabalhara com o sentinela da liberdade em seu título solo. A nova dupla criativa deu início ao volume 7 da revista Captain America em janeiro de 2013, numa série de aventuras cósmicas nas quais o personagem é transferido para uma outra dimensão, a Dimensão Z, por Armin Zola, e precisa enfrentar uma série de ameaças alienígenas num mundo em guerra absolutamente distante de seu ambiente tradicional, no que foi um gesto ousado da Marvel. Tendo apenas Sharon Carter ao seu lado por lá, os dois se aliam à “princesa” Jet Black, filha do vilão, que renega seu pai e auxilia os heróis.
Talvez como uma forma de manter os pés no chão, em paralelo a essa abordagem alienígena, a trama de Remender explora a infância de Steve Rogers – um momento praticamente inédito nos quadrinhos – mostrando que seu pai, Joseph Rogers (antes retratado como um herói que morre na I Guerra Mundial) era um alcóolatra que batia na esposa Sarah.
Por fim, os heróis retornam para casa na edição 10, de outubro de 2013, mas ao custo da Agente 13, que se sacrifica detonando a Dimensão Z.

De volta à Terra e com Jet Black do seu lado, se inicia o segundo arco de Remender, agora com o desenhista Carlos Pacheco, continuando a pegada de tratar o Capitão América de modo maduro e mostrando-o como um homem consciente de que o patriotismo levado ao extremo vira fanatismo e que a xenofobia é um grande mal, porque os Estados Unidos foram construídos por imigrantes. Sam Wilson continua a ser a visão das ruas como complemento dessa visão, ao mesmo tempo em que se envolve com Jet Black e os dois namoram. A dupla Capitão e Falcão combate o Bazuca (Nuke), aquele fruto depravado de uma tentativa de recriação do Soro do Supersoldado que aparecera lá atrás no arco Demolidor: A Queda de Murdock, de 1985, e que tivera participação da sentinela da liberdade.
Em seguida, o Capitão precisa enfrentar a ameaça de Ran Shen, um chinês que fora um dos maiores agentes da SHIELD da história, mas achou que foi traído pela agência, ganhou poderes e se transformou num tipo de monstro chamado Iron Nail. Na batalha final entre eles, na edição 21, de agosto de 2014, o vilão envenena Steve de modo que o Soro do Supersoldado é eliminado de seu corpo e ele envelhece.

Ter perdido os seus poderes vem na pior hora, quando Armin Zola retorna à Terra liderando um exército de monstros, então, cabe ao Falcão derrotá-lo. Isso põe em questão se deve haver ainda um Capitão América, em vista do desgaste que a ação com Duke causou, e se sim, quem seria ele? (Também é preciso dizer que Jet volta para a Dimensão Z após a derrota de Zola).
Sam Wilson, o Novo Capitão América
Na edição 25, de dezembro de 2014, há um debate sobre o que deve ser feito com o título do Capitão América e é decidido que Sam Wilson deve ser o novo Capitão América.

Tem-se início uma nova revista chamada All-New Captain America 01, de janeiro de 2015, ainda por Rick Remender nos textos e com arte de Stuart Immonen, com Sam Wilson como o novo Capitão América, em histórias muito boas nas quais o autor explora a reação do público a um homem negro ocupando tal cargo, falando de racismo, intolerância e mais.

Ao lado da heroína Misty Knight, Sam combateu muitas ameaças, como a HIDRA e o Barão Sangue e também fez parte da nova encarnação dos Vingadores (publicada na revista All-New, All Diferent Avengers). Como a Marvel passou a adotar a estratégia de zerar a numeração de suas revistas a cada par de anos, Sam estrelou a nova Captain America: Sam Wilson, a partir de dezembro de 2015, agora com roteiro de Nick Spencer e arte de Daniel Acuña, e na edição 07 daquela revista foi comemorado os 75 anos de publicação do Capitão América.

Na edição 09, Kobic (um Cubo Cósmico consciente) trouxe Steve Rogers de volta à sua condição normal de supersoldado, mas tal qual fizera com Bucky Barnes no passado, Steve prefere que Sam permaneça como Capitão América. Também estreou nessas histórias o personagem Joaquím Torres, um latino, na edição 03, e como Sam agora era o Capitão América, Torres vira um novo Falcão na edição 06, logo sendo um amigo e parceiro do herói.
Agente da HIDRA?
Enquanto Sam Wilson era o Capitão América, a Marvel simplesmente colocou Steve Rogers como Capitão América também, fazendo existirem duas versões concomitantes do herói ao mesmo tempo! Steve estrelou a nova revista Captain America: Steve Rogers 01, começando em julho de 2016, por Nick Spencer e Jesus Saíz, com o herói usando um novo uniforme e agindo ao lado de Sam, Bucky e de Sharon Carter, numa trama contra a HIDRA.

Mas as coisas complicam quando um plano surpreendente vai se revelando de que Steve é, na verdade, um agente da HIDRA e está manipulando os heróis da Marvel em prol dos interesses sombrios da organização e do Caveira Vermelha! O que está acontecendo? Claro, é tudo um grande truque: Kobic, o Cubo Cósmico consciente, foi manipulado pelo vilão e alterou a realidade, para fazer de Rogers um fascista, mas enfim, livre da má influência, Kobic traz de volta o verdadeiro Steve Rogers, que derrota a versão maligna de si mesmo, com essa fase terminando na edição 19, de setembro de 2017.

Na parte final do arco, em paralelo, a Marvel lançou uma saga chamada Império Secreto, escrita por Nick Spencer com vários desenhistas e 10 edições, entre maio e agosto de 2017, mostrando os desdobramentos de trama para o restante do Universo Marvel.
Também em paralelo, continuava o turno de Sam Wilson como Capitão América em sua própria revista e as histórias de Spencer exploraram a difícil situação de Sam como um Capitão que enfrenta aberta oposição de uma parcela da população e enfrenta a organização Americops de cunho fascista, resultando no arco do vigilante Rage – um esquecido personagem resgatado dos anos 1990 – que age no Harlem e termina sendo preso e processado por puro racismo. Essa cadeia de eventos faz com que Sam tenha sua fé nos EUA abalada e ele opta por deixar de ser o Capitão América em Captain America: Sam Wilson 21, de junho de 2017, por Spencer e Daniel Acuña, numa capa que remete à celebre ilustração de John Romita dos anos 1970, quando Steve Rogers fez o mesmo.
Sam ainda fica por um pequeno tempo até a edição 25, mas por fim, deixa o escudo de lado e Steve Rogers passa a ser o único Capitão América outra vez.
Nos Cinemas
Após décadas de produções baratas, mal feitas e sem prestígio, os filmes de super-heróis entraram numa Era totalmente nova no início do século XXI, com bons filmes e muito sucesso, como X-Men – O Filme (2000) e Homem-Aranha (2002) até ganharem ares de seriedade e alta qualidade, como em Batman Begins (2005). No meio disso, a Marvel recriou o seu Marvel Studios sob a liderança do produtor Kevin Feige e assumiu a produção de seus próprios filmes, para realizá-los como sempre sonharam: como um universo integrado de personagens. O Universo Marvel nos Cinemas, MCU em inglês, deu a partida em 2008, com o aclamadíssimo Homem de Ferro, que consagrou o ator Robert Downey Jr. como Tony Stark; e mesmo que o seguinte O Incrível Hulk não tenha agradado na mesma medida, a interligação entre os personagens e histórias sugeridas em ambos os filmes criou um grande frisson: afinal, na última cena de Homem de Ferro, Nick Fury (vivido por Samuel L. Jackson) aparece para Stark para falar da “Iniciativa Vingadores”; e na última cena de O Incrível Hulk, Stark aparece para o general Ross dizendo que está reunindo uma equipe!
Após serem anunciados uma nova leva de filmes, ficou logo muito claro que aqueles heróis apresentados em filmes individuais iriam se reunir em um filme da equipe. Então, após o lançamento de Thor, em 2011, todos esperavam a chegada do Capitão América. E o que não se sabia, inicialmente, era que a Marvel, por meio dos Marvel Studios, iria ter a audácia de reunir rapidamente seus principais heróis nos Vingadores.

O sentinela da liberdade ganhou sua adaptação cinematográfica em 2011, com o lançamento de Capitão América – O Primeiro Vingador, dirigido por Joe Johnson e estrelado por Chris Evans no papel do herói. Curiosamente, Evans já tinha uma vinculação forte com os personagens da Marvel, pois tinha vivido o Tocha Humana nos dois filmes do Quarteto Fantástico lançados pela 20th Century Fox, em 2005 e 2007.

Apesar do receio da “repetição”, o papel caiu como uma luva para Evans e o filme é uma das mais fieis adaptações dos quadrinhos para os cinemas. O roteiro de Christopher Markus e Stephen McFeely explora o fato de um jovem raquítico e idealista do Brooklyn se tornar a principal esperança na guerra contra a HIDRA e o Caveira Vermelha, vivido por Hugo Weaving. A origem do herói é contada em detalhes, reprisando os eventos criados e recontados por nomes como Joe Simon, Jack Kirby, Stan Lee, Roger Stern e John Byrne. E também como trunfo, mantém tudo na ambientação original: em meio à II Guerra Mundial, sendo, portanto, um filme de época.
A personagem Peggy Carter (vivida por Hayley Atwell) também está na trama e conquistou de imediato o coração dos fãs, ocupando o lugar que nas HQs foi da Agente R e da Agente 13 original, ou seja, Betty Ross. Atwell dá um show no papel, mostrando uma mulher firme e eficiente (praticamente, sua primeira cena é disparando uma arma e atingindo a cabeça do motorista fugitivo há uma centena de metros). Mas todo o elenco está ótimo, com Sebastian Stan (Bucky Barnes), Toby Jones (Armin Zola), Dominic Cooper (Howard Stark, o pai de Tony Stark), Tommy Lee Jones (general Phillips).
No filme, Johann Schmidt se torna o Caveira Vermelha com uma primeira versão do Soro do Supersoldado; e lidera a HIDRA, uma divisão nazista especial. Schmidt tem acesso ao Tesseract (o Cubo Cósmico dos quadrinhos), um velho artefato da mitologia nórdica – o que cria uma ligação direta com o filme Thor, lançado no mesmo ano – que o permite criar, junto ao cientista Armin Zola, toda uma série de armas novas extremamente potentes (o que por sua vez, remete ao velho Raio da Morte dos quadrinhos).
O filme mostra o Capitão América liderando o Comando Selvagem ao lado de Bucky Barnes, com apoio de Peggy Carter e do general Phillips, contra a HIDRA em uma caça ao Caveira Vermelha. Em uma ambientação mais realista, Bucky Barnes não é um herói uniformizado, mas um soldado comum, membro da divisão especial encarregada da missão. Ele também não é um adolescente, mas alguém da mesma idade de Steve Rogers, com os dois tendo sido amigos e vizinhos antes da transformação de Rogers no herói. Tal qual os quadrinhos originais, Bucky é tido como morto na guerra: porém, em vez de um acidente de avião, o jovem despenca de um trem em movimento e cai em um abismo.
Em sua missão final contra o Caveira Vermelha, o Capitão América, tal qual nos quadrinhos, também desaparece em missão e termina congelado, de onde é resgatado nos dias atuais por Nick Fury e a SHIELD.

É o gancho para Os Vingadores, de 2012, o épico do Marvel Studios que reuniu Capitão América, Homem de Ferro, Thor e Hulk num mesmo filme, adicionando ainda, Viúva Negra e Gavião Arqueiro como membros da equipe e com participações de Nick Fury e Maria Hill por parte da SHIELD. Na trama, Loki (o meioirmão de Thor) vem à Terra para se apossar do Tesseract e usá-lo para abrir um portal dimensional que permita a invasão dos alienígenas Chitauri.
Em resposta à ameaça de Loki, Nick Fury e a SHIELD ativam os planos da Iniciativa Vingadores, reunindo os poderosos heróis. Mas a equipe logo percebe que a SHIELD está manipulando ações obscuras, usando a energia do Tesseract para produzir armas similares àquelas que a HIDRA usou na II Guerra Mundial. No final, o telespectador ainda descobre que quem está por trás dos Chitauri é ninguém menos do que Thanos, um dos maiores vilões da Marvel.

Os Vingadores é extremamente bem executado, comandado com mão firme do diretor e roteirista Joss Whedon. O público correspondeu: o longa arrecadou mais de US$ 1,3 bilhão e se tornou a terceira maior bilheteria de todos os tempos na época de seu lançamento!
No filme, o Capitão América é o líder nato da equipe, apresentado como um “homem fora do tempo”, já que despertou 70 anos depois de sua época. É o herói que tem mais tempo de tela, apesar da presença marcante do superastro Robert Downey Jr. como o Homem de Ferro.

Em consequência à Os Vingadores, temos Capitão América 2 – O Soldado Invernal, em 2014, o segundo filme solo do herói, agora, dirigido pelos irmãos Joe e Anthony Russo, mas ainda escrito por Marcus e McFeely. Agindo em missões secretas da SHIELD, o herói parece desencavar alguns segredos e depara-se com uma conspiração, ao mesmo tempo em que precisa enfrentar um vilão chamado Soldado Invernal que, para sua surpresa, é um fantasma de seu passado.

Em sua empreitada, Steve Rogers contará com a ajuda de sua colega vingadora Viúva Negra e com o Falcão, Sam Wilson, um militar que usa um par de asas mecânicas para voar, a partir da tecnologia derivada de Stark. O longa também apresenta Brock Rumlow (personagem que nos quadrinhos é o Ossos Cruzados) como um dos operativos da SHIELD dentro da equipe especial liderada por Rogers. 
O filme é um espetáculo de ação e explora de maneira magistral toda a habilidade do Capitão América em combate, além de criar todo aquele clima de “conspiração” ao redor do herói, numa homenagem não somente à HQ de Ed Brubaker que inspirou (o escritor faz uma ponta no filme como um dos cientistas que cuidam do Soldado Invernal), mas também, às tramas dos anos 1970 de Steve Englehart. É um grande filme, fez muito sucesso – batendo mais de US$ 700 milhões nas bilheterias – e não são poucos os fãs (e críticos) que o julgam, até hoje, o melhor filme do Marvel Studios.
Dessa vez, além de Chris Evans, Sebastian Stan, Scarlet Johansson e Samuel L. Jackson reprisando seus papeis de Steve Rogers, Bucky Barnes, Natasha Romanoff e Nick Fury, o filme adiciona Robert Redford como Alexander Pierce, o líder da SHIELD que secretamente é um agente graduado da HIDRA.
A grande consequência do filme, além do retorno de Bucky Barnes como o Soldado Invernal, é a queda da SHIELD, que é revelada como estando totalmente dominada pela HIDRA, que sobrevive como uma organização clandestina. Este último é central à trama de Vingadores – Era de Ultron, que estreou em 2015.

Em Era de Ultron, novamente dirigido e escrito por Joss Whedon, lançado em 2015, é mostrado que os Vingadores assumiram o papel da SHIELD e protegem o mundo de grandes ameaças. O grupo está em ação há três anos quando começa o filme, com os heróis finalmente conseguindo resgatar o Cajado de Loki das mãos da HIDRA. Eles nem sabem, mas o Cajado contém a Joia da Alma, uma das Joias do Infinito (o Tesseract é outra delas). A trama revela que a HIDRA fez testes com seres humanos usando a Joia e, após centenas de mortos, conseguiu gerar “os gêmeos”, os irmãos Wanda e Pietro Maximoff, interpretados por Elizabeth Olson e Aaron Johnson-Taylor, que ganham poderosas habilidades de telecinese e supervelocidade, respectivamente.

Enquanto é dito que o Capitão América e o Falcão (que faz uma pequena participação especial) continuam seguindo as pistas para encontrar o desaparecido Bucky Barnes, Tony Stark e Bruce Banner usam o software JARVIS para se “comunicar” com a Joia do Infinito, gerando uma incrível Inteligência Artificial, que se batiza de Ultron, analisa que os humanos são um mal à Terra e decide exterminá-los.

A grande batalha final é no país (fictício) do Leste Europeu chamado Sokovia, que é o lar dos Maximoff, que iniciam o filme ao lado da HIDRA contra os Vingadores, mas ao longo da batalha, com a intervenção de Ultron, percebem que os heróis estão do lado certo e se juntam a eles. Apesar dos esforços dos Vingadores e de terem conseguido impedir uma catástrofe muito maior, ainda assim, Sokovia é em grande parte destruído por Ultron, antes desse ser eliminado pelo Visão, outro ser artificial criado a partir da Joia. Pietro Maximoff morre na batalha.
No final, arrependido por ter sido o responsável pela criação de Ultron, Stark decide deixar os Vingadores. Thor também parte ao espaço em busca de mais informações sobre as Joias do Infinito e porque estão aparecendo tanto. Com o Gavião Arqueiro se “aposentando” para cuidar da família e o Hulk desaparecido em missão, o Capitão América forma um novo grupo de Vingadores, com Viúva Negra, Máquina de Combate, Falcão, Visão e a Feiticeira Escarlate. A equipe aparece na última cena, porém, nunca a veremos em ação nos cinemas.
Era de Ultron não é baseado em nenhuma HQ em particular, apenas bebe na inspiração das aventuras do vilão, em especial, aquelas escritas por Roy Thomas nos anos 1960 e 70, e na de Kurt Busiek dos anos 1990. O filme fez um sucesso ainda maior, chegando a US$ 1,4 bilhão, ultrapassando o primeiro Vingadores.

A trama geral avança para Capitão América – Guerra Civil, lançado em 2016, novamente com o quarteto dos irmãos Russo, Marcus e McFeely, traz a total desintegração dos Vingadores como conhecíamos, se inspirando na HQ homônima de Mark Millar e Steve McNiven. No início filme, os novos Vingadores estão atrás das últimas células da HIDRA, aquelas lideradas por Brock Rumlow, o Ossos Cruzados, mas neste ataque, o terrorista comete suicídio com uma bomba que explode parte de um prédio e mata dezenas de pessoas.

É a gota d’água para a ONU, que promove o Tratado de Sokovia, na qual 120 países assinam, determinando que os Vingadores só podem agir sob a tutela e as ordens da ONU. Steve Rogers é contra o tratado, pois após os episódios de O Soldado Invernal, antevê o que vai acontecer adiante, mas Stark – movido ainda pela culpa – é a favor. Para piorar, um ex-militar de Sokovia, Helmut Zemo, trama uma pequena conspiração por trás, promovendo um atentado na ONU que mata o rei da nação africana de Wakanda – a terra do Vibranium, que foi citada em Era de Ultron. Zemo faz com que a suspeita do crime caía sobre o Soldado Invernal, que à esta altura já tem de volta todas as suas memórias e vive escondido e atormentado pelo seu passado.
O Capitão América acredita na inocência de Bucky Barnes e vai atrás dele, mas T’Challa, o filho do rei de Wakanda, também vai, porém, disposto a matar o Soldado Invernal, pois ele é o Pantera Negra, o guerreiro máximo de seu país. A ação do Capitão descumpre o Tratado de Sokovia e ele é considerado um criminoso. Então, enquanto Falcão, Soldado Invernal, Sharon Carter, Feiticeira Escarlate e o novato Homem-Formiga são a favor do lado de Rogers; o Homem de Ferro angaria Máquina de Combate, Viúva Negra e Visão para detê-los. Precisando de reforços, Stark ainda coopta o adolescente Peter Parker, que vem há meses agindo em segredo em Manhattan como o Homem-Aranha. E como quer pegar Barnes, o Pantera Negra se une a eles.

Para piorar a situação, Stark descobre que o Soldado Invernal matou seus pais em 1991 (algo que já tinha sido insinuado em O Soldado Invernal) e quer vingança pessoal contra ele. Tanto Stark quanto Rogers pensam que o plano de Zemo é controlar todo um time de Soldados Invernais que estão adormecidos numa velha base soviética na Sibéria. Capitão e Homem de Ferro se encontram lá, mas percebem que Zemo matou todos aqueles agentes e terminam brigando entre si, porque Rogers continua a proteger Bucky Barnes.

No fim (tal qual na HQ), o Capitão vence a batalha e vai embora, enquanto o Pantera Negra prende Zemo. Stark permanece no comando dos Vingadores legais, mas Steve Rogers consegue resgatar seus aliados que estavam presos em uma prisão especial. Barnes vai com T’Challa para Wakanda, em busca de eliminar a programação soviética que ainda existe em sua mente.
Oficialmente um filme do Capitão América, ainda que sua ambientação seja muito mais relacionada aos Vingadores, Guerra Civil foi um estrondoso sucesso e arrecadou US$ 1,1 bilhão nas bilheterias.

O passo seguinte do Capitão América no cinema foi em Vingadores – Guerra Infinita, de 2018, que representa uma mudança criativa, ao dispensar Whedon e passar às mãos do quarteto Russos, Marcus e McFeely, culmina toda a história sobre as Joias do Infinito que já tinham se esboçado em Os Vingadores e Era de Ultron, e mais ainda em outros filmes, como Guardiões da Galáxia e sua sequência, Vol. 2 e Doutor Estranho. Após aparecer apenas em cenas pós-créditos, e como um pequeno coadjuvante no primeiro Guardiões da Galáxia, Thanos, o titã louco, interpretado por Josh Brolin, emerge como o grande oponente dos heróis da Terra.
Na trama, Thanos está reunindo as Joias do Infinito em uma Manopla especial e se tornando o mais poderoso ser do universo, com um plano de eliminar metade da população do cosmos para “consertar” o rumo da civilização, tal qual as clássicas HQs de Capitão Marvel e Adam Warlock em que o vilão antagonizava nos anos 1970, escritas e desenhadas por Jim Starlin, que também produziu (com arte de George Perez e Ron Lim) a megassaga na qual o filme se baseia diretamente: A Trilogia do Infinito (Desafio Infinito, Guerra Infinita e Cruzada Infinita), publicada sob a forma de minisséries, entre 1990 e 1993.

Na Terra estão as duas últimas Joias, a da Alma, com o Visão, e a do Tempo, com o Doutor Estranho, e Thanos manda seus lacaios aqui pegá-las, o que resulta em dois grupos de heróis para defendê-las, pois os heróis estão divididos após Guerra Civil, com Homem de Ferro, Homem-Aranha e Doutor Estranho em uma frente, e o fugitivo Capitão América – usando uma versão “corrompida” de seu uniforme escuro (num aceno às histórias do Nômade dos anos 1970) – liderando os renegados. Com Tropa Nova, Thor e os Asgardianos e os Guardiões da Galáxia basicamente destruídos ao longo do percurso, no fim das contas, o grupo de Stark é levado até uma batalha em Titã, o planeta-natal de Thanos, e são derrotados, com a batalha final sendo em Wakanda, liderada pelo Capitão e os restantes, mas Thanos vence, mata o Visão para tirar-lhe a Joia da Alma e, usando a Manopla do Infinito, estala os dedos (igual nos quadrinhos) e faz metade da população do universo desaparecer, incluindo, gente como Homem-Aranha, Falcão, Nick Fury e muito mais).
Guerra Infinita termina com os heróis derrotados, o mundo em caos e foi um sucesso imenso, arrecadando US$ 2 bilhões nas bilheterias mundiais.

Após o filme da Capitã Marvel, veio o fechamento d’A Saga do Infinito do MCU com Vingadores – Ultimato, de novo pelos Russos, Marcus e McFeely, no qual os derrotados heróis conseguem resgatar Tony Stark perdido no espaço, se reúnem e vão tentar a revanche contra Thanos, mas tendo realizado sua missão, o titã louco não quer mais lutar, e termina sendo morto por um Thor raivoso e descompassado. Mas isso não muda nada do que aconteceu.
O tempo avança 5 anos, para 2023, quando o Homem-Formiga acidentalmente consegue sair do Reino Quântico onde esteve preso (desde Homem-Formiga e a Vespa) e percebe que o tempo lá se passou diferente de nossa realidade. Ele termina instigando os heróis de que é possível usar o Reino Quântico para voltar no tempo e impedir Thanos de reunir as Joias do Infinito, e após longas discussões (pois Stark não quer fazer isso, agora que está casado com Pepper Pots e tem uma filha), os Vingadores restantes aceitam a missão, se espalhando pelo tempo para coletar as Joias em momentos chaves, mas o Thanos do passado descobre isso, e ainda que os heróis sejam bem-sucedidos em reconstruir a Manopla do Infinito e usar o Hulk – único capaz de sobreviver à descarga de energia necessária – para desfazer o “estalo” e trazer de volta todos os que foram apagados, o vilão do passado consegue vir à Terra para refazer sua missão, iniciando uma grande batalha que destrói o Complexo dos Vingadores no interior do Estado de Nova York.

No fim, após uma luta acirrada, os heróis conseguem uma vantagem com o retorno dos heróis desaparecidos, a adesão da Capitã Marvel e com o Capitão América usando Mjornir para machucar Thanos, até que aproveitando uma oportunidade única, o Homem de Ferro se apossa da Manopla do Infinito e a usa para para matar Thanos e todos os seus aliados, ainda que, sendo um humano comum, Tony Stark não suporta a energia e morre.

Os heróis velam Stark com tristeza e o Capitão assume a missão de, sozinho, viajar no tempo e devolver cada uma das Joias do Infinito ao seu momento “certo” da linha temporal, mas de algum modo, ele terminou escolhendo ficar nos anos 1940 ao lado de seu amor, Peggy Carter. No presente, ele aparece como um senhor idoso para Bucky e Sam e entrega o escudo para que o Falcão mantenha o manto do Capitão América vivo.
Ultimato não foi um sucesso, foi um fenômeno cultural que arrecadou US$ 2,7 bilhões nas bilheterias mundiais e se tornou o filme de maior sucesso de todos os tempos no momento em que foi lançado, ainda que tenha caído à segunda posição depois, quando um relançamento nos cinemas aumentou a arrecadação de Avatar, de James Cameron. O longa dos Vingadores foi o clímax do cinema de super-heróis e trouxe uma finalização absolutamente satisfatória à trama geral do MCU.

Mas a máquina não parou… atrapalhados pela pandemia de covid-19 que se alastrou entre 2020 e 2022, o Marvel Studios diminuiu forçadamente sua produção para o cinema, mas também perdeu a mão ao investir n’A Saga do Multiverso, com histórias focadas em viagens no tempo, em realidades diferentes e no surgimento de variantes de personagens vindas dessas outras linhas do tempo. No campo específico do Capitão, a série de TV Falcão e o Soldado Invernal explorou as consequências do “desaparecimento” de Steve Rogers (o MCU nunca esclareceu se ele morreu ou permaneceu recluso como um idoso) e a relutância de Sam em se tornar o novo Capitão, ao mesmo tempo em que o Governo dos EUA decide transformar o agente John Walker no novo Capitão e Helmut Zemo também tem um plano de vingança, numa trama que se inspira especialmente naquela HQ dos anos 1980 de Mark Gruenwald.

No fim da série, Sam se torna o Capitão usando um uniforme idêntico à primeira versão que usou nas HQs e suas aventuras continuam no filme Capitão América – Admirável Mundo Novo, que estreou nos cinemas em 2025, embora sem grande efusividade por parte de público ou crítica. A narrativa de Bucky prosseguiu no filme Thunderbolts, no qual os anti-heróis apresentados em vários outros filmes (como Viúva Negra ou Homem-Formiga), que também não foi bem-recebido, mesmo com o time (e o filme!) serem rebatizados de Novos Vingadores!
Postura Mais Crítica
O sucesso do Capitão América nos cinemas, inclusive, em países que não os Estados Unidos, exigiram uma série de questões sobre o personagem, que já começaram a aparecer nas HQs em qualquer revista pós-2012 que relatamos acima, contudo, com o passar dos anos, esses elementos ganharam ainda mais força.

Passado Império Secreto e encerrada a temporada de Sam Wilson como detentor do escudo, Steve Rogers precisa reconstruir sua imagem como Capitão América, daí a revista retomou a numeração original (pela primeira vez em sete anos!), reiniciando, portanto, em Captain America 695, em janeiro de 2018, com uma nova temporada escrita por Mark Waid, contando com a bela arte de Chris Samnee. Waid entrega uma fase cheia de nostalgia, mas com boas reflexões críticas sobre o papel do herói no mundo do século XXI, ainda que retomando ideias que já desenvolvera em suas histórias dos anos 1990.
Contudo, Waid faz um gesto inesperado ao repetir o processo da animação suspensa e desperta Steve Rogers no futuro distante, como forma de ressaltar o elemento de ser “um homem fora do tempo” (outra vez) e, principalmente, que sua causa é a esperança e a liberdade, e não uma defesa ufanista dos EUA ou de seus governos ou de suas campanhas militares.

O arco chamado Homem Fora do Tempo termina na celebrativa Captain America 700, de junho de 2018, que traz uma interessantíssima segunda história, na qual Waid e o departamento de arte da Marvel reciclam ilustrações de Jack Kirby para criar uma história “clássica” do Capitão, com SHIELD, Fury, HIDRA e Caveira Vermelha, num efeito maravilhoso. Uma bela homenagem.
O arco seguinte é ainda mais inesperado, mostrando um descendente de Steve Rogers em um futuro ainda mais distante, encerrando essa curta fase na edição 704, de agosto de 2018.

Daí, a Marvel zera novamente a numeração e dá início ao volume 9, com Captain America (vol. 9) 01, de setembro de 2018, com roteiro do aclamado escritor Ta-Nehisi Coates, um afroamericano, filho de um membro dos Panteras Negras dos anos 1970, e especialista em literatura africana, que após uma carreira muito bem sucedida na literatura e crítica política escreveu uma célebre temporada com o Pantera Negra. Com alto valor literário e teor crítico, a fase de Coates gerou bastante falatório na indústria e foi bastante longeva. Contando com a arte do filipino Leinil Francis Yu e capas chamativas do ilustrador Alex Ross, sua temporada explora de modo ainda mais efetivo do que a etapa anterior de Waid, os efeitos (nefastos) do arco Império Secreto, e o clima de desconfiança criado sobre o Capitão América, explorando um herói que não tem mais o apreço do público e nem a confiança de antigos aliados, como Nick Fury.

Ao mesmo tempo, emerge uma nova ameaça, uma organização terrorista secreta chamada Power Elite, que manipula uma série de eventos que resultam em Steve Rogers ser acusado de um homicídio que não cometeu e ser perseguido por isso, um arco que começa na edição 07, já com a arte de Andy Kubert. Entre as edições 13 e 19, além da perseguição das autoridades, do retorno da organização THEM (ELES, dos anos 1960, lembram?), o Capitão conta com a ajuda das Filhas da Liberdade, agindo ao lado de personagens como a Tigresa Branca, Harpia e Misty Knight.
Por fim, temos o retorno do Caveira Vermelha (na edição 24) e a conclusão dessa grande saga, que se encerra na edição 30, de setembro de 2021.
Captain America ganhou seu volume 10 em 2022 e, em seguida, o título foi novamente “dividido” em dois, com Captain America: Sentinel of the Liberty (vol. 2) focado em Steve Rogers (o uso de “volume 2” é porque o volume 1 corresponde àquela revista dos anos 1990) e Captain America: Symbol of Truth focado em Sam Wilson, que volta a empunhar o escudo como um aceno à produção da série de TV Falcão e o Soldado Invernal do Marvel Studios.

O volume 11 foi lançado em 2023 trazendo o polêmico escritor J.M. Straczynski (com arte de Jesus Saíz) com um arco no qual uma ameaça mística persegue Steve Rogers ao longo do tempo (no passado, presente e futuro), sendo outra oportunidade de explorar o personagem antes de virar o Capitão América, um modo de dizer que não é só habilidade física que faz o herói, mas seu espírito.



























Ola.
E aquela fase onde o efeito do soro do super soldado esta acabando e o CA vai ficando debilitado, a ponto do Tony Stark desenvolver uma armadura pro CA ?
Qual o numero e nome exato da revista, dessa fase para frente, tem ideia ?
Grato.
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Olá, Armindo! A fase em que o Capitão descobre que os efeitos do soro do supersoldado estão se esvaindo ocorreu entre Captain America 425 e 454, publicadas entre 1994 e 1996, totalmente escrita por Mark Gruenwald e desenhada por vários desenhistas, como Ron Lin, Rik Levins e Dave Hooper.
Um grande abraço!
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belissima matéria,fui muito fã dessa fase do capitão deixando seu uniforme,curto muito aquela cena que cascavel pensa “vou pedir ajuda pra um cara que até super-vilão pode contar”e na cena seguinte ela está entrando em contato com o velho capitão…
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Olá, Lucas! Concordo, essa fase específica do Mark Gruenwald em que o Capitão se relaciona com a Cascavel.e luta contra o Ossos Cruzados e a Irmandade da Serpente foi a melhor entre todas da longa contribuição do escritor com o personagem. Os desenhos também eram ótimos, de Kieron Dwyer e Ron Lin.
Depois, tudo desandou…
Um abraço!
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tá certo que a épca foi modorrenta,mas a cena dele se lamentando com Batroc foi muito tocante…(era da armadura)
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é verdade que a certo ponto das histórias,o capitão américa se envolve com a viuva negra?
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Oi, Romina. Na verdade, a Viúva Negra é mais famosa por seus envolvimentos com Gavião Arqueiro, Demolidor e Homem de Ferro.
Um abraço!
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Olá, é possivel que no filme,o capitão america se envolva com a natasha ou seu unico interesse romantico é a sharon carter?
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Oi, Nina,
Acho que no filme só deve haver o envolvimento com a Sharon Carter mesmo.
Mas pode rolar um flerte com a Viúva, sim…
Um abraço!
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Oi,gosto muito do site e venho acompanhando os comentarios e as materias,percebi que tem tido muitas perguntas sobre o envolvimento da Viuva Negra com o Capitão América,voces poderiam fazer um post sobre isso esclarecendo o ponto da histórias que eles se tornam aliados ou se envolvem? Só uma dica mesmo
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Valeu pela dica, Jon.
Vamos pensar nisso…
Um abraço!
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Que trabalho genial, parabéns de verdade. É praticamente um documentário, muito amplo e muito bem feito
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Obrigado, Leandro! Que bom que você gostou.
Não deixe de conferir os outros dossiês que o HQRock tem sobre os personagens dos quadrinhos. Vá na barra Especiais ou na Categoria Dossiê de Personagens.
Um abraço!
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Hqrock obrigado por este grande trabalho, eu tenho uma dúvida. Caveira Vermelha tem a sua origem nos quadrinhos como um homem normal nas primeiras edições. Existe alguma edição que mostra que ele tomou o soro antes do Capitão América ou isso foi uma criação dos filmes de 1990 e 2011? Obrigado
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Oi, Guilherme, tudo bem?
Você está certo: nos quadrinhos originais o Caveira Vermelha era apenas um homem comum, bem treinado. Inclusive, as histórias de Stan Lee e Jack Kirby mostravam o vilão usando um tipo de armadura debaixo de seu uniforme verde, como uma maneira de explicar como ele aguentava as porradas do Capitão América.
O Caveira Vermelha só passou a ter o soro do supersoldado no meio do arco “Nunca Mais”, de Mark Gruenwald, quando se revela que o homem por trás do Comitê de Atividades Superhumanas que obriga Steve Rogers a abandonar o uso do niforme do Capitão América (que passa para John Walker), é não somente o Caveira Vermelha, mas um CLONE de Steve Rogers.
Uma história secundária da revista mostrou que Armin Zola produziu um clone de Steve Rogers e transferiu a consciência de Johan Schmidt para o corpo, após o Caveira ter sido dado como morto no fim da temporada de J.M. DeMatteis.
No fim de Nunca Mais, o Caveira é vítima de seu próprio pó assassino e passa a ter o rosto da caveira vermelha de verdade; e não mais uma máscara como fora no passado.
Os quadrinhos mais recentes – inclusive a fase de Ed Brubaker – continuavam referendando que o Caveira Vermelha habita um clone de Steve Rogers.
Contudo, a minissérie Sentinela da Liberdade, de 1991, escrita por Fabian Nicieza, que mostra em detalhes a origem do Capitão América, fez um pequeno retcon mostrando a já estabelecida ideia de que o vilão foi a primeira cobaia do Projeto Supersoldado, ainda na Alemanha.
Essa é a ideia exibida nos dois filmes, de 1991 e de 2011.
Um abração, Guilherme!
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Acabei lendo a minissérie com suas 4 edições e a revista ”Nunca mais”
Pelo o que eu li, essa minissérie sentinelas da liberdade foi de 1998 sendo um spinoff, ou seja, não faz parte da cronologia original, isso então quer dizer que a ideia no Caveira Vermelha ser o primeiro teste do soro, foi ideia do filme de 1991?
Existe alguma história em quadrinhos de 1990 pra cá, que reforça essa teoria ou não?
Abraços Hqrock 🙂
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Oi, Guilherme,
A minissérie Sentinela da Liberdade do Fabian Nicieza é de 1991, comemorando os 50 anos do personagem. Se o filme é de 1990, então, a ideia foi lançada primeiro no cinema. (Embora sejam ideias concomitantes, pois a minissérie começou a produção naquele ano e demorou bastante a ser terminada por causa de problemas editorais na Marvel e da lentidão do desenho caprichado de Kevin Maguire).
E Nunca Mais se encerrou em 1989, apresentando um Caveira Vermelha com o soro do supersoldado. Portanto, podemos até dizer que tanto a minissérie quanto o filme pegaram uma ideia dos quadrinhos e apenas a levaram para o início da trajetória do personagem, em sua origem.
Um abração!
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